sexta-feira, 24 de março de 2023

Acordo do Mercosul permite aposentadoria no Brasil

Nesta sexta-feira será visto uma jurisprudência que trata sobre a utilização de tempo de contribuição no exterior para aposentadoria junto ao INSS conforme o Acordo do Mercosul. Abaixo segue a decisão para análise dos amigos.



EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. CÔMPUTO DO TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO NO EXTERIOR. ACORDO MULTILATERAL DE SEGURIDADE SOCIAL DO MERCOSUL. CERTIDÃO PARA CONTAGEM RECÍPROCA. POSSIBILIDADE.
1. O Decreto 5.722/2006 - que promulgou o “Acordo Multilateral de Seguridade Social do Mercado Comum do Sul e seu Regulamento Administrativo” – estabeleceu que o Instituto Nacional do Seguro Social - INSS é o representante do Brasil na condição de “entidade gestora” e “organismo de ligação” nas questões previdenciárias (Título I, art. 2º, do Regulamento Administrativo).
2. O INSS é responsável por realizar a coordenação e comunicação entre as instituições competentes dos países acordantes, inclusive para troca de documentos e expedição de certidão por tempo de serviço; nessa condição, possui legitimidade exclusiva para figurar no polo passivo da ação em que busca o cumprimento do acordo Multilateral de Seguridade Social do MERCOSUL.
3. O acordo contempla o aproveitamento do tempo de contribuição para fins de concessão de benefícios por velhice, idade avançada, invalidez ou morte.
4. A própria autarquia divulga em seu sítio eletrônico na rede mundial de computadores que: “Os acordos internacionais de Previdência permitem a contagem do tempo de contribuição dos trabalhadores aos sistemas de Previdência Social dos países para a obtenção de benefícios previdenciários como aposentadoria por idade, pensão por morte e aposentadoria por invalidez, além de evitar a bitributação em caso de deslocamento temporário” (www.previdencia.gov.br).
5. A autora juntou certidão emitida pelo Conselho de Educação Secundária da Administração Nacional de Educação Pública (ANEP) da República Oriental do Uruguai que informa sobre seu trabalho como professora na disciplina de Biologia nos períodos de 28/09/1959 a 12/10/1959, de 15/03/1960 a 05/10/1962, de 09/09/1963 a 28/10/1963, de 16/03/1964 a 04/07/1966 e de 01/03/1972 a 28/02/1973 (fls. 33/35).
6. A certidão instruiu o procedimento administrativo através do qual o órgão de ligação do Uruguai “validou” os referidos períodos contributivos, fls. 172 e 200, viabilizando seu aproveitamento para fins previdenciários no Brasil, na forma do Decreto 5.722/2006.
7. O cômputo do tempo de contribuição no exterior no regime próprio previdenciário dos servidores públicos federais deve ser realizado mediante sua inclusão dele na certidão de contagem recíproca, a ser emitida pelo INSS, de sorte a assegurar que não houve aproveitamento no regime geral previdenciário nacional.
8. Relativamente à compensação financeira, caberá à autarquia adotar as medidas necessárias à operacionalização, em função do tempo contributivo e do valor do benefício, socorrendo-se eventualmente de informações a serem requisitadas da UFJF, na forma do Decreto 5.722/2006.
9. As dificuldades operacionais do INSS na execução do acordo não devem prejudicar o gozo dos direitos assegurados à autora por tratado multilateral internacional, devidamente incorporado à legislação pátria.
10. Apelação e remessa não providas.
TRF 1ª, APELAÇÃO CÍVEL N. 0009411-62.2011.4.01.3801/MG, 1ª Câmara Regional Previdenciária de Juiz de Fora/MG, juiz federal relator Ubirajara Teixeira, 17/09/2019.


ACÓRDÃO
Decide a 1ª Câmara Regional Previdenciária de Juiz de Fora/MG, à unanimidade, NEGAR PROVIMENTO à apelação do INSS e à remessa oficial, nos termos do voto do relator.

Brasília, 6 de setembro de 2019.
JUIZ FEDERAL UBIRAJARA TEIXEIRA
RELATOR CONVOCADO

RELATÓRIO
A sentença condenou o Instituto Nacional do Seguro Social – INSS a averbar o tempo de serviço trabalhado por Mirian Lidia Volpe na República Oriental do Uruguai; houve antecipação de tutela para determinar a autarquia à expedição de certidão para fins de contagem recíproca.

O INSS apelou, defendendo a necessidade de concessão de efeito suspensivo ao recurso; nulidade da sentença, pois a União e a UFJF deveriam integrar o polo passivo, por ser a autora servidora pública e a averbação de tempo de serviço servir para totalizar a contagem de tempo de aposentadoria estatutária; os acordos multilaterais de seguridade social do Mercado do Sul não se aproveitam no Regime Próprio da Previdência; não há amparo legal para que o INSS forneça certidão de tempo de serviço; a situação albergada na sentença cria a hipóteses de que o RGPS tenha que indenizar o RPPS, ao qual a autora encontra-se vinculada, enquanto o acordo internacional não prevê mecanismos de transferências de fundos; há necessidade de realizar os recolhimentos previdenciários para fins de emissão de certidão de tempo de serviço.

Houve contrarrazões.

É o relatório.

VOTO
Não configura qualquer nulidade a apreciação do recurso pela Câmara Regional Previdenciária (CRP), que é presidida por desembargador oriundo do Tribunal Regional Federal da 1ª Região e composta por outros juízes de instância inicial, convocados para julgamento pela referida Corte Recursal, nos termos estabelecidos pelo art. 4º da Lei 9.788/1999: “Os Tribunais Regionais Federais poderão, em caráter excepcional e quando o acúmulo de serviço o exigir, convocar Juízes Federais ou Juízes Federais Substitutos, em número equivalente ao de Juízes de cada Tribunal, para auxiliar em Segundo Grau, nos termos de resolução a ser editada pelo Conselho da Justiça Federal”. Esse dispositivo haure fundamento de validade no próprio art. 107, § 3º, da Constituição Federal, segundo o qual: “Os Tribunais Regionais Federais poderão funcionar descentralizadamente, constituindo Câmaras regionais, a fim de assegurar o pleno acesso do jurisdicionado à justiça em todas as fases do processo”. Inexiste, pois, violação a preceitos da LOMAN ou a princípios constitucionais, o que foi chancelado pelo plenário do Supremo Tribunal Federal com repercussão geral:

RECURSO EXTRAORDINÁRIO. PROCESSUAL PENAL. JULGAMENTO DE APELAÇÃO POR TURMA JULGADORA COMPOSTA MAJORITARIAMENTE POR JUÍZES FEDERAIS CONVOCADOS. NULIDADE. INEXISTÊNCIA. OFENSA AO PRINCÍPIO DO JUIZ NATURAL. INOCORRÊNCIA. PRECEDENTES. RECURSO DESPROVIDO. I – Não viola o postulado constitucional do juiz natural o julgamento de apelação por órgão composto majoritariamente por juízes convocados, autorizado no âmbito da Justiça Federal pela Lei 9.788/1999. II – Colegiado constituídos por magistrados togados, integrantes da Justiça Federal, e a quem a distribuição de processos é feita aleatoriamente. III – Julgamentos realizados com estrita observância do princípio da publicidade, bem como do direito ao devido processo legal, à ampla defesa e ao contraditório. IV – Recurso extraordinário desprovido. (RE 597133, Relator(a): Min. RICARDO LEWANDOWSKI, Tribunal Pleno, julgado em 17/11/2010, REPERCUSSÃO GERAL, DJe-065, p. 06/04/2011.

O recurso não merece efeito suspensivo, pois a tutela de urgência concedida na sentença não ostenta caráter irreversível, diante da recente orientação firmada pelo Superior Tribunal de Justiça: “(...) Orientação a ser seguida nos termos do art. 543-C do Código de Processo Civil: a reforma da decisão que antecipa a tutela obriga o autor da ação a devolver os benefícios previdenciários indevidamente recebidos. (STJ - REsp: 1401560 MT 2012/0098530-1, Relator: Ministro SÉRGIO KUKINA, Data de Julgamento: 12/02/2014, S1 - PRIMEIRA SEÇÃO, Data de Publicação: DJe 13/10/2015).

O Decreto 5.722/2006 - que promulgou o “Acordo Multilateral de Seguridade Social do Mercado Comum do Sul e seu Regulamento Administrativo” – estabeleceu que o Instituto Nacional do Seguro Social - INSS é o representante do Brasil na condição de “entidade gestora” e “organismo de ligação” nas questões previdenciárias (Título I, art. 2º, do Regulamento Administrativo).

O INSS é responsável por realizar a coordenação e comunicação entre as instituições competentes dos países acordantes, inclusive para troca de documentos e expedição de certidão por tempo de serviço; nessa condição, possui legitimidade exclusiva para figurar no polo passivo da ação em que busca o cumprimento do acordo Multilateral de Seguridade Social do MERCOSUL.

A autora pretende o reconhecimento do tempo de serviço de 28/09/1959 a 12/10/1959, de 15/03/1960 a 05/10/1962, de 09/09/1963 a 28/10/1963, de 16/03/1964 a 04/07/1966 e de 01/03/1972 a 28/02/1973 prestados na República Oriental do Uruguai, seu país natal, com a expedição de Certidão de Tempo de Serviço pelo Instituto Nacional do Seguro Social - INSS, para fins de aproveitamento no Regime Próprio da Previdência Social, pois é servidora da UFJF.

O Acordo Multilateral de Seguridade Social do MERCOSUL foi integrado ao nosso ordenamento jurídico pelo Decreto Legislativo n.º 451/2001 e pelo Decreto n.º 5.722/2006 da Presidência da República, que assim dispõe no seu artigo 2º:

Artigo 2º
1. Os direitos à Seguridade Social serão reconhecidos aos trabalhadores que prestem ou tenham prestado serviços em quaisquer dos Estados Partes, sendo-lhes reconhecidos, assim como a seus familiares e assemelhados, os mesmos direitos e estando sujeitos às mesmas obrigações que os nacionais de tais Estados Partes com respeito aos especificamente mencionados no presente Acordo.

Na exposição de motivos do Decreto Legislativo nº 451/2001, que aprova o texto do Acordo Multilateral de Seguridade Social do Mercado Comum do Sul e seu Regulamento Administrativo, consta que:

“Por ocasião da XIII da Reunião do Conselho do Mercado Comum, realizada nos dias 14 e 15 de dezembro de 1997, em Montevidéu, os Chanceleres de Argentina, Brasil, Paraguai e Uruguai assinaram o Acordo Multilateral de Seguridade Social do Mercosul.
2. Este instrumento representa um avanço importante da integração no âmbito das políticas públicas da área social, em especial no que se refere ao equacionamento de questões emergentes de natureza previdenciária.
3. O Brasil já mantém acordos bilaterais de previdência social com a Argentina e o Uruguai, firmados, respectivamente, em 1978 e 1980, bem como um acordo de alcance parcial, referente aos trabalhadores de hidrelétrica de Itaipu, firmado com o Paraguai em 1975.”
4. O Acordo Multilateral de Seguridade Social do Mercosul, elaborado com base nesses acordos bilaterais, tem como principal objetivo o estabelecimento de um mecanismo padronizado de coordenação dos sistemas previdenciários no âmbito do Mercosul. Tal coordenação não implica alteração nos respectivos sistemas de previdência, mas permite preservar os direitos adquiridos ou em fase de aquisição por trabalhadores e seus dependentes que se encontrem no território de algum dos países signatários.”

O acordo contempla o aproveitamento do tempo de contribuição para fins de concessão de benefícios por velhice, idade avançada, invalidez ou morte:

Artigo 7º
1. Os períodos de seguro ou contribuição cumpridos nos territórios dos Estados Partes serão considerados, para a concessão das prestações por velhice, idade avançada, invalidez ou morte, na forma e nas condições estabelecidas no Regulamento Administrativo. Este Regulamento Administrativo estabelecerá também os mecanismos de pagamento pro-rata das prestações.

A própria autarquia divulga em seu sítio eletrônico na rede mundial de computadores que: “Os acordos internacionais de Previdência permitem a contagem do tempo de contribuição dos trabalhadores aos sistemas de Previdência Social dos países para a obtenção de benefícios previdenciários como aposentadoria por idade, pensão por morte e aposentadoria por invalidez, além de evitar a bitributação em caso de deslocamento temporário” (www.previdencia.gov.br).

A autora juntou certidão emitida pelo Conselho de Educação Secundária da Administração Nacional de Educação Pública (ANEP) da República Oriental do Uruguai que informa sobre seu trabalho como professora na disciplina de Biologia nos períodos de 28/09/1959 a 12/10/1959, de 15/03/1960 a 05/10/1962, de 09/09/1963 a 28/10/1963, de 16/03/1964 a 04/07/1966 e de 01/03/1972 a 28/02/1973 (fls. 33/35).

A certidão instruiu o procedimento administrativo através do qual o órgão de ligação do Uruguai “validou” os referidos períodos contributivos, fls. 172 e 200, viabilizando seu aproveitamento para fins previdenciários no Brasil, na forma do Decreto 5.722/2006.

ARTIGO 6º
(...)
a) Cada Estado Parte considerará os períodos cumpridos e certificados por outro Estado, desde que não se superponham, como períodos de seguro ou contribuição, conforme sua própria legislação;

ARTIGO 10
1. O Organismo de Ligação do outro Estado preencherá os formulários recebidos cora as seguintes indicações:
a) períodos de seguro ou contribuição creditados ao trabalhador sob sua própria legislação;

O cômputo do tempo de contribuição no exterior no regime próprio previdenciário dos servidores públicos federais deve ser realizado mediante sua inclusão dele na certidão de contagem recíproca, a ser emitida pelo INSS, de sorte a assegurar que não houve aproveitamento no regime geral previdenciário nacional.

Relativamente à compensação financeira, caberá à autarquia adotar as medidas necessárias à operacionalização, em função do tempo contributivo e do valor do benefício, socorrendo-se eventualmente de informações a serem requisitadas da UFJF, na forma do Decreto 5.722/2006:

ARTIGO 7
As prestações a que os trabalhadores, seus familiares e dependentes tenham direito, ao amparo da legislação de cada um dos Estados Partes, serão pagas de acordo com as normas seguintes:
1. Quando se reúnam as condições requeridas pela legislação de um Estado Parte para se ter direito às prestações sem que seja necessário recorrer à totalização de períodos prevista no Título VI do Acordo, a Entidade Gestora calculará a prestação em virtude unicamente do previsto na legislação nacional que se aplique, sem prejuízo da totalização que possa solicitar o beneficiário.
2. Quando o direito a prestações não se origine unicamente com base nos períodos de seguro ou contribuição cumpridos no Estado Contratante de que se trate, a liquidação da prestação deverá ser feita tomando-se em conta a totalização dos períodos de seguro ou contribuição cumpridos nos outros Estados Partes.
3. Caso seja aplicado o parágrafo precedente, a Entidade Gestora determinará, em primeiro lugar, o valor da prestação a que o interessado ou seus familiares e assemelhados teriam direito como se os períodos totalizados tivessem sido cumpridos sob sua própria legislação e, em seguida, fixará o valor da prestação em proporção aos períodos cumpridos exclusivamente sob tal legislação.

ARTIGO 11
1. As Entidades Gestoras dos Estados Partes pagarão as prestações pecuniárias em moeda de seu próprio país.
2. As Entidades Gestoras dos Estados Partes estabelecerão mecanismos de transferências de fundos para o pagamento das prestações pecuniárias do trabalhador ou de seus familiares ou assemelhados que residam no território de outro Estado.

As dificuldades operacionais do INSS na execução do acordo não devem prejudicar o gozo dos direitos assegurados à autora por tratado multilateral internacional, devidamente incorporado à legislação pátria:

ADMINISTRATIVO. SERVIDOR CIVIL. ESTRANGEIRO. AVERBAÇÃO DE TEMPO DE SERVIÇO PARA FINS DE APOSENTADORIA NO BRASIL. ATIVIDADES DESENVOLVIDAS NA REPÚBLICA ARGENTINA. RECONHECIMENTO. PAÍSES INTEGRANTES DO MERCOSUL. O estrangeiro, residente no Brasil, tem direito ao reconhecimento de tempo de serviço prestado em países integrantes do MERCOSUL, para fins de certificação pelo INSS e averbação no órgão competente. Precedentes. (TRF4, APELREEX 5040986-25.2011.4.04.7000, QUARTA TURMA, Relatora VIVIAN JOSETE PANTALEÃO CAMINHA, juntado aos autos em 03/02/2015)

ADMINISTRATIVO. SERVIDOR PÚBLICO CIVIL. AVERBAÇÃO DO TEMPO DE SERVIÇO PRESTADO NO EXTERIOR PARA FINS DE APOSENTADORIA NO BRASIL. REPÚBLICA ARGENTINA. ACORDO MULTILATERAL DE SEGURIDADE SOCIAL. RECONHECIMENTO. 1. Nos termos do Acordo Multilateral entre os países do Mercosul, cabível o pedido de averbação de período laboral cumprido no exterior. 2. À luz do previsto no Acordo, o reconhecimento do referido tempo de serviço prestado na Argentina deve ser por ela efetuado, conforme a legislação daquele país. Na mesma linha, aliás, nas hipóteses de contagem recíproca de tempo de serviço por servidor público, compete ao INSS a expedição de certidão de reconhecimento da contagem de tempo do período pleiteado. 3. Não se estabeleceu, contudo, a necessidade de que também na República da Argentina fosse prevista a concessão de benefício previdenciário por tempo de serviço. 4. Apelações e remessa oficial improvidas. (TRF4 5020169-95.2015.4.04.7000, TERCEIRA TURMA, Relator FERNANDO QUADROS DA SILVA, juntado aos autos em 09/02/2017)

Pelo exposto, NEGO PROVIMENTO à apelação e à remessa oficial.

É como voto.

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Rio Grande, Rio Grande do Sul, Brazil
Especialista em Direito Previdenciário, pela Universidade de Caxias do Sul - UCS, em parceria com a ESMAFE - Escola da Magistratura Federal, em 2009. Formado em janeiro de 2006, pela FURG - Fundação Universidade do Rio Grande, em direito. Este blog tem o objetivo de divulgar o conteúdo previdenciário de maneira gratuita para que todos possam ter acesso as informações sobre esta matéria.

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