Caso de união estável putativa, no qual há o rateio da pensão em partes iguais.
Hoje trago uma decisão interessante, na qual o TRF-4 divide em partes iguais a pensão por morte entre as companheiras com quem o segurado falecido mantinha, paralelamente, união estável putativa. O ácordão explica muito bem que apesar do modelo de família adotado pelo ordenamento jurídico brasileiro ser o monogâmico, ou seja, ninguém pode ser casado duas vezes(bígamo), bem como manter simultaneamente um casamento (convivendo com o cônjuge) e uma união estável, nem duas uniões estáveis.
No presente caso, um dos conviventes em união estável desconhecia o impedimento legal do outro companheiro, daí o nome "união estável putativa", caso em que o convivente de boa-fé terá os mesmos direitos que titularizaria caso não estivesse o impedimento para a formação da união estável. Abaixo trago a íntegra da decisão.
Apelação Cív. 2003.70.01.015492-1/PR
No presente caso, um dos conviventes em união estável desconhecia o impedimento legal do outro companheiro, daí o nome "união estável putativa", caso em que o convivente de boa-fé terá os mesmos direitos que titularizaria caso não estivesse o impedimento para a formação da união estável. Abaixo trago a íntegra da decisão.
Apelação Cív. 2003.70.01.015492-1/PR
APELAÇÃO CÍVEL Nº 2003.70.01.015492-1/PR
RELATOR: Des. Federal RÔMULO PIZZOLATTI
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
ADVOGADO: Milton Drumond Carvalho
APELANTE: MARIA IARA ANTUNES SICORSKI
ADVOGADO: Jorge Evencio de Carvalho
APELADO: MARINALVA DE FREITAS
ADVOGADO: Andre Benedetti de Oliveira e outro
REMETENTE: JUÍZO SUBSTITUTO DA 03A VF DE LONDRINA
Enquanto a sentença concedeu cota-parte de pensão à autora Marinalva de Freitas, como companheira, em concurso com a também companheira Maria Iara Antunes Sicorski, com efeitos retroativos a 05-12-2000 (data do requerimento administrativo), o INSS, em suas razões de apelação, sustenta que a cota-parte de pensão devida à autora só pode vigorar a partir do trânsito em julgado da decisão judicial que a reconheceu como companheira. Já a apelante Maria Iara Antunes Sicorski defende que havia união estável do segurado apenas com ela, não havendo fundamento para a partilha da pensão com a autora, como fez a sentença.
Com contra-razões da autora, vieram os autos a este tribunal.
É o relatório. À revisão
As apelações devem ser admitidas, por serem recursos próprios, formalmente regulares e tempestivos. Também cabe conhecer da remessa oficial, uma vez que o valor da condenação é incerto, caso em que não incide o §2º do art. 475 do Código de Processo Civil.
2. Mérito
Pelo que se vê dos autos, o segurado Hermínio Duarte Filho, nascido em 1928 e falecido em 1999 (fls. 10), foi casado com Claudia Lemos Duarte, com quem teve os filhos Júlia, nascida em 1955, Regina, nascida em 1958, e Márcio, nascido em 1962 (fls. 211). No início da década de setenta, separou-se da esposa (de quem posteriormente se divorciou, fls. 10), e, valendo-se da sua condição de profissional de vendas, com trabalho externo (fls. 211), passou a manter dupla convivência more uxorio. De um lado, com a companheira Marinalva de Freitas, com a qual teve os filhos Fernando, nascido em 1971 (fls. 15) e Patrícia, nascida em 1974 (fls. 14); e de outro lado com a companheira Maria Iara Antunes Sicorski, com quem teve os filhos Roberto, nascido em 1971 (fls. 51) e Ricardo, nascido em 1979 (fls. 52).
As testemunhas ouvidas em juízo, a requerimento das companheiras, deixou claro que o falecido Hermínio convivia maritalmente com uma e outra, justificada a sua eventual ausência do lar pelo fato de ser profissional de vendas, com necessidade de ausentar-se do domicílio (vide depoimentos de Henrique Romano, fls. 182; de Márcia Barbosa da Silva, fls. 183; de Patrícia Toniolo Ferreira, fls. 195; de Regina Lopes da Silva, fls. 196; e de Raquel Regina Dronk, fls. 197).
A prova testemunhal está ancorada na prova documental, uma vez que o falecido segurado designou ambas as companheiras à Previdência Social como suas dependentes, com a peculiaridade de fazê-lo em agências localizadas em cidades distintas (fls. 16 a 18: designações de Marinalva de Freitas como dependente, em Londrina; fls. 56 e e 61, em Ponta Grossa).
É bem verdade que o modelo de família aceito pelo ordenamento jurídico brasileiro é o monogâmico, de modo que, como lembra o Prof. Fábio Ulhoa Coelho, "... assim como ninguém pode ser casado duas vezes (bígamo), também não pode manter simultaneamente um casamento (convivendo com o cônjuge) e uma união estável, nem duas uniões estáveis" ("Curso de Direito Civil", São Paulo, Saraiva, 2006, p. 127). Não menos certo é que se, um dos conviventes em união estável desconhece o impedimento legal do outro, tem-se a chamada "união estável putativa", caso em que "... o convivente de boa-fé terá os mesmos direitos que titularizaria caso não existisse o impedimento para a formação da união estável" (Fábio Ulhoa Coelho, op. cit., p. 140). No caso concreto, a prova circunstancial deixa claro que tanto Marinalva quanto Maria Iara desconheciam a outra convivência mantida por Hermínio: mantinha ele as companheiras em cidades distintas, e trabalhava com vendas externas, o que justificava suas ausências. Conseqüentemente, sendo caso de dupla união estável putativa, ambas as companheiras têm direito à pensão, em igualdade de condições.
Embora o segurado tenha falecido em Curitiba, onde nos últimos anos mantinha lar com a litisconsorte passiva Maria Iara, paralelamente ao lar em Londrina com Marinalva, a prova testemunhal deixou claro que a convivência paralela perdurou até o óbito. Aliás, um mês antes de falecer, o segurado expressamente designou Marinalva como sua companheira e dependente à agência do INSS de Londrina (fls. 17-18).
Ora, tendo o falecido designado Marinalva, como sua companheira e dependente, um mês antes do óbito, e havendo ela apresentado ao INSS certidão de nascimento dos filhos comuns, prova do mesmo domicílio e conta bancária conjunta (vide autos apensos) foi ilegal o indeferimento do requerimento administrativo de pensão, a pretexto de que não provada a união estável senão até 1997, quando o óbito ocorreu em 1999 (autos apensos, fls. 29). Aliás, ainda que a união estável com Marinalva se tivesse rompido de fato antes do óbito, a situação da companheira separada de fato é idêntica à da mulher casada separada de fato: têm, uma e outra, direito a alimentos e à pensão previdenciária tanto que o requeiram, sendo, no último caso, presumida a dependência econômica; só não terão direito à pensão se expressamente renunciaram a alimentos, e não provarem dependência econômica (STJ, Súmula 336). Isso porque, segundo demonstra o Prof. Fábio Ulhoa Coelho, não há hierarquia entre as famílias constitucionais, ou seja, a família fundada no casamento e a família fundada na união estável gozam de idêntica proteção legal (vide "Curso de Direito Civil", São Paulo, Saraiva, 2006, volume 5, p. 119-121). Conseqüentemente, agiu com acerto o juiz da causa, ao estalecer o direito da autora Marinalva à sua cota-parte de pensão desde o requerimento administrativo do benefício (05-12-2000).
Não há reparo a fazer as consectários da condenação (juros moratórios de 1% ao mês, correção monetária pelo IGP-DI e honorários advocatícios em percentual sobre as parcelas vencidas até a sentença).
De resto, com base nos arts. 475-I, caput, e 461 do Código de Processo Civil, e na orientação da 3ª Seção deste Tribunal (vide Questão de Ordem na Apelação Cível nº 2002.71.00.050349-7, publicada no Diário Eletrônico de 02-10-2007), e inexistindo embargos infringentes, determino o cumprimento imediato do acórdão, no que respeita à implementação da concessão do benefício, mediante ofício à Gerência Regional do INSS, a ser feita em até 45 dias, conforme os parâmetros definidos na presente decisão.
3. Dispositivo
Ante o exposto, voto por negar provimento às apelações e à remessa oficial, e determinar o cumprimento imediato do acórdão.
Desembargador Federal RÔMULO PIZZOLATTI(Digital)
Relator
RELATOR: Des. Federal RÔMULO PIZZOLATTI
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
ADVOGADO: Milton Drumond Carvalho
APELANTE: MARIA IARA ANTUNES SICORSKI
ADVOGADO: Jorge Evencio de Carvalho
APELADO: MARINALVA DE FREITAS
ADVOGADO: Andre Benedetti de Oliveira e outro
REMETENTE: JUÍZO SUBSTITUTO DA 03A VF DE LONDRINA
EMENTA
PENSÃO POR MORTE. COMPANHEIRAS SIMULTÂNEAS. UNIÃO ESTÁVEL PUTATIVA. RATEIO DA PENSÃO EM PARTES IGUAIS.É devido o rateio, em partes iguais, da pensão por morte entre as companheiras com quem o falecido segurado manteve, parelelamente, união estável putativa RELATÓRIO
Trata-se de remessa oficial, de apelação do INSS e de apelação da litisconsorte passiva Maria Iara Antunes Sicorski contra sentença que julgou procedente ação de concessão de pensão por morte proposta por Marinalva de Freitas, na qualidade de companheira do falecido segurado Hermínio Duarte Filho. Enquanto a sentença concedeu cota-parte de pensão à autora Marinalva de Freitas, como companheira, em concurso com a também companheira Maria Iara Antunes Sicorski, com efeitos retroativos a 05-12-2000 (data do requerimento administrativo), o INSS, em suas razões de apelação, sustenta que a cota-parte de pensão devida à autora só pode vigorar a partir do trânsito em julgado da decisão judicial que a reconheceu como companheira. Já a apelante Maria Iara Antunes Sicorski defende que havia união estável do segurado apenas com ela, não havendo fundamento para a partilha da pensão com a autora, como fez a sentença.
Com contra-razões da autora, vieram os autos a este tribunal.
É o relatório. À revisão
VOTO
1. Admissibilidade As apelações devem ser admitidas, por serem recursos próprios, formalmente regulares e tempestivos. Também cabe conhecer da remessa oficial, uma vez que o valor da condenação é incerto, caso em que não incide o §2º do art. 475 do Código de Processo Civil.
2. Mérito
Pelo que se vê dos autos, o segurado Hermínio Duarte Filho, nascido em 1928 e falecido em 1999 (fls. 10), foi casado com Claudia Lemos Duarte, com quem teve os filhos Júlia, nascida em 1955, Regina, nascida em 1958, e Márcio, nascido em 1962 (fls. 211). No início da década de setenta, separou-se da esposa (de quem posteriormente se divorciou, fls. 10), e, valendo-se da sua condição de profissional de vendas, com trabalho externo (fls. 211), passou a manter dupla convivência more uxorio. De um lado, com a companheira Marinalva de Freitas, com a qual teve os filhos Fernando, nascido em 1971 (fls. 15) e Patrícia, nascida em 1974 (fls. 14); e de outro lado com a companheira Maria Iara Antunes Sicorski, com quem teve os filhos Roberto, nascido em 1971 (fls. 51) e Ricardo, nascido em 1979 (fls. 52).
As testemunhas ouvidas em juízo, a requerimento das companheiras, deixou claro que o falecido Hermínio convivia maritalmente com uma e outra, justificada a sua eventual ausência do lar pelo fato de ser profissional de vendas, com necessidade de ausentar-se do domicílio (vide depoimentos de Henrique Romano, fls. 182; de Márcia Barbosa da Silva, fls. 183; de Patrícia Toniolo Ferreira, fls. 195; de Regina Lopes da Silva, fls. 196; e de Raquel Regina Dronk, fls. 197).
A prova testemunhal está ancorada na prova documental, uma vez que o falecido segurado designou ambas as companheiras à Previdência Social como suas dependentes, com a peculiaridade de fazê-lo em agências localizadas em cidades distintas (fls. 16 a 18: designações de Marinalva de Freitas como dependente, em Londrina; fls. 56 e e 61, em Ponta Grossa).
É bem verdade que o modelo de família aceito pelo ordenamento jurídico brasileiro é o monogâmico, de modo que, como lembra o Prof. Fábio Ulhoa Coelho, "... assim como ninguém pode ser casado duas vezes (bígamo), também não pode manter simultaneamente um casamento (convivendo com o cônjuge) e uma união estável, nem duas uniões estáveis" ("Curso de Direito Civil", São Paulo, Saraiva, 2006, p. 127). Não menos certo é que se, um dos conviventes em união estável desconhece o impedimento legal do outro, tem-se a chamada "união estável putativa", caso em que "... o convivente de boa-fé terá os mesmos direitos que titularizaria caso não existisse o impedimento para a formação da união estável" (Fábio Ulhoa Coelho, op. cit., p. 140). No caso concreto, a prova circunstancial deixa claro que tanto Marinalva quanto Maria Iara desconheciam a outra convivência mantida por Hermínio: mantinha ele as companheiras em cidades distintas, e trabalhava com vendas externas, o que justificava suas ausências. Conseqüentemente, sendo caso de dupla união estável putativa, ambas as companheiras têm direito à pensão, em igualdade de condições.
Embora o segurado tenha falecido em Curitiba, onde nos últimos anos mantinha lar com a litisconsorte passiva Maria Iara, paralelamente ao lar em Londrina com Marinalva, a prova testemunhal deixou claro que a convivência paralela perdurou até o óbito. Aliás, um mês antes de falecer, o segurado expressamente designou Marinalva como sua companheira e dependente à agência do INSS de Londrina (fls. 17-18).
Ora, tendo o falecido designado Marinalva, como sua companheira e dependente, um mês antes do óbito, e havendo ela apresentado ao INSS certidão de nascimento dos filhos comuns, prova do mesmo domicílio e conta bancária conjunta (vide autos apensos) foi ilegal o indeferimento do requerimento administrativo de pensão, a pretexto de que não provada a união estável senão até 1997, quando o óbito ocorreu em 1999 (autos apensos, fls. 29). Aliás, ainda que a união estável com Marinalva se tivesse rompido de fato antes do óbito, a situação da companheira separada de fato é idêntica à da mulher casada separada de fato: têm, uma e outra, direito a alimentos e à pensão previdenciária tanto que o requeiram, sendo, no último caso, presumida a dependência econômica; só não terão direito à pensão se expressamente renunciaram a alimentos, e não provarem dependência econômica (STJ, Súmula 336). Isso porque, segundo demonstra o Prof. Fábio Ulhoa Coelho, não há hierarquia entre as famílias constitucionais, ou seja, a família fundada no casamento e a família fundada na união estável gozam de idêntica proteção legal (vide "Curso de Direito Civil", São Paulo, Saraiva, 2006, volume 5, p. 119-121). Conseqüentemente, agiu com acerto o juiz da causa, ao estalecer o direito da autora Marinalva à sua cota-parte de pensão desde o requerimento administrativo do benefício (05-12-2000).
Não há reparo a fazer as consectários da condenação (juros moratórios de 1% ao mês, correção monetária pelo IGP-DI e honorários advocatícios em percentual sobre as parcelas vencidas até a sentença).
De resto, com base nos arts. 475-I, caput, e 461 do Código de Processo Civil, e na orientação da 3ª Seção deste Tribunal (vide Questão de Ordem na Apelação Cível nº 2002.71.00.050349-7, publicada no Diário Eletrônico de 02-10-2007), e inexistindo embargos infringentes, determino o cumprimento imediato do acórdão, no que respeita à implementação da concessão do benefício, mediante ofício à Gerência Regional do INSS, a ser feita em até 45 dias, conforme os parâmetros definidos na presente decisão.
3. Dispositivo
Ante o exposto, voto por negar provimento às apelações e à remessa oficial, e determinar o cumprimento imediato do acórdão.
Desembargador Federal RÔMULO PIZZOLATTI(Digital)
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