sexta-feira, 12 de abril de 2019

Ampla defesa e contraditório são necessários antes de cancelamento de benefício

Nesta sexta-feira será visto uma jurisprudência que trata sobre a necessidade de concessão de ampla defesa e contraditório ao segurado antes de cancelar o benefício. Abaixo segue a decisão para análise dos amigos.

EMENTA
CONSTITUCIONAL E PREVIDENCIÁRIO. MANDADO DE SEGURANÇA. REVISÃO DE APOSENTADORIA. ATO UNILATERAL DA ADMINISTRAÇÃO. IMPOSSIBILIDADE DE PRIVAÇÃO DOS BENS DO DEVEDOR SEM O DEVIDO PROCESSO LEGAL. AMPLA DEFESA E CONTRADITÓRIO. ART. 5º, LIV E LV, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL/88. VALORES RECEBIDOS DE BOA-FÉ. CARÁTER ALIMENTAR. IRREPETIBILIDADE. SENTENÇA MANTIDA.
1. A Administração Pública pode, a qualquer tempo, rever os seus atos para cancelar ou suspender benefício previdenciário que foi concedido irregularmente, desde que o faça mediante procedimento administrativo que assegure ao beneficiário o devido processo legal.
2. Não pode a autarquia previdenciária, ainda que sob a alegação de estar corrigindo erro administrativo ou fraude, cancelar aposentadoria por tempo de contribuição do impetrante sem oportunizar o prévio contraditório e a ampla defesa.
3. Não havendo prova de observância do devido processo legal e da ampla defesa, merece ser prestigiada a sentença que determinou o restabelecimento do benefício do autor até o exaurimento do processo na esfera administrativa.
4. Na hipótese, a Administração revisou o benefício da parte autora sem oportunizar à parte interessada o contraditório e a ampla defesa, garantias inerentes ao devido processo legal.
5. Apelação do INSS e remessa oficial desprovidas.
TRF 1ª, Processo nº: 2007.34.00.036921-1/DF, 2ª Turma, Desembargador Federal João Luiz De Sousa, 08/11/2018.

ACÓRDÃO
Decide a Segunda Turma do TRF da 1ª Região, por unanimidade, negar provimento à apelação do INSS e à remessa oficial, nos termos do voto do Relator.

Segunda Turma do TRF da 1ª Região, 17 de outubro de 2018.
DESEMBARGADOR FEDERAL JOÃO LUIZ DE SOUSA
RELATOR

RELATÓRIO
Trata-se de apelação proposta em face de sentença que concedeu a segurança, confirmando a liminar anteriormente concedida, para determinar à autoridade impetrada que mantenha o pagamento do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição do impetrante até o exaurimento da esfera administrativa, respeitando o devido processo legal.

Argui a parte autora que seu benefício de aposentadoria por tempo de contribuição foi sustado sem que o recurso por ele apresentado fosse efetivamente apreciado e o processo administrativo se haja esgotado, o que importou cerceamento do seu direito de defesa.

Sustentou a parte recorrente, em síntese, que, a defesa do impetrante foi analisada pela auditoria e desconsiderada. Uma vez rejeitada a defesa, o INSS já deve de plano adequar o benefício aos termos da decisão administrativa, conforme art. 11, §3º da Lei 10.666/2003. Alegou, ainda, que a Lei 10.666/2003 nada dispôs quanto à atribuição de efeito suspensivo aos recursos, devendo ser aplicada a Lei 9.784/99.

Contrarrazões apresentadas.

Houve remessa oficial.

É o relatório.

VOTO
O impetrante obteve, em primeira instância, segurança concedida para ordenar o Gerente Executivo do INSS no Distrito Federal que restabeleça seu benefício até o exaurimento do processo administrativo no qual é investigada a ocorrência de irregularidade na concessão do benefício previdenciário.

Cinge-se a questão quanto à legalidade, ou não, da cessação do benefício previdenciário de aposentadoria por tempo de contribuição de que trata os autos, em vista da alegação da parte autora de violação aos princípios do devido processo legal.

De fato, em razão do poder de autotutela, a Administração Pública pode rever seus atos quando eivados de vícios, já que deles não se originam direito, tal como prescreve a Súmula 346 do Supremo Tribunal Federal. Entretanto, esse poder não é absoluto, deve respeitar o direito adquirido e os princípios do contraditório e da ampla defesa.

Ademais, a garantia constitucional inserta no art. 5°, LV, da Constituição Federal de 1988 exige que a autoridade administrativa, no exercício de suas atividades, não atue de maneira abusiva ou arbitrária, como de fato ocorreria caso o devido processo legal não fosse observado.

Portanto, não pode a Administração, ainda que sob o impulso do poder-dever de anular atos ilegais, unilateralmente, por mais relevantes que sejam os motivos, suspender ou cancelar benefício previdenciário concedido de maneira indevida, sem a instauração do competente processo administrativo, com vistas a viabilizar ao administrado/segurado o direito ao devido processo legal, tal como estatui a norma constitucional.

Na hipótese, o impetrante interpôs recurso administrativo perante a Junta de Recurso da Previdência Social, com pedido de efeito suspensivo. Entretanto, a autoridade coatora quedou-se inerte em relação à sua manifestação e cancelou o benefício do impetrante/apelado antes da instauração do devido processo legal, do contraditório e da ampla defesa, com o exaurimento de todas as instâncias recursais.

Constatada a inobservância dos princípios do devido processo legal, do contraditório e da ampla defesa configura-se ilegalidade no cancelamento, razão pela qual deve ser restabelecido o benefício.

Confira-se, nesse sentido, a jurisprudência desta Corte, in verbis
“PREVIDENCIÁRIO . RESTABELECIMENTO DE BENEFÍCIO DE APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. INOBSERVÂNCIA DOS PRINCÍPIOS DO DEVIDO PROCESSO LEGAL , DO CONTRADITÓRIO E DA AMPLA DEFESA. MANUTENÇÃO DA SENTENÇA MONOCRÁTICA. 
1. É prerrogativa da Administração Pública rever os seus próprios atos para suspender ou cancelar benefício previdenciário concedido de maneira indevida. Todavia, ela não pode dispensar a instauração do competente processo administrativo, com vistas a viabilizar ao administrado/segurado o direito ao devido processo legal , tal como estatui a norma constitucional.
2. Consoante a Súmula 160 do extinto TRF "a suspeita de fraude na concessão de benefício previdenciário não enseja, de plano, a sua suspensão ou cancelamento, mas dependerá de apuração em procedimento administrativo".
3. A autarquia previdenciária não poderia cancelar ou suspender o benefício da parte autora antes da instauração do devido processo legal , do contraditório e da ampla defesa, com o exaurimento de todas as instâncias recursais. Precedentes desta Corte.
4. Constatada a inobservância dos princípios do devido processo legal , do contraditório e da ampla defesa configura-se ilegalidade no cancelamento, razão pela qual deve ser restabelecido o benefício .
5. As prestações em atraso devem ser pagas de uma só vez, monetariamente corrigidas de acordo com a Lei n. 6.899/81, pelos índices previstos no Manual de Cálculos da Justiça Federal, aprovado pelo Conselho da Justiça Federal, incidindo tal correção desde a data do vencimento de cada parcela em atraso (Súmulas n.s 148 do STJ e 19 do TRF - 1ª Região).
6. Honorários advocatícios mantidos na forma determinada na sentença.
7. Juros de mora devidos em 1% (um por cento) ao mês a contar da citação até o advento da Lei 11.960/09, a partir de quando incidirão à razão de 0,5% (meio por cento) ao mês - ou outro índice de juros remuneratórios das cadernetas de poupança que eventualmente venha a ser estabelecido -, até a apuração definitiva dos cálculos de liquidação.
9. Nas causas ajuizadas perante a Justiça Estadual, no exercício da jurisdição federal (§ 3º do art. 109 da CF/88), o INSS está isento das custas somente quando lei estadual específica prevê a isenção, o que ocorre nos estados de Minas Gerais, Goiás, Rondônia e Mato Grosso. Em se tratando de causas ajuizadas perante a Justiça Federal, o INSS está isento de custas por força do art. 4º, inc. I, da Lei 9.289/96, abrangendo, inclusive, as despesas com oficial de justiça.
9. Remessa parcialmente provida.”

(REO 0006730-56.2006.4.01.3814 / MG, Rel. JUIZ FEDERAL MURILO FERNANDES DE ALMEIDA, SEGUNDA TURMA, e-DJF1 p.393 de 09/11/2012)

“PREVIDENCIÁRIO. RESTABELECIMENTO DE BENEFÍCIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. AMPLA DEFESA E DEVIDO PROCESSO LEGAL : AUSÊNCIA. SÚMULA 160 DO TFR. CORREÇÃO MONETÁRIA. JUROS DE MORA. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. ANTECIPAÇÃO DE TUTELA CONCEDIDA DE OFÍCIO. POSSIBILIDADE: REQUISITOS PREENCHIDOS.
1. Antecipação de tutela deferida "de oficio" em razão do preenchimento dos requisitos do art. 273 do CPC, e diante da ausência de impedimento processual, conforme normas dos arts. 515, § 1º, 516, 798, 461, caput, §§ 3º e 4º e 644, todos do Código de Processo Civil.
2 A suspeita de fraude, na concessão de benefício previdenciário , não enseja, de plano, a sua suspensão ou cancelamento, mas dependerá de apuração em procedimento administrativo. (Súmula 160 do extinto TFR)
3. A Administração Pública pode, a qualquer tempo, rever os seus atos para cancelar ou suspender benefício previdenciário que foi concedido irregularmente, desde que mediante procedimento administrativo que assegure ao beneficiário o devido processo legal .
4. O devido processo legal compreende também a via recursal administrativa, de modo que a suspensão do beneficio somente será possível após o julgamento do recurso. Precedentes desta Corte.
5. Comprovada a irregularidade da cessação do benefício do autor, o restabelecimento da aposentadoria por tempo de contribuição deve retroagir à data de sua suspensão .
6. A correção monetária e os juros devem incidir na forma do Manual de Cálculos da Justiça Federal, aprovado pela Resolução/CJF 134, de 21.12.2010.
7. A verba honorária em conformidade com o artigo 20, § 4o, do CPC.
8. Nas causas ajuizadas perante a Justiça Estadual, no exercício da jurisdição federal (§ 3º do art. 109 da CF/88), o INSS está isento das custas somente quando lei estadual específica prevê a isenção, o que ocorre nos estados de Minas Gerais, Goiás, Rondônia e Mato Grosso. Em se tratando de causas ajuizadas perante a Justiça Federal, o INSS está isento de custas por força do art. 4º, inc. I, da Lei 9.289/96, abrangendo, inclusive, as despesas com oficial de justiça.
9. Apelação a que se nega provimento e remessa oficial a que se dá parcial provimento.“
(AC 0025146-19.2006.4.01.9199 / MG, Rel. DESEMBARGADORA FEDERAL ÂNGELA CATÃO, PRIMEIRA TURMA, e-DJF1 p.704 de 31/10/2012)

Dessa forma, correta a decisão do juízo a quo em julgar procedente o pedido formulado pela parte autora para determinar ao INSS o restabelecimento do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição até o exaurimento do processo na esfera administrativa.

Honorários advocatícios incabíveis na espécie.

Posto isso, nego provimento à apelação do INSS e à remessa oficial, nos termos da fundamentação.

É como voto.

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Rio Grande, Rio Grande do Sul, Brazil
Especialista em Direito Previdenciário, pela Universidade de Caxias do Sul - UCS, em parceria com a ESMAFE - Escola da Magistratura Federal, em 2009. Formado em janeiro de 2006, pela FURG - Fundação Universidade do Rio Grande, em direito. Este blog tem o objetivo de divulgar o conteúdo previdenciário de maneira gratuita para que todos possam ter acesso as informações sobre esta matéria.

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