sexta-feira, 1 de março de 2024

Portadora de neoplasia tem direito a benefício

Nesta sexta-feira será visto uma jurisprudência que trata sobre a concessão de benefício previdenciário a requerente portadora de neoplasia. Abaixo segue a decisão para análise dos amigos.



PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO POR INCAPACIDADE. REQUISITOS. AUXÍLIO-DOENÇA. QUALIDADE DE SEGURADO. CARÊNCIA. NEOPLASIA. CORREÇÃO MONETÁRIA. INPC. PARCIAL PROVIMENTO.
1. São quatro os requisitos para a concessão de benefícios por incapacidade: (a) qualidade de segurado; (b) cumprimento da carência; (c) superveniência de moléstia incapacitante para o desenvolvimento de atividade laboral que garanta a subsistência; e (d) caráter permanente da incapacidade (para o caso da aposentadoria por invalidez) ou temporário (para o caso do auxílio-doença).
2. Tratando-se de benefício por incapacidade, o Julgador firma a sua convicção, via de regra, por meio da prova pericial. No entanto, deve considerar, também as condições pessoais do requerente, como a faixa etária, grau de escolaridade, qualificação profissional, natureza da atividade executada ordinariamente, entre outros.
3. No caso, comprovado pelo conjunto probatório a incapacidade laboral da parte autora, decorrente de doença grave (neoplasia maligna de mama), dispensado o requisito da carência.
4. Demonstrado por exames e atestados médicos a manifestação da doença incapacitante em 2018, possível reconhecer que a autora estaria resguardada pela qualidade de segurada ao tempo do início da incapacidade.
5. Sobre as parcelas vencidas, incide INPC e juros moratórios, desde a citação (Súmula 204 do STJ). A partir de 09-12-2021, deve incidir o art. 3º da EC 113/2021, a qual a qual estabelece que, nas discussões e nas condenações que envolvam a Fazenda Pública, independentemente de sua natureza e para fins de atualização monetária, de remuneração do capital e de compensação da mora, inclusive do precatório, haverá a incidência, uma única vez, até o efetivo pagamento, do índice da taxa referencial do Sistema Especial de Liquidação e de Custódia (SELIC), acumulado mensalmente. 
6. Recurso parcialmente provido. 
(TRF4, AC 5006785-79.2021.4.04.9999, DÉCIMA PRIMEIRA TURMA, Relator VICTOR LUIZ DOS SANTOS LAUS, juntado aos autos em 20/10/2023)

ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 11ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, dar parcial provimento ao recurso, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Florianópolis, 11 de outubro de 2023.

RELATÓRIO
​Trata-se de apelação interposta pelo INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS contra sentença proferida nos autos do Procedimento Comum nº 50013551220198210073, a qual julgou parcialmente procedente o pedido da autora para conceder auxílio-doença.

Em suas razões, a parte apelante argumenta, em síntese, que o fato do início da incapacidade indicado pela perícia judicial ser em momento posterior a DER, faz com que a ação deva ser julgada improcedente. Aduz que, ao tempo de início da incapacidade, a autora não estava coberta pela qualidade de segurada. Requer a reforma da sentença para que seja afastado o benefício concedido e, alternativamente, a aplicação do INPC como índice de correção monetária (evento 57, APELAÇÃO1).

A parte apelada apresentou contrarrazões (evento 60, CONTRAZAP1), tendo sido os autos, na sequência, remetidos a este Tribunal.

É o relatório.

VOTO
Inicialmente, destaca-se que o presente processo foi redistribuído no âmbito da 11ª Turma em 10-8-2022, por força da Resolução TRF4 nº 208/2022, e que este Julgador passou a ter efetivo exercício no Colegiado em 12-6-2023.

A sentença ora recorrida foi redigida nas seguintes linhas (evento 52, SENT1):

Vistos, etc.
MARI BEATRIZ LOPES BOGORESKI ajuizou ação contra o INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL – INSS, ambos já qualificados, relatando, em resumo, que, apesar de possuir enfermidade que a impossibilita para a prática laborativa, teve indeferido pelo demandado pedido administrativo para concessão de auxílio-doença. Por tais razões, requereu que fosse determinado ao réu que lhe concedesse benefício por incapacidade, com a condenação ao pagamento das parcelas vencidas e das vincendas. Juntou documentos.
Foi deferido o pedido de gratuidade de justiça e determinada a realização de perícia médica, em consonância com o teor do Ofício-circular nº 057/2016-CGJ (Evento 3).
As partes apresentaram quesitos, tendo sido o laudo médico juntado ao feito (Evento 17). Apresentados quesitos complementares, estes foram respondidos nos Eventos 31 e 42.
O réu apresentou contestação (Evento 21) em que, em resumo, elencou os requisitos para a concessão dos benefícios previdenciários elencados na inicial e disse que as conclusões exaradas no laudo pericial corroboram aquelas já proferidas pelo seu corpo médico anteriormente. Finalizou, com pedido de improcedência.
Houve réplica (Evento 26).
Os litigantes apresentaram manifestação nos Eventos 47 e 49.
Vieram os autos conclusos para sentença.
É o relatório.
Decido.
Trata-se de pedido de concessão de benefício previdenciário por incapacidade laborativa.
Para a concessão de aposentadoria por invalidez, devem estar presentes os seguintes requisitos: a qualidade de segurado, a carência (quando for o caso) e a incapacidade para o trabalho (art. 42 da Lei nº 8.213/91).
Por sua vez, para a concessão de auxílio-doença, devem estar caracterizadas a qualidade de segurado, a carência (quando for o caso) e a incapacidade para o trabalho por mais de 15 (quinze) dias consecutivos (art. 59 e seguintes da Lei nº 8.213/91).
Ainda, o art. 86 da Lei nº 8.213/91 dispõe sobre os requisitos para a concessão do benefício de auxílio-acidente. In verbis:
O auxílio-acidente será concedido, como indenização, ao segurado quando, após consolidação das lesões decorrentes de acidente de qualquer natureza, resultar sequelas que impliquem redução da capacidade para o trabalho que habitualmente exercia.
A controvérsia diz respeito, no presente caso, à capacidade laborativa da parte autora.
No que se refere a esse tópico, conforme se extrai dos laudos médicos carreados ao feito (Eventos 17, 31 e 42), o perito apurou que a parte autora é portadora de “Pós operatório de CA de mama Z 98”, que a incapacita de forma total e temporária para a prática laborativa.
Nesse sentido, assinalo que descabe o acolhimento do argumento deduzido pelo réu no Evento 47 de que a autora não possua qualidade de segurada por não possuir a carência mínima exigida, porquanto se verifica do teor dos laudos e demais documentos médicos que instruem o feito que a demandante foi acometida por reiteradas neoplasias malignas, o que faz incidir o disposto no art. 26, inciso II, da Lei nº 8.213/91, c/c o art. 152, inciso III, alínea “d”, da Instrução Normativa INSS/PRES nº 45, de 06/08/2010.
Por fim, assinalo que o marco inicial do benefício deve ser aquele estabelecido no laudo juntado no Evento 42, qual seja, 28/11/2019.
Em face do exposto, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTES os pedidos formulados por MARI BEATRIZ LOPES BOGORESKI contra o INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL – INSS, para determinar que o réu conceda à autora benefício de auxílio-doença, a contar da data de 28/11/2019, condenando-o ao pagamento das parcelas vencidas e vincendas ao longo da presente demanda. No que se refere à atualização monetária da condenação, assinalo que o Supremo Tribunal Federal, no julgamento proferido do Recurso Extraordinário nº 870947, firmou a tese de que é inconstitucional o art. 1º-F da Lei nº 9.494/97, com a redação dada pela Lei nº 11.960/09, na parte em que determina a atualização monetária das condenações impostas à Fazenda Pública segundo a remuneração básica e juros da caderneta de poupança, por impor restrição desproporcional ao direito de propriedade (art. 5º, inciso XXII, da Constituição Federal). No mesmo julgado, restou consignada a constitucionalidade do mesmo dispositivo legal no que se refere aos juros de mora quando o débito não é oriundo de relação jurídico-tributária. Dessa forma, deverá o valor da condenação ser atualizado pelo IPCA-E e ser acrescido de juros moratórios nos índices da caderneta de poupança, ambos contados do vencimento de cada parcela.
O réu é isento ao pagamento das custas processuais (Lei Estadual nº 14.634/14). Considerando a sucumbência mínima da parte autora, condeno o demandado ao pagamento de honorários advocatícios ao procurador da parte contrária, que estabeleço em 15% sobre o valor das parcelas vencidas até a data da prolação da sentença, conforme teor da Súmulas nº 111 do Superior Tribunal de Justiça.
Tendo em vista os termos da fundamentação da sentença ora proferida e a natureza alimentar da verba postulada, entendo preenchidos os requisitos do fumus boni iuris e periculum in mora, motivo pelo qual antecipo os efeitos da tutela, determinando que o réu conceda imediatamente à demandante o benefício ora deferido.
Sentença não sujeita a reexame necessário.
Publique-se.
Registre-se.
Intimem-se.

Preenchidos os pressupostos de admissibilidade recursal, conheço do recurso interposto e passo à análise do apelo.

I - Mérito

A concessão de benefícios por incapacidade para o exercício de atividades laborais está prevista nos artigos 42 (aposentadoria por invalidez) e 59 (auxílio-doença) da Lei 8.213/91, verbis:

Art. 42. A aposentadoria por invalidez, uma vez cumprida, quando for o caso, a carência exigida, será devida ao segurado que, estando ou não em gozo de auxílio-doença, for considerado incapaz e insusceptível de reabilitação para o exercício de atividade que lhe garanta a subsistência, e ser-lhe-á paga enquanto permanecer nesta condição.
§ 1º A concessão de aposentadoria por invalidez dependerá da verificação da condição de incapacidade mediante exame médico-pericial a cargo da Previdência Social, podendo o segurado, às suas expensas, fazer-se acompanhar de médico de sua confiança.
§ 2º A doença ou lesão de que o segurado já era portador ao filiar-se ao Regime Geral de Previdência Social não lhe conferirá direito à aposentadoria por invalidez, salvo quando a incapacidade sobrevier por motivo de progressão ou agravamento dessa doença ou lesão.
(...)
Art. 59. O auxílio-doença será devido ao segurado que, havendo cumprido, quando for o caso, o período de carência exigido nesta Lei, ficar incapacitado para o seu trabalho ou para a sua atividade habitual por mais de 15 dias consecutivos.

Atualmente tais benefícios são denominados auxílio por incapacidade temporária ou aposentadoria por incapacidade permanente, segundo redação dada pela EC 103/19 e pela MP 1.113/2022.

Para a concessão dos benefícios por incapacidade, são quatro os requisitos:

(a) qualidade de segurado do requerente (artigo 15 da LBPS);
(b) cumprimento da carência de 12 contribuições mensais prevista no artigo 25, I, da Lei 8.213/91 e art. 24, parágrafo único, da LBPS, ou de metade desse prazo para aproveitamento da carência anterior, ex vi do art. 27-A da LBPS;
(c) superveniência de moléstia incapacitante para o desenvolvimento de atividade laboral que garanta a subsistência; e
(d) caráter permanente da incapacidade (para o caso da aposentadoria por invalidez) ou temporário (para o caso do auxílio-doença).

Insta salientar que os benefícios de auxílio-doença e aposentadoria por invalidez são fungíveis, sendo facultado ao julgador e à Administração conceder o mais adequado, de acordo com a incapacidade apresentada, ainda que o pedido tenha sido limitado ao outro, sendo que o deferimento nesses moldes não configura julgamento ultra ou extra petita.

Neste sentido:
PREVIDENCIÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. BENEFÍCIO POR INCAPACIDADE. QUALIDADE DE SEGURADO ESPECIAL CONTROVERTIDA NA INSTRUÇÃO. REABERTURA DA INSTRUÇÃO. NECESSIDADE DE PROVA DOCUMENTAL E TESTEMUNHAL. FUNGIBILIDADE. ESTUDO SOCIAL PARA AVALIAR BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. SENTENÇA ANULADA DE OFÍCIO. 1. Controvertida a qualidade de segurada especial rural da parte autora durante a instrução, indispensável a produção de prova documental e testemunhal para investigar o preenchimento das condições para o deferimento dos benefícios previdenciários por incapacidade. 2. A jurisprudência deste Regional consagrou a fungibilidade dos benefícios previdenciários de auxílio-doença e de aposentadoria por invalidez e do benefício assistencial, uma vez que todos possuem como requisito a redução ou supressão da capacidade laboral. O magistrado deve conceder o benefício adequado à situação fática, ainda que tenha sido formulado pedido diverso, sem incorrer em julgamento extra petita. 3. Sentença anulada, de ofício, para determinar a reabertura da instrução processual para a produção de prova documental e testemunhal, a fim de comprovar o exercício de atividade rural da requerente no período equivalente à carência, bem como a realização de estudo social, para avaliar o direito ao benefício assistencial estabelecido pela Lei nº 8.742/93 (LOAS). (TRF4, APELAÇÃO CÍVEL Nº 5004409-57.2020.4.04.9999, 11ª Turma, Desembargador Federal HERMES SIEDLER DA CONCEIÇÃO JÚNIOR, POR UNANIMIDADE, JUNTADO AOS AUTOS EM 10-11-2022 - grifei)

Ademais, tratando-se de benefício por incapacidade, o Julgador firma a sua convicção, via de regra, por meio da prova pericial. No entanto, deve considerar, também as condições pessoais do requerente, como a faixa etária, grau de escolaridade, qualificação profissional, natureza da atividade executada ordinariamente, entre outros.

Neste sentido:
PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO POR INCAPACIDADE. TERMO INICIAL. CORREÇÃO MONETÁRIA. CUSTAS. TUTELA ESPECÍFICA. 1. Em se tratando de aposentadoria por invalidez ou auxílio-doença, o julgador firma a sua convicção, em regra, por meio da prova pericial, porquanto o profissional da medicina é que possui as melhores condições técnicas para avaliar a existência de incapacidade da parte requerente, classificando-a como parcial ou total e/ou permanente ou temporária. (...)(TRF4, APELAÇÃO CÍVEL Nº 5004748-50.2019.4.04.9999, 5ª Turma, Desembargadora Federal GISELE LEMKE, POR UNANIMIDADE, JUNTADO AOS AUTOS EM 06-5-2019)

Outrossim, dispõe a Lei nº 8.213/91 que a doença ou lesão de que o segurado já era portador ao filiar-se ao Regime Geral de Previdência Social não lhe conferirá direito ao benefício, salvo quando a incapacidade sobrevier por motivo de progressão ou agravamento da doença ou lesão.

Quanto ao período de carência - número mínimo de contribuições mensais indispensáveis para que o segurado faça jus ao benefício - assim estabelece o artigo 25 da Lei de Benefícios da Previdência Social:

Art. 25. A concessão das prestações pecuniárias do Regime Geral de Previdência Social depende dos seguintes períodos de carência:
I - auxílio-doença e aposentadoria por invalidez: 12 contribuições mensais;
(...)

A par disso, importante mencionar que o período de carência é dispensado em caso de acidente (art. 26, II, da Lei n° 8.213/1991) ou das doenças previstas no art. 151 da Lei n. 8.213/91.

Ainda, o artigo 15 da Lei nº 8.213/91 prevê o denominado "período de graça", que se dá na hipótese de cessação do recolhimento das contribuições, permitindo a prorrogação da qualidade de segurado durante um determinado lapso temporal:

Art. 15. Mantém a qualidade de segurado, independentemente de contribuições:
I - sem limite de prazo, quem está em gozo de benefício;
II - até 12 (doze) meses após a cessação das contribuições, o segurado que deixar de exercer atividade remunerada abrangida pela Previdência Social ou estiver suspenso ou licenciado sem remuneração;
III - até 12 (doze) meses após cessar a segregação, o segurado acometido de doença de segregação compulsória;
IV - até 12 (doze) meses após o livramento, o segurado retido ou recluso;
V - até 3 (três) meses após o licenciamento, o segurado incorporado às Forças Armadas para prestar serviço militar;
VI - até 6 (seis) meses após a cessação das contribuições, o segurado facultativo.
1º O prazo do inciso II será prorrogado para até 24 (vinte e quatro) meses se o segurado já tiver pago mais de 120 (cento e vinte) contribuições mensais sem interrupção que acarrete a perda da qualidade de segurado.
2º Os prazos do inciso II ou do § 1º serão acrescidos de 12 (doze) meses para o segurado desempregado, desde que comprovada essa situação pelo registro no órgão próprio do Ministério do Trabalho e da Previdência Social.
3º Durante os prazos deste artigo, o segurado conserva todos os seus direitos perante a Previdência Social.
4º A perda da qualidade de segurado ocorrerá no dia seguinte ao do término do prazo fixado no Plano de Custeio da Seguridade Social para recolhimento da contribuição referente ao mês imediatamente posterior ao do final dos prazos fixados neste artigo e seus parágrafos.

Assim, caso decorrido o "período de graça", que acarreta a perda da qualidade de segurado, deverão ser vertidas novas contribuições para efeito de carência, anteriormente à data da incapacidade.

Considerando-se a evolução legislativa sobre o tema, o número de contribuições a serem feitas para essa finalidade obedece, tendo sempre como parâmetro a data de início da incapacidade (DII), à seguinte variação no tempo:

a) até 27/03/2005, quatro contribuições;
b) de 28/03/2005 a 19/07/2005, doze contribuições;
c) de 20/07/2005 a 07/07/2016, quatro contribuições;
d) de 08/07/2016 a 04/11/2016, doze contribuições;
e) de 05/11/2016 e 05/01/2017, quatro contribuições;
f) de 06/01/2017 e 26/06/2017, doze contribuições;
g) de 27/06/2017 a 17/01/2019, seis contribuições;
h) de 18/01/2019 a 17/06/2019, doze contribuições; e
i) a partir 18/06/2019, seis contribuições.

De início, o fato da perícia judicial ter apontado como termo inicial da incapacidade 28-11-2019, ou seja, momento posterior ao requerimento administrativo indeferido pelo INSS (17-12-2018), não configura razão para o indeferimento da demanda.

Nesse sentido, a jurisprudência desta Corte tem decidido também em casos em que a doença constatada na perícia é diversa daquela que fundamentou o requerimento administrativo, como segue:

PREVIDENCIÁRIO. AÇÃO ORDINÁRIA. AUXÍLIO-DOENÇA. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. REQUISITOS ATENDIDOS. QUALIDADE DE SEGURADO E CARÊNCIA. MATÉRIA INCONTROVERSA. INCAPACIDADE LABORAL TOTAL E DEFINITIVA. DOENÇA DIVERSA. ATO ADMINISTRATIVO. INTERESSE DE AGIR. TUTELA ESPECÍFICA. 1. São três os requisitos para a concessão dos benefícios por incapacidade: 1) a qualidade de segurado; 2) o cumprimento do período de carência de 12 contribuições mensais; 3) a incapacidade para o trabalho, de caráter permanente (aposentadoria por invalidez) ou temporário (auxílio-doença). 2. O cancelamento/cessação ou indeferimento do benefício pelo INSS é suficiente para que o segurado ingresse com a ação judicial, não sendo necessário o exaurimento da via administrativa. 3. O segurado portador de enfermidade que o incapacita definitivamente para a sua atividade habitual, sem chance de recuperação, tem direito à concessão do benefício de aposentadoria por invalidez. 4. O fato de vir a ser constatada patologia diversa posteriormente ao ajuizamento da demanda não impede a concessão do benefício, haja vista que "se, depois da propositura da ação, algum fato constitutivo, modificativo ou extintivo do direito influir no julgamento do mérito, caberá ao juiz tomá-lo em consideração, de ofício ou a requerimento da parte, no momento de proferir a decisão", nos termos do art. 493 do CPC. 5. Determinada a imediata implementação do benefício, valendo-se datutela específica da obrigação de fazer prevista no artigo 461 do CPC/1973, bem como nos artigos 497, 536 e parágrafos e 537, do CPC/2015, independentemente de requerimento expresso por parte do segurado ou beneficiário. (TRF4, AC 5054853-02.2017.4.04.9999, DÉCIMA TURMA, Relator FERNANDO QUADROS DA SILVA, juntado aos autos em 26-4-2021)

PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. INTERESSE DE AGIR. TERMO INICIAL. ÔNUS SUCUMBENCIAIS. 1. A constatação de incapacidade laborativa por doença diversa e/ou superveniente da alegada no requerimento administrativo não afasta o interesse de agir da parte autora. Precedentes. 2. São três os requisitos para a concessão dos benefícios por incapacidade: a) a qualidade de segurado; b) o cumprimento do período de carência de 12 contribuições mensais; c) a incapacidade para o trabalho, de caráter permanente (aposentadoria por invalidez) ou temporária (auxílio-doença). 3. Comprovada a incapacidade total e permanente, com a necessidade de auxílio contínuo de terceiros, a autora faz jus à aposentadoria por invalidez com o adicional de 25%, a partir da data de início da inaptidão laboral constatada pelo perito judicial. 4. Sucumbência recíproca, uma vez que a incapacidade foi reconhecida posteriormente ao ajuizamento da ação e houve nesse período a concessão administrativa do benefício. (TRF4, AC 5012094-18.2020.4.04.9999, DÉCIMA TURMA, Relatora GISELE LEMKE, juntado aos autos em 29-9-2021)

PREVIDENCIÁRIO. INTERESSE PROCESSUAL. INCAPACIDADE SUPERVENIENTE. DOENÇA DIVERSA. POSSIBILIDADE. RESTABELECIMENTO DE BENEFÍCIO. AUXÍLIO-DOENÇA. INCAPACIDADE. COMPROVAÇÃO. TERMO INICIAL. TERMO FINAL. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. MAJORAÇÃO. TUTELA ESPECÍFICA. 1. A constatação de incapacidade laborativa superveniente à data da cessação administrativa ou do ajuizamento da ação não afasta o interesse processual. Precedentes. 2. Não há óbice à concessão do benefício caso verificada inaptidão laboral decorrente de doença diversa da alegada na inicial. Inteligência do art. 493 do CPC. 3. São três os requisitos para a concessão dos benefícios por incapacidade: a) a qualidade de segurado; b) o cumprimento do período de carência de 12 contribuições mensais; c) a incapacidade para o trabalho, de caráter permanente (aposentadoria por invalidez) ou temporária (auxílio-doença). 4. Comprovada a incapacidade laborativa temporária na data do exame pericial, deve ser concedido o auxílio-doença a contar da perícia, com reavaliação administrativa a partir de seis meses da implantação. 5. Embora reconhecido o direito ao benefício em data posterior à requerida na inicial, a parte autora decaiu de parte mínima do pedido, cabendo ao INSS arcar integralmente com os ônus sucumbenciais. 6. Majorados de 10% para 15% os honorários advocatícios sobre a base de cálculo fixada na sentença. 7. Determinado o cumprimento imediato do acórdão no tocante à implantação do benefício concedido ou revisado. (TRF4, AC 5012676-18.2020.4.04.9999, DÉCIMA TURMA, Relatora CLÁUDIA CRISTINA CRISTOFANI, juntado aos autos em 20-10-2021)

Pois bem.

Cinge-se a controvérisa à comprovação da qualidade de segurada da autora ao tempo da incapacidade.

No presente caso, a parte autora, em julho de 2019, ajuizou a ação em busca da concessão de auxílio-doença desde a data do requerimento administrativo em 17-12-2018 (evento 1, INIC1).

Quanto ao estado de saúde da autora, assim concluiu o perito judicial (evento 42, LAUDO1):

3. Havia incapacidade para o exercício das atividades laborais e habituais
entre a data limite indicada pela perícia médica da Previdência Social
(cessação ou indeferimento do beneficio), e a data de realização da perícia
médica judicial?
Incapaz desde 28/11/2019.
4. Acaso existente incapacidade laborativa, esta incapacidade é temporária
ou permanente?
Temporária, com mal prognóstico.
5. Qual o termo inicial da incapacidade diagnosticada?
Incapaz desde 28/11/2019.

Logo, relevante identificar se a autora estava ou não resguardada como segurada ao tempo do início da incapacidade em 28-11-2019.

De rigor há considerar preliminarmente que, da leitura do caderno processual eletrônico, constata-se que a parte autora encontrava-se acometida de doença classificada pelo CID 10 com código C50.9, a saber, Neoplasia Maligna da Mama (câncer). Como tal, a teor do disposto do artigo 26, II, da Lei nº 8.213/91 (LBPS), adiante transcrita:

Art. 26. Independe de carência a concessão das seguintes prestações:
(...)
II - auxílio-doença e aposentadoria por invalidez nos casos de acidente de qualquer natureza ou causa e de doença profissional ou do trabalho, bem como nos casos de segurado que, após filiar-se ao RGPS, for acometido de alguma das doenças e afecções especificadas em lista elaborada pelos Ministérios da Saúde e da Previdência Social, atualizada a cada 3 (três) anos, de acordo com os critérios de estigma, deformação, mutilação, deficiência ou outro fator que lhe confira especificidade e gravidade que mereçam tratamento particularizado;

Logo, não há que se falar em não cumprimento do requisito da carência. Já com relação à qualidade de segurada da autora, o INSS defende que esta teria encerrado em 20-3-2019, meses antes da data de início da incapacidade apontada na perícia judicial.

No ponto, a despeito do perito ter fixado o termo inicial da incapacidade em novembro de 2019, chamo atenção que dos exames juntados pela autora é possível identificar a realização de tratamento contra a nova manifestação do câncer desde 2018 (evento 1, DOC8, evento 1, PRONT9 e evento 1, EXMMED10) .

Nesse contexto, forço-so reconhecer a existência da incapacidade ao tempo em que a autora estava resguardada pela qualidade de segurada, devendo-se manter a sentença.

Consectários legais

Quanto aos consectários legais, o INSS defende que seja aplicado o INPC como critério de atualização monetária, e não o IPCA-E. De fato, tem razão a autarquia federal.

Isso porque, após o julgamento pelo Plenário do Supremo Tribunal Federal, em regime de repercussão geral, do Tema 810 (RE n. 870.947), a que se seguiu o dos respectivos embargos de declaração (que foram rejeitados, tendo sido afirmada a inexistência de modulação de efeitos), deve a atualização monetária obedecer ao Tema 905 do Superior Tribunal de Justiça, que estabelece, para as condenações judiciais de natureza previdenciária, o seguinte:

As condenações impostas à Fazenda Pública de natureza previdenciária sujeitam-se à incidência do INPC, para fins de correção monetária, no que se refere ao período posterior à vigência da Lei 11.430/2006, que incluiu o art. 41-A na Lei 8.213/91.

Assim, a correção monetária das parcelas vencidas dos benefícios previdenciários será calculada conforme a variação dos seguintes índices, que se aplicam conforme a pertinente incidência ao período compreendido na condenação:

- IGP-DI de 05/96 a 03/2006 (art. 10 da Lei n.º 9.711/98, combinado com o art. 20, §§5º e 6º, da Lei n.º 8.880/94);
- INPC a partir de 04/2006 (art. 41-A da lei 8.213/91)

Por outro lado, a partir de 09-12-2021, para fins de atualização monetária e juros de mora, deve ser observada a redação dada ao artigo 3º da EC 113/2021, a qual estabelece que, nas discussões e nas condenações que envolvam a Fazenda Pública, independentemente de sua natureza e para fins de atualização monetária, de remuneração do capital e de compensação da mora, inclusive do precatório, haverá a incidência, uma única vez, até o efetivo pagamento, do índice da taxa referencial do Sistema Especial de Liquidação e de Custódia (SELIC), acumulado mensalmente.

Dessa forma, nesse ponto deve ser provido o recurso.

Tutela Antecipada

Presente a tutela antecipada deferida pelo Juízo a quo, determinando a implantação do benefício, confirmo-a, tornando definitivo o amparo concedido, e, caso ainda não tenha sido implementada, que o seja no prazo de 20 dias.

II - Conclusões
1. Comprovado que a moléstia incapacitante consiste em neoplasia maligna, afasta-se a exigência do cumprimento de carência.

2. Demonstrado por exames e atestados médicos a manifestação da doença incapacitante em 2018, possível reconhecer que a autora estaria resguardada pela qualidade de segurada ao tempo do início da incapacidade.

3. Assiste razão à autarquia com relação ao índice de correção monetária a ser aplicado. Sobre as parcelas vencidas, incide INPC.

III - Honorários Advocatícios
A despeito de reformada a sentença devido ao parcial provimento da apelação da parte ré, considerando-se a sucumbência mínima da parte autora, mantenho os honorários nos termos estabelecidos pela sentença.

IV - Prequestionamento
Em face do disposto nas Súmulas 282 e 356 do Supremo Tribunal Federal e 98 do Superior Tribunal de Justiça, e a fim de viabilizar o acesso às instâncias superiores, explicito que a presente decisão não contraria nem nega vigência às disposições legais/constitucionais prequestionadas pelas partes.

V - Dispositivo
Ante o exposto, voto por dar parcial provimento ao recurso, nos termos da fundamentação.

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Rio Grande, Rio Grande do Sul, Brazil
Especialista em Direito Previdenciário, pela Universidade de Caxias do Sul - UCS, em parceria com a ESMAFE - Escola da Magistratura Federal, em 2009. Formado em janeiro de 2006, pela FURG - Fundação Universidade do Rio Grande, em direito. Este blog tem o objetivo de divulgar o conteúdo previdenciário de maneira gratuita para que todos possam ter acesso as informações sobre esta matéria.

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