sexta-feira, 19 de agosto de 2022

Decisão trata sobre exposição a eletricidade

Nesta sexta-feira será visto uma decisão da Turma Nacional de Uniformização representativa de controvérsia que gerou o tema 210 com a seguinte redação "Para aplicação do artigo 57, §3.º, da Lei n.º 8.213/91 à tensão elétrica superior a 250 V, exige-se a probabilidade da exposição ocupacional, avaliando-se, de acordo com a profissiografia, o seu caráter indissociável da produção do bem ou da prestação do serviço, independente de tempo mínimo de exposição durante a jornada." Abaixo segue a decisão para análise dos amigos.

EMENTA
PEDIDO DE UNIFORMIZAÇÃO DE JURISPRUDÊNCIA. DIREITO PREVIDENCIÁRIO. TEMA REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. APOSENTADORIA ESPECIAL. ELETRICIDADE. HABITUALIDADE E PERMANÊNCIA DA ATIVIDADE PROFISSIONAL QUE EXPONHA O SEGURADO AO AGENTE NOCIVO. PRESENÇA DE EXPOSIÇÃO A TENSÕES SUPERIORES A 250 VOLTS. RISCO INERENTE À ATIVIDADE E INDISSOCIÁVEL DA PRODUÇÃO DO BEM OU DA PRESTAÇÃO DO SERVIÇO ENVOLVIDO. INCIDENTE CONHECIDO E PROVIDO.
TNU, PEDIDO DE UNIFORMIZAÇÃO DE INTERPRETAÇÃO DE LEI (TURMA) Nº 0501567-42.2017.4.05.8405/RN, relator juiz federal Bianor Arruda Bezerra Neto, 17/12/2019.

ACÓRDÃO
A Turma Nacional de Uniformização decidiu, por unanimidade, CONHECER E DAR PROVIMENTO ao incidente de uniformização interposto pela parte autora, nos termos do voto do Juiz Relator. determinando o retorno dos autos à turma de origem para adequação do julgado à seguinte conclusão de tese: "Para aplicação do artigo 57, §3.º, da Lei n.º 8.213/91 à tensão elétrica superior a 250 V, exige-se a probabilidade da exposição ocupacional, avaliando-se, de acordo com a profissiografia, o seu caráter indissociável da produção do bem ou da prestação do serviço, independente de tempo mínimo de exposição durante a jornada". Pedido de Uniformização julgado como representativo da controvérsia (Tema 210).

Brasília, 12 de dezembro de 2019.

RELATÓRIO

Trata-se de incidente de uniformização, suscitado pela parte-autora, pretendendo a reforma de acórdão oriundo de Turma Recursal que, modificando parcialmente a sentença, deixou de acolher pretensão de qualificação como especial do período de 01/09/2004 a 30/09/2009, no qual o segurado afirma haver trabalhado exposto ao agente nocivo eletricidade, em níveis superiores a 250v.

Segundo o PPP, no período, o segurado exerceu as profissões de “eletricista especializado” e “técnico de manutenção júnior”, sendo as funções a ela inerentes descritas da seguinte forma: “Desenvolvia atividades de manutenção elétrica preventiva, preditiva e corretiva em equipamentos e sistemas elétricos, com tensão nominal de operação superior a 250 V, na UTPF, realizando serviços de planejamento, assessoria, preservação, reparo e recuperação de materiais, equipamentos, ferramentas, dispositivos, instalações e circuitos elétricos em geral; manutenção em quadros e comandos elétricos; identificação de defeitos, reparos e testes de equipamentos com circuitos eletrônicos de controle, disjuntores e baterias; calibração e ajuste de equipamentos e dispositivos, relés de carregadores de bateria e reguladores de tensão; substituição de rolamentos em motores e geradores elétricos; instalação, tese e operação de equipamentos e dispositivos elétricos, dutos e cabos de circuitos elétricos; troca de luminárias em torres; ordem e limpeza do local de trabalho; participação de treinamentos e simulados de emergências, além de outras atividade se mesma natureza, inerentes ao cargo”.

Na espécie, entendeu-se que, para o período posterior à vigência da Lei n.º 9.032/95, ou seja, a partir de 29/04/1995, faz-se necessário demonstrar que a exposição a esse agente nocivo, além de superior a 250v, foi habitual e permanente, circunstâncias não descritas pelo PPP, o que não teria sido provado nos autos.

O acórdão recorrido, no ponto em que é atacado pelo presente recurso, após examinar os documentos apresentados nos autos, concluiu nos seguintes termos:

Do mesmo modo, deve ser reconhecido o caráter comum da atividade desempenhada junto a PETROBRAS no período compreendido entre 01/09/2004 e 30/09/2009, uma vez que, havia exposição a ruído inferior ao limite legal e embora o autor estivesse exposto a tensão elétrica superior a 250V, o PPP (anexo 06) não menciona como se dava a exposição, de modo que não se pode considerá-lo como exercido sob condições especiais, uma vez que a habitualidade e permanência da exposição são requisitos indispensáveis à caracterização da especialidade a partir de 29/04/1995. (grifei)

A parte-autora sustenta o cabimento do pedido de uniformização, por entender que o acórdão recorrido está em confronto com a jurisprudência da TR/SE:

Em relação à habitualidade e permanência, entende este Relator o tempo de trabalho em condições especiais prejudiciais à saúde ou à integridade física referidas no artigo 57, § 3º, da Lei 8.213/91, devem ser analisadas à luz do serviço desenvolvido pelo trabalhador, pois a norma em questão é protetiva, e assim deve ser analisada, sob pena de inutilidade da norma, porquanto em raras atividades a sujeição direta ao agente nocivo se dá durante toda a jornada de trabalho, e em muitas delas a exposição em tal intensidade seria absolutamente impossível. A habitualidade reclamada pela lei de regência dos benefícios previdenciários não se traduz em submissão contínua ao agente nocivo durante toda a jornada de trabalho, mas àquela ínsita ao desenvolvimento das atividades cometidas ao trabalhador, integrada à sua rotina de trabalho. Também em relação à permanência, a exegese adequada deve ser no sentido de que a incidência continuada ao agente nocivo, não necessariamente precisa ocorrer diariamente ou se prolongue durante toda a jornada. O que se exige como permanência é que esta não decorra de acontecimento incerto, casual e fortuito. (Processo n.º 0503813-51.2016.4.05.8500, relator o Juiz Federal Fábio Cordeiro de Lima, voto incluso no Sistema Creta no dia 10/11/2017) (grifei)

Relatados no essencial, passo a decidir.

VOTO
O pedido de uniformização de interpretação de lei federal está previsto no art. 14 da Lei n.º 10.259/2001, sendo cabível quando “houver divergência entre decisões sobre questões de direito material proferidas por Turmas Recursais na interpretação da lei”.

Por questões de direito material, deve-se entender os pontos controvertidos de direito, ou seja, aqueles alusivos à construção, a partir dos enunciados dos textos normativos, da norma jurídica do caso concreto, desde que, para o deslinde da controvérsia, não seja necessária a reavaliação de provas nem o reexame dos fatos concretamente discutidos na demanda.

Para demonstrar a divergência, necessário o confronto do acórdão recorrido com acórdão paradigma de Turma Recursal de região diferente, da própria TNU ou do STJ (art. 14, § 4º). Também é possível que se utilize, para tais fins, enunciado de súmula da TNU ou do STJ.

***

No caso, o pedido merece ser conhecido, uma vez que demonstrada a divergência com relação à questão controvertida nestes autos, nos termos acima.

Assim, embora o acórdão recorrido tenha entendido não haver prova nos autos que permitam avaliar os requisitos da habitualidade e permanência, para alcançar tal conclusão, ele partiu de premissas opostas àquelas consideradas pelo acórdão recorrido, o qual concluiu que, nos casos de exposição ao agente nocivo eletricidade, esses requisitos não exigem que a exposição seja ininterrupta.

Em outras palavras, enquanto o acórdão recorrido não iniciou a discussão acerca da melhor interpretação dos requisitos da habitualidade e permanência para o caso específico da eletricidade, o acórdão paradigma o fez, concentrando-se na sua exegese.

No caso, portanto, a controvérsia a ser equacionada é relacionada com a fixação de critério temporal de exposição, ou seja, saber qual é o tempo mínimo exigido de exposição ao agente nocivo, para fins de se classificar a atividade como exercida em condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física do segurado.

Essa questão controvertida foi afetada como tema representativo no Tema 210, tendo a redação do tema ficado nos seguintes termos: saber se, para o reconhecimento de tempo especial pela exposição nociva ao agente físico eletricidade, há necessidade de comprovar a habitualidade e a permanência.

***

A aposentadoria especial se baseia no princípio da igualdade material, segundo a qual pessoas que se encontram em situações diferentes não podem ser tratadas de maneira formalmente igual. Dessa maneira, esse tipo de benefício desiguala os segurados, permitindo que alguns deles se aposentem após o cumprimento de tempo menor do que aqueles que estão na regra geral.

O fundamento, como adiantado, está no fato de que determinados trabalhadores se encontram em situação de desigualdade, pois exercem trabalho, ofício ou profissão em condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física.

Tais atividades profissionais, por gerarem maior desgaste físico e/ou mental do trabalhador, em tese, diminuem a sua expectativa de vida ou trazem algum risco a ela, razão pela qual eles devem se retirar da vida profissional antes dos demais.

Todavia, como saber quais atividades podem ser consideradas para tal finalidade? Ou seja, como saber quais delas devem ser entendidas como exercidas em condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física?

A legislação optou por separar as atividades em comum e especial de acordo com o critério da exposição do trabalhador a agentes nocivos insalubres ou perigosos.

Inicialmente, com o Decreto n.º 53.831/64 e o Decreto n.º 83.080/79, a legislação brasileira previu duas hipóteses: a) elegeu e listou algumas atividades que, presumidamente, expunham o segurado a agente insalubre ou perigoso; b) listou alguns agentes insalubres ou perigosos, cuja exposição tinha o condão de tornar eventual atividade não listada como sendo do tipo especial.

No caso do Decreto n.º 53.831/64, os agentes nocivos físicos e químicos são descritos através do Código 1.0 e suas subclasses, enquanto as atividades profissionais são apresentadas por meios do Código 2.0 e suas subclasses. No Decreto n.º 83.080/79, por sua vez, os agentes nocivos são listados no Anexo I e as atividades profissionais no Anexo II.

A partir da Lei n.º 9.032/95, esse regramento muda: a) desaparece a lista de atividades que, presumidamente, expunham o segurado a agentes nocivos insalubres ou perigosos; b) mantém-se a exigência de que o segurado demonstre que, efetivamente, não importa o nome que se dê à atividade profissional, esteja exposto a agente nocivo insalubre ou perigoso reconhecido por lei como prejudicial à saúde ou à integridade física.

Com relação ao tempo em que o segurado permanece exposto ao agente nocivo, inicialmente, a Lei n.º 3.807/60, que introduziu a aposentadoria especial no Brasil em seu art. 31, não previu qualquer regra a respeito:

Art. 31. A aposentadoria especial será concedida ao segurado que, contando no mínimo 50 (cinqüenta ) anos de idade e 15 (quinze) anos de contribuições tenha trabalhado durante 15 (quinze), 20 (vinte) ou 25 (vinte e cinco) anos pelo menos, conforme a atividade profissional, em serviços, que, para êsse efeito, forem considerados penosos, insalubres ou perigosos, por Decreto do Poder Executivo.

Por sua vez, o Decreto n.º 53.831/64 trouxe a exigência de que o exercício da atividade considerada especial fosse permanente e habitual:

Art. 3º A concessão do benefício de que trata êste decreto dependerá de comprovação pelo segurado efetuado na forma prescrita pelo art. 60, do Regulamento Geral da Previdência Social, perante o Instituto de Aposentadoria e Pensões a que estiver filiado do tempo de trabalho permanente e habitualmente prestado no serviço ou serviços, considerados insalubres, perigosos ou penosos, durante o prazo mínimo fixado.

Não houve regra específica acerca do tempo mínimo de exposição ao agente nocivo. Nem poderia ter havido, pois cada atividade possui suas particularidades, não sendo possível previsão geral e abstrata a respeito.

O que se exigiu foi apenas que a atividade em condições especiais seja exercida de forma habitual (não ocasional) e permanente (não intermitente).

Com o advento da Lei n.º 9.032/95, esta anomia de que estamos tratando remanesceu, tendo sido mantida apenas a exigência do exercício, habitual e permanente, de atividade em condições especiais, ou seja, aquelas que prejudiquem a saúde ou a integridade física do segurado:

§ 3º A concessão da aposentadoria especial dependerá de comprovação pelo segurado, perante o Instituto Nacional do Seguro Social–INSS, do tempo de trabalho permanente, não ocasional nem intermitente, em condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física, durante o período mínimo fixado

Não havendo como prever o tempo de exposição mínima em relação a cada uma das centenas de agentes nocivos considerados insalubres e perigosos, deixou-se este regramento para as normas de segurança do trabalho.

O Decreto n.º 2.172/97 não detalhou a regra em comento. Todavia, o Decreto n.º 3.048/99, por sua vez, tentando colmatar a lacuna e fixar regra para o tempo mínimo de exposição, afirmou que esta deveria ocorrer durante a integralidade da jornada de trabalho:

Art. 65. Considera-se tempo de trabalho, para efeito desta Subseção, os períodos correspondentes ao exercício de atividade permanente e habitual (não ocasional nem intermitente), durante a jornada integral, em cada vínculo trabalhista, sujeito a condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física, inclusive férias, licença médica e auxílio-doença decorrente do exercício dessas atividades. (grifei)

Em seguida, veio o Decreto n.º 3.265/99, que reforçou a ideia de exposição necessária durante toda a jornada de trabalho, mantendo a tentativa de normatizar o tempo mínimo de exposição:

Art. 65. Considera-se tempo de trabalho, para efeito desta Subseção, os períodos correspondentes ao exercício de atividade permanente e habitual (não ocasional nem intermitente), durante toda a jornada de trabalho, em cada vínculo, sujeito a condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física, inclusive férias, licença médica e auxílio-doença decorrente do exercício dessas atividades. (Redação dada pelo Decreto nº 3.265, de 1999)

Entrementes, na sequência, desistiu-se da ideia de regra geral para o tempo mínimo de exposição. O Decreto n.º 4.882/2003, tentando encontrar critério para reforçar a separação entre atividades comuns e especiais, apelou para o uso da linguagem da Economia e tratou do problema a partir da abordagem da atividade por setor, quais sejam, do setor industrial e do setor de serviços, enfatizando que o trabalho que gera a exposição a ser considerada, além de permanente, ou seja, não ocasional nem intermitente, deve, necessariamente, ser indissociável da produção do bem ou da prestação do serviço:

Art. 65. Considera-se trabalho permanente, para efeito desta Subseção, aquele que é exercido de forma não ocasional nem intermitente, no qual a exposição do empregado, do trabalhador avulso ou do cooperado ao agente nocivo seja indissociável da produção do bem ou da prestação do serviço. (grifei)
Parágrafo único. Aplica-se o disposto no caput aos períodos de descanso determinados pela legislação trabalhista, inclusive férias, aos de afastamento decorrentes de gozo de benefícios de auxílio-doença ou aposentadoria por invalidez acidentários, bem como aos de percepção de salário-maternidade, desde que, à data do afastamento, o segurado estivesse exercendo atividade considerada especial.

Por fim, veio a lume o Decreto n.º 8.123/2013, que manteve a regra acima, apenas aprimorando a redação:

Art. 65. Considera-se tempo de trabalho permanente aquele que é exercido de forma não ocasional nem intermitente, no qual a exposição do empregado, do trabalhador avulso ou do cooperado ao agente nocivo seja indissociável da produção do bem ou da prestação do serviço. (Redação dada pelo Decreto nº 8.123, de 2013)
Parágrafo único. Aplica-se o disposto no caput aos períodos de descanso determinados pela legislação trabalhista, inclusive férias, aos de afastamento decorrentes de gozo de benefícios de auxílio-doença ou aposentadoria por invalidez acidentários, bem como aos de percepção de salário-maternidade, desde que, à data do afastamento, o segurado estivesse exposto aos fatores de risco de que trata o art. 68. (Redação dada pelo Decreto nº 8.123, de 2013)

Como visto, a norma geral e abstrata não foi capaz de universalizar regra a respeito do tempo mínimo necessário de exposição ao agente nocivo, tendo imposto apenas alguns parâmetros para a classificação do trabalho como especial.

Foi fixado que a atividade exercida deve ser habitual e permanente, bem como que, por permanente, deve ser entendida a atividade não ocasional nem intermitente. Chegou-se a dizer que a exposição deveria ocorrer durante toda a jornada de trabalho, porém depois recuou-se, tendo-se mantido apenas regra que determina a vinculação entre a atividade exercida e o setor da economia em que se encontra, talvez com a pretensão de se deixar claro que os trabalhos burocráticos não podem ser tidos como especiais.

Em suma:
1. há atividades que, sem dúvida, expõem o trabalhador ao agente nocivo durante toda a jornada, como o ruído nas tecelagens, porém há outras em que o mesmo agente pode estar presente apenas em alguns momentos, como o ruído nas pistas de aeroportos pequeno porte, sem que esta alternância lhe retire a qualidade de atividade exercida em condições que prejudiquem a saúde ou a integridade física;

2. há agentes nocivos cujo potencial de degradação da saúde ou da integridade física é decorrente da exposição lenta, gradual e prolongada a ele, porém há outros cujo potencial decorre do simples contato direto por uma única vez, como é o caso da eletricidade e de determinados agentes biológicos.

Dessa maneira, quanto ao tempo mínimo de exposição, é no caso concreto que a discussão terá que ser travada, muitas vezes somente mediante o auxílio de laudos técnicos e da opinião de especialistas em medicina do trabalho, de químicos, de engenheiros etc.

***

No presente caso, trata-se do agente nocivo eletricidade, cujo potencial danoso não provém da exposição lenta, gradual e contínua, mas, ao contrário, pode causar o óbito mediante único contato, a partir de determinada voltagem.

Nesse tipo de situação, portanto, o que se protege não é o tempo de exposição (causador do eventual dano), mas o risco de exposição ao agente danoso, no caso classificado como perigoso.

Com relação a este risco, surge a questão: mesmo exercendo, de forma habitual e permanente, atividade que expõe o segurado à eletricidade, como saber quais as condições para esta exposição?

No regime do Decreto n.º 53.831/64, a energia elétrica era prevista como agente nocivo perigoso, desde que o segurado estivesse exposto à tensão superior a 250 volts:


Código 1.1.8.
Campo de aplicação: Eletricidade. Operações em locais com eletricidade em condições de perigo de vida. 
Serviços e Atividades Profissionais
Trabalhos permanentes em instalações ou equipamentos elétricos com risco de acidentes - Eletricistas, cabistas, montadores e outros.
Classificação. Perigoso.
Tempo de serviço. 25 anos.
Observações: Jornada normal ou especial fixada em lei em serviços expostos a tensão superior à 250 volts. Art. 187,195 e 196 CLT. Portaria Ministerial 34 de 8.4.54.

Acerca do tema, a jurisprudência do STJ: “Em se tratando de eletricidade, nos termos do Decreto n.º 53.831/64, vigente à época do labor, a atividade é tida como especial quando submetida a tensão superior a 250 volts.” (AgRg no AG n.º 1.059.799, relator o Ministro Og Fernandes, julgado no dia 17/08/2010.)

A partir da vigência da Lei n.º 9.032/95 e do Decreto n.º 2.172/97, diante da falta de previsão expressa, a jurisprudência do STJ, inicialmente, entendeu que a exposição à eletricidade não mais autorizava qualificação da atividade como especial, mesmo quando acima de 250V: “O agente agressivo eletricidade (acima de 250 volts) teve enquadramento no Decreto 53.831/64 até 5/3/97, data da edição do Decreto 2.172, que não mais o relacionou entre os agentes nocivo.” (AgRg no REsp. n.º 992.855, relator o Ministro Arnaldo Esteves Lima, julgado no dia 06/11/2008) (grifei)

Em seguida, contudo, a orientação pacificou-se no sentido da possibilidade da eletricidade continuar qualificando o serviço como especial: “Assim, o fato de o Decreto n. 2.172/97 não ter previsto o agente agressivo eletricidade como causa para se reconhecer período de atividade de natureza especial, não afasta o direito do segurado à contagem de tempo especial se comprovada a sua exposição de forma habitual e permanente a esse fator de periculosidade. No mesmo sentido, confiram-se: AgRg no REsp 1.314.703/RN, Rel. Min. Sérgio Kukina, Primeira Turma, DJe 27/05/2013; AgRg no REsp 1.348.411/RS, Rel. Min. Castro Meira, Segunda Turma, DJe 11/04/2013; AgRg no REsp 1.168.455/RS, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, Quinta Turma, DJe 28/06/2012; AgRg no REsp 1.284.267/RN, Rel. Min. Sebastião Reis Júnior, Sexta Turma, DJe 15/2/2012. (AgRg no AREsp. n.º 143.834, relator o Ministro Benedito Gonçalves, julgado no dia 18/06/2013)

Ao julgar a questão controvertida no Tema 534, o STJ resumiu o seu entendimento no seguinte enunciado: “É cabível o enquadramento como atividade especial do trabalho exposto ao agente perigoso eletricidade, exercido após a vigência do Decreto nº 2.172/1997, para fins de aposentadoria especial, desde que a atividade exercida esteja devidamente comprovada pela exposição aos fatores de risco de modo permanente, não ocasional, nem intermitente, em condições especiais”. (REsp. n.º 1.306.113, relator o Ministro Herman Benjamin, julgado no dia 21/05/2013)

Esta TNU, ao decidir o Tema 159, também fixou seu entendimento em julgamento afetado como representativo da controvérsia: “É possível o reconhecimento como especial de período laborado com exposição ao agente energia elétrica, após o Decreto 2.172/97, para fins de concessão de aposentadoria especial.” (Processo n.º 5001238-34.2012.4.04.7102, relator o Juiz Federal Bruno Leonardo Câmara Carrá, julgado no dia 06/08/2014)

No presente caso, contudo, a discussão vai além e desafia a seguinte questão controvertida: mesmo exercendo, de forma habitual e permanente, atividade que exponha o segurado à tensão elétrica acima de 250 volts, em que circunstância temporal deve esta exposição ocorrer? Em toda a jornada de trabalho? Todos os dias? Toda semana?

Como visto, a exigência de exposição durante toda a jornada foi retirada da legislação previdenciária, tendo sido substituída.

Por outro lado, acresceu-se a ideia de que a exposição ao fator de risco deve ser indissociável da produção do bem ou da prestação do serviço, de modo a se evitar os casos de exposição meramente circunstancial, ou seja, em situações particularizadas por circunstâncias não inerentes ao trabalho, ofício ou profissão, situações que podem, portanto, ser evitadas pelo segurado.

Se ocorrem, constituem-se fatos jurídicos para o campo do Direito do Trabalho, com possíveis reflexos para o acidente do trabalho, porém não para fins de aposentadoria por tempo de serviço especial.

***

Em tais termos, de acordo com a legislação de regência e a jurisprudência até aqui construída, é possível se afirmar que, para ser qualificado como tempo especial, devem concorrer as seguintes condições:

1. exercício, de maneira habitual e permanente, de atividade profissional em condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física do segurado;
2. exposição do segurado, em razão do exercício da atividade profissional, a tensões elétricas superiores a 250 V, não necessariamente durante toda a jornada;
3. exposição ao risco inerente à profissão, de forma não circunstancial ou particularizada e indissociável da produção do bem ou da prestação do serviço na qual ela está sendo desenvolvida.

Pelo exposto, voto no sentido de CONHECER E DAR PROVIMENTO ao incidente de uniformização, determinando o retorno dos autos à turma de origem para adequação do julgado à seguinte conclusão de tese: “Para aplicação do artigo 57, §3.º, da Lei n.º 8.213/91 à tensão elétrica superior a 250 V, exige-se a probabilidade da exposição ocupacional, avaliando-se, de acordo com a profissiografia, o seu caráter indissociável da produção do bem ou da prestação do serviço, independente de tempo mínimo de exposição durante a jornada”

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Rio Grande, Rio Grande do Sul, Brazil
Especialista em Direito Previdenciário, pela Universidade de Caxias do Sul - UCS, em parceria com a ESMAFE - Escola da Magistratura Federal, em 2009. Formado em janeiro de 2006, pela FURG - Fundação Universidade do Rio Grande, em direito. Este blog tem o objetivo de divulgar o conteúdo previdenciário de maneira gratuita para que todos possam ter acesso as informações sobre esta matéria.

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