TRF3 mantém decisão que determinou fornecimento de medicamentos para leucemia
Antecipação da tutela foi concedida para que a União Federal e o Estado de São Paulo forneçam o remédio “Ponatinib 45 mg – Inclusig”
O desembargador federal Nelton dos Santos, do Tribunal Regional Federal da 3ª Região (TRF3), negou seguimento ao agravo de instrumento interposto pela União e manteve decisão do Juízo Federal da 6ª Vara de Guarulhos/SP.
A decisão do juiz federal Tiago Bologna Dias, proferida em ação ordinária movida por um portador de leucemia mielóide crônica, havia antecipado os efeitos da tutela e determinado que a União e o Estado de São Paulo fornecessem, por meio do SUS, o medicamento necessário para o tratamento da parte autora (Ponatinib 45 mg - Inclusig).
Segundo o laudo do assistente técnico do autor, ele é portador de leucemia mielóide crônica, em fase acelerada, com 100% de metáfases como cromossomo Philadélfia e com mutação T315I, que confere resistência a todos os inibidores de tirosino kinase disponíveis para uso no Brasil. Consta ainda que os medicamentos Imatinibe e Desatinibe não surtiram efeito e que, por se tratar de paciente jovem, sem doador de medula ideal e com altíssimo risco de progressão para a fase blástica, tem indicação de receber a medicação Ponatinibe. O laudo do Estado de São Paulo não contradiz esta conclusão, apontando que os medicamentos com mesmo efeito disponíveis no Brasil são o Imatinibe e o Desatinibe – exatamente aqueles que não têm eficácia alguma sobre o autor.
Na decisão que concedeu a tutela antecipada, o magistrado de primeira instância disse que a eficácia do medicamento é relatada em diversas notícias trazidas ao processo, tendo sido aprovado em pouco tempo pelo Food and Drug Administration (FDA), a entidade de vigilância sanitária dos Estados Unidos, o que evidencia alguma segurança quanto a seus efeitos benéficos e colaterais, conhecidos pelo autor e seu médico. “Embora se trate de medicamento de alto custo, pouco tempo de testes, importado e sem autorização pela vigilância sanitária brasileira, me parece claro que estes óbices devem ser relevados, em atenção ao princípio da proporcionalidade, quando há elementos suficientes a entender, ao menos neste exame preliminar, que é imprescindível ao autor, a única opção a conferir maior sobrevida e evitar a progressão da doença com eficácia testada e comprovada em casos como o presente, tanto que foi rapidamente aprovado pelo FDA”, explicou o juiz.
No agravo de instrumento, a União Federal requer a suspensão da decisão, alegando, preliminarmente, ser parte ilegítima para figurar no pólo passivo da ação. Afirmou, ainda, que o Poder Judiciário não pode interferir na discricionariedade e no juízo de conveniência e oportunidade da administração em determinar o fornecimento de alguns tipos de remédios em detrimento de outros existentes no mercado farmacêutico, sob pena de violar o princípio da separação dos poderes. Por fim, sustentou que o fármaco pleiteado não possui registro na ANVISA.
Analisando a preliminar levantada pela União em seu recurso, o desembargador federal Nelton dos Santos lembrou que é a pacífica a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal e do Superior Tribunal de Justiça no sentido de ser obrigação inafastável do Estado assegurar às pessoas desprovidas de recursos financeiros o acesso à medicação necessária à cura, controle ou abrandamento de suas enfermidades, sobretudo as mais graves, bem como de haver responsabilidade solidária entre os entes federativos no exercício desse dever constitucional.
O relator salientou também que se encontra firmada a interpretação constitucional no sentido da supremacia da garantia de tutela à saúde do cidadão hipossuficiente sobre eventual custo imposto ao Poder Público, pois é dever do Estado prover os meios para o fornecimento de medicamentos e tratamento que sejam necessários a pacientes sem condições financeiras de custeio.
O desembargador explicou que, tratando-se de tutela de urgência, é possível ao julgador abrandar o requisito da prova inequívoca de verossimilhança quando é muito intenso o perigo de dano grave e de difícil reparação, concluindo: “Assim, em casos como o presente, entendo que a melhor solução é, sem dúvida, aquela adotada pelo magistrado de primeiro grau, ao deferir a antecipação dos efeitos da tutela, sem prejuízo, é claro, de oportuna aferição probatória mais profunda”.
Ressaltou, ainda, que para deferir ou não o pedido de tutela de urgência, um dos critérios de que se pode valer o julgador é o da proporcionalidade, aplicável na proteção do bem jurídico mais valioso sempre que houver elementos minimamente seguros de probabilidade do direito. No caso, segundo o relator, há elementos razoáveis no sentido de apontar para a gravidade da patologia que acomete o agravado, bem como a necessidade de se submeter ao tratamento medicamentoso. “Tratando-se, pois, de tutelar o direito à vida, é o quanto basta para deferir-se a tutela antecipada nos termos em que foi decidida, sem que lhe seja oponível quaisquer alegações de ausência de direito ou inadequação do medicamento, todas a demandar dilação probatória”.
Quanto à inexistência de registro do medicamento pleiteado na ANVISA, Nelton dos Santos destacou que a questão ficou superada, conforme precedentes do Supremo Tribunal Federal (SS n.º 4316/RO, Rel. Min. Cezar Peluso) e do próprio TRF3 (APELREEX n.º 1.781.568, rel. Des. Fed. Johonsom Di Salvo).
Por fim, no tocante à alegada ofensa ao princípio da separação dos poderes, o relator lembrou que a jurisprudência não favorece a União (TRF5 – AG 00123831420124050000, Rel. Des. Fed, Geraldo Apoliano e TRF5 – APELREEX 200983000113740, Rel. Des. Fed. José Maria Lucena).
O agravo de instrumento recebeu o número 0017097-37.2013.4.03.0000/SP.
Link: TRF 3
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