Filha maior de 21 anos com união estável perde pensão
Nesta sexta-feira será visto uma jurisprudência que trata sobre a perda do benefício de pensão por morte a filha maior de 21 anos que possui união estável. Abaixo segue a decisão para análise dos amigos.
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. SERVIDOR PÚBLICO. PENSÃO POR MORTE DO PAI. LEI N.º 3.373/58. FILHA MAIOR DE 21 ANOS. UNIÃO ESTÁVEL COMPROVADA. PERDA DA CONDIÇÃO DE SOLTEIRA. EXCLUSÃO DE BENEFICIÁRIA. INOVAÇÃO RECURSAL.
1. O direito ao benefício de pensão por morte é regido pela legislação vigente à data do óbito, que na hipótese ocorreu em 1973.
2. A Lei 3.373/58 garantia o pensionamento apenas às filhas solteiras, maiores de 21 anos, sem cargo público permanente. Aplicação do parágrafo único do art. 5º da Lei nº 3.373/58.
3. A união estável, de acordo com os artigos 226 da Constituição Federal e 1723 do Código Civil de 2002, é reconhecida como entidade familiar, dela decorrendo todos os direitos e deveres oriundos do casamento.
4. Os relacionamentos de união estável mantidos pela parte autora e devidamente comprovados causaram a perda da condição de filha solteira, necessária para o recebimento da pensão por morte instituída pela Lei 3.373/58.
4. O pedido de exclusão da litisconsorte passiva da condição de beneficiária da pensão por morte não merece apreciação em sede recursal, visto que não foi oportunamente postulado e não se submeteu ao crivo do contraditório.
5. Apelação não provida.
TRF 1, Processo nº: 0000727-83.2008.4.01.3307/BA, 1ª T., Juiz Federal Relator Warney Paulo Nery Araujo, 27/05/2016.
ACÓRDÃO
Decide a Primeira Turma, à unanimidade, negar provimento à apelação da parte autora, nos termos do voto do Relator.
Brasília, 20 de abril de 2016.
JUIZ FEDERAL WARNEY PAULO NERY ARAUJO
RELATÓRIO
Trata-se de apelação da parte autora – RITA DE CASSIA COSTA BRITO SANTOS – em face da sentença que julgou improcedente o pedido formulado na inicial, e extinguiu o processo, com resolução do mérito, consistente no restabelecimento de pensão por morte de seu pai, ex-servidor público federal, cessada em razão da perda da condição de solteira, motivada por união estável.
Em seu recurso, em síntese, a apelante alega que a pretensão encontra respaldo na legislação e em precedentes jurisprudenciais. Requer a reforma da sentença para julgar procedente o pedido e excluir a litisconsorte da condição de beneficiária da pensão por morte.
Com contrarrazões das requeridas.
É o relatório
VOTO
Pleiteia a parte autora a reforma da sentença que julgou improcedente o pedido inicial para restabelecer à apelante o benefício de pensão por morte cessado pela União em virtude de não estar preenchida a condição de filha solteira.
Passo analisar se a autora tem direito à pensão por morte.
A legislação aplicável à pensão por morte é aquela vigente à época da implementação dos requisitos para a concessão do benefício, qual seja, o óbito do instituidor, salvo expressa previsão legal, em lei posterior, de sua aplicação retroativa a fatos ocorridos anteriormente.
O parágrafo único do artigo 5º, da Lei 3.373/58 prevê a possibilidade de concessão de pensão por morte de servidor, à filha solteira, maior de 21 anos, sem cargo público permanente.
No caso em comento, à época do óbito, ocorrido em 1973 (fl. 23), a autora era menor, solteira e teria direito à pensão por morte de servidor (seu pai).
Entretanto, o requerimento de pensão somente foi apresentado em setembro de 2001, o qual foi deferido com o pagamento das parcelas retroativas ao ano de 1996 (fl. 25).
Ocorre que em 2007, o benefício foi cessado (fls. 25/26) após averiguação de denúncia anônima no sentido de que a autora não possuía a condição de solteira, por ter convivido em união estável, comprovada através de certidão de casamento religioso com Nerivaldo Santos Pereira (fl. 27), o benefício foi cessado.
Porém, a autora defende a tese de que não viveu em união estável com o referido companheiro nem com outra pessoa e que a geração de filhos em comum não seria suficiente para comprovar o vínculo. Aduz, ainda, que sua irmã, litisconsorte passiva, é quem possui o estado de casada e que o benefício desta é que deve ser cessado.
As provas carreadas aos autos não corroboram a tese da autora. A ocorrência de casamento religioso no ano de 1980 é inconteste, pois restou comprovada pelo documento de fl. 27. O nascimento da filha quase dois anos após a matrimônio, por sua vez, demonstra que a união estável perdurou por no mínimo esse período.
A própria autora, inclusive, admitiu a existência de outra união estável, fato que caracteriza a perda da condição de solteira necessária à manutenção do benefício.
Por oportuno, transcrevo os fundamentos da sentença impugnada:
“Ademais, ficou demonstrado, nos autos, que a autora manteve outra relação de união estável, que, de acordo com seu depoimento em audiência, teve duração de aproximadamente seis anos, da qual nasceram dois filhos.
Diante dos fatos acima apontados, não resta dúvida de que a autora manteve relacionamentos que tem características de união estável, que, de acordo com os artigos 226 da Constituição Federal e 1723 do Código Civil de 2002, é reconhecida como entidade familiar, dela decorrendo todos os direitos e deveres oriundos do casamento.”
Assim sendo, a união estável equipara-se ao casamento e o “status” legal de companheira é semelhante ao de cônjuge. Portanto, os relacionamentos estáveis mantidos pela parte autora e devidamente comprovados nos autos, ainda que já terminados, causaram a perda condição de filha solteira, necessária para o recebimento da pensão por morte instituída pela Lei 3.373/58. Isso porque, considerando o dever de assistência recíproca entre os companheiros, a autora, ao manter a união estável deixa de ser dependente do pai e passa a ser do companheiro.
No mesmo sentido, transcrevo os seguintes julgados:
ADMINISTRATIVO. CUMULAÇÃO DE PENSÕES. CONDIÇÃO DE FILHA MAIOR E SOLTEIRA. LEI 3.373/58. CONDIÇÃO DE COMPANHEIRA. LEI 8.112/90. DESCARACTERIZAÇÃO DO ESTADO CIVIL DE SOLTEIRA. CANCELAMENTO DA PENSÃO TEMPORÁRIA. RESSARCIMENTO AO ERÁRIO. POSSIBILIDADE. MÁ-FÉ CARACTERIZADA. 1- A controvérsia dos autos cinge-se sobre a possibilidade da Administração cobrar valores pagos indevidamente à Autora, uma vez que esta teria percebido simultaneamente duas pensões estatutárias, uma pela morte de seu pai, com base na Lei 3.373/58, na qualidade de filha solteira, e outra em razão da morte de seu companheiro, com base na Lei 8.112/90. 2- A união estável, por ser equiparada ao casamento para todos os efeitos legais, descaracteriza a condição de solteira, autorizando, portanto, a cessão da pensão temporária prevista no art. 5°, parágrafo único, da Lei 3.373/58. Precedente: TRF2, AC 200851010216981, Quinta Turma Especializada, Rel. Des. Fed. FERNANDO MARQUES, E-DJF2R 22/12/2010. 3- Tanto o STF, no julgamento do Mandado de Segurança n° 25.641-9/DF, como o STJ, em sede de recurso repetitivo (AgRg no REsp 788822/MA, Sexta Turma, Rel. Min. OG FERNANDES, DJe 14/05/2013), já consolidaram o entendimento no sentido de que não se sujeitam à repetição os valores pagos em decorrência de erro da Administração ou interpretação inadequada da legislação, desde que o servidor ou seu dependente esteja de boa-fé, não tendo concorrido para a realização do pagamento indevido. 4- Não é possível cogitar de boa-fé da pensionista quando esta recebe duas pensões em função de requisitos completamente antagônicos, na medida em que percebia uma pensão na condição de filha solteira, enquanto a outra lhe era paga por ser companheira de ex-servidor federal. Precedentes: TRF, AC 200951010088790, Sexta Turma Especializada, Rel. Des. Fed. GUILHERME CALMON NOGUEIRA DA GAMA, E-DJF2R 20/07/2012; TRF5, AC 200883000180372, Terceira Turma, Rel. Des. Fed. GERALDO APOLIANO, DJE 25/02/2010. 5- Além disso, não houve dúvida plausível sobre a validade ou incidência da norma, nem mesmo sua interpretação equivocada pela Administração, uma vez que, quando da concessão da pensão por morte, a Autora preenchia todos os requisitos do art. 5 ° da Lei 3.373/58, inexistindo aí qualquer ilegalidade. O pagamento indevido da pensão só se deu em razão do comportamento da Autora que, ao deixar de informar a sua união estável, manteve a Administração em erro, permitindo que o benefício continuasse a ser pago mesmo quando este já não lhe era mais devido. 6- Recurso e remessa necessária providos para afastar a vedação ao ressarcimento ao erário. (APELRE 201151010045929, Desembargador Federal MARCUS ABRAHAM, TRF2 - QUINTA TURMA ESPECIALIZADA, E-DJF2R - Data::08/10/2013.)
ADMINISTRATIVO. PENSÃO POR FALECIMENTO DE SERVIDOR. FILHA MAIOR DE 21 ANOS. LEI 3.373/58 VIGENTE À ÉPOCA DA MORTE DO INSTITUIDOR DO BENEFÍCIO. COMPANHEIRA. STATUS LEGAL SEMELHANTE AO DO CÔNJUGE. DIREITO NÃO CONSTITUÍDO. - Para a concessão do benefício de pensão por morte de servidor, há que se respeitar a legislação vigente à época do óbito. - A Lei 3.373/58, que dispõe sobre o Plano de Assistência ao Funcionário e à sua Família, a que se referem os arts. 161 e 256 da Lei 1.711/52, assegura pensão à filha maior, solteira, não ocupante de cargo público. - Após o falecimento de seu genitor a Autora passou a conviver em união estável com o militar José Lino Rocha, até a data de seu falecimento, descaracterizando-se, portanto, a condição de solteira. - A jurisprudência pátria já se posicionou no sentido de que a companheira possui “status legal” semelhante ao do cônjuge. - Apelação improvida. (AC 200851010216981, Desembargador Federal FERNANDO MARQUES, TRF2 - QUINTA TURMA ESPECIALIZADA, E-DJF2R - Data::22/12/2010 - Página::260.) – grifos nossos
Por outro lado, o pedido de exclusão da litisconsorte passiva da condição de beneficiária da pensão por morte não merece apreciação em sede recursal, visto que não foi oportunamente postulado e não se submeteu ao crivo do contraditório.
Diante do exposto, nego provimento à apelação da parte autora.
É o voto.
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