Decisão converte auxílio-doença em aposentadoria por invalidez a pescador
Nesta sexta-feira será visto uma jurisprudência que trata sobre a concessão do benefício de aposentadoria por invalidez a um pescador portador de lombociatalgia. Abaixo segue a decisão para análise dos amigos.
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIOS POR INCAPACIDADE. SEGURADO ESPECIAL. PESCADOR. LAUDO PERICIAL. INCAPACIDADE MULTIPROFISSIONAL E PERMANENTE. CONDIÇÕES PESSOAIS DO SEGURADO. PREENCHIMENTO DOS REQUISITOS LEGAIS. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO.REFORMA DA SENTENÇA.
1. A aposentadoria por invalidez é devida ao segurado que, havendo cumprido, quando for o caso, o período de carência, estando ou não em gozo de auxílio-doença, for considerado incapaz e insuscetível de reabilitação para o exercício de atividade que lhe garanta a subsistência, e ser-lhe-á paga enquanto permanecer nesta condição.
2. No caso em exame, tendo o laudo pericial constatado a incapacidade permanente e multiprofissional do autor — segurado especial, pescador —, e tendo o próprio laudo confirmado que o demandante somente poderá exercer atividades que não necessitem de esforço físico moderado ou intenso, há que se concluir pela impossibilidade de sua reabilitação para outra atividade, reconhecendo-lhe consequentemente o direito à aposentadoria por invalidez.
3. A correção monetária e os juros de mora devem observar o que foi decidido pelo Supremo Tribunal Federal no RE 870.947 (tema 810) e pelo Superior Tribunal de Justiça ao julgar o REsp 1.495.146/MG (Tema 905), bem como o que consta da Emenda Constitucional n. 113/2021.
4. Apelação da parte autora provida. Alteração, de ofício, do índice de correção monetária e dos juros de mora.
TRF 1ª, APELAÇÃO CÍVEL 1033390-17.2021.4.01.9999, Nona Turma, Desembargadora Federal relatora Nilza Reis, 04/09/2023.
ACÓRDÃO
Decide a Nona Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região, por unanimidade, dar provimento à apelação, nos termos do voto da relatora.
Brasília, data da assinatura eletrônica.
Desembargadora Federal relatora NILZA REIS
RELATÓRIO
A parte autora interpõe recurso de apelação contra a sentença que julgou parcialmente procedente o pedido para a concessão do benefício auxílio-doença, a contar da data do requerimento administrativo (08/07/2019), até a enfermidade persistir ou até a efetiva reabilitação, com a condenação da autarquia previdenciária no pagamento de honorários advocatícios (fls. 149/153) ¹.
Na apelação (fls. 155/176), a parte autora requer a reforma da sentença para que seja determinada a conversão do benefício de auxílio-doença em aposentadoria por invalidez, ao argumento de que possui incapacidade total e permanente para o trabalho.
O INSS não apresentou contrarrazões, conforme se infere da certidão de fl. 177.
É o relatório.
VOTO
O recurso reúne os requisitos de admissibilidade, merecendo ser conhecido
A concessão de benefício por incapacidade laboral está prevista nos artigos 42 e 59 da Lei n. 8.213/91, in verbis:
Art. 42. A aposentadoria por invalidez, uma vez cumprida, quando for o caso, a carência exigida, será devida ao segurado que, estando ou não em gozo de auxílio-doença, for considerado incapaz e insusceptível de reabilitação para o exercício de atividade que lhe garanta a subsistência, e ser-lhe-á paga enquanto permanecer nesta condição.
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Art. 59. O auxílio-doença será devido ao segurado que, havendo cumprido, quando for o caso, o período de carência exigido nesta Lei, ficar incapacitado para o seu trabalho ou para a sua atividade habitual por mais de 15 dias consecutivos.
Dessa forma, são três os requisitos para a concessão dos benefícios por incapacidade: 1) a qualidade de segurado; 2) o cumprimento do período de carência de doze contribuições mensais, quando necessário; 3) a incapacidade para o trabalho, de caráter permanente (aposentadoria por invalidez) ou temporário (auxílio-doença).
Quanto ao segurado especial, o art. 39 da Lei de Benefícios dispõe que fica garantida a concessão de auxílio-doença e aposentadoria por invalidez, no valor de 1 (um) salário mínimo, desde que comprove o exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, igual ao número de meses correspondentes à carência do benefício requerido. Nesse sentido, vale conferir os seguintes dispositivos da Lei n. 8.213/91
Art. 11. São segurados obrigatórios da Previdência Social as seguintes pessoas físicas: (Redação dada pela Lei nº 8.647, de 1993) [...]
VII – como segurado especial: a pessoa física residente no imóvel rural ou em aglomerado urbano ou rural próximo a ele que, individualmente ou em regime de economia familiar, ainda que com o auxílio eventual de terceiros, na condição de: (Redação dada pela Lei nº 11.718, de 2008) [...]
b) pescador artesanal ou a este assemelhado que faça da pesca profissão habitual ou principal meio de vida; e (Incluído pela Lei nº 11.718, de 2008)
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“Art. 39. Para os segurados especiais, referidos no inciso VII do caput do art. 11 desta Lei, fica garantida a concessão: (Redação dada pela Lei nº 13.846, de 2019)
I - de aposentadoria por idade ou por invalidez, de auxílio-doença, de auxílio-reclusão ou de pensão, no valor de 1 (um) salário mínimo, e de auxílio-acidente, conforme disposto no art. 86 desta Lei, desde que comprovem o exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, igual ao número de meses correspondentes à carência do benefício requerido, observado o disposto nos arts. 38-A e 38-B desta Lei; ou (Redação dada pela Lei nº 13.846, de 2019)”.
Do caso concreto.
O Autor, nascido em 11/03/1984, ajuizou a presente ação em 20/08/2020, pleiteando a concessão de aposentadoria por invalidez ou, subsidiariamente, a concessão de auxílio-doença.
Existe prova nos autos no sentido de que o autor é pescador (fls. 38/40), e a lide recursal é encaminhada, essencialmente, à análise acerca da questão relativa à existência (ou não) da sua incapacidade total para o trabalho.
Do laudo da perícia médica judicial, realizada em 02/12/2020 (fls. 126/128), extrai-se que o Autor, pescador, ensino fundamental incompleto, encontra-se acometido de lombociatalgia , espondilose lombar grave com retrolistese, protusão discal levando a compressão modular, CID M51 e M19, tendo como causa provável esforço físico. O Perito informa que o autor só está apto a realizar atividades que não demandem esforço físico moderado ou intenso. Concluiu que se trata de incapacidade permanente e multiprofissional, indicando que a doença teve início há 4 (quatro) anos.
Ora, considerando as condições pessoais e sociais desfavoráveis da parte autora (ensino fundamental incompleto, pescador), resta concluir que a lesão multiprofissional permanente gera incapacidade para o trabalho, uma vez que pouco adianta ao segurado a existência de capacidade residual para atividades que não demandem esforço físico intenso ou moderado quando, ao que tudo indica, pois não há prova nos autos em sentido contrário, ele sempre laborou desenvolvendo ocupações que exigiam esforço físico (fl. 126).
Estão presentes, portanto, os requisitos para o recebimento do benefício de aposentadoria por invalidez.
Sobre o tema em destaque, vale conferir o seguinte precedente deste egrégio TRF – 1ª Região:
PREVIDENCIÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. TRABALHADORA RURAL. RESTABELECIMENTO DE APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. REQUISITOS ATENDIDOS. INCAPACIDADE LABORAL PARCIAL E PERMANENTE. ANÁLISE DAS CONDIÇÕES PESSOAIS. MENSALIDADE DE RECUPERAÇÃO. COMPENSAÇÃO. CORREÇÃO MONETÁRIA E JUROS DE MORA. 1. A sentença proferida na vigência do CPC/2015 não está sujeita à remessa necessária, pois a condenação nela imposta não tem o potencial de ultrapassar o limite previsto no art. 496, § 3º, do novo CPC. 2. São requisitos para a concessão dos benefícios de aposentadoria por invalidez e de auxílio-doença: a qualidade de segurado da Previdência Social, com o preenchimento do período de carência de 12 (doze) contribuições mensais, salvo nas hipóteses previstas no art. 26, II, III e art. 39, I, ambos da Lei 8.213/91, e a comprovação de incapacidade para o exercício de atividade que garanta a subsistência (art. 42, § 1º e § 2º, da Lei 8.213/91), devendo essa incapacitação ser definitiva, para a aposentadoria por invalidez, e temporária, no caso do auxílio-doença. 3. A parte autora gozou benefício de aposentadoria por invalidez de 07/05/2012 a 21/09/2018, cessado por ocasião do exame médico revisional, sob a alegação de recuperação da capacidade laborativa. 4. A perícia médica judicial concluiu pela existência de incapacidade laborativa parcial e permanente da demandante, de forma multiprofissional, em razão de diabetes e hipertensão arterial sistêmica. 5. Diante das circunstâncias do caso concreto, analisando as condições pessoais e socioeconômicas, idade (nascida em 1961), grau de escolaridade (fundamental incompleto), atividade laboral anterior (trabalhadora rural), sem qualificação técnica, e as limitações atribuídas pela doença, conclui-se pela impossibilidade de reabilitação para o exercício de outra atividade que lhe garanta a subsistência. 6. A despeito da perícia não ter precisado a data do início da incapacidade, nota-se que as patologias apontadas no laudo médico são as mesmas que ensejaram o deferimento da prestação previdenciária no âmbito administrativo (fls. 49 autos digitalizados). 7. Mantido, portanto, o restabelecimento da aposentadoria por invalidez, desde a data da cessação indevida, conforme sentença. 8. Tendo a parte autora recebido a mensalidade de recuperação após a cessação da aposentadoria por invalidez, até 03.2020, conforme CNIS, devem tais valores serem compensados no pagamento do valor da condenação. 9. Atrasados: correção monetária e os juros moratórios conforme Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal. 10. Apelação parcialmente provida (item 8). De ofício, foram fixados os critérios de correção monetária e de juros de mora.(AC 1019380-02.2020.4.01.9999, DESEMBARGADOR FEDERAL MORAIS DA ROCHA, TRF1 - PRIMEIRA TURMA, PJe 18/04/2023 PAG.)
Quanto à correção monetária e juros moratórios, deve ser observado o que foi decidido pelo Supremo Tribunal Federal no RE 870.947 (tema 810) e pelo Superior Tribunal de Justiça ao julgar o REsp 1.495.146/MG (Tema 905). Ou seja, deve ser aplicado a variação do INPC para a apuração da correção monetária dos valores devidos, e juros moratórios nos termos do art. 1º-F da Lei n. 9.494/97, com redação da Lei n. 11.960/09, e a partir da vigência da Emenda Constitucional n. 113/2021, apenas a SELIC.
Ante o exposto, dou provimento à apelação interposta pela parte autora, para converter o benefício de auxílio-doença, concedido nestes autos, em aposentadoria por invalidez, a partir da data do laudo (02/12/2020).
Alteração, de ofício, do índice de correção monetária e juros de mora, na forma da fundamentação supra.
Honorários advocatícios recursais fixados em 1% do valor da condenação (Súmula n. 111, do STJ).
É como voto.
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