sexta-feira, 13 de setembro de 2013

Decisão classifica doença degenerativa como doença ocupacional

Nesta sexta-feira será visto uma jurisprudência que trata sobre o fato de uma doença degenerativa poder ser considerada como doença do trabalho, pois ela pode ser desencadeada por condições especiais existentes nas atividades e/ou nos ambientes de trabalho. Abaixo segue a decisão para análise dos amigos.

EMENTA:DOENÇA DEGENERATIVA. CONFORMAÇÃO DE DOENÇA OCUPACIONAL EQUIPARADA A ACIDENTE DO TRABALHO. POSSIBILIDADE FÁTICA.
O fato de a doença ser do tipo “degenerativo” não exclui a possibilidade de que seja classificada como doença ocupacional. Com efeito, as doenças degenerativas podem ser caracterizadas como doenças do trabalho (origem ocupacional), quando desencadeadas por condições especiais existentes nas atividades e/ou ambientes, pois indicam, na verdade, o desgaste anormal dos diversos tecidos humanos e elas podem ocorrer em qualquer idade, inclusive em crianças, razão pela qual é engano relacioná-las exclusivamente ao processo natural de envelhecimento das pessoas.

TRT 3, Proc. 00212-2011-104-03-00-5-RO, Desembargador Federal Relator Cesar Machado, Publicado em 08.07.2013


Vistos, relatados e discutidos os presentes autos de Recurso Ordinário, em que figuram, como recorrentes, RONIR BORGES DA SILVA JÚNIOR e CARGILL AGRÍCOLA S/A e, como recorridos, OS MESMOS. 
RELATÓRIO
O MM. Juiz da 04ª Vara do Trabalho de Uberlândia, pela r. sentença de fs. 582/588, rejeitou as preliminares de inépcia da inicial e de carência de ação; declarou prescritos os pretensos direitos anteriores a 10/02/2006; e julgou procedentes, em parte, os pedidos do autor, conforme definido no dispositivo de f.588.
 
Embargos de declaração, opostos pela reclamada (fs. 590/590-v), julgados procedentes, para esclarecer que o deferimento do adicional de periculosidade e reflexos se restringe ao período não prescrito, de 10/02/2006 a 15/02/2008, em que o reclamante atuou na função de operador de empilhadeira (dispositivo de f. 592).

Recorreu o autor (fs. 593/595-v), requerendo a majoração do valor
da indenização por danos morais ao patamar de 200 (duzentos) salários mínimos. Contrarrazões apresentadas às fs. 618/625.
 
Recorreu a reclamada (fs. 597/613), requerendo fossem excluídas as condenações ao pagamento de adicional de periculosidade e de indenização por danos morais, bem como, uma vez invertidos os encargos da sucumbência, revista a obrigação de pagar honorários periciais; sucessivamente, pede seja, pelo menos, mantido o valor arbitrado à reparação moral e reduzido o valor dos honorários periciais; se ainda assim não for entendido, pede para que seja dividido, entre as partes, o pagamento dos honorários periciais médicos (f. 612). Comprovantes de recolhimento das custas processuais e do depósito recursal foram anexados às fs. 614/615.
O reclamante não apresentou contrarrazões. É o relatório.

VOTO
ADMISSIBILIDADE
Conheço de ambos os recursos, porque neles atendidos os pressupostos objetivos e subjetivos de admissibilidade, e passo a analisá-los em conjunto, dada a similitude parcial das matérias neles deduzidas.

MÉRITO
ADICIONAL DE PERICULOSIDADE – HONORÁRIOS PERICIAIS (RECLAMADA)
A reclamada requer seja excluída a obrigação de pagar adicional de periculosidade e, invertidos os encargos da sucumbência, revista a obrigação de pagar honorários periciais.
 
Alega que o laudo é falho, porque baseado exclusivamente em informações inverídicas fornecidas pelo autor, quem, no ambiente de trabalho, jamais atuou em condições de risco acentuado, em contato direto com produtos inflamáveis (f. 600).
 
Examino.
O perito relatou que, devidamente acompanhado pelas partes, teve acesso aos locais de trabalho do reclamante. No que se refere ao objeto da perícia, afirmou que o autor realizava a troca de cilindro de GLP, gás armazenado em 15 (quinze) cilindros P-20 (20 kg), cheios e vazios não desgaseificados (f. 508).
 
Em continuação, afirmou que o local era aberto, sem demarcação da área de risco, ao contrário do determinado na NR 16, item 16.8 (f. 513); que, no cubículo onde eram armazenados os cilindros, havia espaço somente para eles, o que, no entanto, não caracterizava o local como ambiente fechado; e que, simulada a troca de cilindros, normalmente não havia transferência de GLP (f. 509).

O perito ainda disse que a operação de troca ocorria em área de risco (v.g., item 08, f. 511), com periodicidade diária (v.g., itens 04 e 11, respectivamente às fs. 445 e 512), o que não se confundia, porém, com o abastecimento da empilhadeira.
 
Ao fim, informou que o enquadramento da atividade como perigosa não se deu pelo fato de se transportar o cilindro P-20 na empilhadeira, na medida em que tal reservatório era para consumo do veículo e estava abaixo de 135 kg. Segundo ele, o enquadramento derivou do fato de a troca dos cilindros ocorrer em área de risco, não demarcada (f. 513, item 14). 
Todavia, a reclamada ressalta que o tempo despendido na troca do GLP era ínfimo em relação à jornada diária do autor (f. 600). E, quanto à essa particularidade, o perito nada elucidou, ao longo de suas 03 (três) manifestações, às fs. 438/449, 475/479 e 507/513.
 
Com efeito, limitou-se a responder, evasivamente, que a operação de troca se dava pelo “tempo necessário” (f. 447, item 16); nada mais. Em razão disso, o julgamento foi convertido em diligência e, retornados os autos ao perito, ele informou, à f. 638, que:
a) o tempo de empilhadeira no local de troca do cilindro de GLP era de 02min35; e
b) o tempo efetivo de troca do cilindro de GLP P-20 era de 01min50.
 
Como já decidido por esta Turma Julgadora, “consoante a jurisprudência pacífica do c. TST, por meio da Súmula n.º 364, I, é indevido o adicional de periculosidade ao trabalhador que se expõe, ou se sujeita, à condição de risco, de forma eventual, cuja exposição é fortuita, e que se dá por tempo extremamente reduzido (...)” (TRT 3ª Reg., 3ª T. Proc. 02132-2009-029-03-00-8
RO, Rel. Des. Bolívar Viégas Peixoto, DJ 11/07/2011).

Logo, não basta a constatação de que havia trabalho em área normatizada como de risco, mas, para configuração do direito à percepção do adicional de periculosidade, há de se também levar em conta o tempo de exposição ao risco (contato), que, consoante os esclarecimentos de fs. 638/638-v, era extremamente reduzido, na comparação com o total da jornada de trabalho diária – em regra, de, pelo menos, 07h30 (f. 03).

Portanto, dou provimento ao recurso ordinário, para absolver a reclamada da obrigação de pagar adicional de periculosidade ao autor e, invertidos os encargos da sucumbência, absolvê-la também da obrigação de pagamento dos honorários periciais, facultado ao perito postular o recebimento deles, fixados em R$ 1.500,00 (hum mil e quinhentos reais), de acordo com os termos do Provimento n.04/2006 deste E. Regional e da Resolução n. 35/2007 do Conselho Superior da Justiça do Trabalho.

DOENÇA OCUPACIONAL – INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS
– PERÍCIA MÉDICA (MATÉRIA COMUM)
A reclamada requer seja excluída a obrigação de pagar indenização
por danos morais ao reclamante; sucessivamente, pede seja, pelo menos, mantido o valor arbitrado à reparação.
 
No entanto, ainda que alegue que não são consideradas, como doença do trabalho, as degenerativas (f. 605), vale destacar que o fato de a doença ser reputada como tal não exclui a possibilidade de que venha a ser classificada como moléstia ocupacional. 
Com efeito, as doenças degenerativas podem ser reputadas como doenças do trabalho (origem ocupacional), quando desencadeadas por condições especiais existentes nas atividades e/ou ambientes, de acordo com os conceitos técnicos e legais. Em outras palavras, a expressão doença degenerativa, por possuir diversas etiologias (causas), não deve ser utilizada de forma genérica para afastar o nexo causal ocupacional, pois indica, na verdade, o desgaste anormal dos diversos tecidos humanos e pode ocorrer em qualquer idade, inclusive em crianças, razão pela qual é equívoco relacioná-la apenas ao processo natural de envelhecimento das pessoas.

Nesse passo, sobressai o bem elaborado laudo pericial (fs.521/545), do qual se extrai, como aludido na sentença (fs. 585/586), que: "o autor apresentou, durante o contrato de emprego, o desenvolvimento de patologias degenerativas do eixo vertebral,com componente predisponencial evidenciado, associado à
exposição pré-patogênica suficiente ao seu desenvolvimento/ desencadeamento a fatores contributivos e/ou desencadeantes médico-ocupacionais, detectados in loco, no posto de trabalho, confirmada a presença do fator agravante ocupacional, relativo à sobrecarga mecânica informada na documentação médica especializada juntada aos autos e devidamente compilada e discorrida, o que explica o início patológico aos 32 anos de idade (fase adulto-jovem da vida). "

Assim, como o autor nasceu em 17/01/1975 e ingressou na reclamada em 15/03/2004 (f. 25) – portanto, aos 29 anos de idade – fica fácil perceber o acerto do trabalho apresentado pelo perito, ao estabelecer o nexo causal indireto/concausa para o caso avaliado (f. 537).

Lado outro, ainda que o autor não esteja funcionalmente incapacitado (f. 538 c/c f. 609), não se pode olvidar que, em decorrência da patologia, sofreu, sequelarmente, redução funcional segmentar – déficit de flexão e extensão cervical (f. 609) –, quantificada à ordem de 10% (dez por cento), em consonância com a tabela SUSEP, em relação a um indivíduo hígido, e alteração anti-estética de pequena monta (f. 538).
 
Desse modo, ainda que não incapacitado para a atividade de motorista freteiro (f. 522), é inegável que a redução experimentada pelo autor impede se cogitar, tal qual arguido às fs. 605 e 623, da ausência de responsabilidade civil da reclamada, mesmo porque, para que ele voltasse a atuar como operador de empilhadeira, seria necessário adaptar a máquina à sua nova condição ergonômica (f. 530).

Dessa feita, vêm abaixo as seguintes assertivas de defesa:
a) a de que não há nexo causal entre o ato do empregador e a doença, ao argumento de que as circunstâncias do caso estariam a revelar a inexistência de fatos capazes de provocar abalo moral, ou aborrecimento passível de reparação (f. 621);
b) a de que a doença alegada pelo autor não guarda nenhuma relação com qualquer atividade profissional exercida na empresa, pelo que não pode ser considerada como concausa do agravamento da moléstia, nem gerar direito à indenização por danos morais (fs. 606 e 621);
c) a de que todos os documentos juntados aos autos relatam que os problemas do reclamante são de origem degenerativa, sem cunho ocupacional, causados apenas pelo desgaste natural da idade (fs. 609 e 623);
d) a de que as doenças degenerativas são as em que não há nenhuma contribuição da causa-trabalho (f. 623); e
e) a de que não houve conduta da reclamada, capaz de implicar ou de trazer grandes repercussões na vida do reclamante, a ponto de atrair condenação a título de danos morais (f. 623). 

Noutro giro, o reclamante requer a majoração da sobredita indenização – arbitrada em R$ 4.000,00 (quatro mil reais) –, para o patamar de 200 (duzentos) salários mínimos – fs. 593/595-v. O arbitramento do quantum reparatório deve levar em conta a necessidade da vítima e a possibilidade econômica do ofensor. Não é porque a reclamada é multinacional, que deverá ser condenada a pagar indenização exorbitante, a propiciar o locupletamento do autor (f. 624).

Assim, em paráfrase a Carlos Alberto Bittar, citado à f. 594, a importância a ser fixada para a indenização deve se compatibilizar com o vulto dos interesses em conflito. Nessa toada, penso que a quantia definida na sentença não atende, suficientemente, ao princípio da dignidade da pessoa humana; não traduz justa reparação de todo o gravame sofrido; nem estimula a acionada a abster-se da prática de ilicitudes semelhantes (f. 593-v), principalmente porque, em relação aos vários anos de serviços prestados (TRCT, f. 25), não há nos autos, segundo o perito, documentação assinada pelo reclamante, a atestar tenha ele recebido treinamento sobre o risco ergonômico referente a posturas específicas [f. 528, item III. A.2 (03)].
 
Então, à vista da natureza das lesões e do descaso patronal em ofertar ambiente de trabalho hígido e sadio, entendo necessária a elevação da indenização arbitrada na origem. Em consequência, rejeito o pedido da reclamada, para que seja dividido, entre as partes, o pagamento dos honorários periciais médicos (f. 612).

Pelo exposto, nego provimento ao recurso da reclamada e provejo, em parte, o apelo do autor, para majorar a condenação referente ao pagamento de indenização por danos morais ao valor de R$ 10.000,00 (dez mil reais), a não ensejar o enriquecimento sem causa do autor, nem vulnerar os limites financeiros da demandada, embora lhe sirva de censura contra novas práticas semelhantes e, aos olhos deste Juízo, se amolde ao percentual de redução de mobilidade corporal acima assinalado.
 
CONCLUSÃO
Conheço de ambos os recursos ordinários e, no mérito, dou provimento parcial ao do reclamante, para majorar a condenação referente ao pagamento de indenização por danos morais ao valor de R$ 10.000,00 (dez mil reais); e dou provimento parcial ao da reclamada, para absolvê-la da obrigação de pagar adicional de periculosidade ao autor e, invertidos os encargos da sucumbência, absolvê-la também da obrigação do pagamento dos honorários periciais, facultado ao perito postular o recebimento deles, fixados no montante de R$ 1.500,00 (hum mil e quinhentos reais), de acordo com os termos do Provimento n. 04/2006 deste E. Regional e da Resolução n. 35/2007 do Conselho Superior da Justiça do Trabalho, tudo nos termos da fundamentação supra, parte deste dispositivo.

Em atendimento à norma do art. 832, § 3º, da CLT, declaro não salarial a indenização por danos morais. Mantenho o valor da condenação, porque ainda compatível. Fundamentos pelos quais, 
ACORDAM os Desembargadores do Tribunal Regional do Trabalho da Terceira Região, pela sua Terceira Turma, à unanimidade, conhecer de ambos os recursos ordinários e, no mérito, sem divergência, dar provimento parcial ao do reclamante para majorar a condenação referente ao pagamento de indenização por danos morais ao valor de R$10.000,00 (dez mil reais); unanimemente, dar provimento parcial ao da reclamada para absolvê-la da obrigação de pagar adicional de periculosidade ao autor e, invertidos os encargos da sucumbência, absolvê-la também da obrigação do pagamento dos honorários periciais, facultado ao perito postular o recebimento deles, fixados no montante de R$1.500,00 (hum mil e quinhentos reais), de acordo com os termos do Provimento n. 04/2006 deste E. Regional e da Resolução n. 35/2007 do Conselho Superior da Justiça do Trabalho, tudo nos termos da fundamentação, parte deste dispositivo.
 
Em atendimento à norma do art. 832, § 3º, da CLT, declarar não salarial a indenização por danos morais. Mantido o valor da condenação, porque ainda compatível.
Belo Horizonte, 27 de junho de 2013.
F/ CÉSAR MACHADO
Desembargador Relator

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Rio Grande, Rio Grande do Sul, Brazil
Especialista em Direito Previdenciário, pela Universidade de Caxias do Sul - UCS, em parceria com a ESMAFE - Escola da Magistratura Federal, em 2009. Formado em janeiro de 2006, pela FURG - Fundação Universidade do Rio Grande, em direito. Este blog tem o objetivo de divulgar o conteúdo previdenciário de maneira gratuita para que todos possam ter acesso as informações sobre esta matéria.

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