TNU decide que não cabe cumulação de LOAS com auxílio-acidente
Nesta sexta-feira será visto uma decisão da Turma Nacional de Uniformização representativa de controvérsia que gerou o tema 253 com a seguinte redação "É inacumulável o benefício de prestação continuada - BPC/LOAS com o auxílio-acidente, na forma do art. 20, §4º, da Lei nº 8.742/1993, sendo facultado ao beneficiário, quando preenchidos os requisitos legais de ambos os benefícios, a opção pelo mais vantajoso". Abaixo segue a decisão para análise dos amigos.
EMENTA
PEDIDO DE UNIFORMIZAÇÃO DE INTERPRETAÇÃO DE LEI FEDERAL. REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. TEMA 253. DIREITO PREVIDENCIÁRIO. ACUMULAÇÃO DE BPC/LOAS E AUXÍLIO-ACIDENTE. IMPOSSIBILIDADE. VEDAÇÃO LEGAL EXPRESSA. VEDAÇÃO COMPATÍVEL COM O SISTEMA DE PROTEÇÃO SOCIAL INSTITUÍDO PELA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. POSSIBILIDADE DE RENÚNCIA E OPÇÃO PELO BENEFÍCIO MAIS VANTAJOSO. CONCORDÂNCIA DAS PARTES. PREVISÃO NA IN 77/2015. RECURSO PROVIDO COM FIXAÇÃO DE TESE.
TNU, PEDILEF 0500878-55.2018.4.05.8310/PE, Juiz Federal Ivanir César Ireno Júnior, 27/05/21.
ACÓRDÃO
A Turma Nacional de Uniformização decidiu, por unanimidade, DAR PROVIMENTO ao pedido de uniformização, nos termos do voto do Juiz Relator, julgando-o como representativo de controvérsia, fixando a seguinte tese do tema 253: "É inacumulável o benefício de prestação continuada - BPC/LOAS com o auxílio-acidente, na forma do art. 20, §4º, da Lei nº 8.742/1993, sendo facultado ao beneficiário, quando preenchidos os requisitos legais de ambos os benefícios, a opção pelo mais vantajoso".
Brasília, 27 de maio de 2021.
RELATÓRIO
1. Trata-se de pedido de uniformização de interpretação de lei federal - PUIL - intentado pelo INSS contra acórdão proferido pela 3ª TR da SJPE, que reconheceu ao autor o direito de receber, simultaneamente, o benefício assistencial de prestação continuada do idoso (LOAS idoso) e o auxílio-acidente.
2. Na sessão do dia 12/03/2020, o PUIL foi admitido e afetado como representativo de controvérsia (Tema 253), com a seguinte questão controvertida: "se o benefício assistencial de prestação continuada e o auxílio-acidente são acumuláveis ou inacumuláveis."
3. O Instituto Brasileiro de Direito Previdenciário (IBDP) e a DPU foram admitidos como amicus curiae, apresentando manifestações escritas (eventos 37 e 35, respectivamente).
4. No evento 30, após verificar cumprido todo o procedimento do §6º do art. 16 do RI/TNU, declarei o processo apto para julgamento.
VOTO
PEDIDO DE UNIFORMIZAÇÃO DE INTERPRETAÇÃO DE LEI FEDERAL. REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. TEMA 253. DIREITO PREVIDENCIÁRIO. ACUMULAÇÃO DE BPC/LOAS E AUXÍLIO-ACIDENTE. IMPOSSIBILIDADE. VEDAÇÃO LEGAL EXPRESSA. VEDAÇÃO COMPATÍVEL COM O SISTEMA DE PROTEÇÃO SOCIAL INSTITUÍDO PELA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. POSSIBILIDADE DE RENÚNCIA E OPÇÃO PELO BENEFÍCIO MAIS VANTAJOSO. CONCORDÂNCIA DAS PARTES. PREVISÃO NA IN 77/2015. RECURSO PROVIDO COM FIXAÇÃO DE TESE.
5. Da admissibilidade do PUIL
Trata-se de matéria já preclusa, decidida na sessão de afetação. O paradigma contrário apresentado é do STJ. Registro que não ocorreu fato superveniente à afetação a impedir o julgamento do PUIL como representativo de controvérsia. Sem preliminares, vou ao mérito.
6. Contexto fático, controvérsia e decisões das instâncias oridinárias
6.1. Sentença (LOAS idoso concedido com DIB em 2811/2017):
[...]
O autor, por sua vez, recebe o valor de R$ 296,96 (duzentos e noventa e seis reais e noventa e seis centavos), a título de auxílio-acidente (anexo 56).
[...]
A única renda que pode ser considerada - para fins de aferição do critério de miserabilidade - é o auxílioacidente percebido pelo autor, cujo valor, notoriamente baixo, não faz com que a renda per capita familiar ultrapasse o limite estabelecido legalmente.
Vale salientar que é plenamente possível a cumulação do benefício assistencial com o auxílio-acidente. É o que se extrai da dicção do §3º, do art. 86, da Lei nº 8.213/91, que ora transcrevo, por oportuno: " o recebimento de salário ou concessão de outro benefício, exceto de aposentadoria, observado o disposto no §5º, não prejudicará a continuidade do auxílio-acidente.".
6.2. Recurso:
[..]
Ocorre que a legislação que disciplina o benefício assistencial que é posterior à legislação acima citada proíbe expressamente a cumulação de benefício assistencial (LOAS) com qualquer outro benefício seja no âmbito da seguridade social seja de outro regime.
Ou seja, sabe-se que o benefício assistencial NÃO é cumulável com qualquer outro benefício, conforme preceitua o § 4.º, do art. 20, da Lei 8.742/93. Assim, por óbvio, não é cumulável com auxílio-acidente.
Vejamos:
Art. 20. O benefício de prestação continuada é a garantia de um salário-mínimo mensal à pessoa com deficiência e ao idoso com 65 (sessenta e cinco) anos ou mais que comprovem não possuir meios de prover a própria manutenção nem de tê-la provida por sua família.
§ 4º O benefício de que trata este artigo não pode ser acumulado pelo beneficiário com qualquer outro no âmbito da seguridade social ou de outro regime, salvo os da assistência médica e da pensão especial de natureza indenizatória. (grifos acrescidos)
Dessa maneira, apesar de o auxílio-acidente permitir a cumulação com alguns tipos de benefício. A lei que regulamente o benefício assistencial PROÍBE a acumulação do mesmo com qualquer outro, como o auxílioacidente.
Dessa maneira, apesar de não constar qualquer proibição de revisão na parte dispositiva da sentença, em face de haver menção na fundamentação do decisum, o INSS requer a esta Turma Recursal que se pronuncie expressamente no sentido de declarar a inexistência de qualquer proibição na sentença vergastada de o INSS, (se utilizando do seu poder de autotutela e de órgão originário de análise das hipóteses de concessão e cessação dos benefícios) proceder com a revisão/cessação no auxílio-acidente do demandante em face da implantação do benefício assistencial concedido nos presentes autos.
Por fim, ainda em razão da inacumulatividade dos benefícios de LOAS e auxílio-acidente, a Autarquia pugna seja determinada a dedução na planilha de atrasados dos valores recebidos a título de auxílio-acidente (NB: 601.276.680).
6.3. Acórdão: confirmou a sentença pelos próprios fundamentos.
7. Do resumo das argumentações dos amicus curiae e dos memoriais do INSS
7.1. Memorial INSS:
(i) a Lei 8.742/93, ao garantir 01 salário mínimo para o deficiente e o idoso, sem possibilidade de cumulação com outros benefícios, cumpre, substancialmente, o comando do art. 203, V, da CF/88;
(ii) a política de assistência social é para propiciar um mínimo existencial;
(iii) a Lei 8.742/93 é clara ao impedir a cumulação e o §3º do art. 86 da Lei 8.213/91 foi utilizado incorretamente, uma vez que voltado a impedir cumulação de benefícios previdenciários entre si; para benefícios previdenciários e assistenciais a regra específica é a do §4º do art. 20 da Lei 8.742/93;
(iv) a juprisprudência de todos os TRF's é pacífica e o STJ e a TNU já decidiram pela impossibilidade de cumulação (cita acórdãos);
(v) sobre a possibilidade de renúncia para fins de ficar com o benefício mais vantajoso, o art. 533 da IN 77/2015 já traz essa previsão;
(vi) requer a fixação da seguinte tese: " É inacumulável o benefício de prestação continuada - BPC/LOAS com qualquer outro benefício da seguridade social ou de outro regime previdenciário, incluindo o auxílio-acidente, na forma do art. 20, §4º, da Lei nº 8.742/1993, sendo facultado ao beneficiário, quando preenchidos os requisitos legais de ambos os benefícios, a opção pela proteção mais vantajosa, salvo nos casos de aposentadorias especiais, por tempo de contribuição e por idade”.
7.2. DPU:
(i) diante do que consta dos arts. 86, §3º e 124 da Lei 8.213/91, é possível a acumulação de: Auxílio-Acidente + LOAS; Auxílio-Acidente + Pensão por Morte; Auxílio-Acidente + Auxílio-Doença; Auxílio-Acidente + Salário Maternidade; Auxílio-Acidente + Seguro Desemprego; sendo vedada somente a acumulação com aposentadoa e outro auxílio-acidente;
(ii) princípio da dignidade da pessoa humana e proteção social;
(iii) até 1997 era possível a acumulação do auxílio-acidente até mesmo com a aposentadoria.
7.3. IBDP:
(i) dignidade da pessoa humana como ponto de partida da interpretação;
(ii) o auxílio-acidente é benefício de caráter indenizatório, não substitutivo da renda e que decorre das próprias contribuições do segurado; assim, na forma da legislação, ele se encerra com a aposentadoria, mas não com a concessão do amparo assistencial;
(iii) embora a lei vede a cumulação do LOAS com outro benefício da seguridade social, existem exemplos de cumulação, como a possibilidade de cumular LOAS e bolsa família, desde que a renda da família se enquadre nos requisitos;
(iv) a TNU ja se manifestou no sentido de ser impossível cumular LOAS e cota de pensão por morte, admitindo, porém, a opção pelo benefício mais vantajoso (PEDILEF 05109419420124058200); no entanto, a pensão por morte é benefício do dependente e o auxílio-acidente decorre de esforço do segurado, sendo as situações distintas;
(v) o que deve ser verificado, na verdade, é se o beneficiário preenche os requisitos do LOAS considerada a renda do auxílio-acidente; se positiva a resposta, deve ter o direito de acumular, porque somente assim haveria a proteção social preconizada pela CF/88;
(vi) alternativamente, entende ser possível, pelo menos, a escolha pelo benefício mais vantajoso, garantindo-se assim a percepção de um salário-mínimo a quem dele necessitar.
8. Da legislação de regência:
8.1. Lei 6.179/74, que institiu o amparo para maiores de 70 anos de idade e para os inválidos:
Art 2º As pessoas que se enquadrem em qualquer das situações previstas nos itens I e III, do artigo 1º, terão direito a:
I - Renda mensal vitalícia, a cargo do INPS ou do FUNRURAL, conforme o caso, devida a partir da data da apresentação do requerimento e igual à metade do maior salário-mínimo vigente no País, arredondada para a unidade de cruzeiro imediatamente superior, não podendo ultrapassar 60% (sessenta por cento) do valor do salário-mínimo do local de pagamento.
§ 1º A renda mensal de que trata este artigo não poderá ser acumulada com qualquer tipo de benefício concedido pela Previdência Social urbana ou rural, por outro regime, salvo, na hipótese do item III, do artigo 1º, o pecúlio de que trata o § 3º, do artigo 5º, da Lei nº 3.807, de 26 de agosto de 1960, na redação dada pelo artigo 1º, da Lei nº 5.890, de 8 junho de 1973.
8.2. Lei 8.213/91, no ponto que que mateve provisoriamente a renda mensal vitalícia (benefício que antecedeu o LOAS):
Art. 139. A Renda Mensal Vitalícia continuará integrando o elenco de benefícios da Previdência Social, até que seja regulamentado o inciso V do art. 203 da Constituição Federal. (Revogado pela Lei nº 9.528, de 1997)
§ 1º. A Renda Mensal Vitalícia será devida ao maior de 70 (setenta) anos de idade ou inválido que não exercer atividade remunerada, não auferir qualquer rendimento superior ao valor da sua renda mensal, não for mantido por pessoa de quem depende obrigatoriamente e não tiver outro meio de prover o próprio sustento, desde que: (Revogado pela Lei nº 9.528, de 1997)
I - tenha sido filiado à Previdência Social, em qualquer época, no mínimo por 12 (doze) meses, consecutivos ou não; (Revogado pela Lei nº 9.528, de 1997)
II - tenha exercido atividade remunerada atualmente abrangida pelo Regime Geral de Previdência Social, embora sem filiação a este ou à antiga Previdência Social Urbana ou Rural, no mínimo por 5(cinco) anos, consecutivos ou não; ou (Revogado pela Lei nº 9.528, de 1997)
III - se tenha filiado à antiga Previdência Social Urbana após completar 60 (sessenta) anos de idade, sem direito aos benefícios regulamentares. (Revogado pela Lei nº 9.528, de 1997)
§ 2º O valor da Renda Mensal Vitalícia, inclusive para as concedidas antes da entrada em vigor desta lei, será de 1 (um) salário mínimo. (Revogado pela Lei nº 9.528, de 1997)
§ 3º A Renda Mensal Vitalícia será devida a contar da apresentação do requerimento. (Revogado pela Lei nº 9.528, de 1997)
§ 4º A Renda Mensal Vitalícia não pode ser acumulada com qualquer espécie de benefício do Regime Geral de Previdência Social, ou da antiga Previdência Social Urbana ou Rural, ou de outro regime. (Revogado pela Lei nº 9.528, de 1997)
8.3. Lei 8.213/91, no ponto que tratou do auxílio-acidente:
Art. 86. O auxílio-acidente será concedido, como indenização, ao segurado quando, após consolidação das lesões decorrentes de acidente de qualquer natureza, resultarem seqüelas que impliquem redução da capacidade para o trabalho que habitualmente exercia. (Redação dada pela Lei nº 9.528, de 1997)
§ 1º O auxílio-acidente mensal corresponderá a cinqüenta por cento do salário-de-benefício e será devido, observado o disposto no § 5º, até a véspera do início de qualquer aposentadoria ou até a data do óbito do segurado. (Redação dada pela Lei nº 9.528, de 1997)
§ 2º O auxílio-acidente será devido a partir do dia seguinte ao da cessação do auxílio-doença, independentemente de qualquer remuneração ou rendimento auferido pelo acidentado, vedada sua acumulação com qualquer aposentadoria. (Redação dada pela Lei nº 9.528, de 1997)
§ 3º O recebimento de salário ou concessão de outro benefício, exceto de aposentadoria, observado o disposto no § 5º, não prejudicará a continuidade do recebimento do auxílio-acidente. (Redação dada pela Lei nº 9.528, de 1997)
8.4. CF/88: determinou a instituição do LOAS, escolheu os beneficiários, fixou o valor e remeteu à lei a sua regulamentação:
Art. 203. A assistência social será prestada a quem dela necessitar, independentemente de contribuição à seguridade social, e tem por objetivos:
V - a garantia de um salário mínimo de benefício mensal à pessoa portadora de deficiência e ao idoso que comprovem não possuir meios de prover à própria manutenção ou de tê-la provida por sua família, conforme dispuser a lei.
8.5. Lei 8.742/93, que instituiu o LOAS:
Art. 1º A assistência social, direito do cidadão e dever do Estado, é Política de Seguridade Social não contributiva, que provê os mínimos sociais, realizada através de um conjunto integrado de ações de iniciativa pública e da sociedade, para garantir o atendimento às necessidades básicas.
Art. 20. O benefício de prestação continuada é a garantia de um salário-mínimo mensal à pessoa com deficiência e ao idoso com 65 (sessenta e cinco) anos ou mais que comprovem não possuir meios de prover a própria manutenção nem de tê-la provida por sua família.
§ 3º Considera-se incapaz de prover a manutenção da pessoa com deficiência ou idosa a família cuja renda mensal per capita seja: (Redação dada pela Lei nº 13.982, de 2020)
I - inferior a um quarto do salário mínimo; (Redação dada pela Medida Provisória nº 1.023, de 2020) Vigência
§ 4º O benefício de que trata este artigo não pode ser acumulado pelo beneficiário com qualquer outro no âmbito da seguridade social ou de outro regime, salvo os da assistência médica e da pensão especial de natureza indenizatória. (Redação dada pela Lei nº 12.435, de 2011)
§ 9º Os rendimentos decorrentes de estágio supervisionado e de aprendizagem não serão computados para os fins de cálculo da renda familiar per capita a que se refere o § 3o deste artigo. (Redação dada pela Lei nº 13.146, de 2015)
§ 14. O benefício de prestação continuada ou o benefício previdenciário no valor de até 1 (um) salário-mínimo concedido a idoso acima de 65 (sessenta e cinco) anos de idade ou pessoa com deficiência não será computado, para fins de concessão do benefício de prestação continuada a outro idoso ou pessoa com deficiência da mesma família, no cálculo da renda a que se refere o § 3º deste artigo. ' (Incluído pela Lei nº 13.982, de 2020)
§ 15. O benefício de prestação continuada será devido a mais de um membro da mesma família enquanto atendidos os requisitos exigidos nesta Lei. (Incluído pela Lei nº 13.982, de 2020)
9. Tema correlato no âmbito da TNU: ausência de prejudicialidade ou conexão/continência
9.1. Está pendente de julgamento no âmbito da TNU o tema 284, com a seguinte controvérsia: "Saber se, ao beneficiário da cota-parte de pensão por morte, é possível optar pelo benefício assistencial, mais vantajoso, e em quais condições caberia tal opção."
9.2. Eis trecho esclarecedor do acórdão de afetação:
Trata-se de pedido de uniformização interposto pela parte autora em face de acórdão proferido pela Turma Recursal de Tocantins que, mantendo a sentença singular de improcedência, entendeu não ser possível a renúncia à cota-parte de pensão por morte, para fins de percepção de benefício assistencial.
Alega o recorrente que a decisão estaria em conflito com o entendimento desta TNU, no sentido de que os beneficiários que recebem cota de pensão podem exercer o direito de opção pelo benefício assistencial, sem que isto viole o §4º do art. 20 da Lei 8.742/923, bem como da Turma Recursal do Paraná, para a qual há direito de opção entre benefício previdenciário e benefício assistencial, cabendo a renúncia ao primeiro com o fim específico de recebimento do segundo.
[...]
A controvérsia cinge-se ao exame da possibilidade de a demandante renunciar à cota-parte de pensão por morte, para fins de opção de benefício previdenciário mais vantajoso, no caso, benefício assistencial.
A divergência encontra-se bem delineada, pelo que cabível o conhecimento do presente incidente. Enquanto a Turma de origem entende pela inviabilidade do restabelecimento do LOAS com renúncia à cota-parte da pensão por morte, os julgados paradigmas posicionam-se no sentido de admitir a opção pelo benefício assistencial quando mais vantajoso do que o benefício previdenciário.
9.3. Como se vê, embora se encontrem teoricamente em um ponto (renúncia para fins de benefício mais vantajoso: foco secundário neste tema 253 e principal no tema 284), os temas 253 e 284 não são prejudiciais, conexos ou continentes, a exigir julgamento conjunto.
10. Da jurisprudência sobre o tema:
10.1. STJ: é amplamente dominante (talvez pacífica) no sentido da impossibilidade de cumulação:
PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO DE PRESTAÇÃO CONTINUADA. INACUMULATIVIDADE COM OUTRO BENEFÍCIO. RECURSO ESPECIAL IMPROVIDO.
1. Se gundo o art. 20, §4º, da Lei nº 8.742/93, não pode haver a cumulação de benefício de prestação continuada com qualquer outro benefício previdenciário.
2. Recurso especial improvido. (REsp 916.365/SP, Rel. Min. MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA, SEXTA TURMA, julgado em 17/4/2008, DJe 12/5/2008).
PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. RECURSO ESPECIAL. VIOLAÇÃO AO ART. 535 DO CPC. AUSÊNCIA. CONCLUSÃO LÓGICO SISTEMÁTICA DO DECISUM. AUXÍLIO-ACIDENTE E BENEFÍCIO DE PRESTAÇÃO CONTINUADA. ACUMULAÇÃO. IMPOSSIBILIDADE. ART. 20, § 4º DA LEI 8.742/93. CARÁTER ASSISTENCIAL. VEDAÇÃO EXISTENTE DESDE SUA INSTITUIÇÃO. DENOMINAÇÕES DIVERSAS. PROTEÇÃO AO HIPOSSUFICIENTE. RECURSO ESPECIAL DESPROVIDO.
I - [...]
III - A inacumulabilidade do benefício de prestação continuada com quaisquer outros benefícios de cunho previdenciário, assistencial ou de outro regime foi inicialmente disciplinada no artigo 2º, § 1º da Lei 6.179/74.
IV - O artigo 139 da Lei 8.213/91, expressamente revogado pela Lei 9.528/97, manteve provisoriamente o benefício, vedando sua acumulação no § 4º do aludido artigo.
V - Atualmente, o artigo 20, § 4º da Lei 8.742/93 disciplina a quaestio, vedando a acumulação do benefício de prestação continuada, - intitulado ainda de benefício assistencial ou amparo social -, com quaisquer outros benefícios.
VI - Apesar da sucessão de leis, a inacumulabilidade do benefício de prestação continuada com quaisquer outros benefícios se manteve incólume, dado seu caráter assistencial, e não previdenciário, conforme previsto no artigo 203, V da Constituição Federal e regulamentado pela Lei 8.742/93.
VII - Escorreito o acórdão recorrido, pois a despeito da vitaliciedade do auxílio-acidente concedido nos termos da Lei 6.367/76, sempre foi vedada a acumulação do benefício de prestação continuada com qualquer outro benefício, desde sua instituição com denominação diferente, mas com intuito de proteção social aos hipossuficientes.
VIII - Recurso especial conhecido, mas desprovido. (REsp 753.414/SP, Rel. Min. GILSON DIPP, QUINTA TURMA, julgado em 20/9/2005, DJ 10/12/2005 p. 426).
Em decisão monocrática proferida no REsp 1727264, publicada no dia 04/05/2021, o ministro Og Fernandes negou provimento ao recurso da parte autora, afirmando: "Dessa forma, depreende-se que a Corte local seguiu o entendimento deste Tribunal Superior segundo o qual é vedado a acumulação de benefício assistencial com qualquer outro benefício previdenciário."
10.2. TNU: não localizei precedente específico sobre o tema.
11. (Im)possibilidade de cumulação
11.1. No mérito, inobstante os fundamentos apresentados pelos amicus curiae, tenho que o caso é de fácil solução, bastando aplicar a lei que veda expressamente a cumulação (vedação presente desde 1974), e que, diga-se de passagem, está plenamente de acordo com o sistema de proteção social da CF/88 e não arranha o princípio da dignidade da pessoa humana. Nesse contexto, cabe ao Judiciário, como parece um pouco fora de moda nos últimos tempos, ser reverente à lei.
11.2. Começo constatando o equívoco das instâncias de origem ao invocar o §3º do art. 86 da Lei 8.213/91 para assentar a possibilidade de cumulação de LOAS e auxílio-acidente. O dispositivo em questão, em conjunto com o §2º e o art. 124, trata somente da (im)possibilidade de cumulação de benefícios previdenciários entre si. No caso do auxílio-acidente, veda a cumulação com aposentadoria, com outro auxílio-acidente e com auxílio-doença (se decorrente de mesmo evento). As cumulações não vedadas são permitidas.
11.3. No entanto, e isso é regra básica de hermenêutica, aplica-se ao caso a regra especial e mais recente, prevista no §4º do art. 20 da Lei 8.742/93, que veda expressamente a cumulação entre LOAS e benefício previdenciário, inclusive o auxílio-acidente. A cumulação com o LOAS somente é permitida, no âmbito da seguridade social, com benefícios de assistência médica e pensão especial de natureza indenizatória, que não estão em discussão nos autos.
11.4. Aproveito, desde já, para afastar a alegação descontextualizada do IBDP no sentido de que é possível a acumulação de LOAS e bolsa-família, sendo este último, também, benefício da seguridade social. Segundo o IBPD, essa possibilidade de acumulação demonstra que a vedação do § 4º do art. 20 da Lei 8.213/91, que trata de benefício da seguridade social, não é absoluta.
11.5. De início, tenho que a vedação da lei é para todo e qualquer benefício da seguradidade social, salvo assistência médica e pensão especial, que não se confundem com o bolsa-família. Não consta que essa vedação tenha sido afastada ou flexibilizada pela Lei 10.836/04, que criou o bolsa-família. Na verdade, a vedação é repetida expressamente pelo art. 5º do Decreto 6.214/2007 que regulamentou o LOAS.
11.6. O que ocorre é que o bolsa-família, na forma do art. 2º da Lei 10.836/2004, é benefício destinado à unidade familiar em situação de extrema pobreza, e não a um beneficiário específico. Nesse contexto, segundo a lei e os atos regulamentares (Decreto 6.214/07, Decreto 5.209/04 e Portaria Conjunta MDSA/INSS nº 3 de 21/09/2018), é possível que um integrante do grupo familiar receba LOAS e o grupo familiar, preenchidos os requisitos legais, receba bolsa-família. Inclusive, o valor do bolsa-família não é computado para fins de LOAS (art. 4º, §2º, I e IV, do Decreto 6.214/2007). O que não é possível, por cumulação indevida, é um grupo familiar de somente um integrante, que já receba LOAS, receber, ele mesmo, bolsa-família e vice-versa.
11.7. Em resumo, a hipótese de exceção invocada pelo IBDP, na realidade, não se faz presente, não interferindo no julgamento do tema. Na verdade, somente confirma a regra da inacumulabilidade prevista em lei.
11.8. Retomando o raciocínio, havendo vedação expressa na lei (sem conflito aparente com qualquer outra norma de mesma hierarquia), a cumulação entre LOAS e auxílio-acidente somente poderia ocorrer em caso de inconstitucionalidade, ainda que parcial ou via interpretação conforme para uma ou mais hipóteses casuísticas.
11.9. Ocorre que a restrição de cumulação, no caso, é totalmente compatível com a política de assistência social formatada pela CF/88 e implementada pela Lei 8.742/93, que busca promover os mínimos sociais, atendendo, em especial, de forma subsidiária, com 01 SM, idosos e deficientes que não podem garantir o próprio sustento ou tê-lo provido por sua família.
11.10. Registro que somente essa política assistencial (LOAS), atualmente, segundo dados do Boletim Estatístico da Previdencia Social - BEPS de fevereiro de 2021, atende 4.75 milhões de idosos e deficientes, a um custo mensal de 5.22 bilhões de reais (consulta no dia 21/05/2021: https://www.gov.br/previdencia/pt-br/acesso-a-informacao/dados-abertos/previdencia-social-regime-geral-inss/arquivos/beps022021_final-1.pdf)
11.11. Nesse contexto, é certo que foi o próprio constituinte quem fixou as balizas da política assistencial específica do LOAS, entendendo suficiente e/ou possível a concessão de somente um salário mínimo para prover os mínimos sociais, ressalvadas outras políticas sociais, como, por exemplo, a saúde gratuita.
11.12. E o legislador ordinário, seguindo a determinação constitucional e a conjugando com outras regras e princípios da mesma estatura, como as possibilidades e o equilíbrio financeiro e orcamentário e a responsabilidade fiscal, entendeu que fazendo jus ao LOAS, o benefíciário não poderia cumulá-lo com qualquer outro benefício pago pela seguridade social. Inclusive, buscou o legislador até mesmo promover a igualdade, uma vez que não faria sentido, em sede de benefício assistencial, sem contrapartida, permitir o pagamento de valor idêntico a quem tenha e a quem não tenha renda cumulativa.
11.13. A invocação genérica de princípios como a dignidade da pessoa humana e a proteção social, em discussões como a dos autos, não contribue para o debate. Fico a me perguntar: será que somente a soma do auxílio-acidente com o LOAS garantiria ao autor destes autos e a alguns outros beneficiários uma vida digna? Talvez não seja possível responder considerada a casuística. No entanto, no plano abstrato da política pública assistencial definidada pelo Estado, pode-se afirmar que uma resposta positiva implicaria aceitar que os quase 5 milhões de titulares de LOAS no Brasil, com renda limitada a 01 SM e sem cumulação, estariam desprotegidos e sem dignidade, o que não é correto ou admissível.
11.14. Vou me aventurar a uma especulação. Valendo-me do caso concreto, veja-se a que situação permitir a cumulação de LOAS com auxílio-acidnete pode levar. Segurado detentor de auxílio-acidente permanece trabalhando e contribuindo e, posteriormente, se aposenta por idade, aos 65 anos. Neste cenário, não se tem dúvidas de que o auxílio-acidente será cessado, sendo sua renda integrada aos salários de contribuição para fins de cálculo do salário de benefício. Imagine-se uma renda de 01 SM ou pouco mais, que é regra no RGPS. Já outro, também detentor de auxílio-acidente, não mais trabalha/contribui e passa a ser titular de LOAS ao 65 anos (esse exemplo poderia bem ser o caso dos autos).
11.15. Se acolhida a tese, com base em princípios genéricos, chegaríamos à seguinte situação inusitada: o segundo beneficiário - que em algum momento, podendo, deixou de contribuir - teria renda mensal maior do que o primeiro (que manteve-se contribuindo). Como solucionar isso: voltar a permitir a cumulação também nos casos de aposentadoria? Com certeza, não, sob pena de instalar o caos jurídico e econômico. A saída é simples: prestigiar o sistema legal, que é funcional e compatível com a CF/88.
11.16. Em resumo, e observando a pacífica jurisprudência do STJ, à qual a TNU também deve reverência, tenho que não é possível acumular LOAS e auxílio-acidente (seja de que valor for este benefício), pois seria uma hipótese de sobreproteção social vedada pelo sistema constitucional de seguridade social.
12. Da possibilidade de renúncia e opção pelo benefício mais vantajoso
12.1. Aqui também a solução é simples, uma vez que não existe controvérsia entre as partes e a legislação acolhe a solução, conforme se vê do artigo 533 da IN 77/2015, invocado pelo próprio INS:
Art. 533. O titular de benefício previdenciário que se enquadrar no direito ao recebimento de benefício assistencial será facultado o direito de renúncia e de opção pelo mais vantajoso, exceto nos casos de aposentadoria por idade, tempo de contribuição e especial, haja vista o contido no art. 181-B do RPS.
12.2. Assim sendo, não estando o auxílio-acidente nas exceções do dispositivo citado, é possível a sua renúncia por parte do beneficiário, para obter o LOAS, se mais vantajoso, é claro.
13. Da fixação da tese
Propõe-se a fixação de tese nos seguintes termos: "É inacumulável o benefício de prestação continuada - BPC/LOAS com o auxílio-acidente, na forma do art. 20, §4º, da Lei nº 8.742/1993, sendo facultado ao beneficiário, quando preenchidos os requisitos legais de ambos os benefícios, a opção pelo mais vantajoso.
14. Da aplicação da tese ao caso concreto
O julgado recorrido divergiu da tese firmada acima, ao permitir a cumulação de LOAS e auxílio-acidente. Assim sendo, devem os autos retornar à TR de origem para adequação do julgado.
15. Da conclusão
Em face do exposto, voto por DAR PROVIMENTO ao PUIL, julgando-o como representativo de controvérsia, para 1) fixar a tese do tema 253 nos seguintes termos: "É inacumulável o benefício de prestação continuada - BPC/LOAS com o auxílio-acidente, na forma do art. 20, §4º, da Lei nº 8.742/1993, sendo facultado ao beneficiário, quando preenchidos os requisitos legais de ambos os benefícios, a opção pelo mais vantajoso"; 2) restituir os autos à origem para adequação à tese ora firmada.
Seja o primeiro a comentar ;)
Postar um comentário