sexta-feira, 17 de novembro de 2017

Entendimento sobre contagem do período de auxílio-doença como tempo especial é uniformizado no TRF 4ª

Nesta sexta-feira será visto uma jurisprudência que trata sobre a uniformização do entendimento da contagem do período de auxílio-doença como tempo especial no TRF 4ª. Abaixo segue a decisão para análise dos amigos.
 
EMENTA
INCIDENTE DE RESOLUÇÃO DE DEMANDAS REPETITIVAS. TEMA 8. AUXÍLIO-DOENÇA PREVIDENCIÁRIO. CÔMPUTO DE TEMPO DE SERVIÇO ESPECIAL. POSSIBILIDADE.
O período de auxílio-doença de natureza previdenciária, independente de comprovação da relação da moléstia com a atividade profissional do segurado, deve ser considerado como tempo especial quando trabalhador exercia atividade especial antes do afastamento.
TRF 4ª, Proc. 5003377-89.2013.4.04.7112, 3ª Seção, Desembargador Federal Relator Paulo Afonso Brum Vaz, 26.10.2017.

ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Colenda 3ª Seção do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, solver o IRDR para estabelecer a seguinte tese jurídica: o período de auxílio-doença de natureza previdenciária, independente de comprovação da relação da moléstia com a atividade profissional do segurado, deve ser considerado como tempo especial quando trabalhador exercia atividade especial antes do afastamento, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Porto Alegre, 25 de outubro de 2017.

Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ
Relator

VOTO-VISTA
Cuida-se de Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas suscitado pelo INSS, em que se discute a possibilidade de se computar, como tempo de serviço especial, para fins de inativação, o período em que o segurado esteve em gozo de auxílio-doença de natureza não acidentária (Tema n. 08).

O e. Relator, Des. Federal Paulo Afonso Brum Vaz, votou no sentido de solver o IRDR para estabelecer a seguinte tese jurídica: o período de auxílio-doença de natureza previdenciária, independente de comprovação da relação da moléstia com a atividade profissional do segurado, deve ser considerado como tempo especial quando trabalhador exercia atividade especial antes do afastamento.

Pedi vista para uma maior reflexão acerca da questão suscitada e, da análise procedida, concluo por acompanhar o e. Relator.

Quando do julgamento, pela 3ª Seção desta Corte, dos Embargos Infringentes n. 5002381-29.2010.404.7102, em que se discutiu se, após a alteração do art. 65 do Decreto n. 3.048, de 28-11-1999, pelo Decreto n. 4.882, de 18-11-2003, seria possível considerar como especial o tempo em que o segurado esteve em gozo de auxílio-doença, assim me pronunciei:

Discute-se acerca do reconhecimento, como especial, do período em que o segurado esteve em gozo de benefício de auxílio-doença.
A Constituição Federal de 1988, no art. 201, § 1º, assim dispõe:
É vedada a adoção de requisitos e critérios diferenciados para a concessão de aposentadoria aos beneficiários do regime geral de previdência social, ressalvados os casos de atividades exercidas sob condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física e quando se tratar de segurados portadores de deficiência, nos termos definidos em lei complementar.
Pois bem, a regra geral, constitucional, é de que é proibida a adoção de critérios diferenciados para a obtenção de aposentadoria aos segurados do RGPS. Mas, por questão de justiça, a Constituição ressalva, ou seja, estipula, em algumas situações, a possibilidade de obter a inativação com esses critérios diferenciados. E uma dessas situações é quando o segurado está sujeito a agentes nocivos à sua saúde. Ou seja, não é justo que um segurado, se estiver sujeito e enquanto estiver sujeito a condições nocivas à sua saúde, tenha seu tempo de serviço computado da mesma forma que outro segurado que não está sujeito a essas condições agressivas à saúde.
Dentro desse contexto, vislumbro que há duas situações: na primeira delas, o segurado entra em gozo de auxílio-doença em decorrência da atividade profissional que realiza. A título de exemplo, temos a situação de um auxílio-doença decorrente de um acidente do trabalho, situação esta, inclusive, retratada no art. 65 do Decreto n. 3.048/99, com a redação dada pelo Dec. 4.882/2003. Nessa hipótese, em que o segurado exercia atividade especial e sofreu um acidente do trabalho, deve ele ser beneficiado com o reconhecimento, como especial, do período em que permanecer em gozo de benefício, como uma consequência lógica da atividade especial. Esta não é, contudo, a única hipótese. Por exemplo, um segurado que está sujeito a hidrocarbonetos aromáticos em seu ambiente de trabalho e acaba contraindo doença respiratória e, por conta disso, obtém auxílio-doença: ainda que não seja configurado como benefício acidentário, a lógica é a mesma, ele tem direito à contagem diferenciada do período em que estiver percebendo auxílio-doença. Trago, ainda, outro exemplo: um digitador ou caixa de banco que acaba desenvolvendo LER. Ainda que não venha a ser considerado benefício acidentário, há uma relação muito estreita entre a sua atividade e a doença contraída. Nesses casos, tenho reconhecido a contagem diferenciada de tempo de serviço.
A segunda situação que se estabelece é aquela em que a incapacidade temporária decorre de motivos alheios à atividade laboral. Exemplifico com um caso em que o segurado se machuca ao jogar futebol ou praticar qualquer outra atividade esportiva, e, por conta disso, permanece dois anos afastado do trabalho, em gozo de benefício. Entendo inviável, neste caso, a contagem, como especial, do tempo de serviço em gozo de auxílio-doença, não só porque obviamente o segurado não está sujeito a agentes nocivos, mas porque o benefício não decorreu do exercício da atividade profissional. Parece-me que, neste caso, estaríamos desrespeitando a Constituição, haja vista que a regra geral é que a contagem diferenciada é possível se o segurado estiver sujeito a agentes nocivos, e, na hipótese acima referida, o auxílio-doença não teve relação alguma com o trabalho. A contagem diferenciada do tempo de serviço, nesse caso, constituiria ofensa não só ao artigo 65 do Decreto n. 3.048/99, mas principalmente ao § 1º do art. 201 da Constituição Federal de 1988.
Em suma, penso que, para a contagem do tempo como especial, é imprescindível que haja vinculação entre a doença e a atividade profissional, ou que aquela decorra de acidente do trabalho.
No caso concreto, não há qualquer vinculação entre a doença e a atividade profissional do autor, razão pela qual acompanho o Relator, com acréscimo de fundamentação.


Tal posição se assentava, primordialmente, na relação entre os males causadores do auxílio-doença e os agentes agressivos a que o segurado esteve sujeito por ocasião do desempenho de sua atividade profissional. Ou seja, sustentei, à época, que era devido o reconhecimento, como especial, do período em gozo de auxílio-doença, se comprovado que a moléstia que o motivou era decorrente dos agentes nocivos a que o segurado estava exposto quando da realização da suas atividades profissionais.

Contudo, escapou-me à época a influência dos agentes agressivos (por ocasião do desempenho da atividade especial) na deterioração geral de saúde dos que àqueles ficam sujeitos, fazendo com que diminuam suas defesas imunológicas e fiquem suscetíveis a contrair doenças.
Muitas vezes há, de fato, dificuldade em se constatar que a doença incapacitante decorreu da sujeição do segurado a agentes nocivos à saúde durante o exercício de atividade laboral, ainda quando tal efetivamente ocorra. Isso se dá naquelas situações em que não se consegue estabelecer uma relação evidente entre a atividade profissional e a moléstia, embora a relação de causa e efeito exista, em razão, por exemplo, de a doença incapacitante ter se instalado em face de o segurado estar debilitado pela sujeição aos agentes nocivos.
Nesse sentido, muito bem expôs o e. Relator:

Logo, não é possível limitar a contagem do tempo especial, a priori, àquelas hipóteses de gozo de auxílio-doença decorrente de enfermidades explicitamente vinculadas ao trabalho para o reconhecimento do tempo especial, haja vista que as condições clínicas e imunológicas do ser humano não se restringem àquelas apresentadas no momento em que estiver acometido de determinada moléstia, mas compreende todo o histórico de saúde, o grau de comprometimento funcional dos órgãos e do próprio sistema imunológico após anos de submissão aos agentes nocivos. Nesse sentido, e para usar um exemplo banal, é evidente que um trabalhador de mina de carvão acometido de gripe no inverno não terá a mesma capacidade de recuperação de um auxiliar de escritório que venha padecer dessa mesma doença.
A dificuldade de se estabelecer um nexo causal entre os agentes agressivos a que esteve sujeito o segurado durante sua jornada laboral e os males ensejadores da incapacidade (que propiciou o gozo do auxílio-doença) decorre de uma série de fatores , como bem demonstrou o e. Relator, entre os quais se inclui o 'conhecimento insuficiente quanto aos efeitos para a saúde associados com a exposição em questão'. Exemplo claro deste fator é a relação de causa e efeito entre a exposição ao amianto e o câncer, antes de se ter conhecimento de que aquele agente era causa desta doença (Critério de Saúde Ambiental 203 do Programa de Segurança Química da Organização Mundial da Saúde).

Não bastassem tais aspectos, há outros relevantes, como o de que o Regulamento dos Benefícios Previdenciários considera como tempo de serviço especial o período de recebimento de auxílio-doença decorrente de acidente de trabalho ocorrido no trajeto, por exemplo, entre a residência e o trabalho do segurado, mesmo, portanto, que nenhuma relação direta haja entre os males incapacitantes e os agentes agressivos. Da mesma forma quanto ao período de percepção do salário-maternidade. Cito, no entanto, tais hipóteses mais para mostrar a ilogicidade da atual disciplina infralegal relativa à consideração, como especial, de determinados períodos, em detrimento de outros, que para fundamentar a presente decisão, pois sabido que não é a partir do regulamento que devemos interpretar as leis e a Constituição, mas ao revés!

Voltando às hipóteses anteriores, chego à conclusão de que existem inúmeras possibilidades de uma relação direta (embora nem sempre evidente) entre os agentes nocivos a que o segurado esteve sujeito durante o exercício de sua atividade e os males incapacitantes que ensejaram a percepção do benefício de auxílio-doença, tudo a evidenciar a razoabilidade da tese de se considerar, como tempo especial, o período de afastamento decorrente do gozo do benefício de auxílio-doença, independentemente de sua natureza (previdenciária ou acidentária), quando o trabalhador exercia atividade especial antes do afastamento.

Neste sentido, entendo que o parágrafo único do art. 65 do Decreto n.º 3.048, de 6 de maio de 1999, na redação dada pelo Decreto nº 8.123, de 2013, ao limitar a consideração, como tempo especial, apenas ao período de auxílio-doença acidentário (sem, portanto, considerar o auxílio-doença previdenciário), acabou por desbordar da Lei de Benefícios, em uma interpretação conjunta dos seus arts. 55, inciso II, e 57, caput e §§ 3º, 4º e 5º .

Ante o exposto, voto por acompanhar integralmente o e. Relator, parabenizando-o por seu brilhante voto.

Des. Federal CELSO KIPPER

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Rio Grande, Rio Grande do Sul, Brazil
Especialista em Direito Previdenciário, pela Universidade de Caxias do Sul - UCS, em parceria com a ESMAFE - Escola da Magistratura Federal, em 2009. Formado em janeiro de 2006, pela FURG - Fundação Universidade do Rio Grande, em direito. Este blog tem o objetivo de divulgar o conteúdo previdenciário de maneira gratuita para que todos possam ter acesso as informações sobre esta matéria.

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