sexta-feira, 21 de maio de 2021

Atividade de gari é reconhecida como especial

Nesta sexta-feira será visto uma jurisprudência que trata sobre a averbação da atividade especial de gari. Abaixo segue a decisão para análise dos amigos.

DIREITO PREVIDENCIÁRIO. AVERBAÇÃO DA ATIVIDADE ESPECIAL. ATIVIDADE ESPECIAL COMPROVADA. EXPOSIÇÃO A VIRUS E BACTÉRIAS. SENTENÇA MANTIDA. 
1. Por ocasião da conversão da Medida Provisória nº 1.663/98 na Lei nº 9.711/98, permaneceu em vigor o parágrafo 5º do artigo 57 da Lei nº 8.213/91, razão pela qual continua sendo plenamente possível a conversão do tempo trabalhado em condições especiais em tempo de serviço comum relativamente a qualquer período, incluindo o posterior a 28/05/1998. 
2. Da análise do Perfil Profissiográfico Previdenciário - PPP id 107617590 - Pág. 1/2 e laudo técnico judicial id 107617592 - Pág. 9/11 e, de acordo com a legislação previdenciária vigente à época, o autor comprovou o exercício da atividade especial no período de no período de 01/03/1993 a 01/09/2009, pois trabalhou como auxiliar operacional em obras de infraestrutura e coleta de lixo urbano, exercendo trabalho de cunho braçal, nas diversas áreas da prefeitura, exposto de modo habitual e permanente a agentes biológicos (vírus e bactérias), enquadrado no código 1.3.2, Anexo III do Decreto nº 53.831/64, código 1.3.4, Anexo I do Decreto nº 83.080/79, código 3.0.1 (item e), Anexo IV do Decreto nº 2.172/97 e código 3.0.1 (item e), Anexo IV do Decreto nº 3.048/99. 
3. Sendo o requerimento do benefício posterior à Lei 8.213/91, deve ser aplicado o fator 1,40, conforme disposto no artigo 70 do Decreto nº 3048/99, com a redação dada pelo Decreto nº 4.827/03. 
4. Faz jus a parte autora à averbação da atividade especial exercida de 01/03/1993 a 01/09/2009, devendo o INSS efetuar as anotações de praxe. 
5. Apelação do INSS improvida. 
TRF 3ª, ApCiv. 0005417-21.2019.4.03.9999, 7ª T., desembargador federal Toru Yamamoto, 20/05/2020.


ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Sétima Turma, por unanimidade, decidiu negar provimento à apelação do INSS, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

RELATÓRIO
Trata-se de ação previdenciária ajuizada por AGNALDO APARECIDO CARDOSO em face do INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL-INSS, objetivando o reconhecimento da atividade especial e consequente averbação. 

A r. sentença julgou procedente o pedido inicial, com resolução de mérito, na forma do artigo 487, inciso 1, do Código de Processo Civil, e o faço para declarar como especial a atividade exercida pelo requerente nos seguintes períodos de 01/03/1993 a 31/07/2009, para a Prefeitura Municipal de Duartina, devido à exposição a agentes insalubres; e condenar o INSS ao cumprimento de obrigação de fazer, consistente na averbação dos tempos acima referido no CNIS e em outros sistemas eletrônicos de controle do tempo de serviço dos segurados da Previdência Social. 

Em razão da sucumbência, condenou o requerido ao pagamento das custas e despesas processuais, bem assim dos honorários advocatício do causídico do autor, estes fixados na forma do artigo 85, §8°, do Código de Processo Civil, em R$ 5.000,00 (cinco mil reais), tendo em vista o tempo de tramitação da demanda, a complexidade da causa e o proveito econômico obtido pelo requerente (mais de 25 anos de atividade especial). 

Sentença não sujeita ao reexame necessário. 

O INSS interpôs apelação, alegando impossibilidade do reconhecimento da atividade especial no período de 01/03/1993 a 31/07/2009, na função de 'gari', ante a ausência de previsão legal. Aduz que nenhum vírus ou bactéria de natureza infectocontagioso foi identificado ou descrito no PPP, a assertiva do laudo técnico é por inteiro despicienda, para se constatar a existência de vírus e bactérias, como tal descrito, não haveria necessidade de qualquer levantamento ambiental. 

No mais, a despeito do autor estar "lotado" no setor limpeza pública (coleta de lixo), a descrição de atividades feita no PPP não é nem um pouco similar da de quem realmente trabalha na coleta de lixo. Por tal descrição o autor realizava suas atividades na "área da Prefeitura", não se aludindo a uma possível coleta de lixo urbano na cidade. Diante do exposto, restou configurado que o segurado, no período controverso, não atendeu ao requisito da nocividade (não há indicação, nos autos, de exposição a agentes biológicos infectocontagiosos) e tampouco o da permanência e habitualidade. 

Requer o provimento do recurso, para julgar improcedente o pedido inicial, condenando o autor nas custas processuais, honorários advocatícios e demais cominações de estilo. Requer-se, outrossim, que ao proferir a r. decisão, haja pronunciamento expresso sobre os dispositivos legais e constitucionais mencionados, a fim de prequestionar a matéria com vistas à futura interposição de recursos especial e extraordinário. 

Sem as contrarrazões, subiram os autos a esta Corte. 

É o relatório. 

VOTO
Verifico, em juízo de admissibilidade, que o recurso ora analisado mostra-se formalmente regular, motivado (artigo 1.010 CPC) e com partes legítimas, preenchendo os requisitos de adequação (art. 1009 CPC) e tempestividade (art. 1.003 CPC). Assim, presente o interesse recursal e inexistindo fato impeditivo ou extintivo, recebo-o e passo a apreciá-lo nos termos do artigo 1.011 do Código de Processo Civil. 

In casu, a parte autora alega na inicial ter trabalhado em atividade especial de 01/03/1993 a 31/07/2009, requerendo sua averbação. Portanto, como o autor não impugnou a r. sentença, a controvérsia nos presentes autos restringe-se ao reconhecimento da atividade especial exercida de 01/03/1993 a 31/07/2009. 

Atividade Especial: A aposentadoria especial foi instituída pelo artigo 31 da Lei nº 3.807/60. Por sua vez, dispõe o artigo 57 da Lei nº 8.213/91 que a aposentadoria especial será devida, uma vez cumprida a carência exigida nesta Lei, ao segurado que tiver trabalhado sujeito a condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física, durante 15 (quinze), 20 (vinte) ou 25 (vinte e cinco) anos, conforme dispuser a Lei. (Redação dada pela Lei nº 9.032, de 1995) 

O critério de especificação da categoria profissional com base na penosidade, insalubridade ou periculosidade, definidas por Decreto do Poder Executivo, foi mantido até a edição da Lei nº 8.213/91, ou seja, as atividades que se enquadrassem no decreto baixado pelo Poder Executivo seriam consideradas penosas, insalubres ou perigosas, independentemente de comprovação por laudo técnico, bastando, assim, a anotação da função em CTPS ou a elaboração do então denominado informativo SB-40. 

Foram baixados pelo Poder Executivo os Decretos nºs 53.831/64 e 83.080/79, relacionando os serviços considerados penosos, insalubres ou perigosos. Embora o artigo 57 da Lei nº 8.213/91 tenha limitado a aposentadoria especial às atividades profissionais sujeitas a condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física, o critério anterior continuou ainda prevalecendo. De notar que, da edição da Lei nº 3.807/60 até a última CLPS, que antecedeu à Lei nº 8.213/91, o tempo de serviço especial foi sempre definido com base nas atividades que se enquadrassem no decreto baixado pelo Poder Executivo como penosas, insalubres ou perigosas, independentemente de comprovação por laudo técnico. 

A própria Lei nº 8.213/91, em suas disposições finais e transitórias, estabeleceu, em seu artigo 152, que a relação de atividades profissionais prejudiciais à saúde ou à integridade física deverá ser submetida à apreciação do Congresso Nacional, prevalecendo, até então, a lista constante da legislação em vigor para aposentadoria especial. 

Os agentes prejudiciais à saúde foram relacionados no Decreto nº 2.172, de 05/03/1997 (art. 66 e Anexo IV), mas por se tratar de matéria reservada à lei, tal decreto somente teve eficácia a partir da edição da Lei n 9.528, de 10/12/1997. Destaque-se que o artigo 57 da Lei nº 8.213/91, em sua redação original, deixou de fazer alusão a serviços considerados perigosos, insalubres ou penosos, passando a mencionar apenas atividades profissionais sujeitas a condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física, sendo que o artigo 58 do mesmo diploma legal, também em sua redação original, estabelecia que a relação dessas atividades seria objeto de lei específica. 

A redação original do artigo 57 da Lei nº 8.213/91 foi alterada pela Lei nº 9.032/95 sem que até então tivesse sido editada lei que estabelecesse a relação das atividades profissionais sujeitas a condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física, não havendo dúvidas até então que continuavam em vigor os Decretos nºs 53.831/64 e 83.080/79. Nesse sentido, confira-se a jurisprudência: STJ; Resp 436661/SC; 5ª Turma; Rel. Min. Jorge Scartezzini; julg. 28.04.2004; DJ 02.08.2004, pág. 482. 

É de se ressaltar, quanto ao nível de ruído, que a jurisprudência já reconheceu que o Decreto nº 53.831/64 e o Decreto nº 83.080/79 vigeram de forma simultânea, ou seja, não houve revogação daquela legislação por esta, de forma que, constatando-se divergência entre as duas normas, deverá prevalecer aquela mais favorável ao segurado (STJ - REsp. n. 412351/RS; 5ª Turma; Rel. Min. Laurita Vaz; julgado em 21.10.2003; DJ 17.11.2003; pág. 355). 

O Decreto nº 2.172/97, que revogou os dois outros decretos anteriormente citados, passou a considerar o nível de ruídos superior a 90 dB(A) como prejudicial à saúde. 

Por tais razões, até ser editado o Decreto nº 2.172/97, considerava-se a exposição a ruído superior a 80 dB(A) como agente nocivo à saúde. 

Todavia, com o Decreto nº 4.882, de 18/11/2003, houve nova redução do nível máximo de ruídos tolerável, uma vez que por tal decreto esse nível voltou a ser de 85 dB(A) (art. 2º do Decreto nº 4.882/2003, que deu nova redação aos itens 2.01, 3.01 e 4.00 do Anexo IV do Regulamento da Previdência Social, aprovado pelo Decreto n. 3.048/99). Houve, assim, um abrandamento da norma até então vigente, a qual considerava como agente agressivo à saúde a exposição acima de 90 dB(A), razão pela qual vinha adotando o entendimento segundo o qual o nível de ruídos superior a 85 dB(A) a partir de 05/03/1997 caracterizava a atividade como especial. 

Ocorre que o C. STJ, no julgamento do Recurso Especial nº 1.398.260/PR, sob o rito do artigo 543-C do CPC, decidiu não ser possível a aplicação retroativa do Decreto nº 4.882/03, de modo que no período de 06/03/1997 a 18/11/2003, em consideração ao princípio tempus regit actum, a atividade somente será considerada especial quando o ruído for superior a 90 dB(A). (g.n.) 

Nesse sentido, segue a ementa do referido julgado: "ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. MATÉRIA REPETITIVA. ART. 543-C DO CPC E RESOLUÇÃO STJ 8/2008. RECURSO REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. PREVIDENCIÁRIO. REGIME GERAL DE PREVIDÊNCIA SOCIAL. TEMPO ESPECIAL. RUÍDO. LIMITE DE 90DB NO PERÍODO DE 6.3.1997 A 18.11.2003. DECRETO 4.882/2003. LIMITE DE 85 DB. RETROAÇÃO. IMPOSSIBILIDADE. APLICAÇÃO DA LEI VIGENTE À ÉPOCA DA PRESTAÇÃO DO SERVIÇO. Controvérsia submetida ao rito do art. 543-C do CPC 1. Está pacificado no STJ o entendimento de que a lei que rege o tempo de serviço é aquela vigente no momento da prestação do labor. Nessa mesma linha: REsp 1.151.363/MG, Rel. Ministro Jorge Mussi, Terceira Seção, DJe 5.4.2011; REsp 1.310.034/PR, Rel. Ministro Herman Benjamin, Primeira Seção, DJe 19.12.2012, ambos julgados sob o regime do art. 543-C do CPC. 2. O limite de tolerância para configuração da especialidade do tempo de serviço para o agente ruído deve ser de 90 dB no período de 6.3.1997 a 18.11.2003, conforme Anexo IV do Decreto 2.172/1997 e Anexo IV do Decreto 3.048/1999, sendo impossível aplicação retroativa do Decreto 4.882/2003, que reduziu o patamar para 85 dB, sob pena de ofensa ao art. 6º da LINDB (ex-LICC). Precedentes do STJ. Caso concreto 3. Na hipótese dos autos, a redução do tempo de serviço decorrente da supressão do acréscimo da especialidade do período controvertido não prejudica a concessão da aposentadoria integral. 4. Recurso Especial parcialmente provido. Acórdão submetido ao regime do art. 543-C do CPC e da Resolução STJ 8/2008." (STJ, REsp 1398260/PR, Primeira Seção, Rel. Min. HERMAN BENJAMIN, DJe 05/12/2014) 

Destaco, ainda, que o uso de equipamento de proteção individual não descaracteriza a natureza especial da atividade a ser considerada, uma vez que tal tipo de equipamento não elimina os agentes nocivos à saúde que atingem o segurado em seu ambiente de trabalho, mas somente reduz seus efeitos. 

Nesse sentido, precedentes desta E. Corte (AC nº 2000.03.99.031362-0/SP; 1ª Turma; Rel. Des. Fed. André Nekatschalow; v.u; J. 19.08.2002; DJU 18.11) e do Colendo Superior Tribunal de Justiça: REsp 584.859/ES, Rel. Ministro Arnaldo Esteves Lima, Quinta Turma, julgado em 18/08/2005, DJ 05/09/2005 p. 458). 

Cumpre observar, por fim, que, por ocasião da conversão da Medida Provisória nº 1.663/98 na Lei nº 9.711/98, permaneceu em vigor o parágrafo 5º do artigo 57 da Lei nº 8.213/91, razão pela qual continua sendo plenamente possível a conversão do tempo trabalhado em condições especiais em tempo de serviço comum relativamente a qualquer período, incluindo o posterior a 28/05/1998. (STJ, AgRg no Resp nº 1.127.806-PR, 5ª Turma, Rel. Min. Jorge Mussi, DJe 05/04/2010) 

No presente caso, da análise do Perfil Profissiográfico Previdenciário - PPP id 107617590 - Pág. 1/2 e laudo técnico judicial id 107617592 - Pág. 9/11 e, de acordo com a legislação previdenciária vigente à época, o autor comprovou o exercício da atividade especial no período de: - 01/03/1993 a 01/09/2009, vez que trabalhou como auxiliar operacional em obras de infraestrutura e coleta de lixo urbano, exercendo trabalho de cunho braçal, nas diversas áreas da prefeitura, exposto de modo habitual e permanente a agentes biológicos (vírus e bactérias), enquadrado no código 1.3.2, Anexo III do Decreto nº 53.831/64, código 1.3.4, Anexo I do Decreto nº 83.080/79, código 3.0.1 (item e), Anexo IV do Decreto nº 2.172/97 e código 3.0.1 (item e), Anexo IV do Decreto nº 3.048/99. 

Sendo o requerimento do benefício posterior à Lei 8.213/91, deve ser aplicado o fator 1,40, conforme disposto no artigo 70 do Decreto nº 3048/99, com a redação dada pelo Decreto nº 4.827/03. 

Desse modo, faz jus a parte autora à averbação da atividade especial exercida de 01/03/1993 a 01/09/2009, devendo o INSS efetuar as anotações de praxe. Ante o exposto, nego provimento à apelação do INSS, nos termos da fundamentação. 

É o voto.

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Rio Grande, Rio Grande do Sul, Brazil
Especialista em Direito Previdenciário, pela Universidade de Caxias do Sul - UCS, em parceria com a ESMAFE - Escola da Magistratura Federal, em 2009. Formado em janeiro de 2006, pela FURG - Fundação Universidade do Rio Grande, em direito. Este blog tem o objetivo de divulgar o conteúdo previdenciário de maneira gratuita para que todos possam ter acesso as informações sobre esta matéria.

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