Decisão trata sobre o cálculo da renda mensal do salário-maternidade
Nesta sexta-feira será visto uma decisão da Turma Nacional de Uniformização representativa de controvérsia que gerou o tema 202 com a seguinte redação "O cálculo da renda mensal do salário-maternidade devido à segurada que, à época do fato gerador da benesse, se encontre no período de graça, com última vinculação ao RGPS na qualidade de segurada empregada, deve observar a regra contida no artigo 73, inciso III, da Lei nº 8.213/91." Abaixo segue a decisão para análise dos amigos.
EMENTA
PEDIDO NACIONAL DE UNIFORMIZAÇÃO DE JURISPRUDÊNCIA. TEMA Nº 202 DOS RECURSOS REPRESENTATIVOS DA CONTROVÉRSIA. PREVIDENCIÁRIO. SALÁRIO-MATERNIDADE. REGRA PARA O CÁLCULO DO VALOR DO BENEFÍCIO DEVIDO À SEGURADA DESEMPREGADA, EM PERÍODO DE GRAÇA, COM ÚLTIMO VÍNCULO NO RGPS NA CATEGORIA DE SEGURADA EMPREGADA. CONTROVÉRSIA RESOLVIDA EM FAVOR DA INCIDÊNCIA DA REGRA PREVISTA NO ARTIGO 73, INCISO III, DA LBPS, EM DETRIMENTO DAQUELA CONTIDA NO ART. 72 DO MESMO DIPLOMA. AUSÊNCIA DE VIOLAÇÃO AO ARTIGO 15, §3°, DA MESMA LEI. SUPOSTA OMISSÃO LEGISLATIVA SUPRIDA POR ANALOGIA COM A SITUAÇÃO DE PAGAMENTO DO BENEFÍCIO AO CÔNJUGE SUPÉRSTITE, PREVISTA NO ARTIGO 71-B, §2°, INCISO III, DA LBPS. INCIDENTE DO INSS CONHECIDO E PROVIDO, COM A FIXAÇÃO DA SEGUINTE TESE: O CÁLCULO DA RENDA MENSAL DO SALÁRIO-MATERNIDADE DEVIDO À SEGURADA QUE, À ÉPOCA DO FATO GERADOR DA BENESSE, SE ENCONTRE NO PERÍODO DE GRAÇA, COM ÚLTIMA VINCULAÇÃO AO RGPS NA QUALIDADE DE SEGURADA EMPREGADA, DEVE OBSERVAR A REGRA CONTIDA NO ARTIGO 73, INCISO III, DA LEI Nº 8.213/91.
TNU, PEDIDO DE UNIFORMIZAÇÃO DE INTERPRETAÇÃO DE LEI (TURMA) Nº 5075016-04.2016.4.04.7100/RS , JOSÉ FRANCISCO ANDREOTTI SPIZZIRRI, Juiz Relator , 27/05/2019
ACÓRDÃO
A Turma Nacional de Uniformização decidiu, por unanimidade, DAR PROVIMENTO ao incidente de uniformização interposto pelo INSS, nos termos do voto do Juiz Relator, fixando-se a seguinte tese: o cálculo da renda mensal do salário-maternidade devido à segurada que, à época do fato gerador da benesse, se encontre no período de graça, com última vinculação ao RGPS na qualidade de segurada empregada, deve observar a regra contida no artigo 73, inciso III, da Lei nº 8.213/91. Incidente de Uniformização julgado como representativo da controvérsia (Tema 202).
Brasília, 23 de maio de 2019.
VOTO
Trata-se de pedido nacional de uniformização de jurisprudência interposto pelo INSS contra acórdão da 3ª Turma Recursal do RS que proveu recurso inominado da parte autora. A Turma de origem estabeleceu que o valor do salário-maternidade reconhecido em favor de segurada cujo último vínculo perante o RGPS se deu na condição de segurada empregada deve corresponder à sua última remuneração integral, nos termos do artigo 72 da LBPS, a despeito da situação de desemprego à época do gozo do indigitado benefício (VOTOTR34).
Indica dissídio jurisprudencial em relação a julgado da 6ª Turma Recursal de SP que entende descabida a aplicação da regra contida no artigo 72 da LBPS para o cálculo do salário-maternidade da segurada desempregada, impondo-se, nessa hipótese, o emprego do artigo 73, inciso III, do mesmo diploma legal (IncUniJur37).
Admitido o incidente na origem e também pela Presidência desta TNU, os autos vieram conclusos para julgamento.
Dada a relevância do tema e a multiplicidade de ações sobre a mesma matéria, o recurso foi conhecido e afetado pelo Plenário como representativo da controvérsia (Evento 36).
Intimado o Ministério Público Federal.
Deferido o ingresso no feito do Instituto Brasileiro de Direito Previdenciário - IBDP como amicus curiae, a entidade peticionou pugnando pela uniformização da jurisprudência nos termos em que decidida a lide pela Turma de origem (Evento 56).
Retornam conclusos.
Decido.
Consoante definido na afetação por esta TNU, o tema controvertido nos autos diz com Saber qual a regra aplicável para o cálculo da renda mensal do salário-maternidade devido à segurada que, à época do fato gerador da benesse, se encontre no período de graça, com última vinculação ao RGPS na qualidade de segurada empregada.
A Turma de origem reconheceu aplicável a sistemática prescrita no artigo 72 da LBPS, fundamentalmente atenta ao fato de que, por se encontrar a segurada em período de graça subsequente a uma última vinculação no RGPS como segurada empregada, conserva, nos termos do art. 15 da LBPS, todos os seus direitos perante a previdência social, dentre os quais o status correspondente à sua última filiação. Confira-se:
Verifica-se, então, inexistir previsão específica na Lei acerca do cálculo do salário-maternidade para o caso de segurado que esteja em 'período de graça', situação da autora.
Há previsão, contudo, de que o segurado durante o período de graça conserva todos os seus direitos perante a previdência social, nos termos do art. 15, caput e § 3º, da Lei 8.213/91.
Art. 15. Mantém a qualidade de segurado, independentemente de contribuições:
(...)
§ 3º Durante os prazos deste artigo, o segurado conserva todos os seus direitos perante a Previdência Social.
Assim, a segurada em período de graça por ter tido o vínculo empregatício encerrado deve receber o mesmo tratamento conferido à segurada empregada, em todos os seus aspectos, dentre os quais a aplicação do art. 72 da Lei nº 8.213/91 no cálculo do valor do salário-maternidade.
Em sentido diverso, o INSS indicou como paradigma julgado da 6ª Turma Recursal de SP pela aplicação da regra contida no artigo 73, inciso III, da LBPS, ao entendimento de que, por não se enquadrar a segurada desempregada em qualquer das hipóteses elencadas no artigo 72, há que se compreendê-la inserida na genérica expressão demais seguradas do prefalado inciso III:
O cerne da controvérsia é o formato de cálculo da renda mensal do benefício de salário-maternidade, previsto nos artigos 71 a 73 da Lei nº 8.213/91.Conforme documentação apresentada pela parte autora observo que na data do nascimento de seu filho (em 22/07/2014), a autora encontrava-se desempregada, porém, em período de graça (último vínculo de 02/05/2013 até 24/02/2014), conforme consulta ao CNIS, restando incabível a aplicação da regra do art. 72 da lei nº8.213/91. Assim, corretamente o INSS deferiu o benefício de salário maternidade (NB 170.912.957-0), calculando a RMI (Renda Mensal Inicial) com base no disposto no artigo 73, III da Lei 8.213/91 e artigo 101, III do Decreto 3.048/99.Seguem os diplomas legais (grifo nosso):(...)Sendo assim, verifica-se que a parte autora estava inclusa no grupo abarcado pelo art. 73, III da lei nº8.213/91, tendo o INSS realizado o cálculo corretamente
Evidenciado dissenso jurisprudencial passível de uniformização, o incidente foi conhecido e, em exame do mérito, penso seja o caso de provê-lo.
Com efeito, nos termos do artigo 15, §3°, da LBPS, o segurado em período de graça conserva todos os seus direitos perante a Previdência Social. Ocorre que, por se tratar o indigitado § 3º de norma destinada a explicitar o conteúdo desse próprio artigo 15, não há por onde pretender extrair da mesma alcance que extrapole para o reconhecimento de direitos outros que não aqueles expressamente elencados no caput do artigo 15, ou seja, direitos outros que não aqueles atinentes à manutenção da qualidade de segurado; os direitos conservados durante o período de graça são, pois, todos aqueles alusivos à manutenção da qualidade de segurado perante o RGPS, não fazendo sentido a sua desmedida ampliação para direitos outros como regras atinentes ao cálculo de prestações previdenciárias referentes a determinada categoria de segurado, até mesmo em face do caráter dinâmico compreendido na sistemática para a quantificação da renda mensal de um benefício, a depender de fatores variáveis como o valor da efetiva remuneração do segurado.
Por certo não se discute que a demandante em gozo do período de graça à época do parto faça jus à fruição de salário-maternidade, pois amparada no permissivo do art. 15 da LBPS, e respectivo § 3º, no que diz com a manutenção de todos os direitos alusivos à sua qualidade de segurada; o mesmo não se pode concluir, contudo, à míngua de imperativo lógico que conduza a tal, é pela oponibilidade do direito a que o valor do benefício seja calculado como se ela estivesse empregada.
É certo que a legislação não traz previsão textual, como o fez para a segurada empregada, no art. 72 da LBPS (Art. 72. O salário-maternidade para a segurada empregada ou trabalhadora avulsa consistirá numa renda mensal igual a sua remuneração integral), acerca da forma de apuração do valor do salário-maternidade devido à segurada desempregada no período de graça.
Mas previsão há, pois, não se tratando de segurada empregada, e deixando de ostentar qualificação que permita aferir o valor do benefício por qualquer outra forma especificamente prevista, nos arts. 72 e 73, incisos I e II, sua situação se amoldará, ao fim e ao cabo, na previsão da norma residual prescrita no inciso III do art. 73 (Art. 73. Assegurado o valor de um salário-mínimo, o salário-maternidade para as demais seguradas, pago diretamente pela Previdência Social, consistirá: ... III - em um doze avos da soma dos doze últimos salários-de-contribuição, apurados em um período não superior a quinze meses, para as demais seguradas).
Nesse mesmo sentido, apesar de a Lei não ter trazido previsão específica para o cálculo do salário-maternidade da segurada desempregada, o trouxe para a hipótese de o benefício ser devido ao cônjuge supérstite, em caso de falecimento da segurada titular do benefício, e desde que o referido cônjuge sobrevivente ostente qualidade de segurado, nos termos do art. 71-B da LBPS:
Art. 71-B. No caso de falecimento da segurada ou segurado que fizer jus ao recebimento do salário-maternidade, o benefício será pago, por todo o período ou pelo tempo restante a que teria direito, ao cônjuge ou companheiro sobrevivente que tenha a qualidade de segurado, exceto no caso do falecimento do filho ou de seu abandono, observadas as normas aplicáveis ao salário-maternidade.
(...)
§ 2º O benefício de que trata o caput será pago diretamente pela Previdência Social durante o período entre a data do óbito e o último dia do término do salário-maternidade originário e será calculado sobre:
I - a remuneração integral, para o empregado e trabalhador avulso;
II - o último salário-de-contribuição, para o empregado doméstico;
III - 1/12 (um doze avos) da soma dos 12 (doze) últimos salários de contribuição, apurados em um período não superior a 15 (quinze) meses, para o contribuinte individual, facultativo e desempregado;
Conforme se pode verificar, a Lei nº 8.213/91, nesse ponto, traz uma diferença expressa entre o cálculo do salário-maternidade para o cônjuge supérstite quando se tratar de segurado empregado ou, ao revés, desempregado, em gozo do período de graça. Ressalto a similaridade entre os dispositivos legais acima trancritos e os dispositivos em exame neste feito:
Art. 72. O salário-maternidade para a segurada empregada ou trabalhadora avulsa consistirá numa renda mensal igual a sua remuneração integral.
(...)
Art. 73. Assegurado o valor de um salário-mínimo, o salário-maternidade para as demais seguradas, pago diretamente pela Previdência Social, consistirá:
I - em um valor correspondente ao do seu último salário-de-contribuição, para a segurada empregada doméstica;
II - em um doze avos do valor sobre o qual incidiu sua última contribuição anual, para a segurada especial;
III - em um doze avos da soma dos doze últimos salários-de-contribuição, apurados em um período não superior a quinze meses, para as demais seguradas.
Assim como no artigo 72 da LBPS, o artigo 71-B, §2°, I, da mesma Lei, prevê o pagamento do benefício em valor equivalente à remuneração integral para o segurado empregado ou trabalhador avulso. De igual forma, o artigo 73, III, e o artigo 71-B, §2°, inciso III, ambos da LBPS, preveem o mesmo cálculo de "um doze avos da soma dos doze últimos salários-de-contribuição, apurados em um período não superior a quinze meses" para outras espécies de segurados; a única diferença é que o artigo 73, III, faz referência genérica a essas outras categorias (demais seguradas), enquanto que o artigo 71-B, §2°, inciso III, as refere de forma explícita (individual, facultativo e desempregado).
Assim, diante da semelhança entre as situações fáticas reguladas pelos dispositivos acima, afigura-se forçoso, em uma interpretação sistemática, e por imperativo lógico, concluir que na expressão demais seguradas do art. 73, III, da LBPS devem ser compreendidas também as seguradas individuais, facultativas e notadamente as desempregadas.
A solução construída pela Turma de origem, ao tornar equivalentes as situações da segurada empregada e da segurada desempregada, em gozo do período de graça, para cálculo do valor do salário-maternidade, data maxima venia, além de se ressentir de amparo legal, acaba por introduzir inconsistência no sistema previdenciário, pois o mesmo argumento da incidência do art. 15, § 3º, também seria oponível pelo cônjuge supérstite desempregado em período de graça (que almejasse o recebimento do salário-maternidade pelo valor integral de sua última remuneração); mas para ele a legislação expressamente prevê que o valor do benefício corresponderá a 1/12 (um doze avos) da soma dos 12 (doze) últimos salários de contribuição, apurados em um período não superior a 15 (quinze) meses.
Em outras palavras, para se conferir o alcance que a Turma de origem pretende ao § 3º do art. 15 da LBPS, necessariamente haveria de se concluir pela incompatibilidade do art. 71-B, §2º, inciso III, da mesma Lei, frente a seus termos, o que não soa plausível. Plausível é, isto sim, que o aparente vácuo normativo relativamente à situação da segurada desempregada em gozo do período de graça seja preenchido com a solução legal conferida para situação semelhante, que é a do cônjuge sobrevivente desempregado e em gozo do período de graça a quem se reconheça o direito de recebimento do salário-maternidade.
Por fim, a título de reforço argumentativo, observo que ao examinar a questão relativa ao critério para apuração da renda do instituidor do benefício de auxílio-reclusão, nos casos de segurado desempregado e em gozo do período de graça, para fins de enquadrá-lo como segurado de baixa-renda, o C. STJ fixou o entendimento de que o critério de aferição de renda do segurado que não exerce atividade laboral remunerada no momento do recolhimento à prisão é a ausência de renda, e não o último salário de contribuição (Tema 896 dos recursos repetitivos); observa-se nesse entendimento cisão entre o plexo de direitos inerentes ao reconhecimento da manutenção da qualidade de segurado (art. 15, § 3º, da LBPS) - que na acepção do acórdão recorrido importaria reconhecimento infalível de que a última remuneração efetivamente auferida adere ao próprio status de segurado da Previdência - e a consideração de que a situação fática remuneratória (ou sua ausência) à época da ocorrência do fato gerador dos direitos passíveis de fruição no período de graça é, por si, relevante. Tanto quando se apresenta favorável ao reconhecimento em si do direito (no caso do auxílio-reclusão) como desfavorável (como no caso da quantificação do valor do salário-maternidade).
Assim, tenho que seja o caso de prover o incidente de uniformização interposto pelo INSS, fixando-se a seguinte tese: o cálculo da renda mensal do salário-maternidade devido à segurada que, à época do fato gerador da benesse, se encontre no período de graça, com última vinculação ao RGPS na qualidade de segurada empregada, deve observar a regra contida no artigo 73, inciso III, da Lei nº 8.213/91, com o retorno dos autos à Turma de origem, para exercício do necessário juízo de adequação.
Ante o exposto, voto por DAR PROVIMENTO ao incidente de uniformização interposto pelo INSS, nos termos da fundamentação.
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