sexta-feira, 2 de abril de 2021

Carência para concessão do auxílio-doença

Nesta sexta-feira será visto uma jurisprudência que trata sobre os requisitos para concessão do benefício do auxílio-doença e a carência. Abaixo segue a decisão para análise dos amigos.

EMENTA 
PREVIDENCIÁRIO. APELAÇÃO. AUXÍLIO-DOENÇA. PERÍODO DE CARÊNCIA CUMPRIDO. BENEFÍCIO DEVIDO. JUROS E CORREÇÃO MONETÁRIA. MANUAL DE CÁLCULOS NA JUSTIÇA FEDERAL. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. 
1. A Lei nº 8.213/91, no artigo 42, estabelece os requisitos necessários para a concessão do benefício de aposentadoria por invalidez, quais sejam: qualidade de segurado, cumprimento da carência, quando exigida, e moléstia incapacitante e insuscetível de reabilitação para atividade que lhe garanta a subsistência. O auxílio-doença, por sua vez, tem seus pressupostos previstos nos artigos 59 a 63 da Lei nº 8.213/91, sendo concedido nos casos de incapacidade temporária. 
2. Constitui condição imprescindível para concessão do benefício de auxílio-doença que, no momento do surgimento da incapacidade laboral, estejam preenchidos os requisitos de qualidade de segurado e carência, conforme previsto no artigo 59, caput da Lei nº 8.213/91. 
3. O conjunto probatório demonstra que o autor preencheu os requisitos legais para a concessão do benefício de auxílio-doença no período de 25/07/2015 a 25/01/2016, considerando o único documento médico trazido aos autos, momento que havia cumprido o período de carência do benefício. 
4. Juros e correção monetária pelos índices constantes do Manual de Orientação para a elaboração de Cálculos na Justiça Federal vigente à época da elaboração da conta, observando-se, em relação à correção monetária, a aplicação do IPCA-e em substituição à TR - Taxa Referencial, consoante decidido pelo Plenário do Supremo Tribunal Federal no RE nº 870.947, tema de repercussão geral nº 810, em 20.09.2017, Relator Ministro Luiz Fux. 
5. Honorários advocatícios fixados em 10% do valor da condenação, consoante o entendimento desta Turma e o disposto §§ 2º e 3º do artigo 85 do Código de Processo Civil/2015, considerando as parcelas vencidas até a data da sentença, nos termos da Súmula nº 111 do Superior Tribunal de Justiça. 
6. Apelação parcialmente provida. Sentença corrigida de ofício.
TRF 3, ApCiv 5186347-46.2019.4.03.9999, 7ª Turma, 06/10/2020.


ACÓRDÃO 
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Sétima Turma, por unanimidade, decidiu, dar parcial provimento à apelação e, de ofício, corrigir os critérios de atualização do débito, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

RELATÓRIO
Trata-se de ação objetivando a concessão do benefício de auxílio doença durante os períodos de 09/04/2015 a 09/01/2016. A sentença julgou procedente o pedido e condenou a INSS a conceder o benefício de auxílio-doença no período de 09/04/2015 a 09/01/2016, com o pagamento dos valores em atraso acrescidos de correção monetária e juros de mora nos termos do art. 1º-F da Lei nº 9.494/97, com a redação da Lei nº 11.960/09, condenando o INSS ao pagamento de despesas processuais e honorários advocatícios fixados em 15% sobre o valor das parcelas vencidas até o trânsito em julgado. 

Sentença não submetida a remessa necessária, Apela o INSS, sustentando não ter sido cumprida a carência para a concessão do benefício, já que havia vertido apenas oito contribuições antes da data da início da incapacidade fixada, 04/2015, quando necessárias seriam 12 contribuições, Subsidiariamente, pede a redução da verba honorária. Com contrarrazões. 

É o relatório. 

VOTO
Presentes os pressupostos de admissibilidade, conheço do recurso de apelação. Considerando que a sentença se enquadra entre as hipóteses de exceção de submissão ao reexame necessário previstas nos § 3º e 4º do artigo 496 do CPC/2015 e que a matéria impugnada no recurso se limita à questão do cumprimento da carência restando, portanto, incontroversas as questões atinentes e à qualidade de segurado e à existência de incapacidade, restrinjo o julgamento apenas à insurgência recursal. 

A Lei nº 8.213/91, no artigo 42, estabelece os requisitos necessários para a concessão do benefício de aposentadoria por invalidez, quais sejam: qualidade de segurado, cumprimento da carência, quando exigida, e moléstia incapacitante e insuscetível de reabilitação para atividade que lhe garanta a subsistência. 

O auxílio-doença, por sua vez, tem seus pressupostos previstos nos artigos 59 a 63 da Lei nº 8.213/91, sendo concedido nos casos de incapacidade temporária. No que se refere à carência, a redação original do artigo 25, inciso I, da Lei de Benefícios exige o cumprimento de 12 (doze) contribuições mensais para a concessão de aposentadoria por invalidez ou auxílio-doença, in verbis: "Art. 25. A concessão das prestações pecuniárias do Regime Geral de Previdência Social depende dos seguintes períodos de carência, ressalvado o disposto no art. 26: I - auxílio-doença e aposentadoria por invalidez: 12 (doze) contribuições mensais;". 

Na hipótese de perda da qualidade de segurado, o parágrafo único do artigo 24 da mencionada lei previa que as contribuições anteriores a essa data só seriam computadas para efeito de carência depois que o segurado contasse, a partir da nova filiação à Previdência Social, com, no mínimo, 1/3 (um terço) do número de contribuições /exigidas para o cumprimento da carência definida para o benefício a ser requerido. 

Tal disposição foi revogada pela Medida Provisória nº 739/2016, de 07 de julho de 2016, que incluiu o parágrafo único no artigo 27 da Lei nº 8.213/91, dispondo que "No caso de perda da qualidade de segurado, para efeito de carência para a concessão dos benefícios de auxílio-doença, de aposentadoria por invalidez e de salário-maternidade, o segurado deverá contar, a partir da nova filiação à Previdência Social, com os períodos previstos nos incisos I e III do caput do art. 25". 

Todavia, essa norma não foi convertida em lei dentro do prazo de 120 dias (05 de novembro de 2016), tendo perdido a eficácia com efeitos retroativos à data da edição, nos termos do §3º do artigo 62 da Constituição Federal de 1988, voltando, portanto, a viger a norma anterior. 

Anote-se que não tendo sido editado o decreto legislativo previsto no mencionado §3º, apenas as relações jurídicas constituídas e decorrentes de atos praticados sob a sua vigência conservar-se-ão por ela regidas, conforme disposto no §11 do mesmo artigo 62 da Lei Maior. Em 06 de janeiro de 2017, entrou em vigor a Medida Provisória nº 767/2017, que novamente revogou o parágrafo único do artigo 24, disciplinando a matéria por meio da inclusão do artigo 27-A na Lei nº 8.213/91, repetindo o texto da Medida Provisória nº 739/2016. Convertida na Lei nº 13.457/2017, a norma do art. 27-A foi modificada para exigir o recolhimento de metade das contribuições exigidas para a carência dos benefícios por incapacidade (para todos os segurados) e do salário-maternidade (para as seguradas contribuinte individual e facultativa). 

Na seqüência, houve nova alteração do texto do artigo 27-A pela Medida Provisória nº 871/2019, de 18 de janeiro de 2019, que retomou a necessidade do cumprimento dos períodos integrais de carência previstos nos incisos I, III e IV do caput do art. 25. Por fim, convertida na Lei nº 13.846, de 2019, houve o restabelecimento da exigência da metade das contribuições, conforme anteriormente fixado na Lei nº 13.457/2017. Em resumo, na hipótese de perda da qualidade de segurado, para readquirir a carência necessária para fins da concessão dos benefícios de auxílio-doença, e de aposentadoria por invalidez, o segurado deverá, quando da data do requerimento administrativo, ter vertido: I) até 05/01/2017, 4 contribuições; II) de 06/01/2017 a 26/06/2017 (MP 767/2017), 12 contribuições; III) 27/06/2017 a 17/01/2019 (Lei 13.457/2017), 6 contribuições; IV) de 18/01/2019 a 17/06/2019 (MP 871/2019), 12 contribuições; e V) a partir de 18/06/2019, 6 contribuições. 

No caso dos autos: O recurso merece provimento parcial. Nascido em 11/03/1954, o autor alegou na inicial ter permanecido voluntariamente internado no período de 09/04/2015 a 09/01/2016 pra tratamento de transtornos psiquiátricos decorrentes de dependência de álcool e química. Apresentou requerimento administrativo em 14/05/2015, indeferido por não cumprimento da carência do benefício. Um segundo requerimento foi apresentado em 06/11/2015, indeferido por ter sido reconhecida a existência de incapacidade até 31/07/2015, data anterior a DIB. 

O laudo médico pericial, exame realizado em 20/03/2017 (fls. 78), constatou que o autor, então aos 63 anos de idade, alegou quadro de depressão e dependência de álcool e internação voluntária no período de 09/04/2015 a 09/01/2016, sendo que, na ocasião da perícia, referiu melhora do quadro de depressão, ainda sob tratamento medicamentoso, negando alcoolismo, concluindo pela existência de incapacidade total e temporária no período de 09/04/2015 a 09/01/2016, ante a prova de que esteve internado no período. 

O conjunto probatório comprovou a existência de incapacidade laboral tão somente a partir de 25/07/2015. A inicial foi instruída com certificado de conclusão de internação e declaração emitidas pela "Associação Carisma de Educação Cultura Recuperação Integração Social de Jaguariúna-SP, afirmando que o autor esteve em tratamento para dependência química no período de 09/04/2015 a 09/10/2015, prorrogado até 09/01/2016, tratando-se de documentos expedidos pela entidade e assinado por seus dirigentes. 

O único documento médico trazido pelo autor foi o atestado de fls. 17, segundo o qual o autor foi examinado pela primeira vez em 25/07/2015 em clínica de recuperação para dependentes químicos onde se encontrava internado, sendo reexaminado em 24/10/2015, afirmando o médico psiquiatra apresentar o diagnóstico de transtornos mentais e comportamentais devidos ao uso de álcool - síndrome de dependência, classificada no CID 10 pelo código F 10.2, com tempo provável de tratamento de 6 meses. Foram apresentados receituários médicos datados de 25/07/2015. 

Desta forma, na data de 25/07/2015 o autor já havia implementado a carência de 12 contribuições exigida para a concessão do benefício por incapacidade, considerando que o extrato do CNIS de fls. 27 aponta ter efetuado dois recolhimentos, como contribuinte individual, no período de 01/10/2012 a 30/11/2012 e manteve vínculo empregatício no período de 08/09/2014 a 05/04/2016. 

Não colhe a alegada dispensa do cumprimento da carência prevista no art. 151 da Lei de Benefícios, por não ter sido comprovada nos autos a existência de quadro de alienação mental, na medida em que a internação decorreu de ato voluntário do autor, demonstrando que permanecia com a cognição preservada. 

Constitui condição imprescindível para concessão do benefício de auxílio-doença que, no momento do surgimento da incapacidade laboral, estejam preenchidos os requisitos de qualidade de segurado e carência, conforme previsto no artigo 59, caput da Lei nº 8.213/91: "Art. 59. O auxílio-doença será devido ao segurado que, havendo cumprido, quando for o caso, o período de carência exigido nesta Lei, ficar incapacitado para o seu trabalho ou para a sua atividade habitual por mais de 15 (quinze) dias consecutivos.". 

Desta forma, o autor não preencheu os requisitos legais exigidos para a concessão cabível a concessão do benefício de auxílio-doença no período de 25/07/2015 a 25/01/2016. 

Quanto aos honorários advocatícios, é de ser reformada a sentença para que sejam fixados em 10% do valor da condenação, consoante o entendimento desta Turma e o disposto §§ 2º e 3º do artigo 85 do Código de Processo Civil/2015, considerando as parcelas vencidas até a data da sentença, nos termos da Súmula nº 111 do Superior Tribunal de Justiça. 

No que tange aos critérios de atualização do débito, verifico que a sentença desborda do entendimento firmado pelo Plenário do Supremo Tribunal Federal no RE nº 870.947, tema de repercussão geral nº 810, em 20.09.2017, Relator Ministro Luiz Fux. 

Assim, tratando-se de matéria cognoscível de ofício (AgRg no AREsp 288026/MG, AgRg no REsp 1291244/RJ), corrijo a sentença e estabeleço que as parcelas vencidas deverão ser atualizadas monetariamente e acrescidas de juros de mora pelos índices constantes do Manual de Orientação para a elaboração de Cálculos na Justiça Federal vigente à época da elaboração da conta, observando-se, em relação à correção monetária, a aplicação do IPCA-e em substituição à TR - Taxa Referencial. 

Anoto que os embargos de declaração opostos perante o STF que objetivavam a modulação dos efeitos da decisão supra, para fins de atribuição de eficácia prospectiva, foram rejeitados no julgamento realizado em 03.10.2019. 

Ante o exposto, dou parcial provimento à apelação. 

É o voto.

Seja o primeiro a comentar ;)

Perfil

Minha foto
Rio Grande, Rio Grande do Sul, Brazil
Especialista em Direito Previdenciário, pela Universidade de Caxias do Sul - UCS, em parceria com a ESMAFE - Escola da Magistratura Federal, em 2009. Formado em janeiro de 2006, pela FURG - Fundação Universidade do Rio Grande, em direito. Este blog tem o objetivo de divulgar o conteúdo previdenciário de maneira gratuita para que todos possam ter acesso as informações sobre esta matéria.

Formulário de contato

Nome

E-mail *

Mensagem *

  ©Comberlato Educação Previdenciária - Todos os direitos reservados.

Template by Dicas Blogger | Topo