sexta-feira, 8 de março de 2013

Repercussão geral na revisão de pensão por morte de ex-combatente concedida a mais de 10 anos.

Nesta sexta-feira será visto o acórdão que originou o Recurso Extraordinário n° 699535 que é objeto de repercussão geral junto ao Supremo Tribunal Federal, no qual se discute o direito do Instituto Nacional do Seguro Social rever pensão paga a viúva de ex-combatente, mais de dez anos depois da conversão da aposentadoria dele em pensão por morte à viúva. Abaixo segue a decisão para análise dos amigos.
 
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. REVISÃO ADMINISTRATIVA DE BENEFÍCIO. APOSENTADORIA. EX-COMBATENTE. REDUÇÃO DE PROVENTOS. DECADÊNCIA CONTRA A ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA. LEI Nº 10.839/04. INCIDÊNCIA RETROATIVA. IMPOSSIBILIDADE. APLICAÇÃO DA NORMA VIGENTE À ÉPOCA DA CONCESSÃO.1. O art. 103-A da Lei de Benefícios ("O direito da Previdência Social de anular os atos administrativos de que decorram efeitos favoráveis para os seus beneficiários decai em dez anos, contados da data em que foram praticados, salvo comprovada má-fé"), acrescentado pela Lei nº 10.839/2004, não retroage para alcançar os benefícios concedidos em data anterior à sua publicação, principalmente para prejudicar o segurado. 
2. Em que pese, em vista da ausência de norma regulamentadora atinente a esta matéria quando do deferimento do benefício, não possa ser acolhida de plano a decadência do direito da Administração em revisar o ato de concessão de aposentadoria do impetrante, impõe-se sejam sopesados os princípios da segurança jurídica e da legalidade, os quais, no caso em exame, demonstram cabalmente o não cabimento da revisão do benefício.TRF 4, Apelação Cível n° 2008.72.00.013842-8/SC, 6ª Turma, Relator Desembargador Federal João Batista Pinto Silveira, D.E. 15.04.2010.

ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia 6ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, negar provimento à apelação do INSS e à remessa oficial e dar provimento à apelação da impetrante para conceder a segurança, nos termos do relatório, votos e notas taquigráficas que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 07 de abril de 2010.

Desembargador Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA
Relator

RELATÓRIO
Osmarina Antunes Correa impetrou Mandado de Segurança contra ato do chefe da agência do INSS em Florianópolis/SC, objetivando que seja a autoridade coatora obstada de revisar seu benefício de aposentadoria de ex-combatente, porquanto configurada a decadência do direito da Administração em assim proceder.

A liminar foi indeferida. Desta decisão foi interposto agravo de instrumento, ao qual foi dado provimento para manter o valor do benefício e impedir os descontos, sob entendimento de que havia se operado a decadência do direito de revisar o ato concessório. A autoridade coatora prestou informações.

O MM. Juízo a quo, sentenciando, denegou a segurança, determinando a devolução dos valores tidos como indevidos ao INSS.

Devidamente intimado da sentença, a impetrante interpôs recurso de apelação, alegando que o ato de redução dos proventos é uma ofensa à segurança jurídica e que é indevida a devolução de valores recebidos de boa-fé.

O INSS também apelou, pugnando pela suspensão de efeito suspensivo deferido no agravo de instrumento que suspendeu os descontos. O Ministério Público Federal opinou pela improcedência do recurso do INSS e pelo parcial provimento do recurso da impetrante. É o breve relatório. Inclua-se em pauta.

VOTO
A controvérsia a ser dirimida cinge-se à existência ou não da decadência do direito da Administração Pública em proceder à revisão do benefício de pensão por morte de ex-combatente marítimo, concedida em 23-04-1980, cujo benefício originário foi deferido em 23-06-1963.

Antes da Lei n. 9.784/99, inexistia legislação que previsse prazo de decadência para revisão dos atos de concessão de benefícios previdenciários. Isso, todavia, não garantia ao INSS o direito de, a qualquer tempo e com base em qualquer justificativa, revisar ou até mesmo suspender determinado benefício. Para tanto, caberia à Autarquia provar a existência de má-fé do segurado. E essa comprovação, por óbvio, deveria observar o devido processo administrativo, sendo-lhe oportunizado o direito de defesa.

Sobre o tema, colhe-se da jurisprudência:
"Os processos de restabelecimento de aposentadoria, a princípio, devem ser enfocados de forma diversa dos de concessão de aposentadoria. Nos processos de concessão, cabe ao autor provar que faz jus ao benefício. Nos processos de restabelecimento, ao contrário, tem como particularidade o fato de que o autor recebia o benefício. O ato administrativo de concessão de aposentadoria se reveste de presunção de legitimidade. Presume-se que os requisitos legais para aposentação tenham sido preenchidos. Portanto, o que está em discussão nos processos de restabelecimento é a legitimidade do ato de cancelamento do benefício, mais do que o próprio direito, o que resulta na inversão do ônus da prova. Se não for comprovada alguma ilegalidade no ato de concessão do benefício, o cancelamento é indevido. É o INSS que tem o ônus de provar que o benefício foi mal concedido e não o segurado de provar o contrário. Os dados apurados unilateralmente pela autarquia em pesquisas e entrevistas - isoladamente - têm restrito valor probante. Sozinhos, não se prestam para desautorizar o conjunto de provas produzidas nos autos em sentido contrário. Contudo, é evidente o valor probante das pesquisas e entrevistas quando são confirmadas pelos demais elementos de prova. O plantio em pequena área, no âmbito residencial, para consumo próprio, não tem o condão de caracterizar-se como exercício da agricultura em regime especial, nos termos do art. 11, VII, e § 1º, da Lei 8.213/91, para fins de percepção de aposentadoria rural por idade. Apelação desprovida" RTRF4(41/300) - grifei.

"A suspeita de fraude na concessão de benefício previdenciário não enseja, de plano, a sua suspensão ou cancelamento, mas dependerá de apuração em procedimento administrativo." (súmula n. 160, do antigo Tribunal Federal de Recursos) - grifei.

PREVIDENCIÁRIO. SUSPENSÃO DE BENEFÍCIO. SUSPEITA DE FRAUDE. PROCESSO ADMINISTRATIVO. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DE FRAUDE OU MÁ-FÉ NA CONCESSÃO PELA AUTARQUIA. PRESCRIÇÃO DA POSSIBILIDADE DE REVISÃO DO ATO ADMINISTRATIVO, LEI 9.784/99, ART. 54. A suspeita de fraude ou irregularidade quando da concessão do benefício previdenciário, deve ser devidamente apurada em processo administrativo e respeitadas as garantias constitucionais do contraditório e da ampla defesa (art. 5º, LIV e LV da CF/88). A mera suspeita de irregularidade não justifica a cassação do benefício. Incumbe ao órgão previdenciário a prova de que o benefício teria sido obtido fraudulentamente, devendo a autarquia observar o devido processo legal, oferecendo oportunidade ao segurado de exercer o contraditório e a ampla defesa. A simples impossibilidade do segurado reapresentar todos os documentos que originaram a concessão ou declaração sem a efetiva comprovação de irregularidade não representa a existência de fraude, tampouco de má-fé. Tendo em vista a data da concessão do benefício (02/06/1995), deve ser observado o art. 54 da Lei nº 9.784/99, que assim dispõe: "O direito da Administração de anular os atos administrativos de que decorram efeitos favoráveis para os destinatários decai em cinco anos, contados da data em que foram praticados, salvo comprovada má-fé.". Apelo provido. (TRF2 - APELAÇÃO EM MANDADO DE SEGURANÇA 55064 - Processo 200351015100107/RJ - QUARTA TURMA - j. 25/08/2004, DJU, 09/11/2004, P. 125 - Rel. JUIZ ROGERIO CARVALHO) - grifei.

No caso dos autos, o INSS não demonstrou que a impetrante, nem que seu falecido marido, tenham agido de má-fé. A revisão se baseou unicamente na justificativa de que "a renda mensal atual está com valor superior ao devido" , e a segurada só foi intimada a se defender após ter a renda de seu benefício revisada para menor (fl. 54). Ou seja, o ato de revisão é flagrantemente ilegal e abusivo.

Nesse contexto, ao contrário da tese sustentada pelo INSS, não é possível vislumbrar hipótese (salvo comprovada fraude ou má-fé) que autorize a Autarquia a ter o direito de revisar a aposentadoria de ex-combatentes, perpetuando assim o poder de revisão ou cancelamento dos atos da Administração Pública que retirem do administrado um direito ou vantagem anteriormente concedida, sob pena de violação do princípio da segurança jurídica, isto é, a necessidade de preservar a estabilidade das relações jurídicas entre o Poder Público e o Particular.

Observe-se que o ato de redução do benefício foi proferido depois de decorridos mais de 45 anos após a concessão da aposentadoria. A revisão reduziu o benefício de R$ 3.750,68 para R$ 801,80. Nesse diapasão, além do longo decurso de tempo entre a concessão e a revisão do benefício, também não se pode olvidar a avançada idade da pensionista, atualmente com mais de 70 anos. Constam, ainda, nos autos, diversos atestados médicos que indicam ser a impetrante portadora de problemas cardíacos, fazendo uso de medicação de uso controlado.

Ora, a disposição trazida pelo artigo 54 da Lei n. 9.784/99, que regula o processo administrativo no âmbito da Administração Pública Federal, só veio a ratificar e regulamentar toda a ordem jurídica que se criou em torno da aplicabilidade e existência da "prescrição administrativa" ou da decadência do direito à revisão dos atos administrativos. A propósito, prevê o artigo 54 da referida Lei:

Art. 54. O direito da Administração de anular os atos administrativos de que decorram efeitos favoráveis para os destinatários decai em cinco anos, contados da data em que foram praticados, salvo comprovada má-fé.

Finalmente, registre-se que entre a data de concessão do benefício e o ato de revisão, há muito já havia expirado o prazo de cinco anos previstos no Decreto n. 20.910/32 e na Lei n. 9.784/99. Além disso, conforme já referido, inexistem nos autos elementos que possam caracterizar má-fé do segurado quando do deferimento do benefício originário.

Logo, em que pese, em vista da ausência de norma regulamentadora atinente a esta matéria quando do deferimento do benefício, não possa ser acolhida de plano a decadência do direito da Administração em revisar o ato de concessão de aposentadoria do impetrante, impõe-se sejam sopesados os princípios da segurança jurídica e da legalidade, os quais, no caso em exame, demonstram cabalmente o não cabimento da revisão do benefício.

Nessa mesma linha, menciono recente julgado desta Turma proferido em caso análogo ao presente, no qual restou reconhecido o direito adquirido do segurado ex-combatente de manter seus proventos nos patamares em que se encontrava por ocasião da revisão administrativa (AC 2001.04.01.046232-0, julg. 04-02-2009)

Tal procedimento administrativo encontra-se, pois, revestido de ilegalidade, porquanto se impõe, no caso, a preponderância da estabilidade das relações jurídicas.

Por fim, reitero meu entedimento de que o prazo decadencial estipulado pela Lei 9.784/99 só passou a viger para os benefícios concedidos após sua edição, não reabrindo prazos para a Autarquia revisar benefícios concedidos anteriormente a sua vigência.

A meu juízo, a idade avançada do impetrante aliada ao decurso de cerca de 45 anos da concessão do benefício, por si só, aliados a boa-fé do segurado, cabalmente demonstrada no exame do processo administrativo acostado aos autos e pelas demais provas, seriam suficientes para o reconhecimento do instituto da decadência do direito de revisão por parte da Administração, ou, no mínimo, da impossibilidade da redução dos proventos.

Condeno a Autarquia à devolução dos valores indevidamente descontados a partir da impetração do mandamus, nos seguintes termos.

Da correção monetária e dos juros de mora
Até 30-06-2009, a atualização monetária, incidindo a contar do vencimento de cada prestação, deve-se dar pelos índices oficiais, e jurisprudencialmente aceitos, quais sejam: ORTN (10/64 a 02/86, Lei nº 4.257/64), OTN (03/86 a 01/89, Decreto-Lei nº 2.284/86, de 03-86 a 01-89), BTN (02/89 a 02/91, Lei nº 7.777/89), INPC (03/91 a 12/92, Lei nº 8.213/91), IRSM (01/93 a 02/94, Lei nº 8.542/92), URV (03 a 06/94, Lei nº 8.880/94), IPC-r (07/94 a 06/95, Lei nº 8.880/94), INPC (07/95 a 04/96, MP nº 1.053/95), IGP-DI (05/96 a 03/2006, art. 10 da Lei n.º 9.711/98, combinado com o art. 20, §§5º e 6.º, da Lei n.º 8.880/94) e INPC (04/2006 a 06/2009, conforme o art. 31 da Lei n.º 10.741/03, combinado com a Lei n.º 11.430/06, precedida da MP n.º 316, de 11-08-2006, que acrescentou o art. 41-A à Lei n.º 8.213/91, e REsp. n.º 1.103.122/PR). Nesses períodos, os juros de mora devem ser fixados à taxa de 1% ao mês, a contar da citação, com base no art. 3º do Decreto-Lei n.º 2.322/87, aplicável analogicamente aos benefícios pagos com atraso, tendo em vista o seu caráter eminentemente alimentar, consoante firme entendimento consagrado na jurisprudência do STJ e na Súmula 75 desta Corte.

A contar de 01-07-2009, data em que passou a viger a Lei n.º 11.960, de 29-06-2009, publicada em 30-06-2009, que alterou o art. 1.º-F da Lei n.º 9.494/97, para fins de atualização monetária e juros haverá a incidência, uma única vez, até o efetivo pagamento, dos índices oficiais de remuneração básica e juros aplicados à caderneta de poupança.

Eventuais valores descontados anteriormente à impetração deverão ser cobrados em ação própria.

Honorários advocatícios incabíveis à espécie. Custas ex lege.
Ante o exposto, voto por negar provimento à apelação do INSS e à remessa oficial e dar provimento à apelação da impetrante para conceder a segurança.

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Rio Grande, Rio Grande do Sul, Brazil
Especialista em Direito Previdenciário, pela Universidade de Caxias do Sul - UCS, em parceria com a ESMAFE - Escola da Magistratura Federal, em 2009. Formado em janeiro de 2006, pela FURG - Fundação Universidade do Rio Grande, em direito. Este blog tem o objetivo de divulgar o conteúdo previdenciário de maneira gratuita para que todos possam ter acesso as informações sobre esta matéria.

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