Menor que vivia com avó consegue benefício
Nesta sexta-feira será visto uma jurisprudência que trata sobre a concessão do benefício de pensão por morte a um menor de idade que vivia sob a guarda de sua avó, tendo o caso sido interpretado em conformidade com o princípio da proteção da criança e do adolescente, devendo o menor sob guarda judicial de servidor público ser considerado seu dependente para fins previdenciários em consonância com o art. 33, § 3º, do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA). Abaixo segue a decisão para análise dos amigos.
EMENTA
ADMINISTRATIVO. SERVIDOR PÚBLICO. PENSÃO TEMPORÁRIA POR MORTE. MENOR SOB GUARDA. ÓBITO NA VIGÊNCIA DA LEI N. 13.135/2015. TESE FIRMADA NO RECURSO ESPECIAL REPETITIVO N. 1.411.258/RS. PREVALÊNCIA DA LEI N. 8.069/90 (ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE). REQUISITOS PREENCHIDOS. CONCESSÃO. EXTENSÃO DO BENEFÍCIO ATÉ 24 ANOS DE IDADE. IMPOSSIBILIDADE. APELAÇÃO PROVIDA EM PARTE.
1. Apelação interposta pela parte autora em face de sentença que julgou improcedente o pedido de concessão do benefício de pensão por morte, na condição de menor sob guarda, pela ausência de comprovação de dependência econômica da servidora.
2. A Lei n. 13.135, de 17 de junho de 2015, alterou a redação do artigo 217 do Estatuto do Servidor Público Federal (Lei nº 8.112/90) e suprimiu o menor sob guarda ou tutela do rol de beneficiários das pensões. Por outro lado, a matéria exige interpretação conforme o princípio da proteção da criança e do adolescente, devendo o menor sob guarda judicial de servidor público ser considerado seu dependente para fins previdenciários, em consonância com o art. 33, §3º, do ECA.
3. “O menor sob guarda tem direito à concessão do benefício de pensão por morte do seu mantenedor, comprovada a sua dependência econômica, nos termos do art. 33, § 3º, do Estatuto da Criança e do Adolescente, ainda que o óbito do instituidor da pensão seja posterior à vigência da medida provisória 1.523/96, reeditada e convertida na Lei n. 9.528/97. Funda-se essa conclusão na qualidade de lei especial do Estatuto da Criança e do Adolescente (8.069/90), frente à legislação previdenciária” (REsp 1411258/RS, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 11/10/2017, DJe 21/02/2018).
4. Dessa maneira, para a concessão do benefício de pensão por morte, em se tratando de menor sob guarda ou tutela, tem-se por necessária a comprovação de dois requisitos concorrentes: a) ter menos de 21 anos; e b) dependência econômica. Preenchidos os requisitos, afigura-se devida a concessão de pensão temporária a menor de 21 anos, com efeitos financeiros a partir da data do óbito da instituidora.
5. No caso dos autos, a ex-servidora, antes do deferimento judicial da guarda do menor Luadson, era responsável por pagar pensão alimentícia ao neto, sendo exonerada da obrigação apenas quando ele passou a viver sob sua guarda e responsabilidade, conforme “TERMO DE RATIFICAÇÃO – GUARDA”(id 13712451). Pelo documento, está comprovada a dependência econômica antes mesmo da guarda judicial do menor, de modo que o Termo de Guarda provavelmente não interrompeu tal dependência, mas, pelo contrário, deu continuidade à aludida situação (regra de experiência comum).
6. Ausente amparo legal para a extensão do pagamento de pensão estatutária civil até a colação de grau do beneficiário ou até que complete 24 anos.
7. Apelação parcialmente provida para determinar a concessão de pensão temporária ao menor sob guarda da instituidora, até que complete 21 anos de idade, com efeitos financeiros a partir da data do óbito da ex-servidora.
TRF 1ª, Apelação Cível 1000490-20.2018.4.01.4200, Primeira Turma, Desembargador Federal relator Marcelo Albernaz, 24/05/2024.
ACÓRDÃO
Decide a Primeira Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região, por unanimidade, dar parcial provimento à apelação, nos termos do voto do Relator.
Brasília/DF.
Desembargador Federal MARCELO ALBERNAZ
Relator
RELATÓRIO
Cuida-se de apelação interposta por LUADSON NASCIMENTO DA COSTA em face de sentença que julgou improcedente o pedido de concessão do benefício de pensão por morte, na condição de menor sob guarda, pela ausência de comprovação de dependência econômica da servidora. Ainda, condenou a parte autora ao pagamento das custas e honorários advocatícios fixados em R$ 3.000,00, no percentual de 10% do valor atribuído à causa, com exigibilidade suspensa pela concessão da gratuidade de justiça.
Na origem, Luadson Nascimento da Costa informa que é filho de Andréa Nascimento Alves e Luidson Costa Silva, porém, vivia sob a dependência econômica de sua avó materna, Idelcy Madeira Nascimento, servidora do ex-Território de Roraima, falecida em 03 de setembro de 2015.
A parte autora, em suas razões recursais, alega:
1 – Nulidade da sentença pela ocorrência de litispendência com o “processo distribuído na 4ª Vara Federal do Estado de Roraima sob o nº 0003897-22.2016.4.01.4200” que trata “do mesmo pedido, causa de pedir, mesmo réu, mesmo autor e as mesmas razões de direito dos presentes autos”; e
2 – "em hipótese superveniente, requer-se a reforma da decisão para concessão do benefício de pensão por morte de sua instituidora até a colação de grau do beneficiário ou até os 24 anos”.
Com contrarrazões.
É o relatório.
VOTO
Inicialmente, verifica-se que a ação em análise foi proposta em 22.02.2018, após a extinção, sem julgamento do mérito, das duas outras ações anteriormente ajuizadas (autos n. 0003897-22.2016.4.01.4200 - 4ª Vara, sentenciada em 25/10/2016 e autos n. 1000418-67.2017.4.01.4200 - 2ª Vara, sentenciada em 27/07/2017). Assim, inexiste litispendência, como argumentado pelo apelante.
A concessão de pensão por morte rege-se pelo princípio do tempus regit actum, isto é, pela lei vigente na data de falecimento do instituidor.
A Lei n. 13.135, de 17 de junho de 2015, alterou a redação do artigo 217 do Estatuto do Servidor Público Federal (Lei nº 8.112/90) e suprimiu o menor sob guarda ou tutela do rol de beneficiários das pensões.
Por outro lado, a matéria exige interpretação conforme o princípio da proteção da criança e do adolescente, devendo o menor sob guarda judicial de servidor público ser considerado seu dependente para fins previdenciários, em consonância com o art. 33, §3º, do ECA, in verbis:
Art. 33. A guarda obriga a prestação de assistência material, moral e educacional à criança ou adolescente, conferindo a seu detentor o direito de opor-se a terceiros, inclusive aos pais.
(...)
§ 3º A guarda confere à criança ou adolescente a condição de dependente, para todos os fins e efeitos de direito, inclusive previdenciários.
Assim, necessário assegurar à criança e ao adolescente acolhidos, sob a forma de guarda, os direitos fundamentais com absoluta prioridade, bem como garantir ao menor os direitos previdenciários e trabalhistas também pelo Poder Público.
Nesse cenário, a jurisprudência do STJ passou a reconhecer ao menor sob guarda a condição de dependente do seu mantenedor, para fins previdenciários, fixando a seguinte tese em recurso repetitivo:
“O menor sob guarda tem direito à concessão do benefício de pensão por morte do seu mantenedor, comprovada a sua dependência econômica, nos termos do art. 33, § 3º, do Estatuto da Criança e do Adolescente, ainda que o óbito do instituidor da pensão seja posterior à vigência da medida provisória 1.523/96, reeditada e convertida na Lei n. 9.528/97. Funda-se essa conclusão na qualidade de lei especial do Estatuto da Criança e do Adolescente (8.069/90), frente à legislação previdenciária” (REsp 1411258/RS, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 11/10/2017, DJe 21/02/2018).
Ainda que o julgado trate do RGPS, o art. 33, § 3º, da Lei nº 8.069/90 deve preponderar sobre a modificação legislativa operada na Lei nº 8.112/90. Dessa maneira, para a concessão do benefício de pensão por morte, em se tratando de menor sob guarda ou tutela, tem-se por necessária a comprovação de dois requisitos concorrentes: a) ter menos de 21 anos; e b) dependência econômica.
Nesse sentido:
ADMINISTRATIVO. PROCESSUAL CIVIL. SERVIDOR PÚBLICO. PENSÃO POR MORTE. GUARDA JUDICIAL. MENOR DE 21 ANOS. DEPENDÊNCIA ECONÔMICA COMPROVADA. APELAÇÃO DESPROVIDA.
1. Em sede de recurso repetitivo, o STJ firmou entendimento de que “o menor sob guarda tem direito à concessão do benefício de pensão por morte do seu mantenedor, comprovada sua dependência econômica, nos termos do art. 33, § 3º do Estatuto da Criança e do Adolescente, ainda que o óbito do instituidor da pensão seja posterior à vigência da Medida Provisória 1.523/96, reeditada e convertida na Lei 9.528/97. Funda-se essa conclusão na qualidade de lei especial do Estatuto da Criança e do Adolescente (8.069/90), frente à legislação previdenciária (REsp n. 1.411.258/RS, relator Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, Primeira Seção, julgado em 11/10/2017, DJe de 21/2/2018 - Tema 732).
2. Seguindo essas interpretações, o menor sob guarda é equiparado ao filho, sendo então aplicado o art. 217, §3º. Assim, para a concessão do benefício de pensão por morte, em se tratando de menor ou maior inválido sob guarda, tem-se por necessário a comprovação de dois requisitos concorrentes: a) ter menos de 21 anos ou comprovar sua invalidade/deficiência anterior ao óbito; b) a dependência econômica.
3. No caso dos autos, os autores comprovaram ter menos de 21 anos e serem dependentes econômicos da instituidora da pensão, fazendo, assim, jus ao recebimento de pensão por morte.
4. Negado provimento à apelação.
5. Majorados os honorários advocatícios, de 10% para 12% do valor atualizado da condenação.
(AC 1000072-30.2018.4.01.3506, DESEMBARGADOR FEDERAL MARCELO ALBERNAZ, TRF1 - PRIMEIRA TURMA, PJe 11/09/2023 PAG.)
No caso dos autos, a ex-servidora, antes do deferimento judicial da guarda do menor Luadson, era responsável por pagar pensão alimentícia ao neto, sendo exonerada da obrigação apenas quando ele passou a viver sob sua guarda e responsabilidade, conforme “TERMO DE RATIFICAÇÃO – GUARDA” (id 13712451):
“Em razão do exposto na inicial e, restando suficientemente preservados o interesse das crianças, acolho o Parecer Ministerial, homologando o acordo a que chegaram as aprtes, declarando que doravante IDELCY MADEIRA DO NASCIMENTO ficará com a guarda e responsbilidade do menor LUADSON NASCIMENTO DA COSTA, filho de Luidson Costa da Silva e Andréa do Nascimento Alves, assumindo o ônus de bem educar, fornecendo-lhe educação, saúde, segurança e alimentação indispensável ao seu bom desenvolvimento físico e intelectual. Outrossim, defiro o pedido de exoneração de pensão alimentícia, tendo em vista que o alimentando passará a viver sob guarda e responsabilidade do alimentante.”
Pelo documento, está comprovada a dependência econômica antes mesmo da guarda judicial do menor, de modo que o Termo de Guarda provavelmente não interrompeu tal dependência, mas, pelo contrário, deu continuidade à aludida situação (regra de experiência comum).
Ainda, na data do óbito da Sra. Idelcy (03.09.2015), Luadson, nascido em 27.07.1999, contava com 16 anos.
Noutro compasso, inexiste amparo legal para a extensão do pagamento de pensão estatutária civil até a colação de grau do beneficiário ou até que complete 24 anos.
Assim, preenchidos os requisitos, afigura-se devida a concessão de pensão temporária ao autor até completar a idade de 21 anos, com efeitos financeiros a partir da data do óbito da instituidora.
Ante o exposto, DOU PARCIAL PROVIMENTO à apelação para determinar a concessão de pensão temporária ao menor sob guarda da instituidora, até que complete 21 anos de idade, com efeitos financeiros a partir da data do óbito da ex-servidora.
Sucumbência mínima da parte autora. Inverto os ônus da sucumbência, ficando a parte vencida condenada em reembolso de despesas processuais e honorários advocatícios em favor da parte vencedora, englobando trabalho do advogado em primeiro e segundo graus (art. 85, §11, CPC), que ora fixo em 1% (um por cento) acima dos percentuais mínimos previstos no art. 85, §§ 2º e 3º, do CPC, sobre o valor atualizado da condenação, consideradas a parcelas vencidas até a prolação do acórdão de procedência.
É como voto.
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