sexta-feira, 8 de julho de 2011

No cálculo da renda per capita familiar não entra benefício já concedido a outro membro familiar.

Hoje será analisada uma decisão da Turma Regional de Uniformização da 4ª Região, que engloba os Estados do Rio Grande do Sul, Santa Catarina e Paraná, a qual trata sobre o cálculo da renda per capita familiar para fins de concessão de benefício assistencial.

No incidente de uniformização abaixo a decisão foi pela exclusão do cálculo de renda per capita a renda já recebida por membro não idoso, mas portador de incapacidade, em uma aplicação analógica do texto constante no parágrafo único do art.34 do Estatuto do Idoso. Abaixo a íntegra da decisão.

INCIDENTE DE UNIFORMIZAÇÃO. BENEFÍCIO ASSITENCIAL. LOAS. CÁLCULO DA RENDA FAMILIAR PER CAPITA. PARÁGRAFO ÚNICO DO ART. 34 DO ESTATUTO DO IDOSO. ANALOGIA. EXCLUSÃO DE BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO POR INCAPACIDADE PERCEBIDO POR MEMBRO NÃO IDOSO DO GRUPO FAMILIAR. POSSIBILIDADE. TERMO INICIAL DO BENEFÍCIO. MATÉRIA NÃO TRATADA NO ACÓRDÃO RECORRIDO. CONHECIMENTO EM PARTE DO RECURSO.
1. Cabe a aplicação analógica do parágrafo único do art. 34 da Lei nº 10.741, de 2003, para excluir do cálculo da renda per capita o benefício previdenciário por incapacidade de valor mínimo percebido por integrante não idoso do grupo familiar, para o fim de concessão do benefício assistencial da Lei nº 8.742, de 1993, a outro membro da mesma família, seja idoso ou deficiente.
2. Não é possível conhecer de incidente para uniformização de matéria não tratada no acórdão recorrido.
3. Recurso parcialmente conhecido e provido, na parte conhecida.
(TRF 4ª R. - IUJ 2009.70.95.000.526-0/PR - TUJEF - Relª Juíza Fed. Luísa Hickel Gamba - Dje 09.02.2011)

RELATÓRIO
Trata-se de incidente de uniformização interposto pela parte autora contra acórdão da Segunda Turma Recursal do Paraná, que, reformando a sentença, deu pela improcedência do pedido de concessão de benefício assistencial a deficiente, sob o fundamento de que a renda de um salário mínimo proveniente da aposentadoria por invalidez percebida por membro não idoso do grupo familiar não pode ser excluída do cálculo da renda per capita, que, sem isso, resta superior a ¼ do salário mínimo. O recurso da parte autora contra sentença, que buscava efeitos financeiros do benefício desde a DER foi considerado prejudicado, restando sem apreciação.

Alega a recorrente que o acórdão recorrido diverge do entendimento esposado pela Primeira Turma Recursal do Paraná, que admite a aplicação analógica do parágrafo único do art. 34 da Lei nº 10.741, de 2003, para excluir do cálculo da renda per capita o benefício previdenciário por incapacidade, de valor mínimo, percebido por membro do grupo familiar. Refere ainda que julgados da Primeira Turma Recursal do Paraná e da então Turma única do Rio Grande do Sul fixam o termo inicial do benefício assistencial na data do requerimento administrativo, mesmo que a prova do cumprimento dos requisitos seja feita somente em juízo, buscando, assim, o provimento do recurso que interpôs contra a sentença.

Não foram apresentadas contrarrazões. A Presidência da Segunda Turma Recursal do Paraná não admitiu o incidente, por falta de similitude fática entre o acórdão recorrido e os paradigmas invocados.

Em pedido de submissão dirigido ao Presidente desta Regional, o incidente foi admitido. O Ministério Público Federal opinou pelo provimento do incidente.

VOTO
Admissibilidade
: O incidente merece parcial conhecimento.
Com efeito, o recurso é tempestivo e formalmente regular, restando demonstrada a divergência alegada em relação à aplicação analógica do parágrafo único do art. 34 da Lei nº 10.741, de 2003, para excluir do cálculo da renda per capita o benefício previdenciário por incapacidade, de valor mínimo, percebido por membro do grupo familiar, como bem assinalou a decisão de 
admissibilidade proferida pela Presidência desta Regional.

Tanto o acórdão recorrido, como o paradigma invocado decidem sobre o requisito da miserabilidade, para o fim de concessão a benefício assistencial a deficiente, sendo a única renda do grupo familiar proveniente de benefício por incapacidade percebido por membro não idoso do grupo familiar.

O acórdão recorrido decide assim a questão:
Excluída a filha da autora (LBPS, art. 16; LOAS, art. 20, § 1º), verifica-se que a renda do grupo familiar é composta apenas por 01 salário mínimo recebido pelo marido da autora, a título de aposentadoria por invalidez.
A renda per capita, portanto, é superior ao critério objetivo estabelecido pela LOAS (¼ do salário mínimo), pois o marido da autora não é idoso, não sendo possível a exclusão de seu benefício, por analogia ao disposto no artigo 34, da Lei nº 10.741/2003.

O paradigma invocado, por sua vez, consigna:
Esta 1ª Turma recursal tem excluído do cálculo da renda per capita todos os benefícios de renda mínima, de idosos e incapazes, de natureza previdenciária ou assistencial, aplicando por analogia o disposto no art. 34 da Lei 10.741/03. Fundamenta esse posicionamento o fato de que nesses casos o benefício percebido visa a amparar unicamente seu beneficiário, não sendo suficiente para alcançar os demais membros do grupo familiar.
Importante salientar, neste particular, que embora a norma mencionada faça menção apenas à hipótese do benefício referido em seu caput (assistencial), evidencia-se que, em atenção ao princípio da isonomia deve a mesma ser observada nos casos de qualquer benefício de valor mínimo, atendido, sempre, o requisito etário do respectivo beneficiário ou sua natureza de benefício por incapacidade.
(...)
No caso dos autos, o auxílio doença recebido pelo pai do autor (portador de hanseníase) possui caráter temporário, não sendo possível inferir que ele esteja inválido para toda e qualquer atividade laborativa.
Ainda que assim não fosse, no caso em tela o auxílio doença recebido pelo pai do autor é superior a um salário mínimo.

Como se vê, embora não haja perfeita identidade fática, é possível extrair divergência na aplicação do direito material entre Turmas Recursais desta Região, razão pela qual, apegada aos princípios que regem os Juizados Especiais, admito o incidente, no ponto.

No tocante à pretendida fixação da DIB do benefício na DER, porém, o incidente não é admitido, visto que, dando por prejudicado o recurso da autora, em face do indeferimento do benefício, o acórdão recorrido não tratou sequer da questão. Com efeito, não é possível conhecer de incidente para uniformização de matéria não tratada no acórdão recorrido.

Por fim, convém acrescentar, por oportuno, que esta instância é meramente de uniformização, razão pela qual não cabe aqui a revisão do julgado, para deferir o benefício e fixar data de início mais favorável que a fixada na sentença. Entretanto, no caso de provimento do incidente, haverá novo julgamento pela Turma Recursal de origem dos recursos interpostos contra a sentença, em juízo de adequação, inclusive do interposto pela parte autora.

Mérito
O objeto do presente incidente é a possibilidade da aplicação analógica do parágrafo único do art. 34 da Lei nº 10.741, de 2003, para excluir do cálculo da renda per capita o benefício previdenciário por incapacidade, de valor mínimo, percebido por membro do grupo familiar, para o fim de concessão de benefício assistencial.

Referido dispositivo legal autoriza a exclusão de benefício assistencial percebido por qualquer membro do grupo familiar do cálculo da renda per capita, para o fim de concessão de benefício assistencial a idoso do mesmo grupo.

A Turma Nacional de Uniformização, uniformizando a interpretação do referido dispositivo legal, assentou que o benefício assistencial percebido por qualquer membro da família, seja na condição de idoso ou deficiente, deve ser sempre excluído do cálculo da renda per capita, para o fim de concessão de benefício assistencial a outro membro do mesmo grupo familiar, seja também na condição de idoso ou deficiente (PEDILEF 200783005023811, JUÍZA FEDERAL JACQUELINE MICHELS BILHALVA, TNU - Turma Nacional de Uniformização, 19/08/2009).

Por outro lado, é pacífico na jurisprudência federal desta 4ª Região, inclusive no âmbito das Turmas Recursais, que o benefício previdenciário de valor mínimo percebido por idoso é excluído do cálculo da renda per capita da família, para efeito de concessão de benefício assistencial a outro membro do grupo familiar, idoso ou deficiente, por aplicação extensiva do citado dispositivo legal.

Nesse sentido, por todos, os seguintes julgados desta Regional, afinados com o entendimento da Turma Nacional de Uniformização, conforme precedentes referidos na ementa:

PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. ART. 34 DO ESTATUTO DO IDOSO (LEI Nº 10.741/2003). BENEFÍCIO DE VALOR MÍNIMO RECEBIDO POR MEMBRO IDOSO DO GRUPO FAMILIAR. EXCLUSÃO DA RENDA. PRECEDENTES DA TNU. 1. Não se inclui no cálculo da renda per capita a renda mínima auferida por idoso, quando da análise do pedido de concessão de benefício assistencial. 2. Inteligência do Estatuto do Idoso (art. 34 da Lei nº 10.741/2003). 3. Precedentes da TNU no Processo nº 2006.83.00.510337-1 (julg. 29.10.2008) e PEDILEF n. 200770530007330, DJ 05/03/2010. 4. Pedido de Uniformização conhecido e provido. (IUJEF 0001163-67.2007.404.7066, Turma Regional de Uniformização da 4ª Região, Relator Antonio Fernando Schenkel do Amaral e Silva, D.E. 24/08/2010)

PEDIDO DE UNIFORMIZAÇÃO REGIONAL. PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. ART. 34 DO ESTATUTO DO IDOSO (LEI Nº 10.741/2003). APLICAÇÃO ANALÓGICA A BENEFÍCIO DE DEFICIENTE. BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO DE VALOR MÍNIMO RECEBIDO POR IDOSO DO GRUPO FAMILIAR. EXCLUSÃO DA RENDA DO GRUPO FAMILIAR. Para fins de concessão de benefício assistencial a deficiente, o disposto no parágrafo único do art. 34 do Estatuto do Idoso (Lei nº 10.741/2003) se aplica por analogia para a exclusão de um benefício previdenciário de valor mínimo recebido por membro idoso do grupo familiar, o qual também fica excluído do grupo para fins de cálculo da renda familiar per capita. (IUJEF 2007.70.51.006794-0, Turma Regional de Uniformização da 4ª Região, Relatora Jacqueline Michels Bilhalva, D.E. 19/02/2009)

Também é pacífico na jurisprudência federal que a condição de deficiente, para efeito de concessão de benefício assistencial, é verificada quando apurada incapacidade para o trabalho e para a vida independente, podendo esta (a incapacidade para a vida independente) ser medida no aspecto econômico ou físico. Em suma, consolidou a jurisprudência que a pessoa portadora de deficiência, para o fim de concessão de benefício por incapacidade é aquela incapaz de prover o próprio sustento.

Nesse sentido, o teor da súmula 29 da Turma Nacional de Uniformização:

Para os efeitos do art. 20, § 2º, da Lei n. 8.742, de 1993, incapacidade para a vida independente não é só aquela que impede as atividades mais elementares da pessoa, mas também a impossibilita de prover ao próprio sustento. (SÚMULA 29, DJ 13/02/2006, pág. 01043)


Resta saber, então, saber se, por aplicação analógica, é possível, ainda, excluir do cálculo da renda per capita o benefício previdenciário por incapacidade, de valor mínimo, percebido por outro membro não idoso do grupo familiar, seja para o fim de concessão de benefício assistencial a idoso, seja para a concessão de benefício assistencial a deficiente membro da mesma família. E mais, se, como no caso concreto, a simples percepção de benefício por incapacidade total permanente (aposentadoria por invalidez) configura a condição de deficiente, para o fim de exclusão da renda mínima proveniente do benefício previdenciário.

A resposta a ambas as questões há de ser afirmativa. Com efeito, a condição de incapaz total e permanentemente para o trabalho configura, em tese, a condição de deficiente, para o fim de percepção do benefício assistencial. Nos casos, como o presente, em que a renda do benefício por incapacidade é a única existente no grupo familiar, a concessão do benefício assistencial ao beneficiário que eventualmente renunciasse ao benefício previdenciário não impediria que outro membro do grupo familiar também recebesse o mesmo benefício assistencial, mediante exclusão do deferido anteriormente. Não há razão, assim, para que não se exclua do cálculo da renda familiar per capita o benefício por incapacidade de valor mínimo percebido por membro não idoso do grupo familiar, quando a incapacidade que deu origem ao benefício previdenciário pode ser equiparada a deficiência, para o fim de concessão do benefício assistencial.

Impõe-se, assim, uniformizar o entendimento no sentido de que cabe aplicar analogicamente o parágrafo único do art. 34 da Lei nº 10.741, de 2003, para excluir do cálculo da renda per capita, para fins de concessão do benefício assistencial da Lei nº 8.742, de 1993, o benefício previdenciário por incapacidade de valor mínimo percebido por integrante não idoso do grupo familiar.

Como o acórdão recorrido está em confronto com a uniformização proposta, deve ser dado provimento ao incidente, com a devolução dos autos à Turma Recursal de origem, para a devida adequação.

Ante o exposto, voto por conhecer em parte do incidente e, na parte conhecida, dar provimento ao recurso, para uniformizar o entendimento no sentido de que cabe a aplicação analógica do parágrafo único do art. 34 da Lei nº 10.741, de 2003, para excluir do cálculo da renda per capita, para fins de concessão do benefício assistencial da Lei nº 8.742, de 1993, o benefício previdenciário por incapacidade de valor mínimo percebido por integrante não idoso do grupo familiar.

Juíza Federal LUÍSA HICKEL GAMBA

Relatora

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Rio Grande, Rio Grande do Sul, Brazil
Especialista em Direito Previdenciário, pela Universidade de Caxias do Sul - UCS, em parceria com a ESMAFE - Escola da Magistratura Federal, em 2009. Formado em janeiro de 2006, pela FURG - Fundação Universidade do Rio Grande, em direito. Este blog tem o objetivo de divulgar o conteúdo previdenciário de maneira gratuita para que todos possam ter acesso as informações sobre esta matéria.

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