sexta-feira, 19 de janeiro de 2024

Justiça nega salário-maternidade a MEI

Nesta sexta-feira será visto uma jurisprudência que trata sobre o pleito de um benefício de salário-maternidade a uma microempreendedora cujas contribuições foram vertidas em atraso após a perda da qualidade de segurado. Abaixo segue a decisão para análise dos amigos.


EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. SALÁRIO-MATERNIDADE. CONTRIBUINTE INDIVIDUAL. CONTRIBUIÇÕES EFETUADAS COM ATRASO, POSTERIORMENTE AO PRIMEIRO RECOLHIMENTO EFETUADO SEM ATRASO. CÔMPUTO PARA FINS DE CARÊNCIA. IMPOSSIBILIDADE DIANTE DA PERDA QUALIDADE DE SEGURADA. IMPROCEDÊNCIA. APELAÇÃO NÃO PROVIDA.
1. Apelação interposta contra a sentença que, em ação ordinária, julgou improcedente a pretensão da autora que objetiva o recebimento do benefício de salário-maternidade, na condição de Microempreendedora Individual (MEI), em face do nascimento de seu filho.
2. A concessão do benefício de salário-maternidade à segurada pressupõe o preenchimento dos seguintes requisitos: a) nascimento de filho, adoção ou obtenção de guarda judicial para fins de adoção; b) a comprovação da qualidade de segurada e, tratando-se de contribuinte individual e facultativas, cumprir uma carência mínima de 10 meses (Lei 8.213/91, arts. 71, e 72 71-A; Decreto nº 3.048/99, art. 100-A).
3. O requisito da comprovação da maternidade/adoção encontra-se preenchido, pois a Certidão de Nascimento constante dos autos atesta o nascimento do(a) filho(a) da requerente, ocorrido em 28/10/2020. O requerimento administrativo foi formulado em 08/01/2021.
4. O cerne da questão diz respeito à comprovação da qualidade de segurada e, tratando-se de contribuinte individual e facultativas, cumprir uma carência mínima de 10 meses.
5. O contribuinte individual que trabalha por conta própria (situação dos autos) e o facultativo, por serem os responsáveis tributários pelo recolhimento da sua contribuição, não possuem presunção de recolhimento, de modo que o período de carência será contado apenas da data de efetivo pagamento da primeira contribuição sem atraso, não sendo consideradas para este fim as contribuições recolhidas com atraso referentes a competências anteriores (art. 27, II, da Lei nº 8.213/91). Assim, nos termos legais, o pagamento de contribuições previdenciárias com atraso pelo contribuinte individual não servirá para fins de carência, se recolhidas após a perda da qualidade de segurado (STJ, AR n. 4.372/SP, relator Ministro Rogerio Schietti Cruz, Terceira Seção, julgado em 13/4/2016, DJe de 18/4/2016).
6. A Turma Nacional de Uniformização decidiu nos autos do PEDILEF 2009.71.50.019216-5/RS, julgado em 20/02/2013, Tema 192, que o pagamento das contribuições em atraso deve ocorrer dentro do período de manutenção da qualidade de segurado, para fins de cômputo da carência, firmando a seguinte tese: "Contribuinte individual. Recolhimento com atraso das contribuições posteriores ao pagamento da primeira contribuição sem atraso. Perda da qualidade de segurado. Impossibilidade de cômputos das contribuições recolhidas com atraso relativas ao período entre a perda da qualidade de segurado e a sua reaquisição para efeito de carência".
7. A parte autora efetuou o pagamento da última contribuição sem atraso em agosto/2019, vertendo o pagamento das prestações subsequentes apenas em dezembro de 2020, quando já havia perdido a qualidade de segurado, nos termos do art. 15, II da Lei 8.213/91. Registre-se que o pagamento extemporâneo das contribuições (dezembro/2020) se deu após o nascimento do seu filho (28/10/2020).
8. Apesar das contribuições recolhidas com atraso possam ser computadas como tempo de contribuição, se mostra indevido o cômputo, para efeito de carência, quando recolhidas após a perda da qualidade de segurado, nos termos do art. 27, II, da Lei n. 8.213/1991. Precedente desse E. Tribunal: TRF5, PROCESSO: 08058873120224058100, APELAÇÃO CÍVEL, DESEMBARGADOR FEDERAL EDILSON PEREIRA NOBRE JUNIOR, 2ª TURMA, JULGAMENTO: 15/08/2023.
9. Honorários advocatícios recursais pela parte autora fixados em 2% (CPC, art. 85, § 11), a serem acrescidos ao valor da verba sucumbencial já estipulada pela sentença recorrida, com exigibilidade suspensa por se tratar de beneficiária da justiça gratuita (art. 98, § 3º do CPC).
10. Apelação não provida.
TRF 5ª, Processo apelação cível nº 0800373-31.2022.8.15.0261, Sexta Turma, Desembargador Federal Leonardo Resende Martins, 22.11.2023.



ACÓRDÃO
Vistos e relatados os autos em que são partes as acima indicadas, decide a Sexta Turma do Tribunal Regional Federal da 5a Região, por unanimidade, negar provimento à apelação, na forma do relatório e voto constantes dos autos, que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Recife/PE, data de julgamento constante da certidão.

Desembargador Federal Leonardo Resende Martins
Relator

RELATÓRIO
Trata-se de apelação interposta por particular contra a sentença que, em ação ordinária, julgou improcedente a pretensão da autora - que objetiva o recebimento do benefício de salário-maternidade, na condição de Microempreendedora Individual (MEI), em face do nascimento de seu filho.

O magistrado condenou a parte autora em honorários advocatícios fixados em R$ 500,00 (quinhentos reais), com exigibilidade suspensa por se tratar de beneficiária da justiça gratuita (art. 98, § 3º do CPC).

A apelante, em suas razões recursais, afirma que: a) cumpriu o requisito de carência, eis que verteu contribuições no interregno de 01/07/2014 a 31/12/2021 como microempreendedora individual (MEI); b) as contribuições pagas em atraso foram efetuadas após a primeira contribuição paga sem atraso na qualidade de contribuinte individual, sendo injustificável o não reconhecimento do cumprimento do período de carência.

Pugnou, assim, pela procedência do pedido autoral, considerando que verteu contribuições no interregno de 01/07/2014 a 31/12/2021 como microempreendedora individual, ocorrendo a primeira contribuição integral sem atraso na competência 08/2014, paga em 02/09/2014, as contribuições posteriores, ainda que pagas em atraso, devem ser integralmente reconhecidas para fins de carência e tempo de contribuição.

Não foram apresentadas contrarrazões recursais.

É, em síntese, o relatório. Passo a decidir.

VOTO
Presentes os pressupostos objetivos e subjetivos de admissibilidade, conheço do apelo.

Cuida-se de pedido de concessão de salário-maternidade na condição de Microempreendedora Individual (MEI).

A concessão do benefício de salário-maternidade à segurada pressupõe o preenchimento dos seguintes requisitos: a) nascimento de filho, adoção ou obtenção de guarda judicial para fins de adoção; b) a comprovação da qualidade de segurada e, tratando-se de contribuinte individual e facultativas, cumprir uma carência mínima de 10 meses (Lei 8.213/91, arts. 71, e 72 71-A; Decreto nº 3.048/99, art. 100-A).

O requisito da comprovação da maternidade/adoção encontra-se preenchido, pois a Certidão de Nascimento constante dos autos atesta o nascimento do(a) filho(a) da requerente, ocorrido em 28/10/2020. O requerimento administrativo foi formulado em 08/01/2021 (Id. 8150261.40785334, doc. 13 e 44).

O indeferimento administrativo do benefício (NB 198.948.621-2) se fundamentou em não comprovação de filiação ao Regime Geral da Previdência Social na data do afastamento.

O cerne da questão diz respeito à comprovação da qualidade de segurada e, tratando-se de contribuinte individual e facultativas, cumprir uma carência mínima de 10 meses.

Acerca da carência, dispõe a Lei nº 8.213/91 e o Decreto nº 3.048/99:

Lei nº 8.213/91:
Art. 27. Para cômputo do período de carência, serão consideradas as contribuições: (Redação dada pela Lei Complementar nº 150, de 2015)
[...]
II - realizadas a contar da data de efetivo pagamento da primeira contribuição sem atraso, não sendo consideradas para este fim as contribuições recolhidas com atraso referentes a competências anteriores, no caso dos segurados contribuinte individual, especial e facultativo, referidos, respectivamente, nos incisos V e VII do art. 11 e no art. 13. (Redação dada pela Lei Complementar nº 150, de 2015)

Decreto nº 3.048/99:
Art. 26. Período de carência é o tempo correspondente ao número mínimo de contribuições mensais indispensáveis para que o beneficiário faça jus ao benefício, consideradas as competências cujo salário de contribuição seja igual ou superior ao seu limite mínimo mensal. (Redação dada pelo Decreto nº 10.410, de 2020).
[...]
§ 4º Para efeito de carência, considera-se presumido o recolhimento das contribuições do segurado empregado, do trabalhador avulso e, relativamente ao contribuinte individual, a partir da competência abril de 2003, as contribuições dele descontadas pela empresa na forma do art. 216. (Redação dada pelo Decreto nº 4.729, de 2003)
[...]
Art. 28. O período de carência é contado:
[...]
II - para o segurado contribuinte individual, observado o disposto no § 4º do art. 26, e o segurado facultativo, inclusive o segurado especial que contribua na forma prevista no § 2º do art. 200, a partir da data do efetivo recolhimento da primeira contribuição sem atraso, e não serão consideradas, para esse fim, as contribuições recolhidas com atraso referentes a competências anteriores, observado, quanto ao segurado facultativo, o disposto nos § 3º e § 4º do art. 11. (Redação dada pelo Decreto nº 10.410, de 2020).
[...]
Art. 29. A concessão das prestações pecuniárias do Regime Geral de Previdência Social, ressalvado o disposto no art. 30, depende dos seguintes períodos de carência:
[...]
III - dez contribuições mensais, no caso de salário-maternidade, para as seguradas contribuinte individual, especial e facultativa, respeitado o disposto no § 2º do art. 93 e no inciso II do art. 101.

Os segurados que possuem presunção de recolhimento da contribuição previdenciária, a exemplo do empregado, do trabalhador avulso e do contribuinte individual que presta serviço à empresa, não há de falar em recolhimento em atraso, devendo a carência ser computada a contar do mês da filiação, independentemente do recolhimento.

Por sua vez, o contribuinte individual que trabalha por conta própria (situação dos autos) e o facultativo, por serem os responsáveis tributários pelo recolhimento da sua contribuição, não possuem presunção de recolhimento, de modo que o período de carência será contado apenas da data de efetivo pagamento da primeira contribuição sem atraso, não sendo consideradas para este fim as contribuições recolhidas com atraso referentes a competências anteriores (art. 27, II, da Lei nº 8.213/91).

Assim, nos termos legais, o pagamento de contribuições previdenciárias com atraso pelo contribuinte individual não servirá para fins de carência, se recolhidas após a perda da qualidade de segurado.

Entendimento pacificado pelo Superior Tribunal de Justiça:

PREVIDENCIÁRIO. AÇÃO RESCISÓRIA. VIOLAÇÃO DE LITERAL DISPOSIÇÃO DE LEI. APOSENTADORIA. INVALIDEZ PERMANENTE. CONTRIBUIÇÕES EFETUADAS COM ATRASO, POSTERIORMENTE AO PRIMEIRO RECOLHIMENTO EFETUADO SEM ATRASO. CÔMPUTO PARA FINS DE CARÊNCIA. POSSIBILIDADE, DESDE QUE PRESERVADA A CONDIÇÃO DE SEGURADO. PEDIDO PROCEDENTE.
1. É da data do efetivo pagamento da primeira contribuição sem atraso que se inicia a contagem do período de carência quando se tratar de contribuinte individual. Precedentes.
2. Nos termos do art. 27, II, da Lei n. 8.213/1991, não são consideradas, para fins de cômputo do período de carência, as contribuições recolhidas com atraso, referentes a competências anteriores à data do efetivo pagamento da primeira contribuição sem atraso.
3. Impõe-se distinguir, todavia, o recolhimento, com atraso, de contribuições referentes a competências anteriores ao início do período de carência, daquele recolhimento, também efetuado com atraso, de contribuições relativas a competências posteriores ao efetivo pagamento da primeira contribuição sem atraso (início do período de carência).
4. Na segunda hipótese, desde que não haja a perda da condição de segurado, não incide a vedação contida no art. 27, II, da Lei n. 8.213/1991.
5. Hipótese em que o primeiro pagamento sem atraso foi efetuado pela autora em fevereiro de 2001, referente à competência de janeiro de 2001, ao passo que as contribuições recolhidas com atraso dizem respeito às competências de julho a outubro de 2001, posteriores, portanto, à primeira contribuição recolhida sem atraso, sem a perda da condição de segurada.
6. Efetiva ofensa à literalidade da norma contida no art. 27, II, da Lei n. 8.213/1991, na medida em que a sua aplicação ocorreu fora da hipótese que, por intermédio dela, pretendeu o legislador regular.
7. Pedido da ação rescisória procedente.
(AR n. 4.372/SP, relator Ministro Rogerio Schietti Cruz, Terceira Seção, julgado em 13/4/2016, DJe de 18/4/2016).

A Turma Nacional de Uniformização decidiu nos autos do PEDILEF 2009.71.50.019216-5/RS, julgado em 20/02/2013, Tema 192, que o pagamento em atraso deve ocorrer dentro do período de qualidade de segurado, firmando a seguinte tese:

"Contribuinte individual. Recolhimento com atraso das contribuições posteriores ao pagamento da primeira contribuição sem atraso. Perda da qualidade de segurado. Impossibilidade de cômputos das contribuições recolhidas com atraso relativas ao período entre a perda da qualidade de segurado e a sua reaquisição para efeito de carência".

Nos termos do entendimento pacificado pela TNU, as contribuições atrasadas após a primeira paga em dia somente se prestam para fins de carência se ainda recolhidas dentro do período de graça, uma vez que, se na data do recolhimento já tiver se dado a perda da qualidade de segurado, serão imprestáveis para tal fim.

No caso dos autos, a parte autora efetuou o pagamento da última contribuição sem atraso em agosto/2019, vertendo o pagamento das prestações subsequentes apenas em dezembro de 2020, quando já havia perdido a qualidade de segurado, nos termos do art. 15, II da Lei 8.213/91.

Registre-se que o pagamento extemporâneo das contribuições (dezembro/2020) se deu após o nascimento do seu filho (28/10/2020).

Assim, conforme consta da sentença "provado nos autos que a autora não mantinha a qualidade de segurada especial quando do nascimento de seu filho, impositiva se torna a improcedência dos pleitos autorais".

Registre-se que apesar das contribuições recolhidas com atraso possam ser computadas como tempo de contribuição, se mostra indevido o cômputo, para efeito de carência, nos termos do art. 27, II, da Lei n. 8.213/1991.

Nesse sentido, o precedente abaixo:

PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE. RECOLHIMENTO EXTEMPORÂNEO DE CONTRIBUIÇÕES. CONTRIBUINTE INDIVIDUAL. PERDA DA QUALIDADE DE SEGURADO. INEXISTÊNCIA DE CONTRIBUIÇÕES POSTERIORES SEM ATRASO. IMPOSSIBILIDADE DO CÔMPUTO PARA PERÍODO DE CARÊNCIA. NÃO CONCESSÃO DO BENEFÍCIO APELAÇÃO PROVIDA.
1. A irresignação do INSS contra a decisão do juízo de primeiro grau diz respeito à impossibilidade do cômputo, para preenchimento da carência, das competências referentes ao intervalo de 01/2018 a 03/2019, recolhidas extemporaneamente, quando a autora já havia perdido a qualidade de segurada.
2. Tem razão o apelante. Com efeito, após a perda da qualidade de segurado, as contribuições anteriores à primeira realizada sem atraso não podem ser computadas para carência, nos termos do disposto no art. 27, II, da Lei 8.213/91.
3. Por conseguinte, somente é possível considerar, para efeito de carência, as contribuições recolhidas extemporaneamente em que o segurado ainda esteja no período de graça ou não tenha havido a perda da qualidade de segurado, quando do recolhimento.
4. Na hipótese dos autos, a demandante contribuiu como autônoma (entre 01/03/1984 e 31/03/1991), como contratada pelo Município de Beberibe/CE (de 01/07/2003 a 31/12/2004) e pelo Município de Ocara/CE (entre 03/01/2005 a 30/11/2016), somente voltando a recolher em 27/05/2020, como contribuinte individual, as contribuições referentes ao intervalo de 01/01/2018 a 31/03/2019, após o período de graça, e, consequentemente, a perda da qualidade de segurada, conforme informações do seu CNIS id: 4058100.25221073.
5. Sendo assim, embora possa o referido intervalo ser computado para tempo de contribuição, o recolhimento extemporâneo, não gera período de carência, de modo que excluídas tais competências, a autora não cumpre a carência exigida (180 contribuições mensais) para a concessão da aposentadoria pretendida.
6. Apelação provida.
(TRF5, PROCESSO: 08058873120224058100, APELAÇÃO CÍVEL, DESEMBARGADOR FEDERAL EDILSON PEREIRA NOBRE JUNIOR, 2ª TURMA, JULGAMENTO: 15/08/2023) Grifos acrescidos.

Nos termos acima, deve ser mantida a sentença de improcedência.

Honorários advocatícios recursais pela parte autora fixados em 2% (CPC, art. 85, § 11), a serem acrescidos ao valor da verba sucumbencial já estipulada pela sentença recorrida, com exigibilidade suspensa por se tratar de beneficiária da justiça gratuita (art. 98, § 3º do CPC).

Ante o exposto, nego provimento à apelação da autora.

É o meu voto.

Seja o primeiro a comentar ;)

Perfil

Minha foto
Rio Grande, Rio Grande do Sul, Brazil
Especialista em Direito Previdenciário, pela Universidade de Caxias do Sul - UCS, em parceria com a ESMAFE - Escola da Magistratura Federal, em 2009. Formado em janeiro de 2006, pela FURG - Fundação Universidade do Rio Grande, em direito. Este blog tem o objetivo de divulgar o conteúdo previdenciário de maneira gratuita para que todos possam ter acesso as informações sobre esta matéria.

Formulário de contato

Nome

E-mail *

Mensagem *

  ©Comberlato Educação Previdenciária - Todos os direitos reservados.

Template by Dicas Blogger | Topo