sexta-feira, 8 de janeiro de 2016

Benefício assistencial a jovem com sequelas de tumor cerebral


Nesta sexta-feira será visto uma jurisprudência que trata sobre a concessão de benefício assistencial ao portador de sequela de tumor cerebral que o incapacita para o trabalho e cuja família vive em estado de miserabilidade. Abaixo segue a decisão para análise dos amigos.

Decisão 4980/2015

APELAÇÃO CÍVEL Nº 0029218-05.2015.4.03.9999/SP
2015.03.99.029218-7/SP

RELATOR : Desembargador Federal TORU YAMAMOTO
APELANTE : Instituto Nacional do Seguro Social - INSS
PROCURADOR : SP135087 SERGIO MASTELLINI
ADVOGADO : SP000030 HERMES ARRAIS ALENCAR
APELADO(A) : EDMAR APARECIDO DOS SANTOS - prioridade
ADVOGADO : SP264909 ERICK RODRIGUES ZAUPA
No. ORIG. : 13.00.00207-8 1 Vr TEODORO SAMPAIO/SP

DECISÃO
Trata-se de ação previdenciária ajuizada por EDMAR APARECIDO DOS SANTOS em face do INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, objetivando a concessão de benefício de prestação continuada.
 
A r. sentença julgou procedente a ação para condenar o réu a conceder o benefício assistencial de prestação continuada em favor do autor, no valor de um salário mínimo mensal, a partir da data da citação, as parcelas em atraso serão acrescidas de correção monetária e juros de mora de 1% ao mês. Condenou ainda a autarquia ao pagamento das custas processuais e aos honorários advocatícios fixados em R$ 350,00. Isento de custas.
 
Sentença não foi submetida ao reexame necessário.
 
O INSS apresentou apelação sustentando, em síntese, que o autor não preenche os requisitos necessários à concessão do beneficio. Subsidiariamente requer a incidência da Lei 11.960/09.
 
Apresentadas as contrarrazões, subiram os autos a esta Corte.
 
O órgão do Ministério Público Federal opinou pelo desprovimento do recurso do INSS e pela fixação do termo inicial na data da cessação da pensão por morte.
 
É o relatório. Decido.
 
A matéria discutida nos autos comporta julgamento nos termos do artigo 557 do Código de Processo Civil.
 
De início, cumpre observar que, embora a sentença tenha sido desfavorável ao Instituto Nacional do Seguro Social - INSS, não se encontra condicionada ao reexame necessário, considerados o valor do benefício e o lapso temporal de sua implantação, não excedente a 60 (sessenta) salários mínimos (art. 475, § 2º, CPC).
 
Em face dos critérios de direito intertemporal, e tendo em vista a legislação vigente à data da formulação do pedido, que provoca a presente análise recursal, os requisitos (independentes de carência ou contribuição, por força do art. 203, caput, do ordenamento constitucional vigente) a serem observados para a concessão do benefício assistencial são os previstos no art. 203, V, da Constituição Federal, versado na Lei n. 8.742/1993. Por força desses diplomas, a concessão do benefício de prestação continuada depende de, cumulativamente: a) idade igual ou superior a 65 anos (art. 34 da Lei 10.741/2003) ou invalidez para o exercício de atividade remunerada (comprovada mediante exame pericial); b) não ter outro meio de prover o próprio sustento; c) família (ou pessoa de quem dependa obrigatoriamente, desde que vivam sob o mesmo teto) impossibilitada de promover o sustento do requerente, devendo apresentar renda mensal per capita não superior a ¼ (um quarto) do salário mínimo. A ausência de prova de qualquer um dos requisitos implica o indeferimento do pleito.
 
Observe-se que o Supremo Tribunal Federal, na Reclamação (RCL) 4374 e, sobretudo, nos Recursos Extraordinários (REs) 567985 e 580963 (ambos com repercussão geral), em 17 e 18 de abril de 2013, reconheceu superado o decidido na ADI 1.232-DF, de tal modo que o critério de renda per capita de ¼ do salário mínimo não é mais aplicável, motivo pelo qual a miserabilidade deverá ser aferida pela análise das circunstâncias concretas do caso analisado (à míngua de novo critério normativo). Aliás, esse já era o entendimento que vinha sendo consagrado pela jurisprudência, como se pode notar no julgamento do REsp 314264/SP pelo Superior Tribunal de Justiça, 5ª Turma, Rel. Min. Félix Fischer, j. 15/05/2001, v.u., DJ 18/06/2001, p. 185, afirmando que "o preceito contido no art. 20, § 3º, da Lei nº 8.742/93 não é o único critério válido para comprovar a condição de miserabilidade preceituada no artigo 203, V, da Constituição Federal. A renda familiar per capita inferior a ¼ do salário-mínimo deve ser considerada como um limite mínimo, um quantum objetivamente considerado insuficiente à subsistência do portador de deficiência e do idoso, o que não impede que o julgador faça uso de outros fatores que tenham o condão de comprovar a condição de miserabilidade da família do autor". No mesmo sentido, também no STJ, vale mencionar o decidido nos EDcl no AgRg no REsp 658705/SP, Quinta Turma, Rel. Min. Felix Fischer, j. 08/03/2005, v.u., DJ 04/04/2005, p. 342, e ainda o teor do REsp 308711/SP, Sexta Turma, Rel. Min. Hamilton Carvalhido, j. 19/09/2002, v.u., DJ 10/03/2003, p. 323.
 
No presente caso, pleiteia o autor a concessão do benefício de assistência social ao portador de deficiência.
 
Nesse passo, o laudo médico-pericial de fls. 62/65, realizado em 12/08/2014, concluiu que o autor é portador de "sequela de tumor cerebral operado em 2012", que o incapacita para o trabalho.
Resta perquirir se o demandante pode ter a subsistência provida pela família.
 
A propósito, não incumbe investigar, aqui, se a proteção social seria supletiva à prestação de alimentos pela família. É bastante analisar, por ora, se o demandante poderia ter a subsistência provida pelos seus (art. 20 da Lei 8.742/1993). Só então, evidenciada a impossibilidade, buscar-se-ia o amparo do Estado.
 
Nessa seara, colhe-se do relatório social realizado em 02/04/2014 (fls. 54/55), que o autor reside em imóvel alugado composto de 04 (quatro) cômodos em precário estado de conservação, em companhia de suas irmã Edmárcia Talita dos Santos com 18 anos e Viviane Rafaela dos Santos com 16 anos.
 
Relata, ainda, a Assistente Social que a renda familiar provém da pensão por morte recebida pelo autor e suas irmãs no valor de um salário mínimo.
 
Em consulta ao sistema CNIS/DATAPREV (fls. 85), verifica-se que a pensão por morte foi cessada em 10/01/2015.
 
No caso em comento, há elementos para se afirmar que se trata de família que vive em estado de miserabilidade. Os recursos obtidos pela família do requerente são insuficientes para cobrir os gastos ordinários, bem como os tratamentos médicos e cuidados especiais que lhe são imprescindíveis.
 
Tecidas essas considerações, entendo demonstrada, quantum satis, no caso em comento, situação de miserabilidade, prevista no art. 20, § 3º, da Lei 8.742/1993, a ensejar a concessão do benefício assistencial.
 
O benefício de prestação continuada é devido a partir da data da cessação da pensão por morte (10/01/2015 - fls. 85), ante a vedação legal à cumulação do benefício assistencial de prestação continuada, postulado pelo autor, com o beneficio que já recebe.
 
Nesse sentido, confira-se o seguinte julgado do C. STJ:
"PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. RECURSO ESPECIAL. VIOLAÇÃO AO ART. 535 DO CPC. AUSÊNCIA. CONCLUSÃO LÓGICO SISTEMÁTICA DO DECISUM. AUXÍLIO-ACIDENTE E BENEFÍCIO DE PRESTAÇÃO CONTINUADA. A CUMULAÇÃO . IMPOSSIBIL IDADE . ART. 20, § 4º DA LEI 8.742/93. CARÁTER ASSISTENCIAL . VEDAÇÃO EXISTENTE DESDE SUA INSTITUIÇÃO. DENOMINAÇÕES DIVERSAS. PROTEÇÃO AO HIPOSSUFICIENTE. RECURSO ESPECIAL DESPROVIDO.
(...)
III - A inacumulabilidade do benefício de prestação continuada com quaisquer outros benefícios de cunho previdenciário, assistencial ou de outro regime foi inicialmente disciplinada no artigo 2º, § 1º da Lei 6.179/74.
IV - O artigo 139 da Lei 8.213/91, expressamente revogado pela Lei 9.528/97, manteve provisoriamente o benefício, vedando sua a cumulação no § 4º do aludido artigo.
V - Atualmente, o artigo 20, § 4º da Lei 8.742/93 disciplina a quaestio, vedando a acumulação do benefício de prestação continuada, - intitulado ainda de benefício assistencial ou amparo social -, com quaisquer outros benefícios.
VI - Apesar da sucessão de leis, a inacumulabilidade do benefício de prestação continuada com quaisquer outros benefícios se manteve incólume, dado seu caráter assistencial, e não previdenciário, conforme previsto no artigo 203, V, da Constituição Federal e regulamentado pela Lei 8.742/93.
VII - Escorreito o acórdão recorrido, pois a despeito da vitaliciedade do auxílio-acidente concedido nos termos da Lei 6.367/76, sempre foi vedada a acumulação do benefício de prestação continuada com qualquer outro benefício, desde sua instituição com denominação diferente, mas com intuito de proteção social aos hipossuficientes.
VIII - Recurso especial conhecido, mas desprovido."
(STJ, REsp nº 753414, Quinta Turma, Rel. Min. Gilson Dipp, j. 20.09.2005, DJU 10.10.2005).
 
"ASSISTENCIAL E CONSTITUCIONAL. BENEFÍCIO DE PRESTAÇÃO CONTINUADA. ARTIGO 203, V, DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA. NÃO PREENCHIMENTO DOS PRESSUPOSTOS. BENEFÍCIO INDEVIDO. CARÁTER EXCLUSIVO. IMPOSSIBIL IDADE DE CUMULAÇÃO . ARTIGO 20, § 4º, DA LEI N.º 8.742/93.
(...)
3. Em razão da não comprovação da hipossuficiência de recursos, além do fato de a Autora ser beneficiária do benefício de aposentadoria por idade, no valor de 01 (um =) salário mínimo, não há como conceder o amparo assistencial, em virtude de seu caráter exclusivo, que impede a cumulação com outro benefício, por expressa disposição legal (§ 4º do artigo 20 da Lei nº 8.742/93).
4. Apelação não provida."
(AC nº 745681, Rel. Des. Fed. Antonio Cedenho, j. 09/10/2006, DJU 28/02/2007, p. 367).
 
No tocante aos juros e à correção monetária, note-se que suas incidências são de trato sucessivo e, observados os termos do art. 293 e do art. 462 do CPC, devem ser considerados no julgamento do feito. Assim, corrigem-se as parcelas vencidas na forma do Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, e ainda de acordo com a Súmula n° 148 do E. STJ e n° 08 desta Corte, observando-se o quanto decidido pelo C. STF quando do julgamento da questão de ordem nas ADIs 4357 e 4425.
 
Quanto aos juros moratórios, incidem de uma única vez e pelo mesmo percentual aplicado à caderneta de poupança (0,5%), consoante o preconizado no art. 5º da Lei nº 11.960/2009. Acresça-se que a fluência respectiva dar-se-á de forma decrescente, a partir da citação, termo inicial da mora autárquica (art. 219 do CPC), até a data de elaboração da conta de liquidação.
 
Ante o exposto, com fundamento no art. 557 do CPC, DOU PARCIAL PROVIMENTO à apelação do INSS para fixar o termo final do beneficio na data da cessação da pensão por morte, mantendo no mais, a r. sentença.
 
Anote-se, por fim, que tratando -se apenas de parcelas vencidas, não há que se falar em antecipação dos efeitos da tutela.
 
Respeitadas as cautelas legais, tornem os autos à origem.
 
Dê-se ciência ao Ministério Público Federal.

São Paulo, 26 de outubro de 2015.
TORU YAMAMOTO
Desembargador Federal

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Rio Grande, Rio Grande do Sul, Brazil
Especialista em Direito Previdenciário, pela Universidade de Caxias do Sul - UCS, em parceria com a ESMAFE - Escola da Magistratura Federal, em 2009. Formado em janeiro de 2006, pela FURG - Fundação Universidade do Rio Grande, em direito. Este blog tem o objetivo de divulgar o conteúdo previdenciário de maneira gratuita para que todos possam ter acesso as informações sobre esta matéria.

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