sexta-feira, 11 de novembro de 2022

Decisão trata sobre o benefício de auxílio-doença e os prazos de carência

Nesta sexta-feira será visto uma decisão da Turma Nacional de Uniformização representativa de controvérsia que gerou o tema 176 com a seguinte redação "Constatado que a incapacidade do(a) segurado(a) do Regime Geral da Previdência Social (RGPS) ocorreu ao tempo da vigência das Medidas Provisórias 739/2016 e 767/2017, aplicam-se as novas regras de carência nelas previstas." Abaixo segue a decisão para análise dos amigos.


EMENTA
REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. PREVIDENCIÁRIO. CONCESSÃO DE AUXÍLIO-DOENÇA. APLICAÇÃO DOS NOVOS PRAZOS DE CARÊNCIA PREVISTOS NAS MEDIDAS PROVISÓRIAS 739/2016 E 767/2017. TURMA RECURSAL DEU CARÁTER ULTRATIVO À REGRA DO PARÁGRAO ÚNICO DO ART. 24 DA LEI Nº 8213/91, OU SEJA, HAVENDO PERDA DA QUALIDADE DE SEGURADO(A), SE ESTE(A), APÓS RECUPERÁ-LA, RECOLHEU UM TERÇO DO NÚMERO DE CONTRIBUIÇÕES EQUIVALENTES À CARÊNCIA (12 CONTRIBUIÇÕES) ANTES DA VIGÊNCIA DAS REFERIDAS MEDIDAS PROVISÓRIAS, CONSIDERA-SE CUMPRIDA A CARÊNCIA. OFENSA AO PRINCÍPIO TEMPUS REGIT ACTUM. JURISPRUDÊNCIA CONSOLIDADA NO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL E NO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. NÃO SE PODE DISSOCIAR AS REGRAS DE CARÊNCIA DA LEGISLAÇÃO VIGENTE À ÉPOCA DA OCORRÊNCIA DO EVENTO QUE DÁ ORIGEM AO BENEFÍCIO. INCIDENTE CONHECIDO E PROVIDO.
TNU, PEDIDO DE UNIFORMIZAÇÃO DE INTERPRETAÇÃO DE LEI (TURMA) Nº 5001792-09.2017.4.04.7129/RS, relator juiz federal Guilherme Bollorini Pereira, 20/08/2018.

ACÓRDÃO
A Turma Nacional de Uniformização, por maioria, decidiu DAR PROVIMENTO ao incidente de uniformização, nos termos do voto do Juiz Relator. Vencido o Juiz Federal Sérgio Brito que negava provimento ao incidente. O feito foi julgado como representativo da controvérsia (Tema 176).

São Paulo, 17 de agosto de 2018.

RELATÓRIO
Trata-se de pedido de uniformização interposto pelo INSS (evento 60) - afetado como Representativo de Controvérsia (Tema 176) - em face do seguinte julgado da 4ª Turma Recursal do Rio Grande do Sul:

Trata-se de recurso inominado interposto pela parte autora contra sentença que julgou improcedente o pedido de benefício por incapacidade, uma vez que não teria sido comprovada incapacidade atual e no período de incapacidade pretérita indicada pelo perito (03 a 06/2017) não teria sida cumprida a carência exigida.
Sustenta a recorrente que faz jus ao benefício no período de 03 a 06/2017 por ter cumprido a carência conforme preceitua o art. 24, § único, da Lei 8.213/91, definitivamente revogado apenas com a Lei 13.457/17.
Passo a decidir.
A sentença ora atacada indeferiu os pedidos nos seguintes termos:
No caso dos autos, determinada a realização de perícia médica judicial, para aferir a incapacidade da Parte Autora, adveio laudo (LAUDO1, evento 21) em que se concluiu que ela se encontra apta ao trabalho. Entretanto, consignou a perita que a Autora esteve incapaz no período compreendido entre março e junho de 2017. De plano, constato que a Parte Demandante não faz jus à concessão de aposentadoria por invalidez ou mesmo à implantação de auxílio-doença, tendo em vista que a perícia médica concluiu que não há incapacidade atual para o trabalho. Entretanto, considerando-se o reconhecimento de incapacidade em período anterior, resta verificar se em tal momento a Parte Autora preenchia os demais requisitos necessários para o recebimento das parcelas pretéritas a título de benefício por incapacidade. De análise dos autos, verifico que o mesmo período fora reconhecido pela Autarquia Previdenciária (PROCADM1, pág. 6 - evento 19), que não concedeu o benefício por não preenchimento do requisito carência (INDEFERIMENTO19, evento 1). Conforme se verifica no extrato de vínculos do Cadastro Nacional de Informações Sociais - CNIS, colacionado no evento 19, a Parte Autora manteve vínculo empregatício, como empregada, até janeiro de 2015. Após este período, voltou a efetuar contribuições previdenciárias, na mesma condição, entre outubro de 2016 a abril de 2017. Após a nova filiação e antes do início da incapacidade (março de 2017), a postulante não comprovou o recolhimento das 12 (doze) contribuições da carência exigida pela Lei de Benefícios para o cômputo das contribuições vertidas antes da perda da qualidade de segurada, na forma do Parágrafo Único do artigo 27 da Lei n.º 8.213/1991, introduzido pela Medida Provisória n.º 767, de janeiro de 2017.
Primeiramente, ressalto que não há controvérsia quanto à constatação de incapacidade apenas no período de 03/2017 a 06/2017 conforme perícia do evento 21.
Resta analisar se restaram cumpridos os requisitos qualidade de segurada e carência na DII 03/2017.
Os dados do CNIS (evento 19 - PROCADM1 - pg. 5) mostram que houve mais de 12 contribuições com vínculo de emprego até 17/01/2015, com a perda da qualidade de segurada em 03/2016. Posteriormente, antes da DII, como já mencionado acima, houve reingresso ao RGPS como empregada entre 28/10/2016 a 04/2017.
Aplicação do art. 24, parágrafo único, da Lei 8.213/91, após alteração efetuada pelas Medidas Provisórias 739/2016 e 767/2017.
O artigo 102, da Lei 8213/91, prevê que a perda da qualidade de segurado importa em caducidade dos direitos inerentes a essa qualidade.
O artigo 24, parágrafo único, da Lei nº 8213/91, em sua redação original, permitia o cômputo das contribuições anteriores à perda da filiação para totalização da carência prevista no artigo 25 da Lei de Benefícios. Impunha-se contudo que o segurado, após a refiliação, cumprisse com ao menos 1/3 do número total de contribuições exigidas como condição para concessão do benefício:
Art. 24. Período de carência é o número mínimo de contribuições mensais indispensáveis para que o beneficiário faça jus ao benefício, consideradas a partir do transcurso do primeiro dia dos meses de suas competências. Parágrafo único. Havendo perda da qualidade de segurado, as contribuições anteriores a essa data só serão computadas para efeito de carência depois que o segurado contar, a partir da nova filiação à Previdência Social, com, no mínimo, 1/3 (um terço) do número de contribuições exigidas para o cumprimento da carência definida para o benefício a ser requerido.
A Medida Provisória n. 739, de 07/07/2016, publicada no dia 08/07/2016, revogou o parágrafo em questão, do que se entendeu que - para aqueles que não haviam ainda computado as doze contribuições (com ou sem a incidência do parágrafo único do artigo 24) -, nos termos do artigo 102, da Lei 8213/91, dever-se-ia exigir, após a nova filiação, o cumprimento da carência total de doze meses sem a perda da condição de segurado como condição para concessão do auxílio-doença ou da aposentadoria por invalidez.
Ocorre que referida MP não foi convertida em lei, perdendo sua eficácia. A respeito das relações jurídicas dela decorrentes, o Congresso Nacional, em cumprimento ao artigo 62, § 3º, da Constituição Federal, dispôs, no Ato Declaratório do Presidente da Mesa nº 53/2016, que referida norma teve seu prazo de vigência encerrado no dia 04/11/2016.
Por tais motivos, somente é possível afastar a possibilidade de computar as contribuições anteriores à perda da condição de segurado, no caso de concessão de aposentadoria por invalidez e de auxílio-doença, àqueles segurados que, incapacitados apenas no período de vigência da MP (de 08/07/2016 a 04/11/2016), não tenham completado 1/3 da carência total (4 meses) até a competência julho/2016, inclusive.
De uma ou de outra forma, é bom que se diga, o segurado deve preencher a carência de 12 meses a que refere o artigo 25, inciso I, da Lei 8213/91. A diferença que se vê é que uma vez completada essa carência com a benesse do parágrafo único do artigo 24 enquanto ainda vigente, o segurado não perde o direito ao benefício enquanto mantiverse filiado ao sistema previdenciário.
Posteriormente, a Medida Provisória nº 767, de 06/01/2017, publicada em 06/01/2017, voltou a revogar o referido parágrafo. Novamente, àqueles que mantinham a qualidade de segurado do RGPS na data da vigência da nova MP e que já haviam completado a carência total exigida (incluindo a competência janeiro/2017), seja pela incidência ou não do parágrafo único do artigo 24, o direito ao benefício em nada lhes afetam enquanto mantida a filiação, porquanto a carência uma vez completada não precisa ser refeita.
A alteração legislativa, na verdade, apenas impede a concessão do amparo por invalidez acaso o segurado se tivesse desvinculado do RGPS e no advento da MP em questão não tivesse ainda completado a carência total de 12 meses com ou sem a utilização do parágrafo único do artigo 24 da Lei 8213/91 então vigente até 05/01/2017.
É que a caducidade do direito ao cômputo das contribuições anteriores apenas ocorre com a perda da qualidade de segurado, conforme prescreve o artigo 102, da Lei 8213/91.
Inexistindo alteração no número de meses de carência exigido para concessão do benefício, que continua sendo de 12 meses (art. 25, I, da Lei 8213/91), uma vez completadas as contribuições nos termos da legislação até então vigente - com ou sem a incidência do parágrafo único do artigo 24 da Lei 8213/91 -, elas não se desfazem, a não ser que venha a perder novamente a sua filiação ao sistema.
Do que se disse, é possível concluir que o segurado, nos períodos de vigência das Medidas Provisórias nº 739/2016 e 767/2017, pode preencher a carência mínima de doze meses com a benesse prevista no artigo 24, parágrafo único, da Lei 8213/91, se totalizar o número mínimo de contribuições mensais até julho de 2016 (inclusive) ou até janeiro de 2017 (inclusive).
Nos demais períodos em que não havia MP vigente, aplica-se o artigo 24, parágrafo único, da Lei 8213/91, sem ressalvas, podendo o segurado completar a carência inclusive no período entre as duas Medidas Provisórias.
Ressalta-se que a carência mede-se por número de meses e não de dias, razão por que se deve computar a favor do segurado o mês de início de vigência da MP para fins de verificação do implemento do requisito em questão, porquanto ainda que referente a alguns dias trabalhados é possível completar a carência necessária à concessão do benefício.
Destaco ainda que a MP 767/17 foi convertida na Lei 13.457/17, em 26/06/2017, a qual passou a dispor que, nos termos do art. 27-A, da Lei 8.213/91, 'No caso de perda da qualidade de segurado, para efeito de carência para a concessão dos benefícios de que trata esta Lei, o segurado deverá contar, a partir da nova filiação à Previdência Social, com metade dos períodos previstos nos incisos I e III do caput do art. 25 desta Lei'. Contudo, tal alteração não implica modificação neste julgado considerando a data de início de incapacidade atestada.
Diante de tais considerações, considerando que a jurisprudência pátria determina a aplicação da lei vigente no implemento das condições, deve-se inicialmente verificar a legislação em vigor na data de início da incapacidade. Acaso o segurado tenha mantido a filiação ao sistema após já ter completado as doze contribuições mensais, com ou sem a incidência do artigo 24, parágrafo único, da Lei 8213/91, conforme o caso, fará jus ao benefício, nos seguintes termos:
a) Data de início de incapacidade até 31/07/2016: o segurado poderá valerse de todas as contribuições anteriores à perda da qualidade de segurado se nesta competência (incluso esta) preencher o disposto no artigo 24, parágrafo único, da Lei 8213/91, até então vigente;
b) Data de início de incapacidade entre 01/08/2016 e 04/11/2016: o segurado não poderá computar as contribuições anteriores à perda da filiação, razão por que para valer-se do artigo 24, parágrafo único, da Lei 8213/91, deverá ter preenchido a carência prevista na Lei de Benefícios antes destas datas e mantido a filiação ao sistema até o início da incapacidade;
c ) Data de início de incapacidade entre 05/11/2016 e 31/01/2017: o segurado poderá valer-se de todas as contribuições anteriores à perda da qualidade de segurado se conseguir preencher até a DII o disposto no artigo 24, parágrafo único, da Lei 8213/91, então vigente, incluindo a competência janeiro/2017;
d) Data de início de incapacidade a partir de 01/02/2017: somente poderá valer-se do artigo 24, parágrafo único, da Lei 8213/91, o segurado que tiver preenchido a carência total necessária até a competência 01/2017 (inclusive), mantendo a filiação ao sistema previdenciário até o início da incapacidade.
Desse modo, o caso concreto enquadra-se na hipótese 'd' supramencionada (trecho grifado), tendo realizado a quarta contribuição após a perda da qualidade de segurada em 01/2017, na DII (03/2017) a segurada cumpriu a carência exigida em lei.
Desse modo, deve ser concedido auxílio-doença desde a DER 13/04/2017 do NB 6182232866 até o término da incapacidade em 30/06/2017.
Cálculo no juízo de origem.
Sobre as parcelas vencidas incidirá atualização monetária pelo IPCA-E desde quando devida cada parcela e juros de acordo com os índices aplicados aos depósitos de poupança (de forma simples), conforme decidido pelo STF no tema 810.
Merece, portanto, ser provido o recurso da parte autora.
O prequestionamento é desnecessário no âmbito dos Juizados Especiais Federais, porquanto o artigo 46 da Lei 9.099/95 dispensa expressamente a fundamentação exaustiva do acórdão. Por conseguinte, tanto nos pedidos de uniformização de jurisprudência quanto para o recebimento de Recurso Especial, não há de se exigir que a matéria tenha sido prequestionada em segunda instância, o que diferencia os processos que tramitam nos Juizados dos processos comuns ordinários.
Todavia, se assim quer o recorrente, dou expressamente por prequestionados todos os dispositivos indicados pelas partes nos presentes autos, para fins do art. 102, III, da Constituição Federal, respeitadas as disposições do art. 14, caput e parágrafos e art. 15, caput, da Lei nº 10.259, de 12.07.2001. A repetição dos dispositivos é desnecessária, para evitar tautologia.
Destaco que a decisão proferida já enfrentou adequadamente todos os argumentos trazidos pelas partes que seriam capazes de, em tese, conduzir o julgamento a entendimento contrário ao adotado pelo julgador, do que se conclui que a interpretação pretendida não foi acolhida.
Ausente sucumbência recursal, não são devidos honorários.
Ante o exposto, voto por dar provimento ao recurso da parte autora.

O INSS traz como paradigmas julgados da 1ª Turma Recursal do Rio de Janeiro (processo nº 20165154160087901, Relatora Juíza Federal Lilea Pires de Medeiros), 7ª Turma Recursal do Rio de Janeiro (processo nª 0165351- 32.2016.4.02.5154/01, Relator Juiz Federal Odilon Romano Neto), 11ª Turma Recursal de São Paulo (processo nº 0001559-88.2016.4.03.6344), 6ª Turma Recursal de São Paulo (processo nº 0001117-12.2016.4.03.6316, Relator Juiz Federal Herbert Cornelio Pieter de Bruyn Junior), 10ª Turma Recursal de São Paulo (processo nº 0000264-93.2017.4.03.6307. Relatora Juíza Federal LIN PEI JENG), 1ª Turma Recursal de Pernambuco (processo nº 0520360-87.20164058300, Rel. Juiz Federal José Batista de Almeida Filho Neto) e 1ª Turma Recursal do Rio Grande do Norte (processo nº 0510014-34.2017.4.05.8400).

Diz a recorrente que se na data da incapacitade a segurada não havia cumprido os novos prazos de carência previstos na Medida Provisória nº 739/2016, e na Medida Provisória nº 767/2017 não havia porque conceder o benefício.

Afirma que a prevalecer o julgado recorrido, cada segurado seria regido pela legislação vigente na época da análise de seu direito, e não do fato gerador, o que demandaria a revisão de TODOS os benefícios previdenciários já concedidos, o que afronta a segurança jurídica e o princípio da igualdade.

Alega que não há violação ao princípio da igualdade, pelo contrário, o julgado recorrido é que ofendeu o referido princípio, por aplicar regra diferenciada aos benefícios concedidos judicialmente. A seguir discorre sobre esse princípio, citando doutrina.

O incidente foi admitido na origem (evento 67) e afetado como Representativo de Controvérsia pelo Presidente da Turma Nacional de Uniformização (evento 3).

Houve a publicação de edital (eventos 7 e 8). Sem manifestação ministerial.

É o relatório. Passo ao voto.

VOTO
Os julgados trazidos como paradigmas, de diferentes Regiões da Justiça Federal, claramente possuem entendimento contrário ao acórdão recorrido da 4ª Turma Recursal do Rio Grande do Sul, pelo que configura-se a divergência, apta a legitimar o incidente de uniformização interposto pela autarquia, nos termos do art. 14 e parágrafos da Lei nº 10.259/2001.

O objeto do processo é a condenação do INSS a implantar o benefício de auxílio-doença. A perícia constatou incapacidade somente no período entre março e junho de 2017.

Os registros do CNIS demonstram que houve mais de 12 contribuições com vínculo de emprego até 17/01/2015, e que a parte autora perdeu a qualidade de segurada em março de 2016. Posteriormente, a partir de outubro de 2016, reingressou no Regime Geral e contribuiu até abril de 2017.

Considerados esses fatos, veja-se, em primeiro lugar, a regra do parágrafo único do art. 24 da Lei nº 8.213/91, que vigorou até 7/7/2016, tendo produzido efeitos também entre 5/11/2016 e 5/1/2017:
Parágrafo único. Havendo perda da qualidade de segurado, as contribuições anteriores a essa data só serão computadas para efeito de carência depois que o segurado contar, a partir da nova filiação à Previdência Social, com, no mínimo, 1/3 (um terço) do número de contribuições exigidas para o cumprimento da carência definida para o benefício a ser requerido.

Como o advento da Medida Provisória nº 739/2016 houve a revogação da regra acima transcrita e o novo parágrafo único do art. 27 da Lei nº 8.213/91 ficou assim:
No caso de perda da qualidade de segurado, para efeito de carência para a concessão dos benefícios de auxílio-doença, de aposentadoria por invalidez e de salário-maternidade, o segurado deverá contar, a partir da nova filiação à Previdência Social, com os períodos previstos nos incisos I e III do caput do art. 25.”

O inciso I do art. 25, para o que é pertinente ao presente processo, fixa em doze meses a carência para a concessão do benefício de auxílio-doença. E sempre foi assim desde o advento da Lei nº 8.213/91.

A Medida Provisória nº 739/2016 vigeu até 4/11/2016 e a partir do dia seguinte voltou a valer a regra do parágrafo único do art. 24 da Lei nº 8.213/91, que até então estava com seus efeitos suspensos.

Veio então a Medida Provisória nº 767, publicada em 6/1/2017, e que vigeu até 26/6/2017, repetindo a regra da anterior, mas colocando-a no caput do novo art. 27-A:
No caso de perda da qualidade de segurado, para efeito de carência para a concessão dos benefícios de auxílio-doença, de aposentadoria por invalidez e de salário-maternidade, o segurado deverá contar, a partir da nova filiação à Previdência Social, com os períodos previstos nos incisos I e III do caput do art. 25.”

Essa medida provisória foi convertida na Lei nº 13.457, publicada e 27/6/2017, que alterou sensivelmente a regra anterior do caput do art.27-A, como se vê:
No caso de perda da qualidade de segurado, para efeito de carência para a concessão dos benefícios de que trata esta Lei, o segurado deverá contar, a partir da nova filiação à Previdência Social, com metade dos períodos previstos nos incisos I e III do caput do art. 25 desta Lei.”

Examinando essa sucessão de diplomas legais que trataram do mesmo assunto, objeto do presente processo, o julgado recorrido entendeu que, havendo perda da qualidade de segurado, mas sendo cumprida a regra do parágrafo único do art. 24 da Lei nº 8.213/91 antes do advento da MP 739/2016 (que suspedeu seus efeitos), mesmo que a incapacidade seja datada no interregno de sua vigência (8/7/2016 a 4/11/2016) e não havendo uma nova perda da qualidade de segurado, o benefício poderia ser concedido.

Por outro lado, a turma gaúcha reconheceu que se após a perda de qualidade de segurado a incapacidade fosse constatada no período de vigência da referida Medida Provisória 739/2016 e se não tivesse sido cumprida a regra do parágrafo único do art. 24 da Lei nº 8.213/91 (que estava com seus efeitos suspensos) antes da sua vigência, o segurado só teria direito ao benefício se houvesse pago as doze contribuições previstas no novo diploma legislativo.

Portanto, se a incapacidade (DII) fosse constatada no interregno da vigência da Medida Provisória nº 739/2016 (mas a partir de agosto, tendo em vista a particularidade abaixo salientada), o segurado só teria direito ao benefício se, após a perda da qualidade de segurado e posterior recuperação, tivesse pago 1/3 das 12 contribuições (que é a carência do benefício) antes da vigência da referida MP, com uma particularidade: incluir-se-ia, se fosse o caso, nas quatro contribuições necessárias para a concessão do benefício, aquela correspondente ao mês de publicação da Medida Provisória (julho de 2016).

O mesmo raciocínio aplica-se, de acordo com o acórdão recorrido, no que respeita à Medida Provisória nº 767, publicada em 6/1/2017 e que vigorou até 26/6/2017. Ela repetiu a redação da MP 736/2016.

Então, entre 5/11/2016 (dia seguinte ao último dia de vigência da MP 739/2016) e 5/1/2017 (dia anterior à publicação da MP 767/2017) voltou a produzir efeitos o parágrafo único do art. 24 a Lei nº 8.213/91.

Por isso, tendo ocorrido a perda da qualidade de segurado e posterior recuperação, se a incapacidade (DII) fosse constatada entre 5/11/2016 e 31/1/2017 e o segurado tivesse pago 1/3 das 12 contribuições (que é a carência do benefício) antes da vigência da MP 767/2017, teria direito ao benefício, com uma particularidade, tal como na primeira hipótese: incluir-se-ia, se fosse o caso, nas quatro contribuições necessárias para a concessão do benefício aquela correspondente ao mês de publicação da Medida Provisória (janeiro de 2017).

Em resumo: para o julgado da turma recursal gaúcha, havendo perda da qualidade de segurado, os novos prazos de carência para a concessão do benefício de auxílio-doença previstos nas Medidas Provisórias 739/2016 e 767/2017, mesmo que a incapacidade tenha ocorrido na vigência de uma delas, aplicam-se somente quando o segurado não tiver cumprido a regra prevista no parágrafo único do revogado art. 24 da Lei nº 8.213/91 (pagamento de 1/3 das contribuições correspondentes à carência do benefício) até o mês de publicação das aludias medidas provisórias.

Então, no caso concreto, constatada a incapacidade entre março e junho de 2017 e tendo a parte autora perdido a qualidade de segurada em março de 2016 e voltado a contribuir para o Regime Geral a partir de outubro de 2016 até abril de 2017, cumpriu-se a regra do parágrafo único do art. 24 da Lei nº 8.213/91 até o mês do advento da MP 767, publicada em 6/1/2017, eis que pagou 1/3 do número de contribuições equivalentes à carência do benefício (12 contribuições) nos meses de outubro, novembro e dezembro de 2016 e janeiro de 2017.

Pois bem, a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal é no sentido do respeito ao princípio tempus regit actum em questões que envolvem a concessão de benefício previdenciário. Veja-se o seguinte julgado:

AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO EXTRAORDINÁRIO. DIREITO PREVIDENCIÁRIO. CONVERSÃO DO TEMPO COMUM EM ESPECIAL. REQUISITOS NECESSÁRIOS PARA CONCESSÃO DO BENEFÍCIO. LEGISLAÇÃO EM VIGOR. MATÉRIA INFRACONSTITUCIONAL. VIOLAÇÃO REFLEXA DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA. SÚMULA 279 DO STF. TEMPUS REGIT ACTUM. ADI 3.104. AGRAVO NÃO PROVIDO. 1. É inviável o processamento do apelo extremo quando a divergência em relação ao entendimento adotado pelo juízo a quo demanda a reanálise da legislação infraconstitucional e do conjunto fático-probatório, incidindo a Súmula 279 do STF. Hipótese em que a violação ao Texto Constitucional, se houver, é meramente reflexa ou indireta. 2. O Supremo Tribunal Federal, no julgamento da ADI 3.104, de relatoria da Min. Cármen Lúcia, Tribunal Pleno, DJE 09.11.2007, decidiu que “em questões previdenciárias, aplicam-se as normas vigentes ao tempo da reunião dos requisitos de passagem para a inatividade”, não havendo falar-se, portanto, em violação ao princípio tempus regit actum. 3. Agravo regimental a que se nega provimento, com previsão de aplicação da multa prevista no art. 1.021, §4º, CPC. Verba honorária majorada em 25%, nos termos do art. 85, §§ 2º, 3º e 11, CPC. (RE 974195 AgR / PR Relator(a): Min. EDSON FACHIN Julgamento: 28/10/2016 Órgão Julgador: Primeira Turma Publicação PROCESSO ELETRÔNICODJe-244 DIVULG 17-11-2016 PUBLIC 18-11-2016).

O Superior Tribunal de Justiça, por sua fez, de há muito firmou jurisprudência no mesmo sentido, isto é, de que a concessão de benefício previdenciário deve ser regulado pela lei vigente ao tempo do fato que lhe determinou a incidência, momento em que se produziu o direito subjetivo à sua percepção. Vejam-se, por todas, as seguintes ementas:

PREVIDENCIÁRIO. PENSÃO POR MORTE. LEI APLICÁVEL. SÚMULA 340/STJ. ÓBITO POSTERIOR À EC 41/2003. INCIDÊNCIA À ESPÉCIE DOS EFEITOS DA REFERIDA EMENDA CONSTITUCIONAL.1. O acórdão recorrido encontra-se em consonância com o entendimento jurisprudencial desta Corte de que os benefícios previdenciários regulam-se pela lei vigente ao tempo da implementação dos requisito spara a sua concessão, o que, no caso de pensão por morte, é a lei em vigor na data do óbito do servidor público. Tal entendimento já foi sumulado no seguinte enunciado: "A lei aplicável à concessão depensão previdenciária por morte é aquela vigente na data do óbito do segurado" (Súmula 340/STJ).2. Na hipótese dos autos, o fato gerador do direito somente foi implementado em 1º/7/2013, com a morte do esposo da Impetrante (fl.28). Nessa data, já estava em vigor a Emenda Constitucional 41/2003,que deu nova redação ao art. 40, § 7º, I, da Constituição Federal,com base no qual a autoridade impetrada calculou o valor do benefício de pensão paga à impetrante.3. Recurso Ordinário não provido. (RMS 48837 / PB Relator Ministro HERMAN BENJAMIN Orgão Julgador T2 - SEGUNDA TURMA Data do Julgamento 13/09/2016 Data da Publicação/Fonte DJe 07/10/2016).

PREVIDENCIÁRIO. RECURSO ESPECIAL. CONCESSÃO DE AUXÍLIO-DOENÇA OU APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. SEGURADO PORTADOR DE MIOCARDIOPATIACHAGÁSICA COM ARRITMIA VENTRICULAR. INCAPACIDADE EVIDENCIADA QUANDO DA CESSAÇÃO DA ATIVIDADE RURAL. PERDA DA QUALIDADE DE SEGURADO NADATA DO REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO. IRRELEVÂNCIA. PREENCHIMENTO DOS REQUISITOS PARA CONCESSÃO DO BENEFÍCIO NO MOMENTO DO SURGIMENTO DAINCAPACIDADE. RECURSO ESPECIAL CONHECIDO E PROVIDO.1. A posterior perda da qualidade de segurado especial, no presente caso, não deve interferir no reconhecimento do direito ao benefícioauxílio-doença, pois incontroverso nos autos que o segurado possuía a qualidade de segurado à época do surgimento da incapacidade para o trabalho. 2. Recurso especial conhecido e provido, para reconhecer ao recorrente o direito ao auxílio-doença, a partir do requerimento administrativo, o qual poderá ser convertido em aposentadoria por invalidez, quando das avaliações periódicas de acompanhamento da incapacidade por parte da Autarquia previdenciária. Condeno, ainda,o INSS no pagamento do ônus sucumbencial, fixando os honorários advocatícios em 10% sobre o valor da condenação. (REsp 1405173 / SP Relator Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES Órgão Julgador T2 - SEGUNDA TURMA Data do Julgamento 20/05/2014 Data da Publicação/Fonte DJe 26/05/2014).

Autorizada doutrina também caminha no mesmo sentido, conforme as seguintes lições:
"Para que um indivíduo faça jus à prestação previdenciária, embora já tenha sido ressaltado o caráter de irrenunciabilidade do direito, é necessário:
a) que o indivíduo se encontre na qualidade de beneficiário do regime à época do evento omissis;
b) existência de um dos eventos cobertos pelo regime, confomre a legislação vigente na época da ocorrência do fato - o que deflagra o direito à prestação é o evento coberto pela Previdência Social, em conformidade com os requisitos legais pertinentes omissis;
c) o cumprimento de exigências legais - em grande parte dos casos, as prestações previdenciárias previstas somente são concedidas se o beneficiário, além de atingido pelo evento amparado, cumprir algumas exigências omissis. (Carlos Aberto Pereira de Castro e João Batista Lazzari, in Manual de Direito Previdenciário, 16ª ed. Forense, Rio de Janeiro, 2014).

Fixados tais conceitos, a Lei nº 8.213/91 prevê a hipótese de concessão do benefício de auxílio-doença da seguinte forma:
Art. 59. O auxílio-doença será devido ao segurado que, havendo cumprido, quando for o caso, o período de carência exigido nesta Lei, ficar incapacitado para o seu trabalho ou para a sua atividade habitual por mais de 15 (quinze) dias consecutivos.

Sendo assim, o benefício é devido quando o segurado, cumprido o período de carência, ficar incapacitado, ou seja, quando atingida essa condição - a incapacidade - ele deve ter cumprido a carência exigida pela Lei nº 8.213/91.

Não há como dissociar o evento que dá origem ao benefício por incapacidade e a lei vigente ao tempo de sua ocorrência, com todas as prescrições legais quanto à condição de segurado e carência para efeito de concessão do benefício de auxílio doença, e dar um caráter de ultratividade à lei revogada.

A ultratividade da lei previdenciária pode ocorrer, mas sob determinadas condições e sempre considerando o cumprimento dos requisitos ao tempo de sua vigência, como se lê, por exemplo, nos §§2º e 3º do art. 102 da Lei nº 8.213/91. Novamente aqui avulta o princípio tempus regit actum. Os requisitos legais estão previstos na legislação vigente ao tempo da ocorrência do fato que gera o direito ao benefício, conforme a doutrina acima transcrita.

Por essas razões, entendo que deve ser dado provimento ao incidente de uniformização, resolvendo-se o Tema 176 pela adoção da seguitne tese: constatada que a incapacidade do(a) segurado(a) do Regime Geral da Previdência Social (RGPS) ocorreu ao tempo da vigência das Medidas Provisórias 739/2016 e 767/2017, aplicam-se os novos prazos de carência nelas previstos.

Ao caso concreto aplica-se a Questão de Ordem nº 38 (Em decorrência de julgamento em pedido de uniformização, poderá a Turma Nacional aplicar o direito ao caso concreto decidindo o litígio de modo definitivo, desde que a matéria seja de direito apenas, ou, sendo de fato e de direito, não necessite reexaminar o quadro probatório definido pelas instâncias anteriores, podendo para tanto, restabelecer a sentença desconstituída por Turma Recursal ou Regional), pelo que o pedido deve ser julgado improcedente.

Pelo exposto, voto no sentido de conhecer e dar provimento ao incidente de uniformização para, aplicando-se a Questão de Ordem nº 38, julgar improcedente o pedido, fixando a seguinte tese relativa ao Tema 176: Constatado que a incapacidade do(a) segurado(a) do Regime Geral da Previdência Social (RGPS) ocorreu ao tempo da vigência das Medidas Provisórias 739/2016 e 767/2017, aplicam-se as novas regras de carência nelas previstas.

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Rio Grande, Rio Grande do Sul, Brazil
Especialista em Direito Previdenciário, pela Universidade de Caxias do Sul - UCS, em parceria com a ESMAFE - Escola da Magistratura Federal, em 2009. Formado em janeiro de 2006, pela FURG - Fundação Universidade do Rio Grande, em direito. Este blog tem o objetivo de divulgar o conteúdo previdenciário de maneira gratuita para que todos possam ter acesso as informações sobre esta matéria.

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