sexta-feira, 24 de dezembro de 2021

Tema 274 trata sobre a concessão de aposentadoria por invalidez após análise de aspectos sociais

Nesta sexta-feira será visto uma decisão da Turma Nacional de Uniformização, a qual gerou o Tema 274 com a seguinte redação: "É possível a concessão de aposentadoria por invalidez, após análise das condições sociais, pessoais, econômicas e culturais, existindo incapacidade parcial e permanente, no caso de outras doenças, que não se relacionem com o vírus HIV, mas, que sejam estigmatizantes e impactem significativa e negativamente na funcionalidade social do segurado, entendida esta como o potencial de acesso e permanência no mercado de trabalho.". Abaixo segue a decisão para análise dos amigos.


EMENTA
PEDIDO DE UNIFORMIZAÇÃO DE JURISPRUDÊNCIA. PREVIDENCIÁRIO. REGIME DOS REPRESENTATIVOS DE CONTROVÉRSIA. TEMA 274 DESTA TURMA NACIONAL. CONCESSÃO DE APOSENTADORIA POR INVALIDEZ, APÓS ANÁLISE DAS CONDIÇÕES SOCIAIS, PESSOAIS, ECONÔMICAS E CULTURAIS, EXISTINDO INCAPACIDADE PARCIAL E PERMANENTE, NO CASO DE OUTRAS DOENÇAS, QUE NÃO SE RELACIONEM COM O VÍRUS HIV. POSSIBILIDADE. PROPOSTA DE REVISÃO DAS SÚMULAS 77 E 78 DESTA TURMA NACIONAL.FIXAÇÃO DE TESE COM REDAÇÃO ATUALIZADA: "É POSSÍVEL A CONCESSÃO DE APOSENTADORIA POR INVALIDEZ, APÓS ANÁLISE DAS CONDIÇÕES SOCIAIS, PESSOAIS, ECONÔMICAS E CULTURAIS, EXISTINDO INCAPACIDADE PARCIAL E PERMANENTE, NO CASO DE OUTRAS DOENÇAS, QUE NÃO SE RELACIONAM COM O HIV, MAS QUE, SEJAM ESTIGMATIZANTES E IMPACTEM SIGNIFICATIVA NEGATIVAMENTE NA FUNCIONALIDADE SOCIAL DO SEGURADO, ENTENDIDA ESTA COMO O POTENCIAL DE ACESSO E PERMANÊNCIA NO MERCADO DE TRABALHO". INCIDENTE CONHECIDO E PROVIDO.
TNU, PEDIDO DE UNIFORMIZAÇÃO DE INTERPRETAÇÃO DE LEI (TURMA) Nº 0512288-77.2017.4.05.8300/PE, relator juiz federal Luis Eduardo Bianchi Cerqueira, 24/09/2021.

ACÓRDÃO
A Turma Nacional de Uniformização decidiu, por maioria, CONHECER e DAR provimento ao incidente de uniformização nacional, nos termos do voto do Juiz Relator, julgando-o como representativo da controvérsia, para fixar a tese do tema 274 nos seguintes termos: "é possível a concessão de aposentadoria por invalidez, após análise das condições sociais, pessoais, econômicas e culturais, existindo incapacidade parcial e permanente, no caso de outras doenças, que não se relacionem com o vírus HIV, mas, que sejam estigmatizantes e impactem significativa e negativamente na funcionalidade social do segurado, entendida esta como o potencial de acesso e permanência no mercado de trabalho". Vencidos os Juízes Federais FÁBIO SOUSA, POLYANA FALCÃO BRITO e JAIRO SCHAFER.

Brasília, 23 de setembro de 2021.

RELATÓRIO
Trata a hipótese de incidente de uniformização nacional, cuja admissibilidade foi negada na origem, o que motivou a interposição de agravo, tendo o recurso sido encaminhado a esta Relatoria pela seguinte decisão, verbis:

DESPACHO/DECISÃO
Trata-se de agravo interposto contra decisão que inadmitiu pedido de uniformização nacional, destinado a reformar acórdão, no qual se discute a concessão de benefício por incapacidade a portadora de Lúpus.
Sustenta a parte requerente, em síntese, a necessidade de análise das condições pessoais e socioeconômicas, para fins de aferição do estado incapacitante, não apenas na circunstância de acometimento por HIV, mas também em caso de doenças com elevado estigma social (como Lúpus).
É o breve relatório.
Conheço do agravo, tendo em vista o cumprimento dos requisitos de admissibilidade.
No caso vertente, há indícios da divergência suscitada, porquanto o entendimento do acórdão recorrido diverge, em princípio, da posição adotada no aresto acostado como paradigma.
Nesse contexto, preenchidos os requisitos de admissibilidade, a matéria em debate merece ser examinada pelo órgão julgador.
Ante o exposto, com fundamento no art. 15, VI, do RITNU, admito o pedido de uniformização. Distribua-se a um dos magistrados integrantes do colegiado.
Intimem-se.

Em breve síntese, trata-se de ação previdenciária na qual se visa a concessão da aposentadoria por invalidez ou do auxílio-doença, eis que indevido o indeferimento na via administrativa.

A sentença foi de improcedencia do pedido, por entender que a parte autora recolhia contribuições na condição de segurada facultativa, bem como que para os atos da vida diária não havia incapacidade.

Inconformada, a parte autora interpôs recurso inominado, o qual a 1ª Turma Recursal dos Juizados Especiais Federais de Pernambuco, por unanimidade, resolveu dar parcial provimento ao Recurso, para conceder em favor da parte autora o restabelecimento do benefício de auxílio-doença, com DIB no dia seguinte à data da cessação indevida do benefício, em 07/08/2016, o e DIP a partir da lavratura do trânsito em julgado. Segue o voto:

EMENTA BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO. AUXÍLIO-DOENÇA/APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. CONCESSÃO. INCAPACIDADE PARCIAL E DEFINITIVA. INCAPACIDADE PARA A ATIVIDADE LABORATIVA HABITUAL. REQUISITO CONFIGURADO. RECURSO DA PARTE AUTORA PROVIDO EM PARTE. Trata-se de recurso inominado interposto pela parte autora contra a sentença que julgou improcedente o pedido de restabelecimento de auxílio-doença/aposentadoria por invalidez. O artigo 59 e seguintes da Lei n.º 8.213/91 determinam que o segurado, incapacitado para o exercício de sua atividade habitual ou trabalho, por mais de 15 dias, terá direito à percepção do auxílio-doença, enquanto perdurar tal condição. Por seu turno, o art. 42 da LBPS estabelece que “aposentadoria por invalidez, uma vez cumprida, quando for o caso, a carência exigida, será devida ao segurado que, estando ou não em gozo de auxílio-doença, for considerado incapaz e insusceptível de reabilitação para o exercício de atividade que lhe garanta a subsistência, e ser-lhe-á paga enquanto permanecer nesta condição”. A controvérsia restringe-se à existência ou não da incapacidade para sua atividade laborativa habitual. No caso dos autos, segundo a perícia, a parte autora é portadora de Lúpus eritematoso sistêmico (Laudo pericial, anexo 13, ques. 08). O perito afirma que a incapacidade teve início em 2010 (Laudo pericial, anexo 13, quesito 11). Não obstante o juízo de origem tenha concluído de forma diversa, entendo que restou comprovado que a demandante exercia a atividade de empregada doméstica, consoante prova testemunhal a qual confirmou que ela realizava serviços como faxineira. Além disso, consta no Cnis ter a mesma vertido contribuições na condição de contribuinte individual nos períodos de 2007 a 2010, 2011 a 2012 e 2012 a 2107, e não como segurado facultativo (vide anexo 11, pg. 4-6), o que corrobora a conclusão de que a mesma desempenhava a atividade na condição de diarista, tal como reconheceu a testemunha ouvida em juízo. A autora também sempre declarou exercer atividades domésticas, como cozinheira ou faxineira, por ocasião das perícias administrativas realizadas perante o INSS (vide doc. 11, pg. 11 e seguintes), de maneira que não há qualquer motivo para infirmar tal condição. Com efeito, para a concessão do auxílio-doença, é imprescindível a constatação da incapacidade para a atividade laboral habitualmente desempenhada pelo trabalhador segurado, o que restou comprovado no presente caso, uma vez que no desempenho da atividade de empregada doméstica, é necessário o uso de força bruta: “(...)4) Em caso positivo, tal doença, lesão, sequela ou deficiência incapacita o(a) periciando(a), no momento atual, para o desenvolvimento de atividades laborativas? R- Sim(...)7) Qual o trabalho exercido pelo periciando quando da constatação de sua incapacidade? REmpregada doméstica. 8) A doença o impede para o exercício da atividade laborativa descrita na questão anterior (sua atividade habitual)? Como? R- Sim. Uma vez que não pode executar tarefas mais duras como carregar peso, ou afastar móveis. 9) Caso esteja desempregado(a), pode o(a) periciando(a) desempenhar as profissões que já exerceu no passado, mesmo acometido da doença alegada? R- Não. 10) A doença apresentada pelo periciando o incapacita para outras atividades laborativas diferentes da sua habitual? Quais? R- Toda aquela que requeira força física grande(...)”. Assim, conclui-se que, de fato, o desempenho da atividade habitual da recorrente (Faxineira) é incompatível com seu quadro clínico. Nesse passo, reputo vencido o requisito da incapacidade. Destarte, considerando que a parte autora é pessoa ainda jovem (atualmente com 43 anos), com prognóstico favorável para a reinserção no mercado de trabalho, em atividades que não exijam esforço demasiado, entendo que o benefício a ser concedido é o auxíliodoença, e não, a aposentadoria por invalidez, devendo a mesma ser encaminhanda ao processo de reabilitação profissional pelo INSS, acaso constatada a elegibilidade. Em razão da possibilidade de encaminhamento à reabilitação profissional, deixo de fixar prazo para cessação do benefício, sem prejuízo da reavaliação do INSS no âmbito administrativo. Por todas as razões acima expostas, bem como em razão de ser esta fundamentação suficiente para a apreciação de todos os pedidos formulados pelas partes, considero como não violados os demais dispositivos suscitados, inclusive considerando-os como devidamente prequestionados, possibilitando, de logo, a interposição do recurso excepcional cabível (RE). Recurso da parte autora provido em parte. Sentença modificada para julgar procedente em parte o pleito autoral, para conceder em favor da parte autora o restabelecimento do benefício de auxílio-doença, com DIB no dia seguinte à data da cessação indevida do benefício, em 07/08/2016, o e DIP a partir da lavratura do trânsito em julgado. Os valores atrasados devem ser corrigidos com Juros de mora conforme a Lei nº 11.960/09 e Correção monetária conforme o índice de Preços ao Consumidor Amplo Especial (IPCAE), considerando o decidido pelo Supremo Tribunal Federal no julgamento do RE nº 870.947. Pagamento via RPV ou precatório. Deixo de condenar a parte autora em honorários advocatícios, uma vez que restou vencedora em parte no recurso. Custas ex lege. ACÓRDÃO Decide a 1ª Turma Recursal dos Juizados Especiais Federais de Pernambuco, por unanimidade, dar parcial provimento ao Recurso da parte autora, nos termos da ementa supra.

Inconformada, a parte autora interpôs incidente de uniformização de jurisprudência. Aduziu que a decisão da 1ª Turma Recursal do Estado de Pernambuco não foi acertada e que contrariou a tese já firmada pela Turma Nacional de Uniformização, no sentido de que, em casos de doença com certo estigma social, deve-se as condições pessoais e sociais serem avaliadas considerando tal ponto. Ou seja, os aspectos pessoais e sociais devem ser apreciados sob a perspectiva de reingresso no mercado de trabalho de uma pessoa acometida por doença estigmatizante.

Esse órgão julgador proferiu voto no evento 16, no sentido de há grande divergência sobre o tema, sendo necessário esclarecer "se é possível a concessão de aposentadoria por invalidez, após análise das condições sociais, pessoais, econômicas e culturais, existindo incapacidade parcial e permanente, no caso de outras doenças, que não se relacionem com o vírus HIV". Votou por propor a afetação do tema, para julgamento no regime dos representativos de controvérsia, com a sua consequente conversão para o referido rito.

Houve a publicação do edital para que pessoas, órgãos ou entidades com interesse na controvérsia possam apresentar memoriais escritos, no evento 20.

A DPU requereu seu ingresso no feito como amicus curiae, o qual foi autorizado por meio do despacho proferido no evento 32.

O MPF manifestou-se em parecer pelo provimento do incidente de uniformização.

O INSTITUTO BRASILEIRO DE DIREITO PREVIDENCIÁRIO – IBDP requereu o ingresso no feito como amicus curiae e foi admitido.

É o breve relatório.

VOTO
Pois bem, a questão da admissibilidade e conversão de rito já foi decidida, restando decidir o mérito da causa e fixar a tese.

I - CONTEXTUALIZANDO O TEMA 274

Assim sendo, no mérito, convém destacar que esta turma nacional tem considerado que doenças estigmatizantes devam ter um tratamento diferenciado, no que diz respeito à analise da possibilidade de reconversão do trabalhador, quando acometido de incapacidade parcial e permanente.

Evidentemente, se a incapacidade é total e permanente, o caso é mesmo de concessão de aposentadoria por invalidez, inexistindo a celeuma.

Se ela for total e temporária, o caso é de auxílio-doença.

Porém, na hipótese de incapacidade parcial e permanente, normalmente, faz-se, mediante análise dos critérios de elegibilidade do trabalhador-segurado, por parte da autarquia, a readaptação, que é a sua reconversão para outra atividade, na qual, não seja prejudicado, em seu labor, pela incapacidade que ostenta.

Dessa forma, não necessitará de qualquer prestação do Estado, porque aquela incapacidade não o impedirá de obter renda por conta própria.

Ocorre, que há algumas situações em que esse trabalhador-segurado não terá chances de conseguir trabalho, mesmo sendo submetido à reconversão laboral.

Isso se dá quando a referida doença, por sua estigmatização social, reduz a sua empregabilidade, o que tende a ocorrer, com segurados portadores de menor instrução, em cidades menores, que possuem labores mais físicos que intelectuais.

Por isso, esta turma nacional, com relação ao HIV, entendeu de baixar a Súmula 78, verbis:

Súmula 78
Órgão Julgador TURMA NACIONAL DE UNIFORMIZAÇÃO DOS JUIZADOS ESPECIAIS FEDERAIS
Data do Julgamento 11/09/2014
Data da Publicação DOU 17/09/2014 PG. 00087
Enunciado
Comprovado que o requerente de benefício é portador do vírus HIV, cabe ao julgador verificar as condições pessoais, sociais, econômicas e culturais, de forma a analisar a incapacidade em sentido amplo, em face da elevada estigmatização social da doença.
Referência Legislativa
Precedentes PEDILEF n. 5003198-07.2012.4.04.7108, julgamento: 11/9/2014. DOU 17/9/2014.
PEDILEF n. 0021275-80.2009.4.03.6301, julgamento: 12/6/2013. DOU 21/6/2013.
PEDILEF n. 0502848-60.2008.4.05.8401, julgamento: 9/10/2013. DOU 28/10/2013.

Assim, é pacífico que, no caso de HIV, dada a sua estigamtização, deve o segurado ter um tratamento diferenciado, de modo que, em havendo incapacidade parcial e permanente, quando as condições pessoais, sociais, econômicas e culturais sugerirem que não haverá possibilidade de reinserção no mercado de trabalho, mesmo após hipotética reconversão laboral, o segurado deve ser aposentado por invalidez.

O que a pergunta do Tema 274 está a questionar é se somente o HIV merece esse tratamento diferenciado ou se outras doenças, que apresentarem o mesmo viés estigmatizante, também poderão ensejar a concessão de aposentadoria por invalidez, uma vez que exista incapacidade parcial e permanente; e que as condições pessoais, sociais, econômicas e culturais permitam entrever que a possibilidade de inserção no mercado do trabalho, daquele segurado, mesmo que viesse a ser submetido à reconversão laboral, seria muito reduzida ou nula, verbis:

"Tema274
Situação do tema Em julgamento - eproc
Ramo do direito DIREITO PREVIDENCIÁRIO
Questão submetida a julgamento: Se é possível a concessão de aposentadoria por invalidez, após análise das condições sociais, pessoais, econômicas e culturais, existindo incapacidade parcial e permanente, no caso de outras doenças, que não se relacionem com o vírus HIV.
Tese firmada
Decisão de afetação: 21/08/2020
Relator (a): Juiz Federal Luis Eduardo Bianchi Cerqueira
Julgado em
Acórdão publicado em
Trânsito em julgado

II - TRATAMENTO DO TEMA NA JURISPRUDÊNCIA
Como dito no voto que decidiu pela afetação ao rito dos representativos de controvérsia, a questão tem sido bastante turbulenta na jurisprudência. Porém, esta turma nacional já se posicionou no sentido da necessidade da análise das condições pessoais, sociais, econômicas e culturais, pela estigmatização da doença, mesmo existindo apenas incapacidade parcial permanente, na hipótese de hanseníase, verbis:

Tipo
Acórdão
Número: 05022366220124058311
05022366220124058311
Relator(a): JUIZ FEDERAL DOUGLAS CAMARINHA GONZALES
Relator para Acórdão: JUIZ FEDERAL PAULO ERNANE MOREIRA BARROS
Data: 12/11/2014
Data da publicação: 23/01/2015
Fonte da publicação: DOU 23/01/2015 PÁGINAS 68/160
Ementa: PEDIDO DE UNIFORMIZAÇÃO INTERPOSTO PELA PARTE AUTORA. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. HANSENÍASE. DOENÇA ESTIGMATIZANTE. SENTENÇA E ACÓRDÃO GENÉRICOS. AUSÊNCIA DE APRECIAÇÃO ACERCA DAS CONDIÇÕES PESSOAIS E SOCIAIS. INCIDENTE CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO. 1. A Turma Recursal da Seção Judiciária de Pernambuco manteve por seus próprios e jurídicos fundamentos a sentença que julgou improcedente o pedido de benefício assistencial ao deficiente. De acordo com o Colegiado, as provas existentes nos autos apontam que o núcleo familiar, não obstante a renda per capita inferior a ¼ do salário-mínimo, não se encontra em situação de miserabilidade. 2. Interposto incidente de uniformização pela parte autora, com fundamento no art. 14, § 2º, da Lei nº 10.259/2001. Alega, em síntese, que o limite de ¼ do salário-mínimo não deve ser o único critério a ser analisado pelo julgador para aferição da miserabilidade. Com o intuito de comprovar a divergência jurisprudencial, acostou como paradigma acórdão da Primeira Turma Recursal do Mato Grosso (autos nº 2008.36.00.700052-6). Afirma, ainda, ser este o entendimento do STF e do STJ (julgado mencionado à guisa de ilustração). 3. Em seu voto o nobre Relator não conhece do incidente ao fundamento de que o acórdão trazido como paradigma está no mesmo sentido do acórdão recorrido. 4. Em que pese os judiciosos fundamentos invocados pelo N. Relator, observo dos autos que o acórdão é por demais genérico, não se pronunciando sobre as condições pessoais e sociais da recorrente. 5. De outro lado, nota-se que a recorrente é portadora de hanseníase, doença que ainda causa repulsa e estigma no meio social, estando parcialmente incapacitada, e vive com o esposo e dois filhos menores. A renda da família é proveniente apenas de aposentadoria de valor mínimo do esposo, porque a autora é vendedora ambulante de bilhetes de loteria, mas com a doença não pode andar no sol. Em que pese somente no acórdão o Relator tenha citado, de forma genérica, que não há nos autos provas de gastos excepcionais que indiquem miserabilidade, não foi feita perícia socioeconômica, não havendo elementos suficientes para aferir se realmente ficou ou não caracterizado o impedimento de longo prazo. 6. Esta Turma Nacional de Uniformização tem entendimento de que a generalidade do acórdão, que não se confunde com a fundamentação sucinta, a não se ater às especificidades do caso que lhe é trazido, acaba por violar o direito à fundamentação da sentença, inserto no art. 93, IX, da CF/88. Nesse sentido cito os seguintes PEDILEFs: 5064796720074058103; 05007292520094058100; 05012457920084058100; 05058174020064058103; e 05012611820084058202. 7. Nesse passo, voto no sentido de que seja o incidente conhecido e parcialmente provido para que seja o acórdão anulado, com retorno dos autos à origem para que, se possível, seja realizado levantamento socioeconômico, a fim de apurar a real situação da recorrente, com a prolação de novo acórdão em que as condições pessoais e sociais sejam efetivamente examinadas. É como voto.
Decisão: Decide a turma nacional de uniformização dos juizados especiais federais conhecer do incidente e dar-lhe provimento.
Outras fontes: PÁGINAS 68/160
Inteiro teor: VOTO VENCIDO (JUIZ RELATOR DOUGLAS CAMARINHA GONZALES) PEDIDO DE UNIFORMIZAÇÃO INTERPOSTO PELA PARTE AUTORA. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. AFASTAMENTO DO LIMITE DE ¼ DO SALÁRIO-MÍNIMO COMO ÚNICO CRITÉRIO PARA AFERIÇÃO DA MISERABILIDADE. ACÓRDÃO RECORRIDO ANALISOU OUTROS MEIOS DE PROVA, ENCONTRANDO-SE NO MESMO SENTIDO DO PARADIGMA APRESENTADO. AUSÊNCIA DE DISSÍDIO JURISPRUDENCIAL. REEXAME DE MATÉRIA FÁTICA. IMPOSSIBILIDADE. SÚMULA Nº 42 DA TNU. INCIDENTE NÃO CONHECIDO. 1. Prolatado acórdão pela Turma Recursal de Pernambuco, o qual manteve a sentença que julgou improcedente o pedido de concessão de benefício assistencial. De acordo com o Colegiado, as provas existentes nos autos apontam que o núcleo familiar, não obstante a renda per capita inferior a ¼ do salário-mínimo, não se encontra em situação de miserabilidade. 2. Interposto incidente de uniformização pela parte autora, com fundamento no art. 14, § 2º, da Lei nº 10.259/2001. Alega a recorrente que o limite de ¼ do salário-mínimo não deve ser o único critério a ser analisado pelo julgador para aferição da miserabilidade. Com o intuito de comprovar a divergência jurisprudencial, acostou como paradigma acórdão da Primeira Turma Recursal do Mato Grosso (autos nº 2008.36.00.700052-6). Afirma, ainda, ser este o entendimento do STF e do STJ (julgado mencionado à guisa de ilustração). 3. Incidente inadmitido na origem, sendo os autos encaminhados a esta TNU após Agravo e distribuídos a este Relator. 4. Nos termos do art. 14, § 2º, da Lei nº 10.259/01, o pedido de uniformização nacional de jurisprudência é cabível quando houver divergência entre decisões sobre questões de direito material proferidas por turmas recursais de diferentes regiões ou em contrariedade à súmula ou jurisprudência dominante da Turma Nacional de Uniformização ou do Superior Tribunal de Justiça. 5. O incidente não merece ser conhecido. 6. Segundo o acórdão paradigma, deve ser considerada para fins de averiguação do estado de miserabilidade toda a estrutura social em que está inserido o postulante do benefício, não sendo o limite de ¼ do salário mínimo o único critério a ser utilizado, ou seja, deve o julgador analisar outros meios de prova. Por sua vez, a Turma Recursal de origem assim decidiu: “(...) Destaque-se, por oportuno, não se desconhecer o juízo firmado no âmbito do c. STF no sentido de que "a definição dos critérios a serem observados para a concessão do benefício assistencial depende de apurado estudo e deve ser verificada de acordo com as reais condições sociais e econômicas de cada candidato à beneficiário, não sendo o critério objetivo de renda per capita o único legítimo para se aferir a condição de miserabilidade" (STF - Rcl nº 4.374/PE). Tal situação, porém, não restou caracteriza Não obstante, no caso concreto, tal entendimento não beneficia a parte autora, haja vista que não há provas nos autos que demonstrem gastos excepcionais a caracterizar uma situação de miserabilidade. (grifei) (...)” 7. Como se vê, a Turma Recursal de origem, consonante com o entendimento do acórdão paradigma, analisou outros meios de prova para aferição da miserabilidade, não se restringindo ao limite de ¼ do salário-mínimo como único critério. Desse modo, qualquer rediscussão nesse sentido em sede de incidente de uniformização caracterizará reexame de matéria fática, implicando, assim, na incidência da Súmula nº 42 desta Corte Uniformizadora (“Não se conhece de incidente de uniformização que implique reexame de matéria de fato”). Ausente, pois, o necessário dissídio jurisprudencial. 8. Incidente de Uniformização de Jurisprudência não conhecido.

Mais ainda, no caso específico dos autos, de lupus eritromatoso, a turma nacional também já se pronunciou no mesmo sentido, ainda que haja um pequeno pormenor, tratando-se de LOAS, não de benefício contributivo, verbis:

Acórdão
Número: 05344825220094058300
05344825220094058300
Relator(a): JUIZ FEDERAL WILSON JOSÉ WITZEL
Data: 11/12/2014
Data da publicação: 23/01/2015
Fonte da publicação: DOU 23/01/2015 PÁGINAS 68/160
Ementa: INCIDENTE DE UNIFORMIZAÇÃO – PREVIDENCIÁRIO – ASSISTÊNCIA SOCIAL – CONCESSÃO DE BENEFÍCIO DE PRESTAÇÃO CONTINUADA (LOAS) – INCAPACIDADE PARCIAL E DEFINITIVA – PORTADORA DE LÚPUS ERITEMATOSO SISTÊMICO – DOENÇA AUTO IMUNE – NECESSIDADE DE AVERIGUAR AS CONDIÇÕES SOCIAIS PARA CONCLUSÃO DA (IN)CAPACIDADE – RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO. Trata-se de agravo contra inadmissão de incidente de uniformização nacional, suscitado pela parte autora, em face de acórdão de Turma Recursal do Juizado Especial Federal da Seção Judiciária de Pernambuco. Inadmitido o incidente pela Turma de origem, foi requerida, tempestivamente, a submissão da admissibilidade à Presidência desta Turma Nacional nos termos do art. 7º, VI do RI/TNU. A matéria ventilada e a ser verificada no presente caso é a possibilidade de se conceder o benefício assistencial previsto na Lei Orgânica da Assistência Social em casos de incapacidade parcial e definitiva, considerando as condições pessoais e sócio-econômicas do beneficiário. A parte autora encontra-se com 35 anos, é portadora de lúpus eritematoso sistêmico, uma doença auto imune, tem o ensino fundamental incompleto, é lavadeira sem nunca ter trabalhado com carteira assinada e, atualmente, quando sente poucas dores, faz pequenos serviços como tal. Depende, para a sobrevivência, da pensão alimentícia dos dois filhos menores e do Bolsa Família. O “prognóstico é pessimista para a cura”. Ainda de acordo com o perito, “no momento a pericianda é portadora de incapacidade parcial definitiva. Pode exercer atividades que não exijam longas caminhadas, exposição ao sol e elevação de peso. Levando em consideração o relativo nível de escolaridade, necessita de programa de reabilitação profissional”. Não houve perícia social nem realização de audiência para a colheita de provas testemunhais. Na contestação, o INSS se manifesta pela improcedência do pedido declinado na exordial, pois “sendo a parte autora apenas parcialmente incapaz, resta descaracterizado um dos requisitos do amparo assistencial”. A Sentença de improcedência de 1º grau foi mantida pela Turma Recursal, sob o argumento de que a parte autora não se enquadra no conceito legal de pessoa portadora de deficiência para efeitos da obtenção de benefício assistencial: “...entendo que a incapacidade parcial da autora não a afasta do mercado de trabalho, eis que existem atividades que podem ser por ela exercidas”, segundo o Magistrado sentenciante. Sustenta o Recorrente que “a patologia da autora é suficiente para torná-la incapaz de prover seu sustento dignamente”. Foram apresentadas as contrarrazões pela inadmissão. É o relatório. Ab initio, verifica-se a similitude fática ente o acórdão recorrido e o trazido a cotejo para embasar a divergência visando ao conhecimento do presente pedido, proferido pela 1ª Turma Recursal da Seção Judiciária do Estado de Goiás. As questões são congêneres em sua substância e o deslinde da causa se deu em contextos probatórios análogos. Quanto à alegação de que a não colheita da prova testemunhal pelo Juizado de origem provocou o cerceamento de defesa da ora requerente, tenho que não há nulidade sem efetivo prejuízo, eis que, embora tenha realmente constado na inicial o pedido de sua produção em audiência, foram apresentados elementos que comprovaram a miserabilidade, ponto incontroverso, e o que houve não foi o julgamento de improcedência deste pleito em razão da ausência dessas provas, mas antes a análise e decisão conforme as que foram apresentadas relacionadas à incapacidade autoral. Ao adentrar no mérito, imperioso perquirir, em um primeiro instante, o que seja incapacidade no habitat da legislação. Efetivando o estudo pelo critério da interpretação sistemática, conclui-se que a incapacidade não pode ser avaliada exclusivamente à luz da metodologia científica. Fatores pessoais e sociais devem ser levados em consideração, outrossim. Há que se perscrutar, considerando que a incapacidade laborativa impossibilita, impreterivelmente, a mantença de uma vida independente, se há a possibilidade real de reinserção do trabalhador no mercado de trabalho, no caso concreto. Deve ser balizada, para tanto, a ocupação efetivamente disponível para o autor, levando-se em conta, além da doença que lhe acometeu, a idade, o grau de instrução, bem como, a época e local em que vive. Como se trata do benefício da Lei Orgânica da Assistência Social, vejamos o que a Lei nº 8.742, de 7 de dezembro de 1993, estabelece: Art. 20. O benefício de prestação continuada é a garantia de um salário-mínimo mensal à pessoa com deficiência e ao idoso com 65 (sessenta e cinco) anos ou mais que comprovem não possuir meios de prover a própria manutenção nem de tê-la provida por sua família. § 2o Para efeito de concessão deste benefício, considera-se pessoa com deficiência aquela que tem impedimentos de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, os quais, em interação com diversas barreiras, podem obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas. § 3o Considera-se incapaz de prover a manutenção da pessoa com deficiência ou idosa a família cuja renda mensal per capita seja inferior a 1/4 (um quarto) do salário-mínimo A Lei n. 7.853/88, que dispõe sobre a Política Nacional para Integração da Pessoa Portadora de Deficiência, foi regulamentada pelo Decreto n. 3.298, que prescreve: Art. 3o Para os efeitos deste Decreto, considera-se: III - incapacidade – uma redução efetiva e acentuada da capacidade de integração social, com necessidade de equipamentos, adaptações, meios ou recursos especiais para que a pessoa portadora de deficiência possa receber ou transmitir informações necessárias ao seu bem-estar pessoal e ao desempenho de função ou atividade a ser exercida. Art. 4o É considerada pessoa portadora de deficiência a que se enquadra nas seguintes categorias: I - deficiência física - alteração completa ou parcial de um ou mais segmentos do corpo humano, acarretando o comprometimento da função física, apresentando-se sob a forma de paraplegia, paraparesia, monoplegia, monoparesia, tetraplegia, tetraparesia, triplegia, triparesia, hemiplegia, hemiparesia, ostomia, amputação ou ausência de membro, paralisia cerebral, nanismo, membros com deformidade congênita ou adquirida, exceto as deformidades estéticas e as que não produzam dificuldades para o desempenho de funções; (Grifos nossos) No que concerne à definição de incapacidade para se fazer jus ao benefício em questão, o Decreto nº. 6.214, de 26/09/07, ao regulamentá-lo, firma, no seus artigos 4º e 16, o que é incapacidade e o grau a ser considerado, in verbis: Art. 4o Para os fins do reconhecimento do direito ao benefício, considera-se: III - incapacidade: fenômeno multidimensional que abrange limitação do desempenho de atividade e restrição da participação, com redução efetiva e acentuada da capacidade de inclusão social, em correspondência à interação entre a pessoa com deficiência e seu ambiente físico e social; .... Art. 16. A concessão do benefício à pessoa com deficiência ficará sujeita à avaliação da deficiência e do grau de incapacidade, com base nos princípios da Classificação Internacional de Funcionalidades, Incapacidade e Saúde - CIF, estabelecida pela Resolução da Organização Mundial da Saúde no 54.21, aprovada pela 54ª Assembléia Mundial da Saúde, em 22 de maio de 2001. § 1o A avaliação da deficiência e do grau de incapacidade será composta de avaliação médica e social. § 2o A avaliação médica da deficiência e do grau de incapacidade considerará as deficiências nas funções e nas estruturas do corpo, e a avaliação social considerará os fatores ambientais, sociais e pessoais, e ambas considerarão a limitação do desempenho de atividades e a restrição da participação social, segundo suas especificidades; (Grifos nossos) O entendimento perfilhado por esta Corte, outrossim, é no sentido de que o magistrado, ao analisar as provas dos autos sobre as quais formará sua convicção, e deparando-se com laudos que atestem incapacidade parcial, deve levar em consideração as condições pessoais da parte requerente para a concessão de benefício assistencial. Malgrado não ser a incapacidade total e definitiva, pode ser considerada como tal quando assim o permitirem as circunstâncias sócio-econômicas do beneficiário, ou na medida em que este não possuir condições financeiras de custear tratamento especializado, ou, mesmo, se sua reinserção no seu ambiente de trabalho restar impossibilitado. Mesmo porque o critério de totalidade não fora adotado pelo § 2º, do art. 20, da Lei 8.742/93, e um dos pressupostos para a manutenção do benefício assistencial é a avaliação periódica a cada dois anos. A parcialidade da incapacidade, portanto, não é óbice à sua concessão A respeito: PREVIDENCIÁRIO. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO DE INSTRUMENTO CONTRA INADMISSÃO DE RECURSO ESPECIAL. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. LAUDO PERICIAL CONCLUSIVO PELA INCAPACIDADE PARCIAL DO SEGURADO. NÃO VINCULAÇÃO. CIRCUNSTÂNCIA SÓCIO-ECONÔMICA, PROFISSIONAL E CULTURAL FAVORÁVEL À CONCESSÃO DO BENEFÍCIO. 1. Os pleitos previdenciários possuem relevante valor social de proteção ao Trabalhador Rural Segurado da Previdência Social, devendo ser, portanto, julgados sob tal orientação exegética. 2. Para a concessão de aposentadoria por invalidez devem ser considerados outros aspectos relevantes, além dos elencados no art. 42 da Lei 8.213/91, tais como, a condição sócio-econômica, profissional e cultural do segurado. 3. Embora tenha o laudo pericial concluído pela incapacidade parcial do segurado, o Magistrado não fica vinculado à prova pericial, podendo decidir contrário a ela quando houver nos autos outros elementos que assim o convençam, como no presente caso. 4. Em face das limitações impostas pela avançada idade, bem como pelo baixo grau de escolaridade, seria utopia defender a inserção do segurado no concorrido mercado de trabalho, para iniciar uma nova atividade profissional, motivo pelo faz jus à concessão de aposentadoria por invalidez. 5. Agravo Regimental do INSS desprovido. (STJ – 5ª Turma - AgRg n° 1011387 – rel. Min. NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO - DJE de 25/05/2009 – grifos nossos) Perfazendo a análise, a súmula 47 desta Corte, in verbis: Uma vez reconhecida a incapacidade parcial para o trabalho, o juiz deve analisar as condições pessoais e sociais do segurado para a concessão de aposentadoria por invalidez. E, como já dito, não obstante não estar inteiramente dependente de outrem para se vestir, se alimentar, se locomover e realizar as demais tarefas cotidianas, encontrando-se sem capacidade uma pessoa de manter o próprio sustento por meio de atividade laborativa, maquinalmente torna-se impossibilitada de manter uma vida independente sem qualquer amparo ou caridade. Neste sentido, a Súmula 29 desta E. TNU parece estar. Confira-se: “Para os efeitos do art. 20, § 2º, da Lei n. 8.742, de 1993, incapacidade para a vida independente não é só aquela que impede as atividades mais elementares da pessoa, mas também a impossibilita de prover ao próprio sustento” A incapacidade, em suma, como estabelecido no Decreto n. 6.214, de 26/09/2007, é um fenômeno multidimensional, que abrange limitação do desempenho de atividade e restrição da participação, com redução efetiva e acentuada da capacidade de inclusão social, em correspondência à interação entre a pessoa com deficiência e seu ambiente físico e social e, por isso mesmo, deve ser vista de forma ampla, abrangendo o mundo em que vive o deficiente. Ou seja, não necessita decorrer, exclusivamente, de alguma regra específica que indique esta ou aquela patologia, mas pode ser assim reconhecida com lastro em análise mais ampla, atinente às condições sócio-econômicas, profissionais, culturais e locais do interessado, a inviabilizar a vida laboral e independente. Uma vez constatada a incapacidade parcial, destarte, devem ser analisadas as condições pessoais do segurado, para fins de aferir se tal incapacidade é total, especificamente para o exercício de suas atividades habituais. Verifico que o Acórdão impugnado confirmou a sentença pelos seus próprios fundamentos, que, por sua vez, limitou-se a reafirmar as conclusões do perito judicial, abandonando a apreciação das condições pessoais e sócio econômicas do Autor. Desta forma, deve ser anulado, de ofício, o Acórdão em referência para que sejam apreciadas as condições pessoais da parte suscitante e realizado novo julgamento, de acordo com a Questão de Ordem nº 20, a seguir transcrita: “Se a Turma Nacional decidir que o incidente de uniformização deva ser conhecido e provido no que toca a matéria de direito e se tal conclusão importar na necessidade de exame de provas sobre matéria de fato, que foram requeridas e não produzidas, ou foram produzidas e não apreciadas pelas instâncias inferiores, a sentença ou acórdão da Turma Recursal deverá ser anulado para que tais provas sejam produzidas ou apreciadas, ficando o juiz de 1º grau e a respectiva Turma Recursal vinculados ao entendimento da Turma Nacional sobre a matéria de direito.”(Aprovada na 6ª Sessão Ordinária da Turma Nacional de Uniformização, do dia 14.08.2006). DJ DATA:11/09/2006 PG:00595 Pelo exposto, CONHEÇO do incidente de uniformização nacional suscitado pela parte autora e DOU-LHE PARCIAL PROVIMENTO, para anular o Acórdão impugnado e determinar o retorno dos autos à Turma Recursal de origem com a finalidade de promover a adequação do julgado com o entendimento da TNU, no sentido de se realizar novo julgamento, procedendo à análise das condições pessoais e sociais do beneficiário para constatação da incapacidade para fins de concessão de benefício assistencial.
Decisão: Vistos, relatados e discutidos estes autos, em que são partes as acima indicadas, decide a Turma Nacional de Uniformização de Jurisprudência dos Juizados Especiais Federais conhecer e dar parcial provimento ao incidente de uniformização, nos termos do voto-ementa do Relator.
Outras fontes: PÁGINAS 68/160

No mesmo sentido, verbis:

Tipo
Acórdão
Número: 00552118720094013800
00552118720094013800
Relator(a): JUIZ FEDERAL DOUGLAS CAMARINHA GONZALES
Data: 21/10/2015
Data da publicação: 06/11/2015
Fonte da publicação: DOU 06/11/2015 PÁGINAS 138/358
Ementa: INCIDENTE DE UNIFORMIZAÇÃO INTERPOSTO PELA PARTE AUTORA. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL AO DEFICIENTE. INCAPACIDADE PARCIAL E PERMANENTE ATESTADA PELA PERÍCIA. INCIDÊNCIA DA SÚMULA Nº 29 DA TNU. NECESSIDADE DE ANÁLISE DAS CONDIÇÕES SÓCIO-ECONÔMICAS PARA AFERIÇÃO DA INCAPACIDADE. INCIDÊNCIA DA SÚMULA Nº 48 DA TNU. INCIDENTE CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO. 1. Prolatado acórdão pela Primeira Turma Recursal de Minas Gerais, o qual reformou a sentença, julgando improcedente o pedido de restabelecimento de benefício assistencial ao deficiente. O Colegiado entendeu que a existência de incapacidade apenas parcial, atestada pela perícia médica judicial, não culmina em impedimentos para os atos da vida independente, razão pela qual afastou o direito ao benefício. 2. Interposto incidente de uniformização pela parte autora, com fundamento no art. 14, § 2º, da Lei nº 10.259/2001. Alega o requerente que o acórdão recorrido diverge do entendimento consolidado da TNU, por meio da Súmula nº 29, segundo a qual “para os efeitos do art. 20, § 2º, da Lei n. 8.742, de 1993, incapacidade para a vida independente não é só aquela que impede as atividades mais elementares da pessoa, mas também a impossibilita de prover ao próprio sustento”. 3. Incidente inadmitido na origem, sendo os autos encaminhados à TNU após agravo e distribuídos a este Relator. 4. Nos termos do art. 14, § 2º, da Lei nº 10.259/01, o pedido de uniformização nacional de jurisprudência é cabível quando houver divergência entre decisões sobre questões de direito material proferidas por turmas recursais de diferentes regiões ou em contrariedade à súmula ou jurisprudência dominante da Turma Nacional de Uniformização ou do Superior Tribunal de Justiça. 5. Comprovado o dissídio jurisprudencial, conheço do incidente e passo ao exame do mérito. 6. O acórdão recorrido reconheceu a improcedência do pedido. Transcrevo, abaixo, excerto do julgado: “(...) 3. Nos termos do antigo regramento, com a redação anterior à Lei nº 12.435/2011, a pessoa portadora de deficiência é aquela incapacitada para a vida independente e para o trabalho (§ 2º do art. 20 da lei n. 8.742/93), tendo tal conceito sido adequado pela jurisprudência para alcançar aquelas pessoas cuja deficiência lhes impossibilitasse prover a própria subsistência por meio do labor (Súmula 29 da TNU). O laudo pericial, confeccionado de forma coerente e inteligível, foi claro ao atestar a incapacidade parcial da recorrida, com redução da capacidade laborativa estimada em 25%, não culminando em impedimentos para os atos da vida independente (quesitos 3 e 10), motivo por que está ausente o requisito a que se refere o § 2º do art. 20 da Lei n. 8.742/93. 4. Recurso provido. Sentença reformada, para ser julgado improcedente o pedido da autora, ora recorrida, ficando imediatamente revogada a antecipação de tutela. Sem custas e honorários advocatícios, regra do art. 55 da Lei n. 9.099/95. (...)” (grifos originais) 7. Esta Turma Nacional de Uniformização consolidou entendimento, por meio da Súmula nº 29, no sentido de que “para os efeitos do art. 20, § 2º, da Lei n. 8.742, de 1993, incapacidade para a vida independente não é só aquela que impede as atividades mais elementares da pessoa, mas também a impossibilita de prover ao próprio sustento”. Também consolidou entendimento no sentido de que a incapacidade não precisa ser permanente para fins de concessão do benefício assistencial de prestação continuada (Súmula nº 48), sendo necessário se fazer uma análise mais ampla das suas condições pessoais, familiares, profissionais e culturais do meio em que vive para melhor avaliar a existência ou não dessa incapacidade. Nesse sentido, o seguinte PEDILEF: “INCIDENTE DE UNIFORMIZAÇÃO – PREVIDENCIÁRIO – ASSISTÊNCIA SOCIAL – CONCESSÃO DE BENEFÍCIO DE PRESTAÇÃO CONTINUADA (LOAS) – INCAPACIDADE PARCIAL E DEFINITIVA – PORTADORA DE LÚPUS ERITEMATOSO SISTÊMICO – DOENÇA AUTO IMUNE – NECESSIDADE DE AVERIGUAR AS CONDIÇÕES SOCIAIS PARA CONCLUSÃO DA (IN)CAPACIDADE – RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO. (...) Efetivando o estudo pelo critério da interpretação sistemática, conclui-se que a incapacidade não pode ser avaliada exclusivamente à luz da metodologia científica. Fatores pessoais e sociais devem ser levados em consideração, outrossim. Há que se perscrutar, considerando que a incapacidade laborativa impossibilita, impreterivelmente, a mantença de uma vida independente, se há a possibilidade real de reinserção do trabalhador no mercado de trabalho, no caso concreto. Deve ser balizada, para tanto, a ocupação efetivamente disponível para o autor, levando-se em conta, além da doença que lhe acometeu, a idade, o grau de instrução, bem como, a época e local em que vive. (...) O entendimento perfilhado por esta Corte, outrossim, é no sentido de que o magistrado, ao analisar as provas dos autos sobre as quais formará sua convicção, e deparando-se com laudos que atestem incapacidade parcial, deve levar em consideração as condições pessoais da parte requerente para a concessão de benefício assistencial. Malgrado não ser a incapacidade total e definitiva, pode ser considerada como tal quando assim o permitirem as circunstâncias sócio-econômicas do beneficiário, ou na medida em que este não possuir condições financeiras de custear tratamento especializado, ou, mesmo, se sua reinserção no seu ambiente de trabalho restar impossibilitado. Mesmo porque o critério de totalidade não fora adotado pelo § 2º, do art. 20, da Lei 8.742/93, e um dos pressupostos para a manutenção do benefício assistencial é a avaliação periódica a cada dois anos. A parcialidade da incapacidade, portanto, não é óbice à sua concessão. (...)Perfazendo a análise, a súmula 47 desta Corte, in verbis: Uma vez reconhecida a incapacidade parcial para o trabalho, o juiz deve analisar as condições pessoais e sociais do segurado para a concessão de aposentadoria por invalidez. E, como já dito, não obstante não estar inteiramente dependente de outrem para se vestir, se alimentar, se locomover e realizar as demais tarefas cotidianas, encontrando-se sem capacidade uma pessoa de manter o próprio sustento por meio de atividade laborativa, maquinalmente torna-se impossibilitada de manter uma vidaindependente sem qualquer amparo ou caridade. Neste sentido, a Súmula 29 desta E. TNU parece estar. Confira-se: “Para os efeitos do art. 20, § 2º, da Lei n. 8.742, de 1993, incapacidade para a vida independente não é só aquela que impede as atividades mais elementares da pessoa, mas também a impossibilita de prover ao próprio sustento” A incapacidade, em suma, como estabelecido no Decreto n. 6.214, de 26/09/2007, é um fenômeno multidimensional, que abrange limitação do desempenho de atividade e restrição da participação, com redução efetiva e acentuada da capacidade de inclusão social, em correspondência à interação entre a pessoa com deficiência e seu ambiente físico e social e, por isso mesmo, deve ser vista de forma ampla, abrangendo o mundo em que vive o deficiente. Ou seja, não necessita decorrer, exclusivamente, de alguma regra específica que indique esta ou aquela patologia, mas pode ser assim reconhecida com lastro em análise mais ampla, atinente às condições sócio-econômicas, profissionais, culturais e locais do interessado, a inviabilizar a vida laboral e independente. Uma vez constatada a incapacidade parcial, destarte, devem ser analisadas as condições pessoais do segurado, para fins de aferir se tal incapacidade é total, especificamente para o exercício de suas atividades habituais. Verifico que o Acórdão impugnado confirmou a sentença pelos seus próprios fundamentos, que, por sua vez, limitou-se a reafirmar as conclusões do perito judicial, abandonando a apreciação das condições pessoais e sócio econômicas do Autor. Desta forma, deve ser anulado, de ofício, o Acórdão em referência para que sejam apreciadas as condições pessoais da parte suscitante e realizado novo julgamento, de acordo com a Questão de Ordem nº 20, a seguir transcrita: “Se a Turma Nacional decidir que o incidente de uniformização deva ser conhecido e provido no que toca a matéria de direito e se tal conclusão importar na necessidade de exame de provas sobre matéria de fato, que foram requeridas e não produzidas, ou foram produzidas e não apreciadas pelas instâncias inferiores, a sentença ou acórdão da Turma Recursal deverá ser anulado para que tais provas sejam produzidas ou apreciadas, ficando o juiz de 1º grau e a respectiva Turma Recursal vinculados ao entendimento da Turma Nacional sobre a matéria de direito.”(Aprovada na 6ª Sessão Ordinária da Turma Nacional de Uniformização, do dia 14.08.2006). DJ DATA:11/09/2006 PG:00595 Pelo exposto, CONHEÇO do incidente de uniformização nacional suscitado pela parte autora e DOU-LHE PARCIAL PROVIMENTO, para anular o Acórdão impugnado e determinar o retorno dos autos à Turma Recursal de origem com a finalidade de promover a adequação do julgado com o entendimento da TNU, no sentido de se realizar novo julgamento, procedendo à análise das condições pessoais e sociais do beneficiário para constatação da incapacidade para fins de concessão de benefício assistencial. (PEDILEF nº 05344825220094058300. Relator: Juiz Federal Wilson José Witzel. DOU: 11/12/2014). 8. Assim sendo, reputo como de rigor a anulação do acórdão para adequação, conforme entendimento desta TNU. 9. Incidente de Uniformização de Jurisprudência conhecido e parcialmente provido para reafirmar a tese no sentido de que, uma vez reconhecida a incapacidade parcial, faz-se necessária a análise das condições pessoais, sociais e econômicas do postulante para a aferição da incapacidade para fins de concessão do benefício assistencial ao deficiente. Retorno dos autos à Turma Recursal de origem para adequação do julgado, conforme premissa ora reiterada (Questão de Ordem nº 20).
Decisão: Acordam os membros da TNU - Turma Nacional de Uniformização CONHECER E DAR PARCIAL PROVIMENTO ao incidente de uniformização interposto, nos termos do voto-ementa do Juiz Federal Relator.
Outras fontes: PÁGINAS 138/358
Inteiro teor: Acesse aqui

No que se refere a benefícios assistenciais, a necessidade de análise das condições pessoais, econômicas, sociais e culturais, para a real avaliação da incapacidade, para outras doenças estigmatizantes, é tão pacífica, que a Presidência desta turma já decide monocraticamente, por analogia à Súmula 78, para negar seguimento a incidentes movidos para contradizer tal possibilidade ou admitir e dar provimento a incidentes que a afirmem, como se vê no precedente abaixo, verbis:

Tipo: DECISAO DO PRESIDENTE
Número: 0000020-09.4000.7.00.6361
00000200940007006361
Classe: Pedido de Uniformização de Interpretação de Lei (Presidência)
Relator(a): MINISTRO RAUL ARAÚJO
Origem: TNU
Órgão julgador: TURMA NACIONAL DE UNIFORMIZAÇÃO
Data: 03/04/2018
Data da publicação: 03/04/2018
Decisão: Trata-se de agravo contra decisão que inadmitiu incidente de uniformização nacional suscitado pela parte ora requerente, pretendendo a reforma de acórdão oriundo da Turma Recursal de origem em que se discute a necessidade de análise das condições pessoais da parte para concessão de benefício assistencial por incapacidade à pessoa portadora de doença estigmatizante (hanseníase). É o relatório. O recurso comporta provimento. No caso concreto, a parte é portadora de enfermidade estigmatizante. A TNU, por meio da Súmula 78, aprovada na Sessão do dia 11.9.2014, pacificou o entendimento no sentido de que, "Comprovado que o requerente de benefício é portador do vírus HIV, cabe ao julgador verificar as condições pessoais, sociais, econômicas e culturais, de forma a analisar a incapacidade em sentido amplo, em face da elevada estigmatização social da doença." Assim, por aplicação analógica da referida súmula e levando-se em consideração a sistemática dos recursos representativos da controvérsia, dos sobrestados por força de repercussão geral e dos incidentes de uniformização processados na TNU, em que se devem observar as diretrizes estabelecidas nos arts. 1036, §§ 1º e 3º, do CPC e 17, do RITNU, os autos devem ser devolvidos à Turma Recursal de origem para aplicação do entendimento pacificado no âmbito da Turma Nacional de Uniformização. Ante o exposto, com fundamento no art. 16, II, do RITNU, admito o incidente de uniformização e, prosseguindo no julgamento, a ele dou provimento. Em consequência, determino a restituição dos autos à origem, para a adequação do julgado e consequente análise das condições em comento. Intimem-se.
Texto: ..INTEIROTEOR: ..a target="_blank" href="https://eproctnu.cjf.jus.br/eproc/externo_controlador.php?acao=inteiro_teor&codigo_verificador=900000025448v2&codigo_crc=611fcc23": Link

Idem, abaixo, verbis:

Tipo: DECISAO DO PRESIDENTE
Número: 0503766-03.2018.4.05.8308
05037660320184058308
Classe: Pedido de Uniformização de Interpretação de Lei (Presidência)
Relator(a): MINISTRO PAULO DE TARSO SANSEVERINO
Origem: TNU
Órgão julgador: TURMA NACIONAL DE UNIFORMIZAÇÃO
Data: 13/08/2019
Data da publicação: 13/08/2019
Decisão: Trata-se de agravo interposto contra decisão que inadmitiu incidente de uniformização nacional destinado a reformar acórdão, no qual examinada concessão de benefício por incapacidade a pessoa portadora de sequela de hanseníase. Sustenta-se a necessidade de exame das condições pessoais e sociais do interessado para definir se incapaz ou não para os fins legais. É o relatório. O pedido de uniformização merece prosperar. É inegável que os portadores de hanseníase sofrem de enfermidade estigmatizante. A Súmula n. 78/TNU enuncia: "Comprovado que o requerente de benefício é portador do vírus HIV, cabe ao julgador verificar as condições pessoais, sociais, econômicas e culturais, de forma a analisar a incapacidade em sentido amplo, em face da elevada estigmatização social da doença." No caso dos autos, o acórdão recorrido não se atentou para esses critérios considerados importantes na aferição, ou não, de "incapacidade de longo prazo". O exame de todo o processado revela que as conclusões da origem não estão conforme o posicionamento visto. Atento ao princípio da primazia da decisão de mérito - CPC, art.4º, As partes têm o direito de obter em prazo razoável a solução integral do mérito, incluída a atividade satisfativa. - deve ser mitigada toda formalidade legal que, eventualmente, nesta instância possa impedir de ser aplicado o entendimento já uniformizado. Assim, por aplicação analógica da referida súmula e considerada a sistemática dos recursos representativos da controvérsia, dos sobrestados por força de repercussão geral e dos incidentes de uniformização, de acordo com a qual devem ser observadas as diretrizes estabelecidas nos arts. 1.030, II, do CPC e 17 c/c 16, III, ambos do RITNU, o feito retornará à origem para aplicar o entendimento já solidificado. Pelo exposto, com fundamento no art. 16, II, do RITNU, dou provimento ao agravo, admito o incidente de uniformização, dou-lhe provimento e determino a restituição do feito à origem para adequação do julgado. Intimem-se.
Texto: ..INTEIROTEOR: ..a target="_blank" href="https://eproctnu.cjf.jus.br/eproc/externo_controlador.php?acao=inteiro_teor&codigo_verificador=900000084217v2&codigo_crc=e94dbb5b": Link

Interessante notar que, apesar do raciocínio ser idêntico, não foram identificadas decisões monocráticas da Exma. Presidência sobre a mesma questão, mas, aplicáveis a benefícios por incapacidade.

Lançados os mesmos argumentos de pesquisa no "site" do Superior Tribunal de Justiça, não foram encontrados precedentes tratando especificamente do mesmo tema, o que decorrerá, muito provavelmente, do fato das causas previdenciárias, em função de seu valor, serem muito mais comuns nos juizados especiais federais, que nas varas federais em geral.

Nas turmas recursais, a Quarta Região é a que mais trata do tema, havendo interessante acórdão, que, por analogia ao lupus eritromatoso, concede aposentadoria por invalidez a trabalhador rural com câncer de pele, já que só tem como exercer labor rural e não tem como fazê-lo - ou seja, analisou as condições pessoais -, verbis:

Tipo
Acórdão
Número: 5000444-79.2019.4.04.7130
50004447920194047130
Classe: RECURSO CÍVEL
Relator(a): JACQUELINE MICHELS BILHALVA
Origem: JEF - QUARTA REGIÃO
Órgão julgador: TERCEIRA TURMA RECURSAL DO RS
Data: 20/07/2020
Data da publicação: 21/07/2020
Fonte da publicação: 21/07/2020
Ementa: RECURSO INOMINADO. PREVIDENCIÁRIO. TRABALHADOR RURAL ACOMETIDO DE LÚPUS ERITEMATOSO DISSEMINADO (SISTÊMICO). INCAPACIDADE. SITUAÇÃO ANÁLOGA À DO CÂNCER DE PELE. 1. No âmbito do microsistema dos juizados especiais federais da 4ª Região, se firmou o entendimento no sentido de que o trabalhador rural acometido de câncer de pele (de qualquer tipo, melanoma, basocelular, etc), está permanentemente incapacitado para o exercício dessa atividade, pois (1) a restrição à exposição solar no período entre 10h e 15h e, nos demais horários, com uso de proteção (roupas longas, protetor solar e chapéu) compromete importante período da jornada de trabalho deste tipo específico de atividade; (2) o exercício da atividade rural, que ocorre principalmente ao ar livre e durante o dia, pressupõe exposição contínua à radiação solar, a qual é um fator determinante ao desenvolvimento e ao agravamento do câncer de pele, de forma que a adoção de medidas que seriam suficientes à prevenção do agravamento do câncer de pele para a maior parte das pessoas (como o uso de bloqueador solar, chapéu, etc), são absolutamente inócuas em relação ao trabalhador do campo, não sendo viável exigir que o segurado exponha-se ao risco de novas lesões e de agravamento de seu quadro médico para poder realizar a sua atividade profissional no meio rural, mesmo porque seria por demasiado sofrido exigir que se cubra totalmente durante estações quentes para realizar labor que consabidamente exige intenso esforço; e (4) de todo modo a eficácia desses equipamentos de proteção ainda não está cientificamente totalmente comprovada, sendo digno de nota que de acordo com a Portaria nº 357 o Ministério da Saúde entende controversa a utilização de filtro solar para redução de incidência da doença. 2. Essas mesmas conclusões aplicáveis ao câncer de pele podem e devem ser estendidas para o trabalhador rural acometido de lúpus eritematoso disseminado (sistêmico), pois em ambos os quadros médicos há a mesma importante restrição à exposição solar. 3. Embora em muitos processos as perícias médicas concluam que o trabalhador rural acometido de lúpus eritematoso disseminado (sistêmico) pode continuar trabalhando se se proteger contra o sol ou radiação solar, forçoso é reconhecer que em muitos outros processos as perícias médicas concluem que o trabalhador rural acometido de lúpus eritematoso disseminado (sistêmico) não pode continuar trabalhando, pois a exposição solar para pessoas portadoras dessa doença pode desencadear reação inflamatória em estruturas como articulações, cérebro e rins, de forma que se o trabalhador rural acometido dessa doença não pode trabalhar com exposição a raios solares, porque agrava uma condição que é crônica, é porque a incapacidade é definitiva para o trabalho rural. 4. Precedentes das Turmas Recursais da 4ª Região e do TRF da 4ª Região. 5. Logo, o trabalhador rural acometido de lúpus eritematoso disseminado (sistêmico), está parcialmente e permanentemente incapacitado, não tendo condições de voltar a exercer essa sua atividade habitual. 6. Caso em que se concede aposentadoria por invalidez, considerando que as condições pessoais da parte autora são desfavoráveis.
Decisão: A 3ª Turma Recursal do Rio Grande do Sul decidiu, por unanimidade, DAR PROVIMENTO ao recurso da PARTE AUTORA, nos termos do voto do(a) Relator(a).
Texto: ..ITEOR: https://jurisprudencia.trf4.jus.br/pesquisa/inteiro_teor.php?orgao=2&numero_gproc=710011281917&versao_gproc=3&crc_gproc=89d01582

Há outro acórdão, que conclui no mesmo sentido, no caso de doença psiquiátrica, verbis:

Tipo
Acórdão
Número: 5002026-90.2018.4.04.7214
50020269020184047214
Classe: RECURSO CÍVEL
Relator(a): JAIRO GILBERTO SCHAFER
Origem: JEF - QUARTA REGIÃO
Órgão julgador: SEGUNDA TURMA RECURSAL DE SC
Data: 20/02/2020
Data da publicação: 21/02/2020
Fonte da publicação: 21/02/2020
Ementa: EMENTA PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO POR INCAPACIDADE. INCAPACIDADE PARCIAL E PERMANENTE. ANÁLISE DAS CONDIÇÕES PESSOAIS. REABILITAÇÃO. 1. Autor permanentemente incapacitado para atividades que demandem coordenação motora fina, justamente como a que exerceu ao longo de toda a vida. 2. Indicação de reabilitação para atividades administrativas. 3. Condições pessoais e sociais, notadamente quadro psiquiátrico, indicam que recolocação no mercado de trabalho seria muito improvável. 4. Restabelecimento da aposentadoria por invalidez tendo em vista condições pessoais.
Decisão: A 2ª Turma Recursal de Santa Catarina decidiu, por unanimidade, DAR PROVIMENTO AO RECURSO DA PARTE AUTORA e por JULGAR PREJUDICADO O RECURSO DO INSS, nos termos do voto do(a) Relator(a).
Texto: ..ITEOR: https://jurisprudencia.trf4.jus.br/pesquisa/inteiro_teor.php?orgao=3&numero_gproc=720005736352&versao_gproc=2&crc_gproc=f7142e09

Igualmente, no que diz respeito à Síndrome de Marfan, verbis:

Tipo
Acórdão
Número: 5018166-32.2018.4.04.7108
50181663220184047108
Classe: RECURSO CÍVEL
Relator(a): FÁBIO VITÓRIO MATTIELLO
Origem: JEF - QUARTA REGIÃO
Órgão julgador: TERCEIRA TURMA RECURSAL DO RS
Data: 18/09/2019
Data da publicação: 19/09/2019
Fonte da publicação: 19/09/2019
Ementa: APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. SÍNDROME DE MARFAN (CID Q87.4). DEFICIÊNCIAS COGNITIVAS PROGRESSIVAS NO TEMPO. INCAPACIDADE PERMANENTE PARA O EXERCÍCIO DE ATIVIDADES HABITUAIS. INVIABILIDADE DA REABILITAÇÃO EM FACE DE SUAS CONDIÇÕES PESSOAIS. BENEFÍCIO DEFERIDO. 1. Autor diagnosticado desde o nascimento com a chamada Síndrome de Marfan (CID Q87.4). Doença que atingiu, também, sua capacidade cognitiva, impedindo a sua alfabetização. 2. Longo vínculo laboral desempenhado em vaga destinada a deficiente, com dificuldades e sob preconceito social dos colegas de trabalho. 3. Incapacidade progressiva no tempo, inviabilizando o exercício de suas atividades laborativas habituais, mas que, em face de suas condições pessoais, especialmente cognitivas, o incapacita permanentemente, inviabilizada a reabilitação profissional. 4. Benefício concedido.
Decisão: A 3ª Turma Recursal do Rio Grande do Sul decidiu, por unanimidade, DAR PROVIMENTO ao recurso da PARTE AUTORA, nos termos do voto do(a) Relator(a).
Texto: ..ITEOR: https://jurisprudencia.trf4.jus.br/pesquisa/inteiro_teor.php?orgao=2&numero_gproc=710009445081&versao_gproc=8&crc_gproc=0ece26a3

O mesmo se dá no caso de agricultora, com ceratose actínica, uma doença de pele, verbis:

Tipo
Acórdão
Número: 5002729-85.2017.4.04.7204
50027298520174047204
Classe: RECURSO CÍVEL
Relator(a): JAIRO GILBERTO SCHAFER
Origem: JEF - QUARTA REGIÃO
Órgão julgador: SEGUNDA TURMA RECURSAL DE SC
Data: 27/09/2017
Data da publicação: 28/09/2017
Fonte da publicação: 28/09/2017
Ementa: EMENTA BENEFÍCIO POR INCAPACIDADE. AGRICULTORA. DOENÇA DE PELE. CERATOSE ACTÍNICA. CARACTERIZADA INCAPACIDADE PERMANENTE. ANÁLISE DAS CONDIÇÕES PESSOAIS. 1. Em se tratando de agricultor, doenças cutâneas que contraindicam a exposição solar configuram incapacidade permanente. 2. Autora portadora de ceratose actiníca. 3. Condições pessoais recomendam aposentadoria por invalidez.
Decisão: ACORDAM os Juízes da 2ª Turma Recursal de Santa Catarina, por unanimidade, DAR PROVIMENTO AO RECURSO, antecipando os efeitos da tutela para fins de concessão do benefício aposentadoria por invalidez, com DIB em 31-05-2017. DIP: 10-2017. RMI e RMA a ser calculada. Prazo de cumprimento: 15 dias, nos termos do voto do(a) Relator(a).
Texto: ..ITEOR: https://jurisprudencia.trf4.jus.br/pesquisa/inteiro_teor.php?orgao=3&documento=6839836

É de se notar que, em todos esses casos, doenças de pele, Síndrome de Marfan ou doenças psiquiátricas, existe o elemento "estigmatização", a prejudicar a empregabilidade do segurado, ainda que a sua incapacidade não seja total.

Percebe-se, por conseguinte, que a turma nacional e as turmas recursais possuem precedentes, autorizando a concessão de aposentadoria por invalidez, mediante a análise das condições sociais, pessoais, culturais e econômicas, mesmo no caso da incapacidade não ser total, mercê da estigmatização social trazida pela doença.

Até existe uma grande controvérsia, no caso específico do HIV, se há a necessidade da existência de incapacidade, ainda que parcial, para esse fim, o que veio a ser esclarecido pela Súmula 77, mesmo diante de um sem número de precedentes da turma nacional, deixando claro que essa incapacitação não seria necessária, verbis:

Súmula: 77
Órgão Julgador: TURMA NACIONAL DE UNIFORMIZAÇÃO DOS JUIZADOS ESPECIAIS FEDERAIS
Data do Julgamento: 04/09/2013
Data da Publicação: DOU 06/09/2013 PG. 00201
Enunciado: O julgador não é obrigado a analisar as condições pessoais e sociais quando não reconhecer a incapacidade do requerente para a sua atividade habitual.
Referência Legislativa
Precedentes: PEDILEF n. 0020741-39.2009.4.03.6301, julgamento: 8/3/2013. DOU 22/3/2013
PEDILEF n. 0056265-97.2009.4.03.6301, julgamento: 17/4/2013. DOU 26/4/2013
PEDILEF n. 0507072-34.2009.4.05.8101, julgamento: 6/12/2013. DOU 1º/02/2013
PEDILEF n. 0052862-57.2008.4.03.6301, julgamento: 7/8/2013. DOU 16/8/2013

Entende, portanto, esta Relatoria, que a existência de alguma incapacidade também seja essencial, para que se proceda a análise das condições pessoais, sociais, culturais e econômicas do segurado, no passo lógico seguinte, no caso de outras doenças, que não se relacionem ao HIV.

Isso se dá, porque a Súmula 78, que trata do HIV, deve ser interpretadda sistematicamente, mais especificamente, em conjunto com as Súmulas 47 e 77 desta mesma turma nacional.

Assim, ao contrário do que se tem afirmado, amplamente, desde a edição da Súmula 78, ela só poderia ser considerada uma exceção à Súmula 77, caso, quando da aprovação da Súmula 78, fosse promovida a revogação ou a alteração parcial da Súmula 77, esclarecendo que "o julgador não é obrigado a analisar as condições pessoais e sociais quando não reconhecer a incapacidade do requerente para a sua atividade habitual, exceto no caso de portador do vírus HIV" ou ainda, "..., exceto no caso de doenças estigmatizantes, em geral".

Porém, a Súmula 77 nunca foi revogada, nem alterada parcialmente, para deixar claro que a hipótese da Súmula 78 constituiria uma exceção à regra geral da Súmula 77.

Então, a turma nacional, longe de promover uma "uniformização", acabou por criar uma enorme balbúrdia interpretativa, por apresentar duas súmulas em aparente contradição, no tratamento da matéria específica (portador do vírus HIV), já que, não basta a Súmula 78 omitir qualquer referência à necessidade de prova de alguma incapacidade, quando diz que "comprovado que o requerente de benefício é portador do vírus HIV, cabe ao julgador verificar as condições pessoais, sociais, econômicas e culturais, de forma a analisar a incapacidade em sentido amplo, em face da elevada estigmatização social da doença".

Pelo contrário, só se diz que, na hipótese de portador de HIV, há a necessidade de uma verificação dessas condições, para analisar a incapacidade ampliada.

Mas, não nega a aplicação, a tais casos, da Súmula 77.

De fato, a Súmula 77 afirma a necessidade de existência de alguma incapacidade, para a realização da verificação das condições sociais, econômicas, pessoais e culturais, em qualquer caso, como regra geral, enquanto a Súmula 78 -diz ser necessária a avaliação de tais condições, no caso do portador do HIV, por conta do estigma social.

Mas, haverá a necessidade de tal avaliação, quando há estigma social e não há qualquer incapacidade?

Por conta dessa lacuna, em razão do aparente conflito entre as súmulas, há uma série de reclamações sendo decididas agora nesta turma nacional e a atividade de uniformização nacional, no microssistema dos juizados especiais federais, é bastante prejudicada por esse fato.

Ou bem, se revoga ou modifica a Súmula 77, para deixar claro que o caso do portador do vírus HIV ou de qualquer doença estigmatizante é uma exceção à regra geral, permitindo, inclusive, a concessão excepcional de benefício por incapacidade sem a existência de qualquer incapacidade, o que, para esta Relatoria parece um tanto quanto absurdo, ou bem se revoga ou modifica a Súmula 78, para que se mantenha existente apenas a Súmula 47, que já consagra a análise dessa incapacidade ampliada, de uma forma geral.

Evidentemente, esse debate influencia a discussão sobre a outras doenças estigmatizantes, igualmente, porque, até que seja revogada ou modificada, permanece existindo a regra geral da Súmula 77, sem qualquer exceção clara, porque a Súmula 78 não é suficientemente clara, para cumprir tal função.

Não bastasse tudo isso, há uma questão que é essencial para a compreensão do problema, que diz respeito à estigmatização social. O que é isso, como se dá ?

III - ESTIGMATIZAÇÃO SOCIAL
Para compreender o conceito de "estigma" e as implicações da estigmatização social, dentre as opções possíveis, esta Relatoria foca a sua atenção para Goffman (GOFFMAN, Erving. Estigma. Notas sobre a Manipulação da Identidade Deteriorada. 4 ed. Rio de Janeiro: Zahar, 1982. 158p.), que escreveu a obra mais famosa sobre esse tema específico.

Ora, o termo "estigma", do grego, designava originalmente os "sinais corporais, com os quais, se procurava evidenciar alguma coisa de extraordinário ou mau sobre o status moral de quem os apresentava"(GOFFMAN, Erving. Op. cit.. p. 11), tal como acontecia com escravos, criminosos ou traidores, que eram marcados com cortes ou fogo no corpo. Uma vez marcados, tais sujeitos eram considerados "ritualmente poluídos", de modo que, deveriam ser evitados no convívio público.

Assim sendo, o "estigma", do ponto de vista social, não se refere apenas à marca em si, mas à "situação do indivíduo, que está inabilitado para a aceitação social plena" (Ibid. p. 7).

Posteriormente, com o advento do Cristianismo, o mesmo termo passou a incorporar mais duas acepções: a primeira delas diz respeito aos "sinais corporais de graça divina, que tomavam a forma de flores em erupção sobre a pele", situados nos locais onde Cristo teria sido marcado pelos pregos de seus verdugos; a segunda, uma metáfora médica, que parte desta última alusão religiosa, referindo-se a "sinais corporais de distúrbios físicos", que é o que se aproxima mais do objeto que se está a julgar. Como salienta GOFFMAN, atualmente, o termo "estigma" é mais utilizado para descrever "a própria desgraça do que à sua evidência corporal"(Ibid. p. 11).

O problema da inabilitação para a aceitação social ocorre, porque os indivíduos são categorizados na sociedade, sendo esperado que as pessoas possuam um certo grupo de atributos "comuns e naturais", para os membros de cada uma dessas categorias, conferindo a tais indivíduos uma identidade social. Ocorre que, por vezes, há um hiato entre a identidade social virtual ou esperada e a identidade social real, o que gera uma reclassificação social. Quando há evidências de que aquele indivíduo específico possui determinado atribuido, que lhe torna diferente dos demais, o "estigma", ele deixa de ser considerado "uma criatura comum e total", para se tornar um ser "estragado e diminuído" (Ibid. p. 12).

Observa Goffman que "nem todos os atributos indesejáveis estão em questão, mas somente os que são incongruentes com o estereótipo que criamos para um determinado tipo de indivíduo", de modo que, o termo "estigma" refere-se a um atributo "profundamente depreciativo", sendo de se notar que o que está um jogo é uma "linguagem de relações", não uma "linguagem de atributos" em si, de tal modo que, "o mesmo atributo que estigmatiza alguém pode confirmar a normalidade de outrem" (Ibid. p. 13).

Sem embargo, tomando como exemplo o caso dos portadores de HIV, existem os estereótipos sociais relativos aos homossexuais (por exemplo, de que seriam mais promíscuos do que os heterossexuais), de tal modo que, quando é tornado público que alguém é portador do mencionado vírus, automaticamente, surge a crença social de que a sua conduta social seria incompatível com a moral social, seja pela homossexualidade em si, seja pela promiscuidade, que normal e erroneamente, é associada à prática. Logo, o fato de portar um vírus - que pode ter se originado, por exemplo, de mera transfusão de sangue - desclassifica socialmente o indíviduo do padrão de normalidade para uma situação pejorativa, calcada em estereótipos sociais, desprovidos de qualquer fundamentação científica.

Exatamente, por esse motivo, ocorreram tantos julgamentos em sentido contrário ao da Súmula 77 desta turma nacional, eis que, independente do fato do trabalhador/segurado apresentar incapacidade, se a sua situação de portador do vírus HIV é, de algum modo, conhecida ou suposta, em especial, em cidades pequenas, onde todos se conhecem e não é tão fácil esconder certos segredos, a sua empregabilidade será, seguramente, dificultada. Não porque o empregador o considere incapaz, fisicamente, de realizar o trabalho, mas, por conta de sua suposta reprovabilidade moral, de sua desclassificação social, de seu estigma.

Se assim o é, relativamente a doença, que sequer é perceptível, quando assintomática, bem como, acerca da qual, existe a proibição legal de se exigir o teste negativo para admissão, o que dirá, relativamente a estigmas facilmente visíveis e identificáveis.

É o passo seguinte do raciocínio.

IV - ESTIGMATIZAÇÃO E DOENÇA
Prosseguindo com o auxílio luxuoso de GOFFMAN, é possível distinguir três tipo de estigmas: "as abominações do corpo", as várias deformidades físicas; as "culpas de caráter individual", inferidas a partir de relatos de distúrbio mental, prisão, alcoolismo, homossexualismo, desemprego e outros, e os "estigmas tribais de raça, nação e religião" (Ibid. p. 14).

Nos casos tratados no Tema 274, doenças sem relação com o vírus HIV, trata-se comumente do estigma, que tangencia as "abominações do corpo".

Mas, também há o estigma do tipo "culpa de caráter individual", quando se refere a doenças psiquiátricas ou relacionadas a vícios, tais como o alcoolismo, por exemplo.

O mecanismo social de reclassificação ou desclassificação, baseado na diferença entre a identidade social esperada e a identidade social real, porém, aplica-se da mesma forma.

Imagine-se, por exemplo, a situação do portador de vitiligo ou fogo selvagem, que é facilmente perceptível, em especial, quando ocorre no rosto do segurado/trabalhador.

Em princípio, não haveria qualquer incapacidade física para o trabalho, puramente, em função do vitiligo em si, porque não há um relação de causa e efeito entre a sua existência e algum grau de redução funcional da capacidade de trabalho.

Porém, como as manchas aparentes provocam esse efeito de desclassificação social, com o rebaixamento da identidade social do indivíduo, com base em determinados estereótipos sociais, a sua empregabilidade, para determinadas funções, tende a ser bastante reduzida.

Acerca do tema, convém verificar o artigo da autoria de SILVA, Morgana Geórgia Fernandes. Vivências de Pessoas com Vitiligo - Exclusão e Inclusão Social: Sensibilização ao Tema. Acesso em http://www.eaic.uem.br/eaic2016/anais/artigos/1174.pdf, no dia 24/04/2021. 20:51).

Isso se dá porque, em círculos sociais menos esclarecidos, acredita-se que possa ocorrer contágio, caso se toque ou chegue próximo a tais manchas na pele. De igual modo, que a doença possa ser transmitida, caso o seu portador toque ou se aproxime de comidas, tecidos ou outros materiais.

De igual modo, acredita-se, nesses mesmos círculos, que tal doença possa decorrer de falta de higiene - o artigo supramencionado, na página 4, traz um relato de portador de vitiligo, que, ao procurar um dermatologista para eventual tratamento, o profissional de saúde lhe teria dito que doença decorreria de "falta de banho" -, sendo comumente relacionada a população de rua, a habitantes de rincões rurais inóspitos ou regiões periféricas miseráveis das grandes cidades, de tal modo que, o estigma físico acaba sendo relacionado a situações moralmente reprováveis ou a condições sociais tidas como inferiores.

Por isso, em cidades menores, em regiões com maior número de analfabetos ou mais pobres, um, portador de vitiligo tenderá a ter menos chances de ser empregado em atividades que envolvam manipulação de alimentos, salões de beleza, cuidados pessoais de crianças ou idosos, alguns tipos de comércio, ou seja, em boa parte das atividades onde um trabalhador/segurado não especializado ou sem um bom nível educacional conseguiria empregar-se.

Tudo isso, com base em estereótipos e generalizações desprovidas de qualquer base científica, que levam a um rebaixamento de "ranking" social desse indivíduo pela sua mera aparência física.

No caso específico do vitiligo, dificilmente tal benefício por incapacidade seria concedido, porém, já que é um pressuposto da turma nacional, a existência de incapacidade parcial em sentido estrito, o que não ocorrerá em tal doença.

O mesmo não ocorre com o lúpus, que é a doença da qual se trata a discussão no caso concreto, porque, hipoteticamente falando, ela tem o potencial de causar limitações físicas para a realização de determinados trabalhos.

Nessa situação, existindo a incapacitação parcial, passa-se ao segundo passo do raciocínio, com a dita análise das condições pessoais, sociais, econômicas e culturais, ou seja, a análise da incapacidade em sentido amplo ou ampliada, ou seja, da funcionalidade.

O mesmo se dá com doenças psiquiátricas, que fazem parte de um outro grupo de estigmas, os do tipo "culpa de caráter individual", da classificação de GOFFMAN, acima referida.

Como o portador de doenças psiquiátricas é normalmente associado a questões de índole moral, como sendo "fracos" (por exemplo, como se dá com os pacientes depressivos) ou de "mau caráter" (todos aqueles de comportamento social desviante, o que define "doença" psiquiátrica), ou ainda, "agressivos" ou "perigosos" (quando, na realidade, uma pequena parcela dessa população de comportamento social desviante representa algum risco aos demais), as suas chances no mercado de trabalho são sensivelmente reduzidas, tão logo, seja evidenciada a sua condição - seja o fato verdadeiro ou não, diga-se de passagem...

Assim, se há algumas doenças psiquiátricas que permitem ao paciente levar uma vida normal, sem a necessidade de internação ou interdição, ou mesmo, outras que levam a perturbações temporárias e/ou cíclicas dessa qualidade de vida, por outro lado, ainda que não estejam, necessariamente, incapazes, tais segurados podem ser de tal modo estigmatizados socialmente, que as suas oportunidades no mercado de trabalho são bastantes reduzidas.

De qualquer modo, pelo menos, uma incapacitação parcial é necessária como pressuposto, por força de entendimento sumulado por esta turma nacional, para que se possa passar ao segundo momento da análise.

Sem embargo, tais evidências somente podem ser percebidas pelo juiz da causa, caso, além da realização do exame pericial médico, que ateste a existência da doença e o seu grau de incapacitação em sentido estrito, também seja realizado, por exemplo, uma pesquisa social, que se dirija, não apenas às condições subjetivas do segurado, mas, igualmente, às condições objetivas do ambiente onde tenta empregar-se.

É sabido que, em cidades maiores, em especial, grandes metrópoles,; em locais onde haja um nível de instrução mais elevado; as oportunidades de trabalho para pessoais com deformidades aparentes e com doenças psiquiátricas tendem a ser maiores que em centros urbanos menores e/ou com um nível de instrução da população mais baixo.

De igual modo, se o segurado possui um nível educacional mais elevado ou alguma especialização, isso facilita na sua empregabilidade, a depender do estigma.

De qualquer modo, em quaisquer dessas situações, o intérprete estará analisando um conceito de incapacidade um pouco diferente, que é o da incapacidade ampliada.

V - INCAPACIDADE AMPLIADA
Para além dos conceitos tradicionais de incapacidade e deficiência, que possuem conotação negativa, se tem utilizado, até mesmo, para instruir políticas públicas, uma perspectiva positiva, que inclui, até mesmo, a participação social (LAMARI, Neuseli. Avaliação Ampliada da Funcionalidade, da Incapacidade e da Saúde. Arquivos de Ciências da Saúde, [S.l.], v. 22, n. 4, p. 7-8, dez. 2015. ISSN 2318-3691. Disponível em: <https://www.cienciasdasaude.famerp.br/index.php/racs/article/view/311>. Acesso em: 25 abr. 2021. doi: https://doi.org/10.17696/2318-3691.22.4.2015.311.).

Para tanto, se tem utilizado um instrumento normativo, que é a Classificação Internacional da Funcionalidade, Incapacidade e Saúde (CIF), não apenas, a Classificação Internacional de Doenças (CID).

Sem embargo, utilizando-se tal classificação, oriunda da Organização Mundial da Saúde, da Organização das Nações Unidas, de forma complementar à CID, na análise da funcionalidade e da capacidade, verifica-se, não apenas a doença em si (funções e estruturas corporais), mas, as atividades humanas como atividades sociais, participação social e a interação com o ambiente, como se vê do Manual de Boas Práticas da FIOCRUZ (https://portaldeboaspraticas.iff.fiocruz.br/atencao-crianca/classificacao-internacional-de-funcionalidade-incapacidade-e-saude-cif/. Acesso em 24/04/2021, 21:27).

Assim o é, porque a funcionalidade e a capacidade se relacionam com a condição de saúde da pessoa, mas também com os seus recursos (habilidades pessoais e recursos econômicos) e o ambiente no qual a pessoa vive.

É por isso, que não é suficiente o laudo pericial médico - calcado na realidade da CID ou do DSM -, para aferir capacidade ou funcionalidade, em especial, no caso de doenças que reduzem a empregabilidade, por serem estigmatizantes, havendo de se levar em conta, igualmente, aspectos subjetivos referentes aos recursos pessoais do segurado (situação econômico-financeira, estudo, especialização do trabalho) e aspectos objetivos atinentes ao ambiente onde o segurado/trabalhador reside e terá de buscar colocação no mercado de trabalho.

Não é esta Relatoria que está pontificando tais conclusões, mas a Organização Mundial de Saúde, com base na ciência.

Mais do que isso, como se está discutindo no Tema 274 desta turma nacional se, para aferição da existência do estado incapacitante, a fim de se conceder benefício por incapacidade, no caso de doenças estigmatizantes outras, que não aquelas decorrentes da infecção e/ou contágio por HIV, seria necessário realizar, igualmente, a avaliação pessoal, social, cultural e econõmica, que é feita naquela circunstância, não se estará, de forma alguma criando algo novo, alguma anomalia, se a conclusão do presente voto levar à resposta positiva.

Pelo contrário, se estará utilizando um conceito atualizado de incapacidade, que não se refere somente às estruturais e funções corporais, mas, a fatores outros, igualmente determinantes do estado de incapacidade.

A Clsssificação Internacional de Funcionalidade, traz uma interessante matriz, na qual se vêem as diferentes situações, envolvendo capacidade e funcionalidade, que podem ser encontradas, na qual, se faz referência a "estigma", verbis:

Se a nossa intenção é descrever uma experiência de saúde, no seu todo, todos os componentes são úteis. Por exemplo, uma pessoa pode:

• ter deficiências sem limitações de capacidade (e.g., uma desfiguração resultante da Doença de Hansen pode não ter efeito sobre a capacidade da pessoa);

• ter problemas de desempenho e limitações de capacidade sem deficiências evidentes (e.g., redução de desempenho nas actividades diárias associado a várias doenças);

• ter problemas de desempenho sem deficiências ou limitações de capacidade (e.g., indivíduo VIH positivo, ou um ex doente curado de doença mental, que enfrenta estigmas ou discriminação nas relações interpessoais ou no trabalho);

•ter limitações de capacidade se não tiver assistência, e nenhum problema de desempenho no ambiente habitual (e.g., um indivíduo com limitações de mobilidade pode beneficiar, por parte da sociedade, de ajudas tecnológicas de assistência para se movimentar);

• experimentar um grau de influência em sentido contrário (e.g., a inactividade dos membros pode levar à atrofia muscular; a institucionalização pode resultar numa perda da socialização)."

Ora, o que diz a CIF é que, ainda que não exista "limitação de capacidade", em sentido estrito, haveria limitação à funcionalidade, que é um conceito mais amplo de capacidade, nos casos de doenças estigmatizantes.

A turma nacional, por outro lado, por força de entendimentos jurisprudenciais reiterados, consubstanciados na Súmula 77, considera que, para se analisar a eventual existência da incapacidade ampliada, para fins de concessão da aposentadoria por invalidez, é requisito necessário a existência de incapacidade parcial permanente.

Isso se reflete na própria pergunta do Tema 274, da maneira como formulada, porque o raciocínio empregado na Súmula 77 é um prius lógico em relação ao Tema 274, verbis: "O julgador não é obrigado a analisar as condições pessoais e sociais quando não reconhecer a incapacidade do requerente para a sua atividade habitual."

Por isso, a própria questão de afetação já incorporou, por decisão do colegiado, a premissa da existência da incapacidade parcial e permanente, para que se possa passar ao degrau seguinte, que é o da análise das condições pessoais, sociais, econômicas e culturais.

VI - PECULIARIDADES DO CASO CONCRETO
Apenas a título de esclarecimento, no caso concreto, a parte Requerente, a Autora, teve a incapacidade parcial e permanente reconhecida por perícia judicial, verbis:

"Data de realização da perícia: 06.10.2017 PROCESSO n.º: 0512288-77.2017.4.05.8300 PERICIANDO: Cristina Maria do Nascimento CPF: 832.359.304-34 RG: 4.548.400 DATA NASCIMENTO: 30.09.1976 ESCOLARIDADE: sétima série. PROFISSÃO ATUAL: desempregada. OCUPAÇÕES ANTERIORES: empregada doméstica. Veio acompanhado à perícia? Sim. Vizinho. Ivaldo Gomes de Araújo. CPF 480.230.434- 04. ASSISTENTES TÉCNICOS: DO AUTOR: Não indicado. DO RÉU: DO MPF: Não indicado. - HISTÓRICO: Refere que se trata para LES desde o ano de 1998 no HC/UFPE. Diz que a doença estava controlada, mas após histerectomia realizada no IMIP no dia 06.06.2016 houve piora. Voltou a sentir dores nas articulações e não consegue mais trabalhar. Faz uso de metrotexate, ac. Fólico, hidroquinona. - DOCUMENTOS MÉDICOS APRESENTADOS: atestado médico previdenciário e atestados. - EXAME FÍSICO/PSÍQUICO: Periciada andando com auxílio de bengala, fácies hiperemiada, sobrepeso. Bom estado geral, eupneica, hidratada, normocorada. Não observamos edemas ou deformidades articulares. Pa = 140 X 97 mmHg. 93 bpm. - IMPRESÃO DIAGNÓSTICA: LES em tratamento. QUESITOS DO JUIZ 1) O(a) periciando(a) é ou foi paciente do Sr. perito? R- Não. 2) O(a) periciando(a) foi devidamente identificado(a) mediante documento oficial com foto (RG, CPF, passaporte, etc.) e submetido(a) a exame clínico completo? R- Sim. 3) O(a) periciando(a) é portador(a) de alguma doença, lesão, sequela ou deficiência (indicar qual a doença e o respectivo CID)? Desde quando? (indique o perito data provável). R- Sim. Lúpus Eritematoso Sistêmico. CID L 32... Desde 1998. 4) Em caso positivo, tal doença, lesão, sequela ou deficiência incapacita o(a) periciando(a), no momento atual, para o desenvolvimento de atividades laborativas? R- Sim. As questões contidas neste quadro (n. 5 a 16) somente devem ser respondidas caso a resposta ao quesito anterior (n. 4) tenha sido positiva, pela existência de incapacidade laborativa. 5) A incapacidade é total (inviabilizando toda e qualquer atividade laborativa) ou parcial (inviabilizando apenas algumas atividades laborativas)? R- Incapacidade parcial. 6) Caso a incapacidade seja parcial, que tipos de atividade podem ser exercidos pelo(a) periciando(a)? (exemplificar). R- Aquelas que não necessitem de força bruta. 7) Qual o trabalho exercido pelo periciando quando da constatação de sua incapacidade? R- Empregada doméstica. 8) A doença o impede para o exercício da atividade laborativa descrita na questão anterior (sua atividade habitual)? Como? R- Sim. Uma vez que não pode executar tarefas mais duras como carregar peso, ou afastar móveis. 9) Caso esteja desempregado(a), pode o(a) periciando(a) desempenhar as profissões que já exerceu no passado, mesmo acometido da doença alegada? R- Não. 10) A doença apresentada pelo periciando o incapacita para outras atividades laborativas diferentes da sua habitual? Quais? R- Toda aquela que requeira força física grande. 11) Qual a data de início da incapacidade? (indicar uma data provável). R-07.10.2010. 12) Com que elementos o perito chegou à conclusão do quesito anterior? R- Laudo pericial anterior. 13) A incapacidade é temporária ou permanente? R- Permanente. 14) Caso a incapacidade seja temporária, qual o prazo ideal para tratamento durante o qual o(a) periciando(a) não poderia trabalhar? 15) Caso a incapacidade seja temporária, que tipo de tratamento se mostra adequado para melhorar o estado de saúde do periciando? É necessário submetêlo a cirurgia ou a transfusão de sangue? O prognóstico é favorável ou pessimista? R- Tratamento medicamentoso. Não há necessidade de transfusão de sangue ou cirurgia. O prognóstico é pessimista. 16)A incapacidade do(a) periciando(a) é intermitente? R- Sim. Há períodos de remissão entremeados com agudização. 17) O(A) periciando(a) é passível de reabilitação para o exercício de outra atividade profissional, tendo em conta a sua idade e condições sócio-econômicas? R- Sim. As questões contidas neste quadro (n. 18 a 18-b) somente devem ser respondidas caso a resposta ao quesito n. 4 tenha sido negativa, pela inexistência de incapacidade laborativa atual. 18) Embora não exista incapacidade laborativa no momento atual, o(a) periciando(a) já esteve, NO PASSADO, incapacitado(a) para exercer suas atividades laborativas? 18-a) Para qual(is) atividade(s) laborativa(s) esteve incapacitado o periciando no passado? Exemplificar e mencionar se esteve incapaz para a sua atividade habitual na época. 18-b) Qual foi a data de início dessa incapacidade? Quanto tempo durou tal incapacidade (dia final ou períodoaproximado)? Com que elementos o perito chegou a tal conclusão/datas/período? 19) As lesões, sequelas ou doenças de que se diz o(a) periciando(a) portador(a) são decorrentes de doença profissional, doença do trabalho ou acidente de trabalho? R- Não. 20) As lesões são decorrentes de acidente de outra natureza (diverso de acidente de trabalho)? R- Não. 21) Caso já consolidadas as lesões do periciando, ainda assim restaram sequelas que implicam redução da capacidade para o trabalho que habitualmente exercia? R- Sim. 22) No estágio em que se encontra a doença, há perigo de contágio no ambiente de trabalho do periciando? R- Não. 23) O(a) periciando(a) consegue ter uma vida independente, vale dizer, sem contar com a ajuda de terceiros para realizar as atividades normais da vida diária (vestirse, alimentar-se, andar sem auxílio de terceiros e fazer sua higiene pessoal)? R- Sim. 24) Caso a resposta ao quesito anterior seja negativa, responda: 24-a) Desde quando (indicar data aproximada) o periciando depende permanentemente de ajuda de terceiros para as atividades normais da vida diária? 24-b) É possível afirmar que desde a data de início da aposentadoria por invalidez do periciando (documento nos autos) ele mantinha a dependência permanente de terceiros para as atividades normais da vida diária? 25) O(a) periciando(a) se submeteu a programa de reabilitação profissional? Em caso positivo, para que tipo de atividade laborativa o(a) periciando(a)foi reabilitado(a)? Houve recusa do(a) periciando(a) em se submeter ao programa de reabilitação profissional ou a alguma de suas etapas? R- Sem elementos para firmar ou negar. 26) O(a) periciando(a) está acometido de: tuberculose ativa, hanseníase, alienação mental, neoplasia maligna, cegueira, paralisia irreversível e incapacitante, cardiopatia grave, doença de Parkinson, espondiloartrose anquilosante, nefropatia grave, estado avançado de doença de Paget (ostaíte deformante), síndrome da deficiência imunológica adquirida (AIDS) e/ou contaminação por radiação (identificar e especificar com CID)? R- Não. 27) Os dados objetivos do exame clínico estão em correspondência com as queixas apresentadas? R- Sim. 28) Qual(is) o(s) elementos(s) utilizados(s) pelo perito para se chegar às conclusões acima (ex.: história da doença; atestados; exames complementares; declarações da parte; perícias médicas do INSS juntadas aos autos)? R- História da doença, exames periciais, declarações médicas. 29) Preste o Sr. Médico Perito outras informações que considerar úteis ao esclarecimento da demanda, de forma clara e em linguagem acessível aos leigos. R- Nada mais a declarar. QUESITOS DO AUTOR 1 – Considerando o quadro patológico da parte autora, bem como suas condições pessoais (idade, escolaridade, grau de instrução), o ilustre perito entende que o periciando encontra-se apto ao exercício das atividades laborais habituais? R- Não. Em caso de resposta afirmativa, a aprovação seria condicional ou com alguma restrição? Sr. Perito, responder aos quesitos 2, 3, 4, 5, 6 e 7 apenas se houver entendido que a patologia não incapacita o periciando para o trabalho habitual. 2 – O exercício de atividade laboral por parte do periciando pode ocasionar algum agravamento, a curto, médio ou longo prazo, da patologia que possui? 3 – O exercício de atividade laboral por parte do periciando será equivalente ao de uma pessoa em perfeito estado de saúde? 4 - Atribua o senhor perito um percentual de 0 a 100% no que concerne a capacidade que o periciando possui para o trabalho que habitualmente exercia. 5 - Os atestados médicos levados pelo periciando no dia da perícia, bem como aqueles juntados ao processo judicial, foram considerados na conclusão do ilustre médico e na resposta aos quesitos? 6 – Em caso de resposta negativa ao quesito anterior, explique o ilustre perito, com a devida fundamentação, a razão pela qual os desconsiderou? 7 – Diga o Sr. Perito se é pertinente, no seu entender, a elaboração de perícia com outro especialista para avaliação de alguma patologia não abordada minuciosamente na presente perícia? Termos em que, pede deferimento. R QUESITOS DO RÉU CONCLUSÃO Médico Perito: Lillian Christyne de Oliveira Arruda CRM: 9331"

Esse foi foi determinante para que a pergunta da tese de afetação não fosse tão aberta e não abrigasse a situação daquelas doenças estigmatizantes, nas quais, não há incapacidade.

V - CONCLUSÃO
No entender desta Relatoria, para se conceder benefício por incapacidade, para portadores de doenças estigmatizantes - inclusive todas as demais, além daquelas decorrentes de contágio e/ou infecção por HIV -, desde que, existente a incapacidade parcial e permanente, deve ser realizada a avaliação das condições pessoais, de índole econômico, social e cultural, para aferir a funcionalidade social do segurado/trabalhador, o que, em outras palavras, significa aferir, em tal contexto, se possui condições mínimas de obter colocação no mercado de trabalho.

Outra não pode ser a conclusão, até que se revogue ou modifique a Súmula 77 ou a própria Súmula 78, para eliminar o aparente conflito surgido e restaurar o sistema, possuindo a resposta à questão formulada no Tema 274 um alcance bem menor do que se considerada aplicável a Súmula 78, sem a incidência da regra geral da Súmula 77, apenas trazendo maior especificidade ao que já foi decidido na Súmula 47 desta turma nacional.

Portanto, uma revisão das referidas súmulas se faz necessária.

Isto posto, conclui-se, em resposta à indagação do Tema 274 dos representativos de controvérsia desta turma nacional, fixando-se tese, que "é possível a concessão de aposentadoria por invalidez, após análise das condições sociais, pessoais, econômicas e culturais, existindo incapacidade parcial e permanente, no caso de outras doenças, que não se relacionem com o vírus HIV, mas, que sejam estigmatizantes e impactem significativa e negativamente na funcionalidade social do segurado".

Voto por conhecer e dar provimento ao incidente de uniformização nacional, no sentido de anular a decisão da turma de origem, a fim de que o seu julgamento seja adequado à tese acima exposta.



VOTO-VISTA
1. Pedido de Uniformização de Interpretação de Lei (PUIL) afetado como representativo de controvérsia, com o objetivo de responder à seguinte questão jurídica: é possível a concessão de aposentadoria por invalidez, após análise das condições sociais, pessoais, econômicas e culturais, existindo incapacidade parcial e permanente, no caso de outras doenças, que não se relacionem com o vírus HIV?

2. O Relator, Juiz Federal Luis Eduardo Bianchi Cerqueira, em brilhante voto, propõe a seguinte tese como solução à questão proposta: "é possível a concessão de aposentadoria por invalidez, após análise das condições sociais, pessoais, econômicas e culturais, existindo incapacidade parcial e permanente, no caso de outras doenças, que não se relacionem com o vírus HIV, mas, que sejam estigmatizantes e impactem significativa e negativamente na funcionalidade social do segurado".

3. Após o voto do Juiz Federal Ivanir Cesar Ireno Junior, acompanhando o Relator, pedi vista, em razão da complexidade da questão.

4. Peço vênia para divergir parcialmente.
***
5. A solução da questão jurídica controvertida afetada sob o tema 274 da Turma Nacional de Uniformização deve ser construída a partir de cinco premissas:

(I) incapacidade total e permanente é o fato gerador da aposentadoria por incapacidade permanente, enquanto a incapacidade parcial ou temporária é fato gerador de auxílio por incapacidade temporária.

(II) para gerar direito a benefício previdenciário, a incapacidade deve, obrigatoriamente, derivar de doença ou lesão.

(III) a análise da incapacidade deve associar aspectos médicos, sociais, pessoais, econômicos e culturais.

(IV) a utilização dos critérios coadjuvantes depende, em regra, da existência do reconhecimento de incapacidade parcial pela avaliação médica.

(V) doenças e lesões estigmatizantes excepcionam o item IV, autorizando a utilização dos critérios sociais, pessoais, econômicos e culturais vinculados à doença ou lesão, mesmo quando não constatada a incapacidade parcial pela avaliação médica.

***

Incapacidade total e permanente é o fato gerador da aposentadoria por incapacidade permanente, enquanto a incapacidade parcial ou temporária é fato gerador de auxílio por incapacidade temporária.

6. Os benefícios por incapacidade extraem fundamento de validade constitucional do art. 201, I da Constituição Federal, atualmente, com a seguinte redação, dada pela Emenda Constitucional 103:

Art. 201. A previdência social será organizada sob a forma do Regime Geral de Previdência Social, de caráter contributivo e de filiação obrigatória, observados critérios que preservem o equilíbrio financeiro e atuarial, e atenderá, na forma da lei, a:
I - cobertura dos eventos de incapacidade temporária ou permanente para o trabalho e idade avançada;

7. Regulamentando o dispositivo constitucional, a Lei 8.213/91 delimita, nos arts. 42 e 59, os fatos geradores dos benefícios por incapacidade permanente e temporária, respectivamente:

Art. 42. A aposentadoria por invalidez, uma vez cumprida, quando for o caso, a carência exigida, será devida ao segurado que, estando ou não em gozo de auxílio-doença, for considerado incapaz e insusceptível de reabilitação para o exercício de atividade que lhe garanta a subsistência, e ser-lhe-á paga enquanto permanecer nesta condição.

Art. 59. O auxílio-doença será devido ao segurado que, havendo cumprido, quando for o caso, o período de carência exigido nesta Lei, ficar incapacitado para o seu trabalho ou para a sua atividade habitual por mais de 15 (quinze) dias consecutivos.

8. Nota-se, portanto, a clara distinção estabelecida pela lei. Nos casos de incapacidade total e permanente, o benefício devido é a aposentadoria por incapacidade permanente, anteriormente denominada aposentadoria por invalidez. Nas hipóteses de incapacidade parcial ou temporária, o benefício a ser concedido é o auxílio por incapacidade temporária, antes chamado de auxílio-doença.

9. Não há exceções, sendo equivocado afirmar que as súmulas 47 e 78 desta Turma Nacional de Uniformização estabelecem ressalvas a essa previsão legal:

Súmula 47: Uma vez reconhecida a incapacidade parcial para o trabalho, o juiz deve analisar as condições pessoais e sociais do segurado para a concessão de aposentadoria por invalidez.

Súmula 78: Comprovado que o requerente de benefício é portador do vírus HIV, cabe ao julgador verificar as condições pessoais, sociais, econômicas e culturais, de forma a analisar a incapacidade em sentido amplo, em face da elevada estigmatização social da doença.

10. De acordo com ambos os enunciados pretorianos, é possível analisar a incapacidade a partir de critérios que vão além dos aspectos médicos (tema do próximo tópico do voto), mas em momento algum afirmam a possibilidade de concessão de benefício sem o preenchimento das condições exigidas pelo legislador:

Incapacidade total e permanente: aposentadoria por incapacidade permanente

Incapacidade parcial ou temporária: auxílio por incapacidade temporária

11. A primeira conclusão a que se chega, portanto, é a seguinte: Incapacidade total e permanente é o fato gerador da aposentadoria por incapacidade permanente, enquanto a incapacidade parcial ou temporária é fato gerador de auxílio por incapacidade temporária.

***

A incapacidade deve, obrigatoriamente, derivar de doença ou lesão

12. A incapacidade contra a qual se protege o segurado é sempre derivada de doença ou lesão, sendo inexistente a cobertura previdenciária nos casos de incapacidade exclusivamente social ou econômica.

13. Nesse sentido, importante destacar o teor do § 1º, do art. 42 da Lei 8.213/91, que exige exame médico-pericial para a verificação da incapacidade:

Lei 8.213/91, art. 42, § 1º A concessão de aposentadoria por invalidez dependerá da verificação da condição de incapacidade mediante exame médico-pericial a cargo da Previdência Social, podendo o segurado, às suas expensas, fazer-se acompanhar de médico de sua confiança.

14. Excluem-se da cobertura dos benefícios por incapacidade, por exemplo, as dificuldades de acesso ao mercado de trabalho decorrentes exclusivamente da idade, de preconceitos não relacionados a doenças ou lesões, de crises econômicas ou de baixa escolaridade.

15. Todas essas condições merecem espaço na agenda política, mas não por meio da política pública de proteção previdenciária contra incapacidade. Não cabe ao Judiciário alterar de modo tão profundo o planejamento da Seguridade Social, a ponto de combater problemas sociais por meio de política pública formatada com foco absolutamente distinto.

16. A segunda conclusão, portanto, é a seguinte: para gerar direito a benefício previdenciário, a incapacidade deve, obrigatoriamente, derivar de doença ou lesão.

***
A análise da incapacidade deve associar aspectos médicos, sociais, pessoais, econômicos e culturais.

17. Como analisado nos itens anteriores, a concessão de benefícios por incapacidade exige, no caso de aposentadoria, incapacidade total e permanente, derivada de doença ou lesão; e, no caso de auxílio, incapacidade parcial ou temporária, também derivada de doença ou lesão.

18. A questão merece, entretanto, um esclarecimento adicional: derivar de doença ou lesão não significa que essas devam ser as causas exclusivas da incapacidade. É possível que a impossibilidade de trabalhar decorra da combinação de uma doença ou lesão com outras circunstâncias.

19. Isso porque é possível que uma mesma situação clínica impacte de modos distintos pessoas com condições sociais, pessoais, econômica e culturais diferentes. Um problema de saúde que impeça o exercício de esforço físico impacta de modos absolutamente díspares um advogado de 30 anos e um trabalhador rural de 60 anos sem estudo formal. Ainda que, do ponto de vista clínico, estejam em situações equivalentes, os aspectos sociais, pessoais, econômicos e culturais levam a uma conclusão distinta em relação à incapacidade.

20. Essa avaliação não é médica e, muitas vezes, escapa à expertise do perito. O perito médico judicial informará sobre a existência de doença ou lesão, bem como se elas, por si só, geram incapacidade. A partir dessa informação, o Juiz analisará as demais circunstâncias, para aferir se um segurado portador de doença ou lesão, apesar de não estar totalmente incapacitado sob o ponto de vista exclusivamente clínico, tem condição de exercer atividade laboral diante da associação de seu quadro de saúde (esclarecido pelo perito) com as condições sociais, pessoais, econômica e culturais.

21. Conclusão desse item: a análise da incapacidade deve associar aspectos médicos, sociais, pessoais, econômicos e culturais.

***
A utilização dos critérios coadjuvantes depende, em regra, da existência do reconhecimento de incapacidade parcial pela avaliação médica

22. A Turma Nacional da Uniformização, com salutar precaução e atenta aos impactos de sua decisão, ajustou balizas para a utilização desses parâmetros coadjuvantes na análise de incapacidade. De acordo com a jurisprudência sumulada da Turma, em regra, a avaliação médica deve constatar ao menos uma incapacidade parcial, a fim de autorizar a utilização dos demais elementos. Nos casos em que a perícia médica não reconhece sequer a incapacidade parcial, fica vedado, em regra, a concessão de benefício por incapacidade com a utilização dos critérios coadjuvantes. É o que se extrai das súmulas 47 e 77:

Súmula 47: Uma vez reconhecida a incapacidade parcial para o trabalho, o juiz deve analisar as condições pessoais e sociais do segurado para a concessão de aposentadoria por invalidez.

Súmula 77: O julgador não é obrigado a analisar as condições pessoais e sociais quando não reconhecer a incapacidade do requerente para a sua atividade habitual.

23. Esse tópico permite extrair a seguinte conclusão: a utilização dos critérios coadjuvantes depende, em regra, da existência do reconhecimento de incapacidade parcial pela avaliação médica.

***
Doenças ou lesões estigmatizantes como causa de distinguishing

24. Como descrito acima, a análise da incapacidade deve associar aspectos médicos, sociais, pessoais, econômicos e culturais, mas a utilização desses critérios coadjuvantes depende, em regra, da existência do reconhecimento de incapacidade parcial pela avaliação médica.

25. A Turma Nacional de Uniformização, entretanto, não identifica esse último parâmetro (reconhecimento de incapacidade parcial pela avaliação médica) como uma exigência absoluta. De modo excepcional, afirmou a possibilidade de reconhecimento da incapacidade com base em aspectos sociais, pessoais, econômicos e culturais relacionados a uma doença que, de acordo com avaliação estritamente médica, não geraria incapacidade parcial. É o que se extrai da súmula 78:

Comprovado que o requerente de benefício é portador do vírus HIV, cabe ao julgador verificar as condições pessoais, sociais, econômicas e culturais, de forma a analisar a incapacidade em sentido amplo, em face da elevada estigmatização social da doença

26. O referido enunciado não autoriza a concessão do benefício sem incapacidade ou sem qualquer vinculação com doença ou lesão. Ele apenas amplia a possibilidade de adoção dos critérios coadjuvantes associados à doença (AIDS). EM outras palavras, permite o reconhecimento de incapacidade quando, em razão dessa doença estigmatizante, o segurado não consegue trabalhar, por força dos aspectos sociais, pessoais, econômicos e culturais.

27. Enquanto, em geral, a jurisprudência exige o reconhecimento de incapacidade parcial pela avaliação médica, a fim de autorizar a adoção dos critérios coadjuvantes, no caso da AIDS, a TNU entendeu que esses parâmetros podem ser utilizados mesmo sem a identificação de incapacidade parcial pela avaliação médica.

28. O que justifica a distinção? A própria súmula responde: a elevada estigmatização social da doença. Desse modo, apesar da menção explícita à AIDS, o verdadeiro critério de distinção é o estigma social.

29. O estigma social associado a uma doença ou lesão tem o potencial de inviabilizar o exercício de atividade que garanta a subsistência do indivíduo. Se, por causa da doença ou lesão, uma pessoa vê eliminadas suas chances de retornar ao mercado de trabalho, não há como afastar a incidência dos arts. 42 e 59 da Lei 8.213/91.

30. Não se trata de avaliação da incapacidade exclusivamente com base nos aspectos sociais, pessoais, econômicos e culturais, pois a situação impeditiva do trabalho é derivada de doença ou lesão. Mas, apenas, do reconhecimento de um peso maior desses critérios nas situações fortemente marcadas por estigmas sociais.

31. Como conclusão, é possível afirmar que as doenças e lesões estigmatizantes autorizam um distinguishing, excepcionando-se a regra pretoriana que exige reconhecimento de incapacidade parcial, pela avaliação médica, para autorizar a utilização dos critérios sociais, pessoais, econômicos e culturais.

***
TESE

32. Nos capítulos do voto, foram extraídas as seguintes conclusões:

(I) incapacidade total e permanente é o fato gerador da aposentadoria por incapacidade permanente, enquanto a incapacidade parcial ou temporária é fato gerador de auxílio por incapacidade temporária.

(II) para gerar direito a benefício previdenciário, a incapacidade deve, obrigatoriamente, derivar de doença ou lesão.

(III) a análise da incapacidade deve associar aspectos médicos, sociais, pessoais, econômicos e culturais.

(IV) a utilização dos critérios coadjuvantes depende, em regra, da existência do reconhecimento de incapacidade parcial pela avaliação médica.

(V) doenças e lesões estigmatizantes excepcionam o item IV, autorizando a utilização dos critérios sociais, pessoais, econômicos e culturais vinculados à doença ou lesão, mesmo quando não constatada a incapacidade parcial pela avaliação médica.

33. Desse modo, em resposta à indagação do tema 274 dos recursos representativos de controvérsia, proponho a seguinte tese ao Colegiado:

Quando o segurado for portador de doença ou lesão estigmatizante, será possível o reconhecimento da incapacidade em razão da inviabilidade do trabalho decorrente de aspectos sociais, pessoais, econômicos e culturais associados à doença ou à lesão estigmatizante, mesmo quando não constatada incapacidade pela avaliação médica.

34. Ante o exposto, voto por CONHECER e DAR PROVIMENTO ao incidente, no sentido de anular a decisão da Turma de origem e determinar a realização de novo julgamento, de acordo com a seguinte tese jurídica (tema 274): “quando o segurado for portador de doença ou lesão estigmatizante, será possível o reconhecimento da incapacidade em razão da inviabilidade do trabalho decorrente de aspectos sociais, pessoais, econômicos e culturais associados à doença ou à lesão estigmatizante, mesmo quando não constatada incapacidade pela avaliação médica”.

Documento eletrônico assinado por FÁBIO SOUZA, Juiz Federal, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006.

VOTO-VISTA
1. Pedi vista dos autos na sessão do dia 27/05/2021, para melhor analisar a controvérsia, que envolve o tema representativo 274, com a seguinte questão a ser diriminda: "Se é possível a concessão de aposentadoria por invalidez, após análise das condições sociais, pessoais, econômicas e culturais, existindo incapacidade parcial e permanente, no caso de outras doenças, que não se relacionem com o vírus HIV."

2. Após detida análise dos autos, acompanho o voto do relator, no sentido de conhecer e dar provimento ao PUIL, com a fixação da seguinte tese: "é possível a concessão de aposentadoria por invalidez, após análise das condições sociais, pessoais, econômicas e culturais, existindo incapacidade parcial e permanente, no caso de outras doenças, que não se relacionem com o vírus HIV, mas, que sejam estigmatizantes e impactem significativa e negativamente na funcionalidade social do segurado".

3. Talvez fosse o caso, se o relator entender adequado, de se incluir na tese trecho que já consta do seu voto, no sentido de explicitar o conceito de funcionalidade social do segurado, ficando a tese com a seguinte redação:

"é possível a concessão de aposentadoria por invalidez, após análise das condições sociais, pessoais, econômicas e culturais, existindo incapacidade parcial e permanente, no caso de outras doenças, que não se relacionem com o vírus HIV, mas, que sejam estigmatizantes e impactem significativa e negativamente na funcionalidade social do segurado, entendida esta como o potencial de acesso e permanência no mercado de trabalho."

4. Justifico a sugestão para melhor orientar a produção da prova nas instâncias ordinárias acerca das condições sociais, pessoais, econômicas e culturais, que muitas vezes segue o padrão e os formulários do LOAS, que possuem escopo diverso - grupo e renda familiar, participação social, estado da moradia e despesas domésticas etc - e muitas vezes dissociado ou sem grande relevância para a aferição da funcionalidade social e da incapacidade ampliada em discussão neste representativo. Destaco, de relevante, dois trechos do voto do relator para demonstrar o que se busca aqui aferir:

[...]
É por isso, que não é suficiente o laudo pericial médico - calcado na realidade da CID ou do DSM -, para aferir capacidade ou funcionalidade, em especial, no caso de doenças que reduzem a empregabilidade, por serem estigmatizantes, havendo de se levar em conta, igualmente, aspectos subjetivos referentes aos recursos pessoais do segurado (situação econômico-financeira, estudo, especialização do trabalho) e aspectos objetivos atinentes ao ambiente onde o segurado/trabalhador reside e terá de buscar colocação no mercado de trabalho.
[...]

No entender desta Relatoria, para se conceder benefício por incapacidade, para portadores de doenças estigmatizantes - inclusive todas as demais, além daquelas decorrentes de contágio e/ou infecção por HIV -, desde que, existente a incapacidade parcial e permanente, deve ser realizada a avaliação das condições pessoais, de índole econômico, social e cultural, para aferir a funcionalidade social do segurado/trabalhador, o que, em outras palavras, significa aferir, em tal contexto, se possui condições mínimas de obter colocação no mercado de trabalho.

5. Em face do exposto, com as achegas acima, voto por acompanhar o relator.

Documento eletrônico assinado por IVANIR CESAR IRENO JUNIOR, Juiz Federal, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006. 

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Rio Grande, Rio Grande do Sul, Brazil
Especialista em Direito Previdenciário, pela Universidade de Caxias do Sul - UCS, em parceria com a ESMAFE - Escola da Magistratura Federal, em 2009. Formado em janeiro de 2006, pela FURG - Fundação Universidade do Rio Grande, em direito. Este blog tem o objetivo de divulgar o conteúdo previdenciário de maneira gratuita para que todos possam ter acesso as informações sobre esta matéria.

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