sexta-feira, 14 de março de 2025

Decisão trata sobre a aposentadoria híbrida

Nesta sexta-feira será visto uma jurisprudência que trata sobre os requisitos para concessão da aposentadoria por idade híbrida. Abaixo segue a decisão para análise dos amigos.


EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. APELAÇÃO. APOSENTADORIA POR IDADE HÍBRIDA. CÔMPUTO DE LABOR URBANO COM PERÍODO DE ATIVIDADE EXERCIDA NA CONDIÇÃO DE SEGURADA ESPECIAL/PESCADORA ARTESANAL. PROVA MATERIAL VÁLIDA. PROVA ORAL FAVORÁVEL. QUALIDADE DE SEGURADA E CARÊNCIA COMPROVADAS. REQUISITOS PREENCIDOS. RECURSO PROVIDO.
1. Para categoria de aposentadoria por idade mista ou híbrida, prevista no artigo 48, § 3º, da Lei 8.213/1991, há a contagem híbrida da carência (soma-se os períodos de labor exercido como segurado especial, sem contribuições vertidas, com outros períodos de contribuições ao RGPS), destinando-se aos segurados especiais que, por alguma circunstância, trabalharam no meio urbano. Contudo, para a concessão do benefício exige-se o requisito etário sem o redutor dos cinco anos, isto é, 65 anos de idade, se homem, e 60 anos, se mulher.
2. Considerando que a autora implementou requisito etário em 2019 (nascimento em 28/6/1959), verifica-se que já havia implementado o requisito etário ao tempo da DER (4/7/2019), de modo que a soma do período de segurada especial, pescadora artesanal, com o período de contribuições vertidas ao RGPS em razão de labor urbano deve atingir, no mínimo, 180 meses (15 anos), nos termos do art. 25, II, da Lei 8.213/91. Verifica-se a presença de contribuições vertidas ao RGPS no período de 17/11/1998 a 01/6/2005 em razão de labor urbano.
3. Dessa forma, se faz necessária a comprovação de labor de subsistência que corresponda ao número de meses necessários ao complemento da carência do benefício. A autora sustenta possuir mais de 9 anos (2010 a 2019) como segurada especial, em razão de efetivo trabalho na atividade pesqueira (pesca artesanal), que somado aos períodos de contribuições na atividade urbana, vertidos à Previdência Social, ultrapassa o tempo mínimo necessário para a concessão do benefício.
4. Com o propósito de comprovar a sua condição de segurada especial a autora juntou aos autos os seguintes documentos, dentre outros de menor relevo: CNIS demonstrando que o INSS reconhece sua condição de segurada especial desde 24/3/2010; comprovante que gozou de seguro desemprego no período de defeso nos anos de 2011 a 2018; cadastro geral de pescadora artesanal emitido pelo Ministério da Fazenda, constando tratar-se de segurada especial em decorrência da pesca de peixes em água doce; Carteira profissional de pescadora artesanal emitida pelo Ministério da Pesca e Aquicultura, expedida em 9/10/2013, constando que o primeiro RGP se deu em 24/3/2010; comprovantes de pagamentos de guias da previdência social, segurada especial, pescadora artesanal.
5. Verifica-se a presença de prova material revestida de robustez, tratando-se de documentos dotados de fé pública e devem ser considerados como prova indiciária da condição de segurada especial da autora, posto que os documentos em referência não apontam quaisquer inconsistências com relação aos demais elementos de prova dos autos. Diante das dificuldades enfrentadas pelos segurados especiais para comprovar o exercício de atividade de pesca artesanal, em razão das peculiaridades inerentes à atividade de subsistência, adota-se a solução pro mísero, em que se admite a prova testemunhal para demonstrar a qualidade de segurada, posto que acompanhada de início de prova material.
6. Neste ponto, a propósito, a prova indiciária da qualidade de segurada especial da autora foi corroborada pela prova testemunhal que, de forma satisfatória, ampliou a prova para todo o período necessário à concessão do benefício, restando amplamente comprovado que a autora ostenta a qualidade de segurada especial pelo período situado entre os anos de 2010 a 2019 e, portanto, fazendo jus ao benefício de aposentadoria por idade híbrida.
7. Apelação a que se dá provimento.
TRF 1ª, ApCiv. 1016594-77.2023.4.01.9999, NONA TURMA, desembargador federal Urbano Leal Berquo Neto, PJe 17/02/2025.

ACÓRDÃO
Decide a Nona Turma do Tribunal Regional Federal da Primeira Região, por unanimidade, DAR PROVIMENTO à apelação interposta pela autora, nos termos do voto do relator.

Desembargador Federal URBANO LEAL BERQUÓ NETO
Relator

RELATÓRIO
Trata-se de apelação interposta pela parte autora em face de sentença que julgou improcedente a pretensão para concessão de benefício de aposentadoria por idade, na modalidade híbrida/mista, em que a autora pretende computar o tempo de labor de pesca artesanal, segurada especial, com tempo de contribuição ao RGPS em decorrência de labor urbano.

Em suas razões de apelação, requer a reforma da sentença para que seja julgado procedente o pedido, ao argumento de que faz jus ao benefício pleiteado, tendo em vista a existência de documento apto a servir como início de prova material da qualidade de segurada especial, e que tais informações foram corroboradas de forma segura pela prova testemunhal produzida.

Devidamente intimado, o INSS não apresentou contrarrazões.

É o relatório.

VOTO
O Excelentíssimo Desembargador Federal Urbano Leal Berquó Neto (Relator):

Presentes os pressupostos recursais, conheço do recurso.

Mister a depuração, de pronto, do cerne da pretensão, ora vertida em base recursal, lembrando que se trata de conflito de interesses condizente ao benefício de aposentadoria por idade híbrida/mista, utilizando-se a soma do tempo de labor urbano com o período de labor exercido na condição de segurada especial, pescadora artesanal.

De início, convém destacar que com a inclusão dos §§ 3º e 4º no art. 48 da Lei 8.213/91, pela Lei 11.718/2008, outra espécie de aposentadoria por idade passou a integrar o ordenamento jurídico, a chamada aposentadoria híbrida ou mista, confira-se:

§ 3º Os trabalhadores rurais de que trata o § 1º deste artigo que não atendam ao disposto no § 2º deste artigo, mas que satisfaçam essa condição, se forem considerados períodos de contribuição sob outras categorias do segurado, farão jus ao benefício ao completarem 65 (sessenta e cinco) anos de idade, se homem, e 60 (sessenta) anos, se mulher. (Incluído pela Lei nº 11.718, de 2008).
§ 4º Para efeito do § 3º deste artigo, o cálculo da renda mensal do benefício será apurado de acordo com o disposto no inciso II do caput do art. 29 desta Lei, considerando-se como salário-de-contribuição mensal do período como segurado especial o limite mínimo de salário-de-contribuição da Previdência Social. (Incluído pela Lei nº 11,718, de 2008).

Consoante jurisprudência assentada pelo STJ:

(...) A aposentadoria híbrida consagra o princípio constitucional de uniformidade e equivalência dos benefícios e serviços às populações urbanas e rurais, conferindo proteção àqueles Trabalhadores que migraram, temporária ou definitivamente, muitas vezes acossados pela penúria, para o meio urbano, em busca de uma vida mais digna, e não conseguiram implementar os requisitos para a concessão de qualquer aposentadoria, encontrando-se em situação de extrema vulnerabilidade social.
5. A inovação legislativa objetivou conferir o máximo aproveitamento e valorização ao labor rural, ao admitir que o Trabalhador que não preenche os requisitos para concessão de aposentadoria rural ou aposentadoria urbana por idade possa integrar os períodos de labor rural com outros períodos contributivos em modalidade diversa de Segurado, para fins de comprovação da carência de 180 meses para a concessão da aposentadoria híbrida, desde que cumprido o requisito etário de 65 anos, se homem, e 60 anos, se mulher. (REsp 1674221/SP, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 14/08/2019, DJe 04/09/2019). Sem grifos no original

Verifica-se, portanto, que para categoria de aposentadoria por idade mista ou híbrida, prevista no artigo 48, § 3º, da Lei 8.213/1991, há a contagem híbrida da carência (soma-se os períodos de labor exercido como segurado especial, sem contribuições vertidas, com outros períodos de contribuições ao RGPS), destinando-se aos segurados especiais que, por alguma circunstância, trabalharam no meio urbano. Contudo, para a concessão do benefício exige-se o requisito etário sem o redutor dos cinco anos, isto é, 65 anos de idade, se homem, e 60 anos, se mulher.

No que tange à caracterização da condição de segurada especial, o Superior Tribunal de Justiça, em sede de Incidente de Uniformização de Jurisprudência, firmou o entendimento de que para o reconhecimento do tempo de serviço do trabalho rural, apesar de não haver exigência legal de que o documento apresentado como início de prova material abranja todo o período que se busca comprovar, é preciso que tal prova seja contemporânea ao menos por uma fração do lapso de trabalho rural pretendido (Pet 7.475/PR, Rel. Ministro Herman Benjamin, Primeira Seção, julgado em 09/11/2016, DJe 29/11/2016).

Por sua vez, registra-se que o pescador artesanal é equiparado ao trabalhador rural, na qualidade de segurado especial, para fins de proteção previdenciária, sendo que a comprovação da atividade de pescador artesanal, assim como de trabalhador rural, é realizada mediante a apresentação de início de prova material, corroborada por prova testemunhal, no caso de inexistência de documentação suficiente que demonstre o exercício de atividade durante todo o período questionado, sendo inadmissível a prova exclusivamente testemunhal (art. 55, §3º, da Lei 8.213/91 e Súmula 149 do STJ).

Nesse contexto, considerando que a autora implementou requisito etário em 2019 (nascimento em 28/6/1959), verifica-se que já havia implementado o requisito etário ao tempo da DER (4/7/2019), de modo que a soma do período de segurada especial, pescadora artesanal, com o período de contribuições vertidas ao RGPS em razão de labor urbano deve atingir, no mínimo, 180 meses (15 anos), nos termos do art. 25, II, da Lei 8.213/91.

Verifica-se a presença de contribuições vertidas ao RGPS no período de 17/11/1998 a 01/6/2005 em razão de labor urbano. Dessa forma, se faz necessária a comprovação de labor de subsistência que corresponda ao número de meses necessários ao complemento da carência do benefício.

A autora sustenta possuir mais de 9 anos (2010 a 2019) como segurada especial, em razão de efetivo trabalho na atividade pesqueira (pesca artesanal), que somado aos períodos de contribuições na atividade urbana, vertidos à Previdência Social, ultrapassa o tempo mínimo necessário para a concessão do benefício.

Com o propósito de comprovar a sua condição de segurada especial a autora juntou aos autos os seguintes documentos, dentre outros de menor relevo:
CNIS demonstrando que o INSS reconhece sua condição de segurada especial desde 24/3/2010;
comprovante que gozou de seguro desemprego no período de defeso nos anos de 2011 a 2018;
cadastro geral de pescadora artesanal emitido pelo Ministério da Fazenda, constando tratar-se de segurada especial em decorrência da pesca de peixes em água doce;
carteira profissional de pescadora artesanal emitida pelo Ministério da Pesca e Aquicultura, expedida em 9/10/2013, constando que o primeiro RGP se deu em 24/3/2010;
comprovantes de pagamentos de guias da previdência social, segurada especial, pescadora artesanal.

Verifica-se a presença de prova material revestida de robustez, tratando-se de documentos dotados de fé pública e devem ser considerados como prova indiciária da condição de segurada especial da autora, posto que os documentos em referência não apontam quaisquer inconsistências com relação aos demais elementos de prova dos autos.

Diante das dificuldades enfrentadas pelos segurados especiais para comprovar o exercício de atividade de pesca artesanal, em razão das peculiaridades inerentes à atividade de subsistência, adota-se a solução pro mísero, em que se admite a prova testemunhal para demonstrar a qualidade de segurada, posto que acompanhada de início de prova material.

Neste ponto, a propósito, a prova indiciária da qualidade de segurada especial da autora foi corroborada pela prova testemunhal que, de forma satisfatória, ampliou a prova para todo o período necessário à concessão do benefício, restando amplamente comprovado que a autora ostenta a qualidade de segurada especial pelo período situado entre os anos de 2010 a 2019 e, portanto, fazendo jus ao benefício de aposentadoria por idade híbrida.

Pertinente se mostra registrar que o indeferimento do benefício, tanto no âmbito administrativo quanto em primeiro grau de jurisdição, não se deu pela ausência de comprovação da qualidade de segurada especial da autora, posto que a própria autarquia previdenciária reconhece que pelo menos desde 2010 a autora ostenta qualidade de pescadora artesanal, mas verifica-se interpretação equivocada das normas, analisando o pedido como se tratasse de aposentadoria por idade de segurada especial, para o qual exige-se a totalidade do período de carência exercido como segurado especial.

Com efeito, no julgamento do Tema Repetitivo sob o número 1007 o STJ estabeleceu que: “O tempo de serviço rural, ainda que remoto e descontínuo, anterior ao advento da Lei 8.213/1991, pode ser computado para fins da carência necessária à obtenção da aposentadoria híbrida por idade, ainda que não tenha sido efetivado o recolhimento das contribuições, nos termos do art. 48, §3º da Lei 8.213/1991, seja qual for a predominância do labor misto exercido no período de carência ou o tipo de trabalho exercido no momento do implemento do requisito etário ou do requerimento administrativo”.

Por conseguinte, é firme o entendimento do STJ no sentido de que se considera válido o cômputo do tempo de labor rural/pesca artesanal, tanto posterior como anterior ao advento da Lei n. 8.213/91, para fins de carência de aposentadoria híbrida por idade, assim como admite total alternância entre atividades rurais/pesqueiras e urbanas, inclusive permitindo que a última atividade desempenhada pelo segurado tenha sido urbana, não havendo que se falar em indeferimento do benefício por ausência de comprovação de 180 meses na condição de segurado especial ao tempo da DER ou do implemento do requisito etário, bastando que a soma do período de segurado especial com o período de contribuições ao RGPS seja suficiente para complemento da carência do benefício de aposentadoria por idade.

Posto isto, DOU PROVIMENTO à apelação interposta pela autora, nos termos da fundamentação supra.

Por via de consequência, condeno o INSS a conceder em favor da autora o benefício de aposentadoria por idade na modalidade híbrida, mediante o cômputo do período de segurada especial ostentada pela autora de 2010 a 2019, com DIB fixada na DER e descontados eventuais valores recebidos, neste período, a título de outro benefício inacumulável.

Condeno o INSS ao pagamento de honorários advocatícios de sucumbência que fixo em 10% sobre o valor das prestações vencidas até a data do acórdão do presente julgado (art. 85 do CPC/2015 c/c Súmula 111 do STJ).

Consigno que as prestações vencidas deverão ser atualizadas com juros e correção monetária segundo os índices previstos no Manual de Cálculo da Justiça Federal, na versão vigente ao tempo da execução.

Determino que o INSS implante o benefício em favor da autora, no prazo de sessenta dias, eis que antecipo os efeitos da tutela, em face do caráter alimentar imperante.

É como voto.

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Rio Grande, Rio Grande do Sul, Brazil
Especialista em Direito Previdenciário, pela Universidade de Caxias do Sul - UCS, em parceria com a ESMAFE - Escola da Magistratura Federal, em 2009. Formado em janeiro de 2006, pela FURG - Fundação Universidade do Rio Grande, em direito. Este blog tem o objetivo de divulgar o conteúdo previdenciário de maneira gratuita para que todos possam ter acesso as informações sobre esta matéria.

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