Vínculo urbano impede concessão de aposentadoria rural
Nesta sexta-feira será visto uma jurisprudência que trata sobre os requisitos para a concessão do benefício de aposentadoria por idade rural. Abaixo segue a decisão para análise dos leitores.
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. APOSENTADORIA POR IDADE. TRABALHADOR RURAL. BENEFÍCIO NÃO CONCEDIDO. VÍNCULO EMPREGATÍCIO URBANO. APELAÇÃO DA PARTE AUTORA NÃO PROVIDA.
1 Trata-se de recurso de apelação interposto pela parte autora contra sentença que julgou improcedente o pedido de aposentadoria por idade de trabalhadora rural.
2. A concessão do benefício de aposentadoria rural por idade exige a demonstração do trabalho rural, cumprindo-se o prazo de carência previsto no artigo 142 da Lei n. 8213/91, mediante início razoável de prova material, corroborada com prova testemunhal, ou prova documental plena. Como requisito etário, exige-se a idade superior a 60 anos para homem e 55 anos para mulher (artigo 48, § 1º da Lei de Benefícios).
3. A parte autora e seu cônjuge têm registros em seu Cadastro Nacional de Informações Sociais (CNIS) (ID 168564050 – Pág. 31) de alguns vínculos empregatícios de natureza urbana, por tempo considerável, dentro do período de carência para concessão do benefício requerido, o que invalida a única prova material apresentada pelo autor, qual seja sua certidão de casamento.
4. Os vínculos empregatícios urbanos, do autor e de sua esposa, descaracterizam o regime de economia familiar rural, com mútua dependência entre os membros da família, por todo o período de carência, nos termos do art. 142 da Lei 8.213/91.
5. Apelação da parte autora não provida.
TRF 1ª, Processo Apelação Cível nº 103112287.2021.4.01.9999, 2ª Turma, desembargador federal relator Pedro Braga Filho, 27/01/2023.
ACÓRDÃO
Decide a Turma negar provimento à apelação, à unanimidade, nos termos do voto do Relator.
2ª Turma do TRF/1ª Região – Brasília (DF), data da assinatura digital.
Desembargador Federal PEDRO BRAGA FILHO
Relator
RELATÓRIO
Trata-se de recurso de apelação interposto por Danildo de Paula contra sentença que julgou improcedente o pedido de aposentadoria por idade de trabalhador rural.
Em suas razões recursais, o apelante sustenta que a sentença deve ser reformada, pois satisfaz os requisitos exigidos por força de legislação em vigor, para a concessão do benefício de aposentadoria por idade.
Sem contrarrazões.
É o relatório.
V O T O
Trata-se de recurso de apelação interposto pela parte autora contra sentença que julgou improcedente o pedido de aposentadoria por idade de trabalhador rural.
Requerimento administrativo
Houve requerimento administrativo.
Mérito
A concessão do benefício pleiteado pela parte autora exige a demonstração do trabalho rural, cumprindo-se o prazo de carência previsto no art. 142 da Lei n. 8.213/91, mediante início razoável de prova material, corroborada com prova testemunhal, ou prova documental plena. Como requisito etário, exige-se a idade de 60 anos para homem e 55 anos para mulher (art. 48, § 1º, da Lei de Benefícios).
Conquanto inadmissível a prova exclusivamente testemunhal (STJ, Súmula 149; TRF-1ª Região, Súmula 27), não é necessário que a prova documental cubra todo o período de carência, podendo ser “projetada” para tempo anterior ou posterior ao que especificamente se refira, desde que contemporânea à época dos fatos a provar (TNU, Súmula 34).
A jurisprudência pátria, considerando a situação peculiar do trabalhador rural e a dificuldade encontrada para se comprovar a atividade rural, em qualquer de suas formas, permite que outros documentos (dotados de fé pública), não especificados em lei, sejam considerados para fins de concessão do benefício previdenciário.
Ademais, é pacífica a jurisprudência do STJ e desta Corte no sentido de que o rol do art. 106 da Lei 8.213/91 é meramente exemplificativo (STJ AgRG no REsp 1073730/CE), sendo admissíveis, portanto, outros documentos hábeis à comprovação do exercício de atividade rural, além dos ali previstos.
Assim, são dotados de idoneidade para a comprovação do início de prova material do exercício de atividade rural, dentre outros documentos, as certidões de nascimento, casamento e óbito, bem como certidão da Justiça Eleitoral, carteira de associação ao Sindicato dos Trabalhadores Rurais, ficha de inscrição em Sindicato Rural, contratos de parceria agrícola, nos casos em que a profissão de rurícola estiver expressamente mencionada, desde que amparados por convincente prova testemunhal (STJ, REsp 1.650.326/MT).
E, ainda, a ficha de alistamento militar, certificado de dispensa de incorporação (CDI), título eleitoral em que conste como lavrador a profissão do segurado (STJ, AgRG no REsp 939191/SC), certidão de casamento, carteira de sindicato rural com comprovantes de recolhimento de contribuições, boletim escolar de filhos que tenham estudado em escola rural (STJ, AgRG no REsp 967344/DF), certidão de casamento que atesta a condição de lavrador do cônjuge ou do próprio segurado (STJ, AR 1067/SP, AR 1223/MS).
De igual forma, são aceitos: certidões do INCRA, guias de recolhimento de ITR, documentos fiscais de venda de produtos rurais, recibos de pagamento a sindicato rural, certidão de registro de imóveis relativos à propriedade rural, contratos de parceria agrícola e todos outros que estabeleçam, indiquem ou apenas indiciem a ligação da parte autora com o trabalho no meio rural, bem como CTPS com anotações de trabalho rural da parte autora, que é considerada prova plena do período nela registrado e início de prova material para o restante do período de carência (REsp 310.264/SP, Rel. Min. Fernando Gonçalves, 6ª Turma, DJ 18.02.2002, p. 530; AC 2004.38.03.000757-8/MG, Rel. Desembargadora Federal Neuza Maria Alves da Silva, Segunda Turma, e-DJF1 p. 33 de 17/07/2008, AC 0004262-35.2004.4.01.3800/MG, Rel. Juiz Federal Miguel Ângelo de Alvarenga Lopes, 3ª Turma Suplementar, e-DJF1 p. 191 de 02/03/2011).
Consoante jurisprudência do colendo Superior Tribunal de Justiça: “os documentos trazidos aos autos pelo autor, caracterizados como início de prova material, podem ser corroborados por prova testemunhal firme e coesa, e estender sua eficácia tanto para períodos anteriores como posteriores aos das provas apresentadas.” (REsp 1.642.731/MG, Rel. Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, DJe 30/06/2017).
Além disso, ressalte-se o teor da Súmula 577 do Superior Tribunal de Justiça: “É possível reconhecer o tempo de serviço rural anterior ao documento mais antigo apresentado desde que amparado em convincente prova testemunhal colhida sob contraditório.”
Também não há necessidade de contemporaneidade da prova material em relação a todo o período do exercício da atividade rural que se pretende provar. No entanto, deve haver ao menos um início razoável de prova material contemporânea aos fatos alegados, desde que complementada por prova testemunhal. Assim, conquanto inadmissível a prova exclusivamente testemunhal (STJ, Súmula 149; TRF-1ª Região, Súmula 27), não é necessário que a prova documental cubra todo o período de carência, podendo ser “projetada” para tempo anterior ou posterior ao que especificamente se refira, desde que contemporânea à época dos fatos a provar (TNU, Súmula 34).
Registre-se, outrossim, que a declaração de exercício de atividade, desprovida de homologação pelo órgão competente, equipara-se apenas à prova testemunhal. Também não configuram início de prova material os documentos confeccionados em momento próximo ao ajuizamento da ação ou ao implemento do requisito etário.
Destaque-se, ainda, que o elemento diferenciador da natureza da classificação do empregado (urbano ou rural) é o da prestação de seus serviços, eis que, consoante o art. 7º, "b", da CLT, não se aplicam os preceitos daquela Consolidação aos trabalhadores rurais, considerados aqueles que, exercendo funções diretamente ligadas ao campo, não executam atividades que, pelos métodos de execução ou pela finalidade, se classifiquem como industriais ou comerciais.
Assim, estando o trabalhador exercendo tarefas diretamente vinculadas à atividade campesina, é rurícola para todos os efeitos legais. Ademais, nos termos do art. 106, I, da Lei 8.213/91, os empregados rurais são abrangidos pelo regime previdenciário deferido aos segurados especiais, não cabendo impor-lhes o ônus de, em face da formalização do vínculo eminentemente rural, serem alijados dos benefícios deferidos à categoria (TRF1, 0036459-25.2016.4.01.9199; 0050435-41.2012.4.01.9199; 1011044-43.2019.4.01.9999; 0013410-28.2011.4.01.9199).
Caso dos autos
Conforme documento apresentado pela parte autora constata-se que o requisito de idade mínima foi atendido, pois contava com idade superior à exigida quando do ajuizamento da ação.
Entre os documentos apresentados pela parte autora, como início de prova material, se destaca a certidão de casamento datada de 30/12/2004 (Pág. 19), onde consta como profissão do autor a ocupação de "lavrador”.
Ocorre que, a parte autora tem registrado em seu Cadastro Nacional de Informações Sociais (CNIS) (Pág. 31) alguns vínculos empregatícios de natureza urbana, por tempo considerável, dentro do período de carência para concessão do benefício requerido, o que invalida a única prova material apresentada pelo autor, qual seja sua certidão de casamento.
Além disso, a esposa do apelante também tem registros de empregos urbanos, segundo CNIS apresentado pelo INSS. Tais vínculos empregatícios urbanos, do casal, descaracterizam o regime de economia familiar rural, com mútua dependência entre os membros da família, por todo o período de carência, nos termos do art. 142 da Lei 8.213/91.
Cabe salientar que, ausente início de prova material, não se admite prova meramente testemunhal, a teor do disposto nas Súmulas 149 do STJ e 27 do TRF da 1ª Região, razão pela qual não podem ser considerados, para concessão do benefício, apenas os depoimentos prestados (AgRg no REsp 944.486/SP, Rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura, 6ª Turma, DJe de 24/11/2008).
Em face do exposto, nego provimento à apelação da parte autora.
É o voto.
Seja o primeiro a comentar ;)
Postar um comentário