sexta-feira, 18 de novembro de 2022

Decisão trata sobre o conceito de pessoa com deficiência

Nesta sexta-feira será visto uma decisão da Turma Nacional de Uniformização representativa de controvérsia que gerou o tema 173 com a seguinte redação "Para fins de concessão do benefício assistencial de prestação continuada, o conceito de pessoa com deficiência, que não se confunde necessariamente com situação de incapacidade laborativa, exige a configuração de impedimento de longo prazo com duração mínima de 2 (dois) anos, a ser aferido no caso concreto, desde o início do impedimento até a data prevista para a sua cessação (tese alterada em sede de embargos de declaração)." Abaixo segue a decisão para análise dos amigos.


EMENTA
PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. ALEGAÇÃO DE OMISSÃO E OBSCURIDADE. PEDIDO DE UNIFORMIZAÇÃO DE INTERPRETAÇÃO DE LEI FEDERAL. INCIDENTE REPRESENTATIVO DA CONTROVÉRSIA (TEMA 173). SEGURIDADE SOCIAL - BENEFÍCIO ASSISTENCIAL À PESSOA COM DEFICIÊNCIA - IMPEDIMENTO DE LONGO PRAZO - LEI N. 12.470/11. EMBARGOS DA PARTE AUTORA ACOLHIDOS, SEM EFEITOS INFRINGENTES. EMBARGOS DO IBDP ACOLHIDOS EM PARTE, SEM EFEITOS INFRINGENTES, PARA SANAR DÚVIDA A RESPEITO DA EXPRESSÃO “INÍCIO DA SUA CARACTERIZAÇÃO”. ALTERAÇÃO DA REDAÇÃO DA TESE PELO COLEGIADO: “PARA FINS DE CONCESSÃO DO BENEFÍCIO ASSISTENCIAL DE PRESTAÇÃO CONTINUADA, O CONCEITO DE PESSOA COM DEFICIÊNCIA, QUE NÃO SE CONFUNDE NECESSARIAMENTE COM SITUAÇÃO DE INCAPACIDADE LABORATIVA, EXIGE A CONFIGURAÇÃO DE IMPEDIMENTO DE LONGO PRAZO COM DURAÇÃO MÍNIMA DE 2 (DOIS) ANOS, A SER AFERIDO NO CASO CONCRETO, DESDE O INÍCIO DO IMPEDIMENTO ATÉ A DATA PREVISTA PARA A SUA CESSAÇÃO”.
TNU, PEDIDO DE UNIFORMIZAÇÃO DE INTERPRETAÇÃO DE LEI (TURMA) Nº 0073261-97.2014.4.03.6301/SP, relator juiz federal Sérgio de Abreu Brito, 25/04/2019.


ACÓRDÃO
A Turma Nacional de Uniformização decidiu, por unanimidade CONHECER e DAR PARCIAL PROVIMENTO AOS EMBARGOS DE DECLARAÇÃO opostos pelo IBDP, e quanto aos embargos de declaração opostos pela parte autora CONHECER e LHE DAR PARCIAL PROVIMENTO, nos termos do voto do Juiz Relator. Quanto à tese fixada no tema 173 da TNU, a Turma, por unanimidade, decidiu alterar a redação, a saber: "Para fins de concessão do benefício assistencial de prestação continuada, o conceito de pessoa com deficiência, que não se confunde necessariamente com situação de incapacidade laborativa, exige a configuração de impedimento de longo prazo com duração mínima de 2 (dois) anos, a ser aferido no caso concreto, desde o início do impedimento até a data prevista para a sua cessação". Em questão de ordem, por proposta do Juiz Relator Sérgio de Abreu Brito, a Turma, por unanimidade, alterou o Enunciado da Súmula n. 48/TNU, ficando com a mesma redação da tese fixada no tema 173.

Brasília, 25 de abril de 2019.


VOTO, juiz federal Sergio de Abreu Brito
RETIFICAÇÃO PARCIAL DO VOTO ANTERIOR:
1. Depois de ler de forma atenta o voto do Juiz Federal FÁBIO SOUZA e refletindo um pouco melhor sobre os conceitos básicos da Linguística de significado e significante (significante é o símbolo, o signo, a palavra escrita e o significado é o sentido, a ideia que o primeiro transmite), verifico que realmente poderão surgir dúvidas sobre o real significado da expressão “início da sua caracterização” contido na tese em apreço (TEMA 173), fixada por esse Colegiado.

2. Em que pese o meu entendimento de que o sentido desta expressão se refira ao início da existência do impedimento e não o momento da sua constatação pelo perito, com escopo de sanar qualquer dúvida, concluo ser prudente a alteração da expressão supracitada na tese.

3. Destaco que não existe divergência propriamente de sentido - de significado, pois, conforme registrei no item 11 do meu voto (evento n. 159), minhas conclusões estão em perfeita consonância com o voto-vista do Juiz Federal FÁBIO SOUZA. Confira-se:

"11. Entretanto, por amor ao debate, insta registrar que o impedimento deve ser computado desde o seu início até a data prevista, na perícia judicial, para o seu término (prazo estimado pelo auxiliar do juízo). Enfim, deve-se aferir o tempo total de impedimento desde o início da sua caracterização, somando-se com o prazo futuro estimado na perícia judicial. Assim, leva-se em conta não só o lapso temporal de impedimento até a perícia judicial mas também o período futuro estimado pela prova pericial".

4. Enfim, a dissonância ocorre tão somente sobre o termo mais adequado a ser utilizado na tese do tema representativo da controvérsia. Assim, por cautela, convém alterar a redação da tese, para que se afaste qualquer dúvida na sua interpretação, retificando meu voto anterior neste ponto, aderindo aos fundamentos do voto-vista.

5. Desta feita, em busca de maior clareza, proponho a alteração da redação da tese fixada no tema 173 da TNU, a fim de que passe a adotar a seguinte redação: “para fins de concessão do benefício assistencial de prestação continuada, o conceito de pessoa com deficiência, que não se confunde necessariamente com situação de incapacidade laborativa, exige a configuração de impedimento de longo prazo com duração mínima de 2 (dois) anos, a ser aferido no caso concreto, desde o início do impedimento até a data prevista para a sua cessação”.

6. Ante o exposto, voto no sentido de: (i) CONHECER e DAR PARCIAL PROVIMENTO AOS EMBARGOS DE DECLARAÇÃO interpostos pelo Instituto Brasileiro de Direito Previdenciário (IBDP), a fim de sanar obscuridade no julgamento do PEDILEF, esclarecendo que, na análise da deficiência, para a apuração do “longo prazo”, deve ser computado o período inserido entre a data de início do impedimento e a data prevista para a sua cessação; (ii) CONHECER e DAR PARCIAL PROVIMENTO AOS EMBARGOS DE DECLARAÇÃO interpostos pela parte autora, por meio da Defensoria Pública da União, apenas para esclarecer a inexistência de violação a princípio da vedação do retrocesso; e (iii) propor nova redação da tese fixada no tema 173 da TNU nos termos supracitados. No mais, mantenho a integralidade dos fundamentos do meu voto anterior (evento n. 159). Por fim, suscito questão de ordem para alteração da redação do enunciado n. 48 da Súmula deste Colegiado, para os termos da nova tese aprovada no presente representativo de controvérsia.


VOTO DIVERGENTE, juiz federal Fábio Souza
1. No julgamento do PEDILEF 0073261-97.2014.4.03.6301/SP, representativo de controvérsia (tema 173), foi fixada na seguinte tese:
para fins de concessão do benefício assistencial de prestação continuada, o conceito de pessoa com deficiência, que não se confunde necessariamente com situação de incapacidade laborativa, é imprescindível a configuração de impedimento de longo prazo com duração mínima de 2 (dois) anos, a ser aferido no caso concreto, desde a data do início da sua caracterização

2. O Instituto Brasileiro de Direito Previdenciário interpôs embargos de declaração, requerendo esclarecimento do conteúdo da expressão “desde a data do início da sua caracterização” e exclusão do termo “necessariamente”.

3. Em relação ao primeiro ponto, os embargos alegam que a forma como foi redigida a tese dá margem a dúvidas em relação ao significado da expressão “desde a data do início da sua caracterização”. Assim, requer o amicus curiae, seja aclarado o conteúdo da expressão, indicando se quer dizer “o começo do aparecimento do impedimento de longa duração, bem como se o prazo de dois anos pode considerar períodos posteriores ao requerimento administrativo do benefício de prestação continuada, mas que, no total, perfaça-se o biênio requerido pela legislação”.

4. O INSS, em suas contrarrazões, também sustenta a necessidade do esclarecimento requerido pelo IBDP, afirmando que “a expressão ‘desde a data da sua caracterização’ não pode ser jungida ao começo do aparecimento do impedimento de longa duração ou contar períodos anteriores e posteriores à data do requerimento do benefício e passamos a explicar o porquê. A autarquia previdenciária entende que o prazo de 2 anos deve ser contado da avaliação realizada pela perícia e, neste sentido, prospectiva do tempo de impedimento”.

5. Tanto o IBDP, quanto o INSS manifestam dúvidas sobre o significado que esta Turma Nacional de Uniformização atribui ao termo “data de início de sua caracterização”. A visão antagônica apresentada pelos atores processuais já fornece um forte indício de que há obscuridade na decisão.

6. No voto vencedor, que deu origem à tese do tema 173, a questão é analisada nos seguintes termos:
Todavia, em que pese a não exigência de impedimento de natureza permanente, para fins de concessão do benefício à pessoa com deficiência, esse impedimento deve produzir efeitos pelo prazo mínimo de 2 (dois) anos. Insta destacar que, para apuração do lapso temporal deste impedimento, sua duração deve ser contada desde a data do início da sua caracterização, nos termos da conclusão da perícia judicial.

7. De fato, a expressão “caracterização” tem caráter dúbio e tem o potencial de gerar controvérsia a respeito de parte estratégica da tese firmada, o que vai de encontro com o objetivo uniformizador desta Turma Nacional. Afinal, a tese deveria fornecer resposta segura sobre quando está “caracterizado” o impedimento: no momento do seu surgimento ou quando constatado pela perícia?

8. Em que pese a TNU ter solucionado o caso concreto levando em consideração a data de início do impedimento e a projeção de sua duração, o raciocínio não ficou claro na tese ao final aprovada.

9. Desse modo, reconheço a existência de obscuridade e passo a esclarecer o significado da expressão questionada.

10. No caso concreto, a Turma Recursal de São Paulo considerou que, no caso concreto, a prova pericial afastou a existência de impedimento de longo prazo, confirmando a sentença de improcedência, a qual, por sua vez, baseou-se no fato de a perícia indicar o período de 180 dias para a recuperação do postulante. Nota-se que a perícia foi realizada em 10/12/2014 e informou que o início da “incapacidade” se deu em 31/01/2014. Indagado o perito sobre o prazo estimado para reavaliar a capacidade laborativa, respondeu: 180 (cento e oitenta) dias (evento 27). Assim, entre a data do surgimento do impedimento e o momento previsto para sua cessação não decorreu o período de 2 anos, motivo pelo qual não se configurou o impedimento de longo prazo.

11. Em seu voto nos embargos de declaração, o MM Juiz Federal Relator esclarece que “deve-se aferir o tempo total de impedimento desde o início da sua caracterização, somando-se com o prazo futuro estimado na perícia judicial” (evento 159). Esse é o sentido da tese firmada no tema 173 dos representativos de controvérsia desta Turma Nacional.

12. A deficiência exige um impedimento de longo prazo. O tempo de impedimento existente no momento do requerimento do benefício deve ser computado, sob pena de se criar situações em que uma pessoa com deficiência há vários anos não terá cobertura da Assistência Social porque há prognóstico para sua recuperação em período inferior a 2 anos contados da perícia.

13. A solução defendida pelo INSS provocaria a exclusão da proteção assistencial a pessoas com deficiência, em evidente afronta ao art. 203, V da Constituição e ao art. 20 da Lei 8.742/93. Em outras palavras, pessoas com impedimentos de longo prazo que, associados a barreiras, vivenciam situação de desigualdade de oportunidades de participação plena na vida social, deixariam de receber o benefício de prestação continuada, mesmo diante de sua deficiência.

14. Logo, é importante esclarecer que a expressão “início da sua caracterização” significa “surgimento do impedimento”.

15. Por outro lado, como reconhecido pelo próprio INSS, o período de 2 anos pode incluir uma avaliação prospectiva, que projeta para o futuro o momento de possível cessação do impedimento. Tal assertiva é confirmada pelo § 6º, do art. 16, do Decreto 6.214/2007, com redação dada pelo Decreto 9.642/2018, que trabalha com a ideia de “previsão da duração do impedimento”, demonstrando que o prognóstico deve ser considerado na avaliação do impedimento.

16. Desse modo, para a aquisição do direito ao benefício de prestação continuada não é necessário o transcurso de 2 anos até a data do requerimento, uma vez que a caraterização do longo prazo deve incluir o tempo previsto para a duração do impedimento.

17. Em resumo, como conclusão deste tópico, a obscuridade apontada deve ser sanada por meio do seguinte esclarecimento: para a apuração do “longo prazo”, deve ser computado o período inserido entre a data de início do impedimento e a data prevista para a sua cessação.

18. Quanto à utilização da expressão “necessariamente”, o IBDP afirma que o termo pode gerar dúvidas, pois daria margem à interpretação de que, em alguns casos, seria necessária a configuração da incapacidade laborativa, para fins de concessão do benefício.

19. Nesse ponto não tem razão o IBDP. A tese – assim como o voto que a fundamenta – deixa claro que os conceitos de deficiência e incapacidade não se confundem. Evidentemente, em algumas hipóteses, a pessoa com deficiência será também inválida. Esse é o motivo pelo qual a TNU utilizou a expressão questionada.

20. Por isso, neste ponto, acompanho o voto do MM Juiz Federal Relator.

21. Por fim, no que se refere aos embargos de declaração interpostos pela parte autora, por intermédio da Defensoria Pública da União, também adiro às razões lançadas no voto do Relator, a fim de afirmar a inexistência de retrocesso social na delimitação do prazo de 2 anos para a configuração da deficiência.

22. Em busca de maior clareza e da redução de divergências, proponho a alteração da redação da tese fixada no tema 173 da TNU, bem como do enunciado 48 da súmula da jurisprudência dominante na TNU, a fim de que passem a adotar a seguinte redação:
para fins de concessão do benefício assistencial de prestação continuada, o conceito de pessoa com deficiência, que não se confunde necessariamente com situação de incapacidade laborativa, exige a configuração de impedimento de longo prazo com duração mínima de 2 (dois) anos, a ser aferido no caso concreto, desde o início do impedimento até a data prevista para a sua cessação.

23. Isto posto, voto por CONHECER e DAR PARCIAL PROVIMENTO AOS EMBARGOS DE DECLARAÇÃO interpostos pelo Instituto Brasileiro de Direito Previdenciário (IBDP), a fim de sanar obscuridade no julgamento do PEDILEF, esclarecendo que, na análise da deficiência, para a apuração do “longo prazo”, deve ser computado o período inserido entre a data de início do impedimento e a data prevista para a sua cessação. Outrossim, acompanhando o MM Juiz Federal Relator, voto por CONHECER e DAR PARCIAL PROVIMENTO AOS EMBARGOS DE DECLARAÇÃO interpostos pela parte autora, por meio da Defensoria Pública da União, apenas para esclarecer a inexistência de violação a princípio da vedação do retrocesso.

VOTO, juiz federal Sergio de Abreu Brito
PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. ALEGAÇÃO DE OMISSÃO E OBSCURIDADE. PEDIDO DE UNIFORMIZAÇÃO DE INTERPRETAÇÃO DE LEI FEDERAL. INCIDENTE REPRESENTATIVO DA CONTROVÉRSIA (TEMA 173). SEGURIDADE SOCIAL - BENEFÍCIO ASSISTENCIAL À PESSOA COM DEFICIÊNCIA - IMPEDIMENTO DE LONGO PRAZO - LEI N. 12.470/11. EMBARGOS DA PARTE AUTORA ACOLHIDOS, SEM EFEITOS INFRINGENTES. EMBARGOS DO IBDP REJEITADOS.

1. Trata-se de embargos de declaração opostos pela parte autora e pelo Instituto Brasileiro de Direito Previdenciário (IBDP) em face de acórdão desta Turma Nacional de Uniformização (evento n. 139) que conheceu do incidente de uniformização e negou-lhe provimento, fixando a seguinte tese representativa da controvérsia (TEMA 173): “para fins de concessão do benefício assistencial de prestação continuada, o conceito de pessoa com deficiência, que não se confunde necessariamente com situação de incapacidade laborativa, é imprescindível a configuração de impedimento de longo prazo com duração mínima de 2 (dois) anos, a ser aferido no caso concreto, desde a data do início da sua caracterização”.

2. Aduz a parte autora, em síntese, que este Colegiado deixou de analisar a alegação –trazida nas razões recursais –relacionada à previsão de vedação de retrocesso contida no Artigo 4.4 Convenção de Nova Iorque sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência e seu Protocolo Facultativo.

3. Por sua vez, o IBDP asseverou que há necessidade de se sanar pontos obscuros no acórdão embargado. Primeiro, saber-se como deve ser entendida a expressão “desde a data de sua caracterização”, quando a TNU fixa a tese de que: “Para fins de concessão do benefício assistencial de prestação continuada, o conceito de pessoa com deficiência, que não se confunde necessariamente com situação de incapacidade laborativa, é imprescindível a configuração de impedimento de longo prazo com duração mínima de 2 (dois) anos, a ser aferido no caso concreto, desde a data do início sua caracterização”. Questiona se a duração mínima de 2 (dois) anos já deve estar configurada, se já deve estar comprovada ou ser aferida na perícia a existência pretérita desse período ou se poderá ser projetada, de acordo com a perícia e documentos juntados. Além disso, entende haver contradição entre a fixação de um prazo de deficiência (impedimento de longo prazo) com a expressão “que não se confunde necessariamente com situação de incapacidade laborativa” uma vez que ao conter o termo “necessariamente” pode ensejar a intepretação de que em alguns casos seria necessário (e em outros não). Desse modo, entende mais adequado excluir-se o termo “necessariamente”.

4. Nos termos do art. 48 da Lei n. 9.099/95 c/c art. 1.022 do NCPC, cabem embargos de declaração contra qualquer decisão judicial para: I - esclarecer obscuridade ou eliminar contradição; II - suprir omissão de ponto ou questão sobre o qual devia se pronunciar o juiz de ofício ou a requerimento; III - corrigir erro material. Parágrafo único. Considera-se omissa a decisão que deixe de se manifestar sobre tese firmada em julgamento de casos repetitivos ou em incidente de assunção de competência aplicável ao caso sob julgamento; ou incorra em qualquer das condutas descritas no art. 489, § 1º, do NCPC.

5. No tocante aos embargos da parte autora, verifico que, de fato, não fora enfrentada de forma expressa a alegação de proibição de retrocesso, previsto no art. 4.4 da Convenção Internacional sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência. Razão pela qual os embargos devem ser acolhidos, para que o tema seja abordado de forma direta.

6. Como registrado, no voto condutor, de minha lavra:
"8. Cumpre destacar que, na sua redação original, a Lei n. 8.742/1993, em seu art. 20, § 2o, fixou que: "Para efeito de concessão deste benefício, a pessoa portadora de deficiência é aquela incapacitada para a vida independente e para o trabalho".
9. Entretanto, esse conceito estava em dissonância com a Convenção Internacional sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência (Convenção de Nova York) de 6 de dezembro de 2006, a qual foi promulgada pelo Decreto n. 6.949, de 25 de agosto de 2009. A aludida convenção dispõe, em seu artigo 1, que "pessoas com deficiência são aquelas que têm impedimentos de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, os quais, em interação com diversas barreiras, podem obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdades de condições com as demais pessoas."
10. O legislador ordinário, por meio da Lei n. 12.470, de 31/08/2011, promoveu a alteração do conceito de pessoa com deficiência contido na LOAS, fixando o seguinte: "Para efeito de concessão deste benefício, considera-se pessoa com deficiência aquela que tem impedimentos de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, os quais, em interação com diversas barreiras, podem obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas" (Lei n. 8.742/1993, art. 20, § 2o). Além disso, o referido veículo normativo incluiu o § 10 ao citado art. 20 da Lei n. 8.742/1993, trazendo a seguinte definição "Considera-se impedimento de longo prazo, para os fins do § 2o deste artigo, aquele que produza efeitos pelo prazo mínimo de 2 (dois) anos".
11. Por fim, a Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência (Estatuto da Pessoa com Deficiência), Lei n. 13.146, de 06 de julho de 2015, deu nova redação ao § 2o do supracitado art. 20 da LOAS: "Para efeito de concessão do benefício de prestação continuada, considera-se pessoa com deficiência aquela que tem impedimento de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, o qual, em interação com uma ou mais barreiras, pode obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas"."

7. No caso em exame, inexistiu qualquer retrocesso porque o legislador pátrio apenas ajustou o conceito de pessoa com deficiência para aquele contido na Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência. Antes, a concessão do benefício se dava somente para as pessoas com incapacidade laborativa, o que estava em completa dissonância com o conceito trazido pelo artigo 1 daquela convenção: "pessoas com deficiência são aquelas que têm impedimentos de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, os quais, em interação com diversas barreiras, podem obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdades de condições com as demais pessoas."

8. Destarte, devem ser acolhidos os embargos de declaração da parte autora, sem efeitos infringentes, tão somente para afastar a omissão supracitada.

9. Passo à analise dos embargos do IBDP.

10. De início, quanto à alegação de obscuridade na fixação da tese, mais precisamente no significado da expressão "desde a data do início sua caracterização", não vislumbro qualquer obscuridade.

11. Entretanto, por amor ao debate, insta registrar que o impedimento deve ser computado desde o seu início até a data prevista, na perícia judicial, para o seu término (prazo estimado pelo auxiliar do juízo). Enfim, deve-se aferir o tempo total de impedimento desde o início da sua caracterização, somando-se com o prazo futuro estimado na perícia judicial. Assim, leva-se em conta não só o lapso temporal de impedimento até a perícia judicial mas também o período futuro estimado pela prova pericial.

12. Por fim, com relação à expressão "necessariamente", contida na tese fixada, destaco que sua utilização não leva à qualquer exigência de que para se configurar a situação de deficiência se faz necessária a prova da incapacidade. Ao contrário, com base no conceito de deficiência contido na Convenção de Nova York e na lei ordinária, procurou-se deixar claro que esses conceitos não se confundem, porém, em casos particulares, existe uma zona de interseção entre as duas condições, quando o indivíduo encontra-se ao mesmo tempo em situação de deficiência e de incapacidade laborativa. A explicação deste ponto foi consignada no item 13 do voto. Confira-se:

"13. Como se vê, sob o prisma da Convenção Internacional sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, o conceito de pessoa portadora de deficiência não se confunde necessariamente com pessoa incapacitada para a vida independente e para o trabalho. Nesse sentido, existem pessoas com deficiência com capacidade laborativa, inclusive inseridas no mercado de trabalho. Aliás, o próprio ordenamento jurídico pátrio prevê a reserva de vagas para pessoas com deficiência tanto no setor público (CF/88, art. 37, VIII) quanto no setor privado (Lei n. 8.213/91, art. 93). Por outro lado, também há pessoas com incapacidade laborativa que não se enquadram no conceito de pessoas com deficiência. Por fim, existe uma zona de interseção no campo de abrangência destes dois grupos de indivíduos, ou seja, existem pessoas com deficiência e também com incapacidade laborativa."

13. Assim sendo, não devem ser acolhidos os embargos do IBDP.

14. Ante o exposto, voto por: (i) acolher os embargos de declaração formulado pela parte autora, sem efeitos infringentes; e (ii) rejeitar os embargos opostos pelo Instituto Brasileiro de Direito Previdenciário (IBDP).

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Rio Grande, Rio Grande do Sul, Brazil
Especialista em Direito Previdenciário, pela Universidade de Caxias do Sul - UCS, em parceria com a ESMAFE - Escola da Magistratura Federal, em 2009. Formado em janeiro de 2006, pela FURG - Fundação Universidade do Rio Grande, em direito. Este blog tem o objetivo de divulgar o conteúdo previdenciário de maneira gratuita para que todos possam ter acesso as informações sobre esta matéria.

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