sexta-feira, 26 de dezembro de 2014

Pensionista não é obrigado a devolver benefício do INSS recebido de boa-fé

Nesta sexta-feira será visto uma jurisprudência que entendeu que o segurado não é obrigado a devolver aos cofres públicos o que indevidamente recebeu de boa-fé, tendo em vista a irrepetibilidade dos vencimentos e a boa-fé no recebimento. Abaixo segue a decisão para análise dos amigos.

EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. MANDADO DE SEGURANÇA. PROCESSUAL CIVIL. PENSÃO POR MORTE APOSENTADORIA POR INVALIDEZ CONCESSÃO INDEVIDA. ERRO DA ADMINISTRAÇÃO. BOA-FÉ DO SEGURADO. DEVOLUÇÃO. PENSIONISTAS. DESCABIMENTO. CARÁTER ALIMENTAR.

1. Ao instituidor da pensão por morte foi concedido, inicialmente, o benefício de auxílio-doença, convertido posteriormente em aposentadoria por invalidez, sem pedido do segurado que se manifestou contrário à conversão.
2. Em 26.05.2006 foi deferida a aposentadoria por idade, NB nº 137.110.080-0 (fl. 24), que, após o falecimento dele, foi transformada na pensão por morte, benefício NB nº 138.109.828-0.
3. O ato administrativo atacado busca repetir dos pensionistas supostos valores indevidos recebidos do instituidor da pensão.
4. Ausência de má-fé do segurado para a conversão do benefício de auxílio-doença em aposentadoria por invalidez e impossibilidade de repetir de terceiras pessoas – os pensionistas – supostos valores recebidos pelo falecido instituidor.
5. Remessa oficial não provida.
TRF 1,
Processo n.º 0004259-69.2007.4.01.3802, 2ª T., Juiz Federal Relator Cleberson José Rocha, e-dJF1: 03/12/2014.

ACÓRDÃO
Decide a Turma, por unanimidade, negar provimento à remessa oficial.

2ª Turma do TRF-1ª Região.
Brasília, 12 de novembro de 2014.

JUIZ FEDERAL CLEBERSON JOSÉ ROCHA
RELATOR CONVOCADO

RELATÓRIO
1. Maria Cristina Machado Portes, por si e representando seu filho Lucas Portes Camargo, impetraram mandado de segurança em face de do Agente Geral do INSS em Araxá/MG, objetivando que a autoridade coatora se abstenha de suspender o pagamento da pensão por morte oriundo do benefício 138.109.828-0.

2. Foi concedida a liminar para determinar que a autoridade impetrada não suspenda o pagamento da pensão por morte (fls. 83/88).

3. Sentença proferida pela MMª. Juíza Federal Substituta da Subseção Judiciária de Uberaba/MG (fls. 104/110) confirmou a liminar e concedeu a segurança para o fim de determinar à autoridade coatora que se abstenha de suspender o pagamento de pensão por morte aos impetrantes.

4. Por força de remessa oficial, subiram os autos a este Corte.

5. Parecer do Ministério Público Federal pelo não provimento da remessa oficial (fls. 126/128).

É o relatório.
 
VOTO
1. Trata-se de remessa oficial interposta pelo INSS de sentença que concedeu a segurança para que a autora coatora se abstenha suspender o pagamento de pensão por morte aos impetrantes.

2. Ao instituidor da pensão por morte, Dagoberto Camargo, foi concedido, inicialmente, auxílio-doença, convertido posteriormente em aposentadoria por invalidez. Em 26.05.2006 foi deferida a aposentadoria por idade, NB nº 137.110.080-0 (fl. 24), que, após o falecimento dele, foi transformada na pensão por morte, benefício NB nº 138.109.828-0. Requer o INSS o ressarcimento dos valores pagos indevidamente a título de aposentadoria por invalidez, sob pena de suspensão do benefício (fl. 23).

3. Entretanto, à fl. 94, informa o INSS que a pensão por morte concedida aos autores não foi e nem será suspensa.

4. O entendimento deste Tribunal e do egrégio Superior Tribunal de Justiça, quanto à devolução dos valores percebidos de boa-fé, nos casos que resultarem de equívoco da Administração decorrente de errônea interpretação ou má aplicação da lei pela Administração Pública e, ainda, para os quais não houver participação do beneficiário, é no sentido de que não há necessidade de ressarcimento, como se vê dos seguintes julgados:

ADMINISTRATIVO. SERVIDOR PÚBLICO. REPOSIÇÃO AO ERÁRIO DE DIFERENÇAS DO VALOR DE FUNÇÕES COMISSIONADAS. VALORES PAGOS EM EXCESSO POR EQUÍVOCO DA ADMINISTRAÇÃO. CARÁTER ALIMENTAR. BOA FÉ. DIREITO À INTEGRALIDADE DOS VALORES ATÉ A DATA DE CIÊNCIA DA DECISÃO ADMINISTRATIVA. NECESSIDADE DE ANUÊNCIA DO SERVIDOR PARA DESCONTO EM FOLHA DE PAGAMENTO.
1. Recebendo o servidor quantia maior que a devida em seus vencimentos ou proventos diante de diferenças do valor de funções comissionadas, resultado de equívoco da própria Administração e por se tratar de verba alimentar recebida de boa fé, não está obrigado a ressarcir o erário os valores recebidos até à data em que lhe foi dada ciência da decisão administrativa que reduziu o pagamento ao seu patamar legal. Súmula 106 do TCU e precedentes deste Tribunal.
(…)
(AMS n. 2000.01.00.057540-0/MG, Rel. Juiz Federal Convocado Miguel Ângelo Alvarenga Lopes, Primeira Turma – Unânime. DJU 22/1/2007, p. 5).

ADMINISTRATIVO. SERVIDOR PÚBLICO. GRATIFICAÇÃO DE QUINTOS/DÉCIMOS (ART. 62, § 2º, DA LEI Nº 8.112/90). DESCONTOS A TÍTULO DE REPOSIÇÃO DE ERÁRIO. SEGURANÇA PARCIALMENTE CONCEDIDA.
1. A revisão do valor dos proventos de aposentadoria dos impetrantes decorreu da necessidade de correção de equívocos no tocante ao cálculo da gratificação de quintos, não cabendo a alegação de ofensa aos princípios constitucionais do contraditório e da ampla defesa.
2. A garantia constitucional da irredutibilidade de vencimentos/proventos não impede que a Administração retifique o valor da remuneração ou dos proventos do servidor com a finalidade de excluir vantagens pecuniárias pagas indevidamente. A aludida retificação nos proventos dos impetrantes não ensejou decréscimo remuneratório, uma vez que não havia base legal para o pagamento na forma como vinham recebendo.
3. O julgamento, pela ilegalidade, das concessões de reforma, aposentadoria e pensão, não implica por si só a obrigatoriedade da reposição das importâncias já recebidas de boa-fé, até a data do conhecimento da decisão pelo órgão competente -, para que não sejam compelidos a devolver os valores até então percebidos. (Súmula 106 do TCU)
4. Os valores excedentes recebidos pelos impetrantes decorreram de equívocos materiais do Ministério das Comunicações, de que os impetrantes não foram responsáveis, razão pela qual não podem ser obrigados à reposição de ditas importâncias, pois recebidas de boa-fé.
5. O mandado de segurança não é substitutivo de ação de cobrança (Súmula 269 do STF).
6. Apelação a que se dá parcial provimento.
(Grifei) (AMS 1999.01.00.010831-6/DF, Segunda Turma Suplementar, Rel. Juiz Federal Convocado Carlos Alberto Simões De Tomaz, D.J.U 15/09/2005 p.113).

PROCESSO CIVIL. ADMINISTRATIVO. PENSÃO. PAGAMENTO INDEVIDO. RESTITUIÇÃO. ERRÔNEA INTERPRETAÇÃO OU MÁ APLICAÇÃO DA LEI PELA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA. RECEBIMENTO DE BOA-FÉ.
Em recente decisão, este Superior Tribunal de Justiça traçou diferença entre ilegalidade manifesta e errônea interpretação ou má aplicação da lei pela Administração Pública. ‘...é incabível o desconto das diferenças recebidas indevidamente pelo servidor, em decorrência de errônea interpretação ou má aplicação da lei pela Administração Pública, quando constatada a boa-fé do beneficiado.’
Precedentes.
Recurso desprovido.
(STJ, REsp n. 549790, Rel. Ministro José Arnaldo da Fonseca, 5ª Turma – Unânime. DJU 15/8/2005).

5. Ainda que seja possível a repetição de verbas pagas indevidamente pelo Poder Público, deve tal possibilidade ser mitigada se o valor percebido a título de benefício é o mínimo constitucional e se o recebimento caracterizou-se pela boa-fé.

6. Ressalto que o estado de boa-fé deve ser sempre presumido e, no caso, inexiste qualquer outro elemento indicativo de que o instituidor da pensão haja contribuído para a ocorrência da irregularidade ou mesmo que dela tivesse efetivo conhecimento.

7. O erro da concessão do benefício adveio da autarquia, conforme comprova a documentação acostada aos autos (fls. 36/78).

8. Percebendo o instituidor o benefício de boa-fé, revela-se inadequado o desconto das parcelas percebidas, especialmente ante o caráter alimentar dessas verbas.

9. Nesse sentido veja-se aresto desta corte, abaixo transcrito:
PREVIDENCIÁRIO. PENSÃO POR MORTE. DESCONTO DE PAGAMENTO INDEVIDO DE APOSENTADORIA POR VELHICE: IMPOSSIBILIDADE. RECEBIMENTO DE BOA-FÉ. CORREÇÃO MONETÁRIA. VERBA HONORÁRIA. PRESCRIÇÃO REJEITADA. APELAÇÃO NÃO PROVIDA E REMESSA OFICIAL PARCIALMENTE PROVIDA.
1. Conquanto o autor tenha ajuizado a presente ação em novembro/2003 pleiteando o pagamento de parcelas do benefício de pensão por morte referentes ao período compreendido entre abril/97 e junho/2003, não há que se falar em prescrição qüinqüenal, eis que a beneficiária da pensão somente foi comunicada da concessão da aludida pensão em 10.04.2002, conforme carta de concessão de fl. 35, a qual discrimina, inclusive, os créditos atrasados. Anoto, ainda, que a segurada somente foi comunicada da irregularidade de sua aposentadoria em 14.04.2003 (fl. 49), oportunidade em que teria que fazer a opção por um dos dois benefícios.
2. O art. 115 da Lei nº 8.213/91, que regulamenta a hipótese de desconto administrativo, sem necessária autorização judicial, nos casos em que a concessão a maior se deu por ato administrativo do Instituto agravante, não se aplica às situações em que o segurado é receptor de boa-fé, o que, conforme documentos acostados aos presentes autos, se amolda ao vertente caso. (STJ, 6ª Turma, Rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura, AgRg no Recurso Especial 413.977/RS, unânime, DJe 16.03.2009).
3. Inviável o desconto incidente sobre benefício de valor mínimo, em face do caráter alimentar dos benefícios previdenciários. (TRF-1ª Região, 1ª Turma, AMS 2001.40.00.003947-9/PI, Rel. Des. Federal Antônio Sávio de Oliveira Chaves, unânime, DJ 05.09.2005.)
(...)
(AC 0037792-61.2006.4.01.9199/MG; Relator: Desembargadora Federal Ângela Catão, Órgão Julgador: Primeira Turma, Publicação: e-DJF1, p.20, de 26/10/2010 Data da Decisão: 25/08/2010).

PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO DE PRESTAÇÃO CONTINUADA. CONCESSÃO INDEVIDA. ERRO DA ADMINISTRAÇÃO. BOA - FÉ DO SEGURADO. DEVOLUÇÃO. DESCABIMENTO. CARÁTER ALIMENTAR. SENTENÇA CONFIRMADA. 1. A jurisprudência dos Tribunais pátrios tem se firmado no sentido de que, em se tratando de benefício previdenciário, que possui natureza alimentar, afigura-se descabida a devolução de valores recebidos indevidamente, se decorrentes de erro exclusivo da Administração e recebidos de boa-fé pelo administrado, como no caso dos autos. Precedentes desta Corte. 2. Correta a sentença que julgou procedente o pedido autoral para determinar ao INSS que se abstenha de efetuar descontos na pensão paga à autora, em virtude de indevida cumulação do referido benefício com o de amparo social. 3. Apelação do INSS e remessa oficial não providas.(AC 201038000060340, DESEMBARGADOR FEDERAL NÉVITON GUEDES, TRF1 - PRIMEIRA TURMA, e-DJF1 DATA:20/02/2013 PAGINA:169.)

PREVIDENCIÁRIO. INDEVIDA CUMULAÇÃO DE BENEFÍCIOS. DESCONTOS. REPOSIÇÃO. LEGITIMIDADE DO INSS. PROVENTOS. CARÁTER ALIMENTAR. BOA-FÉ. NÃO APLICAÇÃO DO ART. 115, II DA LEI N. 8.213/91. NEGATIVA DE DEVOLUÇÃO DOS VALORES JÁ DESCONTADOS A TÍTULO DE REPOSIÇÃO. 1. Remessa oficial tida por interposta, nos termos da Súmula 423/STF. 2. O INSS possui a responsabilidade pela execução e manutenção dos recursos de responsabilidade da União, que são destinados ao financiamento dos benefícios de prestação continuada (Lei n. 8.742/93, art. 20), o que impõe à autarquia previdenciária a obrigação de prestação de contas de boa gestão perante o ente financiador. Desse contexto se deve inferir a legitimidade dos descontos sob discussão porque realizados com embasamento legal (Lei n. 8.213/91, no art. 115, II) e com o fim precípuo de conferir ampla efetividade às atribuições do INSS. 3. Em que pese seja possível a repetição de verbas pagas indevidamente pelo Poder Público, deve tal possibilidade ser mitigada se o valor percebido a título de benefício é o mínimo constitucional e se o recebimento caracterizou-se pela boa-fé. Precedentes. 4. O estado de boa-fé deve ser sempre presumido e, in casu, inexiste qualquer outro elemento indicativo de que a autora haja contribuído para a ocorrência da irregularidade ou mesmo que dela tivesse efetivo conhecimento, na medida em que parece razoável se compreender que para a demandante - pessoa idosa e moradora da área rural à época da concessão - a continuidade do pagamento do benefício de prestação continuada pelo ente responsável, mesmo após a concessão da pensão por morte, estava revestida de aparente regularidade. 5. Não há que se falar em determinação da devolução de valores já descontados no contracheque da autora, o que implicaria em novamente fazer com que o INSS efetuasse pagamento indevido, não sendo admissível que sob o manto da proteção à boa-fé se albergue a possibilidade de enriquecimento ilícito. 6. Apelações e remessa Oficial, tida por interposta, a que se nega provimento.(AC 200438010057948, JUIZ FEDERAL FRANCISCO HÉLIO CAMELO FERREIRA, TRF1 - 1ª TURMA SUPLEMENTAR, e-DJF1 DATA:09/05/2012 PAGINA:627.)

10. Assim, mostra-se incabível a devolução ao erário dos valores indevidamente recebidos, eis que a jurisprudência assentou que o segurado não deve ser compelido a devolver aos cofres públicos o que indevidamente recebeu de boa-fé, tendo em vista a irrepetibilidade dos vencimentos e a boa-fé no recebimento.

11. Em face do exposto, nego provimento à remessa oficial.

É como voto.

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Rio Grande, Rio Grande do Sul, Brazil
Especialista em Direito Previdenciário, pela Universidade de Caxias do Sul - UCS, em parceria com a ESMAFE - Escola da Magistratura Federal, em 2009. Formado em janeiro de 2006, pela FURG - Fundação Universidade do Rio Grande, em direito. Este blog tem o objetivo de divulgar o conteúdo previdenciário de maneira gratuita para que todos possam ter acesso as informações sobre esta matéria.

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