INSS não pode descontar benefício de segurado sem processo administrativo
Nesta sexta-feira será visto decisão da Turma Nacional de Uniformização que entendeu que para o INSS não pode descontar de benefício do segurado sem que seja feito processo administrativo no qual seja oportunizado a ampla defesa e o contraditório ao segurado. Abaixo segue a decisão para análise dos amigos.
VOTO / EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. CONCESSÃO DE PENSÃO POR MORTE A VIÚVA QUE RECEBIA BENEFÍCIO DE AMPARO SOCIAL A IDOSO. GERAÇÃO AUTOMÁTICA DE DÉBITO. IMPOSSIBILIDADE. JUÍZO SUMÁRIO POR AGENTE ADMINISTRATIVO DO INSS QUE VIOLA O DEVIDO PROCESSO LEGAL. AUSÊNCIA DE OPORTUNIDADE DE AMPLA DEFESA E CONTRADITÓRIO. SENTENÇA E ACÓRDÃO COM FUNDAMENTOS
DIVERSOS. ACÓRDÃO RECORRIDO MANTIDO POR FUNDAMENTOS DIVERSOS. PEDILEF CONHECIDO E NÃO PROVIDO.
TNU, Proc. 0514296-37.2011.4.05.8300, Juiz Federal Relator Luiz Claudio Flores da Cunha, 18.10.13 D.O.U.
O requerente busca a reversão do julgado da Turma Recursal da Seção Judiciária de Pernambuco, que manteve a Sentença do JEF de origem, ainda que por fundamentos diversos, para sustar os descontos nos proventos da pensão por morte recebida pela requerida a título de ressarcimento de prestações de benefício de amparo social a idoso, em período anterior à DER da pensão.
A requerida foi ao requerente e pediu a concessão de amparo social a idoso em 04/12/2000, obtendo-o, e assim permaneceu sustentada por esses proventos até 30/04/2009. Em 01/05/2009, faleceu seu marido, Sr. Alfredo Cosme Duarte, e então pediu a concessão da pensão por morte, simplesmente amparada pela certidão de casamento.
Ao deferir-lhe a pensão por morte, o agente administrativo do requerente entendeu, em juízo sumário, sem abertura de processo administrativo próprio, sem formulação de dúvida, sem oportunidade de contraditório e de ampla defesa à requerida que ela tinha recebido o benefício de amparo social ao idoso de forma irregular e que deveria ressarcir ao requerente todos os gastos com ela efetuados.
No procedimento administrativo nenhuma decisão fundamentada foi elaborada, bastando ao requerente, por meio de seu agente, um comando ao sistema informatizado para que a requerida passasse de credora de uma pensão por morte de valor mínimo, que lhe dava a mais que o benefício de amparo social a idoso, apenas a gratificação natalina, a devedora da importância de mais de 36 mil reais, que passaram a ser descontados de seu novo benefício.
Já em Juízo, deflui que a requerida teria concorrido para o suposto erro administrativo na concessão daquele benefício assistencial, já que declarou no processo concessório que seu marido a tinha abandonado sem qualquer prestação de alimentos há 15 anos.Note-se que a requerida é analfabeta e quem prestou a declaração foi terceira pessoa a seu rogo.
O requerente pretende que a requerida, para fazer jus à pensão por morte, teria mentido sobre o abandono pelo marido. Mera presunção baseada no princípio de que todo segurado e beneficiário pretende se locupletar à custa da Previdência Social.
Não há comprovação alguma de que o benefício de amparo social a idoso tenha sido pago indevidamente à autora da demanda, ora requerida, partindo todo o procedimento de ressarcimento de uma premissa, estabelecida de forma cruel e ilegal. Apenas por hipótese, o marido da requerida pode tê-la abandonado quinze anos antes do pedido do amparo social a idoso, e, quando soube da morte dele, casada que ainda era com ele, embora separada de fato, e com prova pré-constituída de sua necessidade, que era o próprio recebimento do amparo social a idoso, em data em muito anterior ao óbito do instituidor, resolveu pleitear a pensão por morte, de condição econômica mais vantajosa para si.
Veja que essa hipótese, que nada tem de sobrenatural, está em consonância com a versão dos fatos apresentada pela requerida, com as provas dos autos e com a legislação vigente. Mas o requerente achou por bem cobrar o ressarcimento, sem desejar ou achar que tinha de ouvi-la primeiro.
A sentença interpretou a questão, a meu ver com argúcia, ao estabelecer que, conforme a jurisprudência majoritária da época, o benefício recebido pelo marido da ora requerida deveria ser mesmo excluído da receita do núcleo familiar, por analogia ao Estatuto do Idoso (Lei 10.741/2003), onde determina que não seja considerado o benefício assistencial (artigo 34, parágrafo único).
Depois, recentemente, o STF decidiu em sentido diverso, para dizer que não é possível excluir outros benefícios e de outras pessoas do núcleo familiar do cômputo da renda mensal média por componente.
A Sentença chegou ao ponto de expressamente afastar qualquer ilegalidade na percepção do amparo social a idoso. Se os Juízes assim decidiam, é pouco provável que se pudesse exigir da viúva tratamento distinto, mas isso esbarraria na questão da declaração de abandono, que, se se entender que possa ser atribuída à requerida, mesmo que por ela não assinada, traria a questão da indução do requerente a erro.
Por outro lado, o Acórdão da Turma Recursal da Seção Judiciária de Pernambuco resolveu definir a questão pela boa-fé, atribuindo à autora tal condição, mesmo sem maior digressão sobre a questão na fase instrutória.
Poderia até ser pelo fato da Turma Recursal de origem acreditar que a concessão do primeiro estava eivada de ilegalidade, mas tal fundamento não se pode presumir, ainda mais que o recurso do INSS não atacou a Sentença na parte em que expressamente considera lícita a concessão do amparo social a idoso.
Portanto, não se trata apenas de decidir sobre a irrepetibilidade ou não das prestações conforme apurada a ocorrência de boa-fé, mas muito mais que isso, de se responder a pergunta que não quer calar: teria a requerida a obrigação de devolver as prestações de benefício assistencial considerado lícito em sua concessão pela Justiça?
A resposta só poderá ser um retumbante não!
Ademais, ainda subsiste outro fundamento, que apresento apenas como apoio ao externado na Sentença, de que este Colegiado ainda poderia se inclinar por uma terceira via argumentativa, se se entender que a decisão da Sentença não fez coisa julgada sobre a licitude da concessão do amparo social a idoso à requerida.
É de conhecimento impositivo aos Magistrados os casos de afronta ao devido processo legal, com negativa do contraditório e da ampla defesa, ainda mais quando desta violação se atinge o patrimônio jurídico de uma idosa, hoje com 80 anos de idade e analfabeta.
É de conhecimento impositivo aos Magistrados os casos de afronta ao devido processo legal, com negativa do contraditório e da ampla defesa, ainda mais quando desta violação se atinge o patrimônio jurídico de uma idosa, hoje com 80 anos de idade e analfabeta.
Portanto, a falta notória de um prévio procedimento administrativo para averiguação das condições de eventual incongruência entre o recebimento do amparo social ao idoso e das condições com as quais se trabalhou para a concessão da pensão por morte de seu marido, deverá ser fundamento suficiente a que não se autorizem os descontos efetivados e por se efetivar para ressarcimento das prestações do amparo social ao idoso, sem que se verifique o devido processo legal administrativo, com contraditório e ampla defesa assegurados à requerida e com decisão administrativa final fundamentada, que, se negativa aos interesses da autora, ainda deveria trazer o período a ser ressarcido e a forma de cálculo, lembrando, como bem notado na Sentença, que as prestações anteriores a 01/05/2004 já se encontravam prescritas.
Ademais, ali se poderia melhor avaliar a questão da irrepetibilidade ou não das prestações, até porque penso que não se resolva pela questão da boa-fé da requerida, mas sim pela correção ou não do pagamento do amparo social ao idoso, como já disse antes, objeto da Sentença em sentido positivo e omitido no
recurso do ora requerente à Turma Recursal de origem.
Ante o exposto, voto por conhecer do Pedido de Uniformização da Interpretação de Lei Federal e negar-lhe provimento.
Brasília, 09 de outubro de 2013.
Luiz Claudio Flores da Cunha
Juiz Federal
Relator
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