sexta-feira, 29 de abril de 2022

Aposentadoria cassada não impede utilização do tempo de contribuição para outra aposentadoria

Nesta sexta-feira será visto uma decisão da Turma Nacional de Uniformização representativa de controvérsia que gerou o tema 233 com a seguinte redação "O servidor público aposentado no RPPS e que sofrer pena de cassação de sua aposentadoria pode utilizar o respectivo período contributivo para requerer aposentadoria no RGPS, devidamente comprovado por meio de Certidão de Tempo de Contribuição fornecida pelo órgão público competente." Abaixo segue a decisão para análise dos amigos.


EMENTA
DIREITO PREVIDENCIÁRIO. INCIDENTE DE UNIFORMIZAÇÃO DE INTERPRETAÇÃO DE LEI FEDERAL. REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. (TEMA AFETADO Nº 233). SABER SE, UMA VEZ CASSADA A APOSENTADORIA ESTATUTÁRIA, PODE O RESPECTIVO TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO SER APROVEITADO PARA A OBTENÇÃO DE APOSENTADORIA EM OUTRO REGIME, NO CASO O RGPS. TESE JURÍDICA: O SERVIDOR PÚBLICO APOSENTADO NO RPPS E QUE SOFRER PENA DE CASSAÇÃO DE SUA APOSENTADORIA PODE UTILIZAR O RESPECTIVO PERÍODO CONTRIBUTIVO PARA REQUERER APOSENTADORIA NO RGPS. APLICAÇÃO DA QUESTÃO DE ORDEM. 38. RESTABELECIMENTO DA SENTENÇA. PEDIDO DE UNIFORMIZAÇÃO CONHECIDO E PROVIDO.
TNU, PEDIDO DE UNIFORMIZAÇÃO DE INTERPRETAÇÃO DE LEI (TURMA) Nº 0053962-51.2016.4.02.5151/RJ, relator juiz federal Erivaldo Ribeiro dos Santos, 16/03/2020.


ACÓRDÃO
A Turma Nacional de Uniformização decidiu, por unanimidade, DAR PROVIMENTO AO INCIDENTE DE UNIFORMIZAÇÃO interposto pela parte autora, nos termos do voto do Juiz Relator, fixando a seguinte tese: O servidor público aposentado no RPPS e que sofrer pena de cassação de sua aposentadoria pode utilizar o respectivo período contributivo para requerer aposentadoria no RGPS, devidamente comprovado por meio de Certidão de Tempo de Contribuição fornecida pelo órgão público competente. Pedido de Uniformização julgado como representativo da controvérsia (Tema 233). Ausente, ocasionalmente, a Juíza Federal Taís Ferracini.

Brasília, 12 de março de 2020.

RELATÓRIO
REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA - TEMA 233 - Saber se, uma vez cassada a aposentadoria estatutária, pode o respectivo tempo de contribuição ser aproveitado para a obtenção de aposentadoria em outro regime, no caso o RGPS.

Trata-se de incidente de uniformização interposto pela parte autora, com fulcro no artigo 14, §2º, Lei 10.259/01, em face de acórdão prolatado pela 4ª Turma Recursal do Rio de Janeiro, que deu provimento ao recurso do INSS para julgar improcedente o pedido de aproveitamento de período contributivo do RPPS no RGPS, em face da pena de cassação de aposentadoria pública imposta à autora.

O incidente foi admitido pela Presidência da TNU (ev. 3 DESPADEC1).

Em seguida o incidente foi afetado por este colegiado como representativo de controvérsia sob o Tema 233, cuja questão controvertida envolve: Saber se, uma vez cassada a aposentadoria estatutária, pode o respectivo tempo de contribuição ser aproveitado para a obtenção de aposentadoria em outro regime, no caso o RGPS.

A tese defendida pela parte é pela possibilidade de aproveitamento do tempo de contribuição no RGPS em decorrência da cassação da aposentadoria estatutária do servidor (ev. 1 PEDUNIFNAC42 e ev. 1 AGRAVO PU56).

Tendo em vista a afetação como representativo de controvérsia, foi seguida a tramitação regimental estabelecida, com publicação de Edital e intimação de todos os interessados e do Ministério Público Federal.

O Instituto Brasileiro de Direito Previdenciário (IBDP) requereu admissão na condição de amicus curiae.

Ciência do Ministério Público Federal.

Deferida a admissão do INSTITUTO BRASILEIRO DE DIREITO PREVIDENCIÁRIO - IBDP na figura de amicus curiae no presente PUIL (EVENTO 38), nos termos do art. 138 do CPC.

Em seguida, o INSTITUTO BRASILEIRO DE DIREITO PREVIDENCIÁRIO - IBDP opinou no evento 45, no sentido de que há possibilidade do ex-servidor, que teve a sua aposentadoria cassada no RPPS, utilizar as respectivas contribuições previdenciárias para obtenção de aposentadoria no RGPS.

Delimitado o objeto do recurso, passa-se à fundamentação.

VOTO
As questões relativas à admissibilidade e similitude fática e jurídica restaram superadas em face da decisão colegiada no evento 23.

No caso concreto, consta que em 13/10/14 foi publicada a cassação da aposentadoria da servidora inativa Maura Cortaz Vieira, vinculada no DETRAN - RJ (EVENTO 1 - ANEXO 4), por infração do art. 55, inciso I, c/c art. 52, incisos V, VI, VII e VIII e art. 40, incisos III e VIII do Decreto-Lei 220/75.

Consigno que tanto o STJ e o STF já decidiram pela constitucionalidade da cassação de aposentadoria de servidor público prevista no art. 127, IV c/c 134 da Lei 8.112/90, inobstante o caráter contributivo de que se reveste o benefício previdenciário.

Nesse sentido:

PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. MANDADO DE SEGURANÇA INDIVIDUAL. SERVIDOR PÚBLICO FEDERAL. AUDITOR FISCAL DA RECEITA FEDERAL DO BRASIL. PROCESSO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR. PENA DE CASSAÇÃO DE APOSENTADORIA. ART. 117, IX C/C ART. 132, IV E XIII, DA LEI 8.112/1990. CONSTITUCIONALIDADE. PRECEDENTES DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL E DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. CONTAGEM RECÍPROCA DO TEMPO DE SERVIÇO. INTELIGÊNCIA DO ART. 201, § 9°, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. SEGURANÇA DENEGADA.
1. Pretende o impetrante, ex-Auditor Fiscal da Receita Federal do Brasil, a concessão da segurança para anular o ato coator que cassou a sua aposentadoria por invalidez, em razão da prática de infração disciplinar tipificada no art. 132, inc. IV ("improbidade administrativa") da Lei 8.112/1990, ao fundamento da inconstitucionalidade da pena de cassação de aposentadoria.
2. É firme o entendimento no âmbito do Supremo Tribunal Federal e desse Superior Tribunal de Justiça no sentido da constitucionalidade da pena de cassação de aposentadoria prevista no art. 127, IV e 134 da Lei 8.112/1990, inobstante o caráter contributivo de que se reveste o benefício previdenciário.
3. Precedentes: MS 23.299/DF, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, Tribunal Pleno do STF, julgado em 06/03/2002, DJ 12/04/2002; AgR no MS 23.219/RS, Rel. Min. Eros Grau, Tribunal Pleno do STF, julgado em 30/06/2005, DJ 19/08/2005; (AgR na STA 729/SC, Rel. Min. Ricardo Lewandowski (Presidente), Tribunal Pleno do STF, julgado em 28/05/2015, DJe 22/06/2015; AgR no ARE 866.877/RJ, Rel. Min. Rosa Weber, Primeira Turma do STF, julgado em 25/08/2015, DJe 09/09/2015;
MS 20.936/DF, Rel. Ministro Mauro Campbell Marques, Primeira Seção do STJ, julgado em 12/08/2015, DJe 14/09/2015; MS 17.537/DF, Rel.Ministro Arnaldo Esteves Lima, Rel. p/ Acórdão Ministro Mauro Campbell Marques, Primeira Seção do STJ, julgado em 11/03/2015, DJe 09/06/2015; MS 13.074/DF, Rel. Ministro Rogério Schietti Cruz, Terceira Seção do STJ, julgado em 27/05/2015, DJe 02/06/2015.
4. Nos termos do art. 201, § 9°, da Constituição Federal, "para efeito de aposentadoria, é assegurada a contagem recíproca do tempo de contribuição na administração pública e na atividade privada, rural e urbana, hipótese em que os diversos regimes de previdência social se compensarão financeiramente, segundo critérios estabelecidos em lei".
5. Segurança denegada.
(MS 20.470/DF, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 25/02/2016, DJe 03/03/2016)

Ementa: DIREITO ADMINISTRATIVO. AGRAVO INTERNO EM RECURSO ORDINÁRIO EM MANDADO DE SEGURANÇA. PROCESSO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. CASSAÇÃO DE APOSENTADORIA. 1. Pena de cassação de aposentadoria aplicada a ex-Auditor da Receita Federal do Brasil, em razão da prática de improbidade administrativa (art. 132, IV, da Lei 8.112/1990). 2. É pacífica a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal no sentido da constitucionalidade da pena de cassação de aposentadoria prevista no art. 127, IV c/c 134 da Lei 8.112/1990, não obstante o caráter contributivo de que se reveste o benefício previdenciário. 3. Nos termos do art. 201, § 9°, da Constituição Federal, ‘para efeito de aposentadoria, é assegurada a contagem recíproca do tempo de contribuição na administração pública e na atividade privada, rural e urbana, hipótese em que os diversos regimes de previdência social se compensarão financeiramente, segundo critérios estabelecidos em lei’. 4. Recurso desprovido.
(RMS 34499 AgR, Relator(a): Min. ROBERTO BARROSO, Primeira Turma, julgado em 11/09/2017, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-214 DIVULG 20-09-2017 PUBLIC 21-09-2017)

Agravo regimental em recurso extraordinário com agravo. 2. Direito Administrativo. 3. Servidor Público. Processo Administrativo Disciplinar. Penalidade de cassação de aposentadoria. 4. A jurisprudência desta Corte já reconheceu a constitucionalidade da previsão legal de perda do direito como sanção disciplinar, apesar do caráter previdenciário da verba. 5. Ausência de argumentos capazes de infirmar a decisão agravada. 6. Agravo regimental a que se nega provimento. Majoração dos honorários advocatícios em 10%.
(ARE 1091968 AgR, Relator(a): Min. GILMAR MENDES, Segunda Turma, julgado em 23/11/2018, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-256 DIVULG 29-11-2018 PUBLIC 30-11-2018)

Ementa: AGRAVO REGIMENTAL. SUSPENSÃO DE TUTELA ANTECIPADA. SERVIDOR PÚBLICO ESTADUAL. CASSAÇÃO DE APOSENTADORIA. CONSTITUCIONALIDADE. DECISÃO AGRAVADA QUE DEFERIU A SUSPENSÃO DE TUTELA ANTECIPADA. AGRAVO REGIMENTAL IMPROVIDO. I – A natureza excepcional da contracautela permite tão somente juízo mínimo de delibação sobre a matéria de fundo e análise do risco de grave lesão à ordem, à saúde, à segurança e à economia públicas. Controvérsia sobre matéria constitucional evidenciada e risco de lesão à ordem e à economia públicas verificado. II – O Plenário Supremo Tribunal Federal já se manifestou pela constitucionalidade da cassação da aposentadoria, inobstante o caráter contributivo de que se reveste o benefício previdenciário. Precedentes: MS 21.948/RJ, Rel. Min. Néri da Silveira, MS 23.299/SP, Rel. Min. Sepúlveda Pertence e MS 23.219-AgR/RS, Rel. Min. Eros Grau. III – Impõe-se a suspensão das decisões como forma de evitar o efeito multiplicador, que se consubstancia no aforamento, nos diversos tribunais, de processos visando ao mesmo escopo. Precedentes. IV – Agravo regimental a que se nega provimento.
(STA 729 AgR, Relator(a): Min. RICARDO LEWANDOWSKI (Presidente), Tribunal Pleno, julgado em 28/05/2015, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-121 DIVULG 22-06-2015 PUBLIC 23-06-2015)

Vistos etc. Trata-se de embargos de declaração opostos de decisão monocrática, da minha lavra, pela qual negado seguimento a embargos de divergência, ao fundamento de que ausente dissenso interna corporis na interpretação de um mesmo preceito constitucional. Na espécie, assinalada a consonância da decisão impugnada com a jurisprudência do Plenário desta Corte, no sentido da constitucionalidade da cassação da aposentadoria de servidor público demitido por enquadramento em infração disciplinar tipificada como crime, inobstante o caráter contributivo do benefício previdenciário. O embargante aduz contraditório o julgado, ao articular direta a ofensa a preceitos constitucionais. Insiste demonstrado o dissenso jurisprudencial apto a ensejar a admissibilidade dos embargos de divergência. Defende, ainda, a suspensão do processo até que prolatada decisão na ADI 4.882, a qual versa sobre a constitucionalidade dos arts. 127, IV, e 134 da Lei 8.112/1990. Requer, por fim, a concessão de efeitos infringentes para apreciar o mérito do apelo extremo. Em contraminuta, a União aduz inadmitido o recurso por questões processuais, pelo que inviável suspendê-lo por questões meritórias. Postula a condenação da parte recorrente ao pagamento de honorários sucumbenciais recursais. Transcrevo o teor da decisão embargada: “Vistos etc. 1. Trata-se de embargos de divergência de Paulo Roberto Pinheiro da Cruz contra acórdão da Primeira Turma deste Supremo Tribunal Federal, pelo qual rejeitados os seus embargos de declaração em agravo regimental em agravo em recurso extraordinário. Foram apresentadas contrarrazões.
(...)
II – O Plenário Supremo Tribunal Federal já se manifestou pela constitucionalidade da cassação da aposentadoria, inobstante o caráter contributivo de que se reveste o benefício previdenciário. Precedentes: MS 21.948/RJ, Rel. Min. Néri da Silveira, MS 23.299/SP, Rel. Min. Sepúlveda Pertence e MS 23.219-AgR/RS, Rel. Min. Eros Grau.(...). IV – Agravo regimental a que se nega provimento.” (STA 729-AgR/SC, Relator Ministro Ricardo Lewandowski, Tribunal Pleno, DJe 23.6.2015, destaquei) “I. Cassação de aposentadoria pela prática, na atividade, de falta disciplinar punível com demissão (L. 8.112/90, art. 134): constitucionalidade, sendo irrelevante que não a preveja a Constituição e improcedente a alegação de ofensa do ato jurídico perfeito. II. Presidente da República: competência para a demissão de servidor de autarquia federal ou a cassação de sua aposentadoria. III. Punição disciplinar: prescrição: a instauração do processo disciplinar interrompe o fluxo da prescrição, que volta a correr por inteiro se não decidido no prazo legal de 140 dias, a partir do termo final desse último. IV. Processo administrativo-disciplinar: congruência entre a indiciação e o fundamento da punição aplicada, que se verifica a partir dos fatos imputados e não de sua capitulação legal.” (MS 23.299/SP, Relator Ministro Sepúlveda Pertence, Tribunal Pleno, DJ 12.4.2002, destaquei) “AGRAVO REGIMENTAL. MANDADO DE SEGURANÇA. ADMINISTRATIVO. INFRAÇÃO DISCIPLINAR. PRESCRIÇÃO. INOCORRÊNCIA. ART. 142, I E § 2º, DA LEI N. 8.112/90. INSTAURAÇÃO DE PROCESSO ADMINISTRATIVO APÓS A INATIVIDADE. POSSIBILIDADE. COMPETÊNCIA DISCIPLINAR. PRESIDENTE DA REPÚBLICA. CASSAÇÃO DE APOSENTADORIA. APLICABILIDADE. INFRAÇÕES PRATICADAS DE FORMA CULPOSA. DILAÇÃO PROBATÓRIA. IMPOSSIBILIDADE. (...) O fato do servidor público ter atendido aos requisitos para a concessão de aposentadoria não impede a instauração de processo administrativo para apurar a existência de falta eventualmente praticada no exercício do cargo. Precedente [MS n. 21.948, Relator o Ministro NÉRI DA SILVEIRA, DJ 07.12.95]. (…) Não obstante o caráter contributivo de que se reveste o benefício previdenciário, o Tribunal tem confirmado a aplicabilidade da pena de cassação de aposentadoria. Precedente [MS n. 23.299, Relator o Ministro SEPULVEDA PERTENCE, DJ 12.04.2002] (...). Agravo regimental a que se nega provimento.” (MS 23219-AgR/RS, Relator Ministro Eros Grau, Tribunal Pleno, DJ 30.6.2005, destaquei) “Agravo regimental no recurso extraordinário com agravo. Administrativo. (…) Condenação penal por crime cometido em atividade. Cassação da aposentadoria. (…) A Corte já se pronunciou no sentido da possibilidade de cassação da aposentadoria, em que pese o caráter contributivo do benefício previdenciário. 5. Agravo regimental não provido.” (ARE 892262-AgR/DF, Relator Ministro Dias Toffoli, Segunda Turma, DJe 11.5.2016, destaquei) “RECURSO ORDINÁRIO EM MANDADO DE SEGURANÇA – SERVIDOR PÚBLICO – PROCESSO ADMINISTRATIVO – SANÇÃO DISCIPLINAR – CASSAÇÃO DE APOSENTADORIA – LEI Nº 8.112/90 – DECISÃO QUE SE AJUSTA À JURISPRUDÊNCIA PREVALECENTE NO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL – CONSEQUENTE INVIABILIDADE DO RECURSO QUE A IMPUGNA – SUBSISTÊNCIA DOS FUNDAMENTOS QUE DÃO SUPORTE À DECISÃO RECORRIDA – RECURSO DE AGRAVO IMPROVIDO.” (RMS 32624-AgR/DF, Relator Ministro Celso de Mello, Segunda Turma, DJe 23.6.2014, destaquei) “Embargos de declaração recebidos como agravo regimental. 2. Servidor público: legitimidade da pena de cassação de aposentadoria, por ilícito administrativo cometido pelo servidor ainda na atividade, conforme reiterada jurisprudência do Supremo Tribunal (v.g. RMS 24.557, 2ª T., 2.9.2003, Carlos Velloso, DJ 7.12.95; MS 21.948, Pleno, 29.9.1994, Néri da Silveira, DJ 26.9.2003). 3. Recurso extraordinário: descabimento: controvérsia relativa à imposição da pena de cassação de aposentadoria à agravante, que demanda o reexame dos fatos e provas que permeiam a lide: incidência da Súmula 279.” (AI 504188-ED/RS, Relator Ministro Sepúlveda Pertence, Primeira Turma, DJ 11.11.2005) Firmada a jurisprudência do Plenário e de ambas as turmas da Corte no sentido da decisão embargada, mostram-se incabíveis os embargos, a teor do art. 332 do RISTF. 6. Ante o exposto, nego seguimento aos embargos de divergência (art. 21, § 1º, do RISTF)." É o relatório. Decido. Satisfeitos os pressupostos extrínsecos, passo à análise do mérito dos aclaratórios, opostos já na vigência do Código de Processo Civil de 2015, que em seu artigo 1.022 estatui o cabimento de embargos de declaração “contra qualquer decisão judicial”, permitido expressamente, consoante o art. 1.024, § 2º, sejam decididos monocraticamente quando “opostos contra decisão de relator ou outra decisão unipessoal proferida em tribunal”. Com base, pois, nesse permissivo legal, procedo à apreciação singular destes declaratórios, independentemente do caráter infringente que ostentam. Não há vício a sanar. De início, realço devidamente explicitadas as razões de decidir e enfrentadas as questões necessárias e suficientes ao deslinde da controvérsia, consideradas, a teor do art. 489, IV, do CPC/2015, bem como da jurisprudência desta Corte, aquelas assertivas recursais capazes de, em tese, infirmar a conclusão adotada pelo julgador. Precedentes: AR 2374 AgR-ED, Tribunal Pleno, Relator Min. Teori Zavascki, DJe 15.9.2016 e ARE 919777 AgR-ED, Tribunal Pleno, Relator Min. Ricardo Lewandowski (Presidente), DJe 21.9.2016. Os pontos tidos por contraditórios consubstanciam questões atinentes ao mérito dos embargos de divergência, os quais, todavia, não ultrapassaram a barreira do conhecimento. Rememoro didaticamente explanada, no decisum impugnado, a ausência de demonstração de dissenso interna corporis específico, a revelar a existência de teses diversas na interpretação do direito constitucional diante das mesmas premissas fáticas. Não atendidas as exigências dos arts. 1.043, I e III, do CPC de 2015, bem como 330 e 332 do RISTF, não há como adentrar-se ao exame do mérito da controvérsia, procedimento que supõe a adequação da via processual, já enfaticamente repelida. Com efeito, sobrelevo expressamente consignado, na decisão embargada – nos termos do que assentado pelo Plenário do Supremo Tribunal Federal, no julgamento da STA 729-AgR/SC (DJe 23.6.2015) –, o entendimento de que constitucional a cassação da aposentadoria, não obstante o caráter contributivo de que se reveste o benefício previdenciário. Inservível, por sua vez, o julgado trazido à colação pela parte embargante, anterior, inclusive, ao prolatado pelo Plenário. A corroborar essa orientação, realço citados, na decisão acoimada de contraditória, atuais precedentes da Segunda Turma no sentido da aplicabilidade da pena de cassação de aposentadoria (v.g. ARE 892262-AgR/DF, Relator Ministro Dias Toffoli, Segunda Turma, DJe 11.5.2016, (RMS 32624-AgR/DF, Relator Ministro Celso de Mello, Segunda Turma, DJe 23.6.2014). Logo, firmada a jurisprudência do Plenário e de ambas as turmas da Corte no sentido da decisão embargada, revelam-se incabíveis os embargos, a teor do art. 332 do RISTF. Por conseguinte, reputo desatendidos os pressupostos de embargabilidade, consoante o art. 1.022 do CPC.
(...)
(ARE 866877 AgR-ED-EDv-ED, Relator(a): Min. ROSA WEBER, julgado em 30/11/2016, publicado em PROCESSO ELETRÔNICO DJe-263 DIVULG 09/12/2016 PUBLIC 12/12/2016)

A questão a ser dirimina é se as contribuições vertidas ao Regime Próprio de Previdência Social (RPPS) podem ser utilizadas no Regime Geral de Previdência Social (RGPS), após aplicada a pena de cassação da aposentadoria do servidor público que, como se viu, é constitucional.

A sentença fundamenta a procedência do pedido consignando que:

O que justifica a emissão da apontada CTC é justamente o histórico fato de a aposentadoria estatutária ter sido cassada administrativamente, de modo que os respectivos períodos deixaram de estar afetados a algum benefício em manutenção. Essa lógica também se extrai da própria Instrução Normativa INSS/PRES nº 77/2015, ao prever, por exemplo, o aproveitamento de tempo averbado e não utilizado. Vejamos: “Art. 452. A CTC que não tiver sido utilizada para fins de averbação no RPPS ou, uma vez averbada, o tempo certificado, comprovadamente não tiver sido utilizado para obtenção de aposentadoria ou vantagem no RPPS, será revista, a qualquer tempo, a pedido do interessado, inclusive para incluir novos períodos ou para fracionamento, mediante a apresentação dos seguintes documentos: I - solicitação do cancelamento da certidão emitida; II - certidão original; e III - declaração emitida pelo órgão de lotação do interessado, contendo informações sobre a utilização ou não dos períodos certificados pelo INSS, e para quais fins foram utilizados. § 1º Serão consideradas como vantagens no RPPS as verbas de anuênio, quinquênio, abono de permanência em serviço ou outras espécies de remuneração, pagas pelo ente público. § 2º Em caso de impossibilidade de devolução pelo órgão de RPPS, caberá ao emissor encaminhar a nova CTC com ofício esclarecedor, cancelando os efeitos da anteriormente emitida. (...)” Em outras palavras, os períodos de tempo relacionados na certidão integram o patrimônio jurídico da demandante, sendo certo que não estão mais sendo “utilizados”, i.é, não estão mais comprometidos com a concessão/manutenção do benefício estatutário, o qual já fora cassado.

De seu turno a Turma de origem entendeu que:

Autorizar que o tempo laborado como servidora pública perante o Estado do Rio de Janeiro seja contabilizado para a concessão de uma nova aposentadoria pelo Regime Geral da Previdência Social constituiria, indubitavelmente, uma fraude à lei e completo desvirtuamento do sistema jurídico pátrio, já que o autor obteria um benefício com base em um tempo que foi excluído do RPPS, em razão da aplicação de sanção disciplinar por falta grave cometida.

Ocorre que não consta da decisão que cassou a aposentadoria da autora qualquer reflexo que resulte na invalidação ou perdimento também das contribuições vertidas ao RPPS, nem vedação específica para que sejam utilizadas para fim de contagem recíproca.

Também a Constituição - art. 201, §9º - ao asseguradar a contagem recíproca do tempo de contribuição entre o Regime Geral de Previdência Social e os regimes próprios de previdência social, e destes entre si, não ressalvou a hipótese dos autos.

A Lei nº 8.213/91 ao dispor sobre a contagem recíproca de tempo de contribuição fez várias ressalvas, mas não esta, de que o servidor apenado com demissão ou cassação de aposentadoria não pode utilizar o seu tempo contributivo.

Dentre as ressalvas, o artigo 96, III, da referida lei estabelece que: "não será contado por um sistema o tempo de serviço utilizado para concessão de aposentadoria pelo outro".

Entretanto, essa questão está bem resolvida na sentença, cujos fundamentos adoto no presente julgamento. Vejamos:

Assevere-se que a cassação resultou de transgressões disciplinares que não atingiram nem sequer tangenciaram a credibilidade do período contributivo, de maneira que o tempo utilizado no benefício revogado continua hígido e com integral aptidão para produzir efeitos previdenciários no RGPS, sem que isto represente qualquer cômputo em duplicidade. O que justifica a emissão da apontada CTC é justamente o histórico fato de a aposentadoria estatutária ter sido cassada administrativamente, de modo que os respectivos períodos deixaram de estar afetados a algum benefício em manutenção.

(...)

Em outras palavras, os períodos de tempo relacionados na certidão integram o patrimônio jurídico da demandante, sendo certo que não estão mais sendo “utilizados”, i.é, não estão mais comprometidos com a concessão/manutenção do benefício estatutário, o qual já fora cassado.

Por fim, o Decreto nº 3.048/99, ao regular o tema, além de não ressalvar a hipótese dos autos, expressamente prevê emissão de CTC ao servidor demitido, nos termos do artigo 130, §3º, II, sendo certo que a demissão também é uma penalidade, nos termos do artigo 127, III, da Lei nº 8.112/90.

Nesse sentido já decidiram os Egrégios Tribunais Federais da 4ª e 5ª Região:

ADMINISTRATIVO. CASSAÇÃO DE APOSENTADORIA. REGULARIDADE DO PROCESSO ADMINISTRATIVO. INFRAÇÃO PUNÍVEL COM DEMISSÃO. CASSAÇÃO É PUNIÇÃO ADEQUADA. PROVIMENTO PARCIAL PARA PRESERVAR O TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO PARA O REGIME GERAL.HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS.
O fato do servidor público ter atendido aos requisitos para a concessão de aposentadoria não impede a instauração de processo administrativo para apurar a existência de falta eventualmente praticada no exercício do cargo.
O Supremo Tribunal Federal assentou que não é inconstitucional a penalidade de cassação de aposentadoria: Lei 8.112/90, art. 127, IV: MS 21.948/RJ, Relator Ministro Néri da Silveira, Plenário, 29.9.94, 'D.J.' de 07.12.95
Em tendo havido contribuições previdenciárias, durante o lapso que esteve ligado ao RPPS, é de se possibilitar, ao autor, a utilização das contribuições vertidas no Regime Geral da Previdência Social.
Honorários advocatícios minorados.
(APELAÇÃO CÍVEL Nº 5009342-80.2010.404.7200/SC - Relator: LUÍS ALBERTO D AZEVEDO AURVALLE - julgado em 16/06/147 - publicado em 20/06/14)
...
CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. PROCESSO DISCIPLINAR. RESPEITO AOS PRINCÍPIOS DO DEVIDO PROCESSO LEGAL. NULIDADE DO ATO. IMPOSSIBILIDADE.
1 - Apelação de sentença que julgou improcedente o pedido da autora ao deixar de decretar a nulidade do processo administrativo disciplinar que culminou na cassação da aposentadoria da ex-servidora, assim como afastou o pagamento de todas as remunerações referentes desde à época da referida punição, não concedendo ainda a devolução do valor de todas as contribuições previdenciárias recolhidas durante o tempo de serviço público.
2 - Compete ao Poder Judiciário apreciar a regularidade do procedimento administrativo disciplinar tão-somente à luz dos princípios do contraditório, da ampla defesa e do devido processo legal, sem, no entanto, adentrar no mérito administrativo, quando a lei reservar à autoridade margem de liberdade para decidir seguindo critérios de conveniência e oportunidade.
3 - In casu, o procedimento transcorreu com estrita obediência à ampla defesa e ao contraditório, tendo a comissão processante franqueando ao recorrente, inclusive por seu advogado, todos os meios e recursos inerentes à sua defesa. É cediço que o acusado deve saber quais fatos lhe estão sendo imputados, ser notificado, ter acesso aos autos, ter possibilidade de apresentar razões e testemunhas, solicitar provas etc., o que ocorreu.
4 - Dentre as irregularidades apontadas no processo administrativo disciplinar em questão, cuja autoria foi confirmada pela apelante em sua peça de defesa, estão a expedição indevida do cheque nº 268950/2, no valor de R$ 998,64 para pagamento do resíduo relativo ao benefício nº NB-07/091.379.440-6, com o uso de dados relativos a outro benefício; ainda, a autorização dada a Maria dos Anjos Bezerra da Silva para sacar o referido cheque, e o seu repasse ainda a um terceiro, sendo certo que foi reconhecido nos autos que estas pessoas não possuem qualquer vínculo com os reais titulares do benefício, nem detinham procuração regular destes para saque do referido valor.
5 - A apelante infringiu o art. 117, IX, da Lei nº 8.112/90 de forma a configurar infração de natureza grave, punida com a pena de cassação de sua aposentadoria, nos termos do art. 127, IV, e do art. 132, XIII do referido Estatuto do Servidor.
6 - Evidenciado o respeito aos princípios do devido processo legal, do contraditório e da ampla defesa, não há que se falar em nulidades do processo administrativo disciplinar, principalmente quando a ação é promovida como forma derradeira de insatisfação com o conclusivo desfecho do processo administrativo disciplinar.
7 - Não há como se acolher o pedido alternativo para que seja determinada a devolução das contribuições pagas durante todo o tempo de serviço público em regime de previdência social. A contribuição previdenciária está vinculada à prestação do serviço laboral, os recolhimentos foram efetuado de forma regular, não havendo que se falar em restituição. No entanto, tais contribuições podem ser aproveitadas no calculo de eventual concessão futura de aposentadoria pelo Regime Geral da Previdência Social, obedecidos os ditames do art. 201, § 9º, da CF e o art. 24, parágrafo único, da Lei nº 8.213/91, situação em que os sistemas contributivos se compensarão.
8 - Apelação improvida.
(APELAÇÃO CÍVEL Nº 392178/PE (2004.83.02.005904-2) - Relator: ES. FED. FRANCISCO WILDO - julgado em 30/03/10 - publicado em 05/04/10)

Assim, em face dos limites da pena aplicada, e não havendo ressalva na legislação de regência, tenho que as contribuições vertidas no RPPS poderão ser aproveitadas no RGPS, mediante expedição de CTC e filiação ao RGPS, mesmo quando o servidor tiver sua aposentadoria cassada.

Ante o exposto, voto por dar provimento ao presente Pedido de Uniformização de Interpretação de Lei Federal, processado como representativo de controvérsia - Tema 233 - firmando a seguinte tese: O servidor público aposentado no RPPS e que sofrer pena de cassação de sua aposentadoria pode utilizar o respectivo período contributivo para requerer aposentadoria no RGPS, devidamente comprovado por meio de Certidão de Tempo de Contribuição fornecida pelo órgão público competente.

Em relação ao caso concreto submetido a julgamento, não havendo matéria de fato a ser apreciada na origem, aplico a Questão de Ordem 38 e determino o restabelecimento da sentença, na íntegra, condenando o INSS ao pagamento de honorários advocatícios, que fixo em 10% sobre o valor da condenação (Lei 9.099/95, artigo 55), excluída sua incidência sobre as parcelas vencidas posteriormente à prolação da sentença (STJ, Súmula 111).

Ante o exposto, voto por DAR PROVIMENTO AO INCIDENTE DE UNIFORMIZAÇÃO.

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Rio Grande, Rio Grande do Sul, Brazil
Especialista em Direito Previdenciário, pela Universidade de Caxias do Sul - UCS, em parceria com a ESMAFE - Escola da Magistratura Federal, em 2009. Formado em janeiro de 2006, pela FURG - Fundação Universidade do Rio Grande, em direito. Este blog tem o objetivo de divulgar o conteúdo previdenciário de maneira gratuita para que todos possam ter acesso as informações sobre esta matéria.

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