Decisão trata sobre anotação extemporânea e sua validade como início de prova material
Nesta sexta-feira será visto uma decisão da Turma Nacional de Uniformização representativa de controvérsia que gerou o tema 240 com a seguinte redação "I) É extemporânea a anotação de vínculo empregatício em CTPS, realizada voluntariamente pelo empregador após o término do contrato de trabalho; (II) Essa anotação, desacompanhada de outros elementos materiais de prova a corroborá-la, não serve como início de prova material para fins previdenciários.". Abaixo segue a decisão para análise dos amigos.
EMENTA
PEDIDO DE UNIFORMIZAÇÃO DE INTERPRETAÇÃO DE LEI FEDERAL REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. TEMA 240. DIREITO PREVIDENCIÁRIO. ANOTAÇÃO DE VÍNCULO EMPREGATÍCIO REALIZADA EXTEMPORANEAMENTE EM CTPS. É EXTEMPORANEA A ANOTAÇÃO DE VINCULO EMPREGATÍCIO EM CTPS REALIZADA VOLUNTARIAMENTE PELO EMPREGADOR APÓS O TÉRMINO DO CONTRATO DE TRABALHO. SERVENTIA, POR SI SÓ, COMO INÍCIO DE PROVA MATERIAL. IMPOSSIBILIDADE. NECESSIDADE DE OUTROS ELEMENTOS MATERIAIS PARA CORRORÁ-LA. DECISÃO QUE NÃO SE APLICA À ANOTAÇÃO EXTEMPORÂNEA DECORRENTE DE SENTENÇA TRABALHISTA. CONTROVÉRSIA ESPECÍFICA SOBRE APRECIAÇÃO DO STJ. PUIL 293. PUIL PROVIDO COM FIXAÇÃO DE TESE.
TNU, PEDIDO DE UNIFORMIZAÇÃO DE INTERPRETAÇÃO DE LEI (TURMA) Nº 0500540-27.2017.4.05.8307/PE, relator juiz federal Ivanir Cesar Ireno Junior, 26/03/2021.
ACÓRDÃO
A Turma Nacional de Uniformização decidiu, por unanimidade, DAR PROVIMENTO ao pedido, nos termos do voto do Juiz Relator com a tese ajustada, conforme voto-vista apresentado pelo Juiz Federal Atanair Nasser Ribeiro Lopes, fixando-a nos seguintes termos: i) é extemporânea a anotação de vínculo empregatício em CTPS, realizada voluntariamente pelo empregador após o término do contrato de trabalho; (ii) essa anotação, desacompanhada de outros elementos materiais de prova a corroborá-la, não serve como início de prova material para fins previdenciários.. Pedido de Uniformização julgado como representativo da controvérsia (Tema 240).
Brasília, 25 de março de 2021.
VOTO-VISTA - ATANAIR NASSER RIBEIRO LOPES, Juiz Federal
Cuida-se de incidente interposto pelo INSS, o qual foi convertido para representativo de controvérsia para solução do seguinte tema: "saber se a anotação de vínculo empregatício realizada extemporaneamente em CTPS tem a serventia de início de prova material para fins previdenciários (art. 55, § 3º, da Lei 8.213/91) ou se depende de outros elementos materiais de prova a corroborá-la" (tema 240 na TNU).
No que tange à definição da configuração fática submetida à Corte, o eminente relator considerou o seguinte:
"Relata a inicial, em síntese: a) o juízo de origem e o acórdão reconheceram como início de prova material, para fins de tempo de contribuição, anotação extemporânea em CTPS, desacompanhada de outras provas materiais; b) alegando que a anotação na CTPS foi corroborada por prova testemunhal convincente, reconheceram o período de 10/10/1966 (a partir dos 16 anos da idade) a 28/05/1982, sem concessão de benefício (o autor já estava vinculado, na DER, a RPPS); c) no entanto, o período anotado junto à Usina Santa Terezinha S/A era de 02/01/1958 (07 anos de idade) a 28/05/1982; d) a CTPS somente foi emitida em 26/08/1982; e) no CNIS consta vínculo com a Usina Santa Terezinha S/A de 29/09/1979 a 03/1982 (última remuneração) sem comprovação nos autos; f) na CTPS também consta vínculo de 12/02/1983 a 30/06/1987 com a mesma empresa (não sindicado no PUIL); g) a decisão recorrida está em confronto com jurisprudência de outras TR's, da TNU e do STJ, que não consideram a anotação extemporânea em CTPS, desacompanhada de outras provas materiais, como início de prova material."
Esse relato fático no pedido de uniformização se harmoniza com aquele produzido na inicial da ação, feito pelo próprio autor ao dispor:
"O autor, conforme dados da CTPS e declaração da empresa (doc. anexos), possui 28 anos, 9 meses e 14 dias pelo regime da CLT, conforme tabela de vínculos abaixo: "USINA SANTA TERESINHA S.A 02/01/1958 28/05/1982; USINA SANTA TERESINHA S.A 12/02/1983 30/06/1987; TOTAL DE TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO PELA CLT 28 ANOS 9 MESES 14 DIAS" (desfigurado ao copiar do sistema, mantida a essência da informação).
De tal contexto, destaco que a empregadora tomou providências formais, aparentemente a tempo e modo, para informar o vínculo empregatício do autor desde 29/09/1979 a 03/1982 (última remuneração) a ser registrado no CNIS. Com efeito, a CTPS do autor somente foi emitida em 26/08/1982, após o registro no CNIS, nela se anotando pelo empregador os vínculos referentes a 02/01/1958 (07 anos de idade) a 28/05/1982 e também de 12/02/1983 a 30/06/1987. Conclui-se, a princípio, que o segundo vínculo empregatício com a mesma empresa estava em curso quando a CTPS foi anotada.
A sequência destas anotações não é informada nos julgados de origem e nem tampouco consta da documentação colacionada, sendo que, se seguidas regularmente e corroboradas ainda que parcialmente por anotações tempestivas no CNIS, validam os vínculos anotados. Se o segundo vínculo foi válido, tanto que sequer impugnado pelo INSS, e segue na ordem natural as folhas da CTPS expedida posteriormente ao primeiro vínculo, mas tendo sido este devidamente anotado na sequência com aquele segundo vínculo, penso ser inadmissível admitir apenas a validade parcial do documento. Na época, ainda que em 1982, o autor e o empregador sequer imaginavam provocar alguma fraude previdenciária para com o INSS.
Todavia, como disse, não há dados que informem sobre essa sequência, a qual é apenas presumida das informações lançadas nas peças processuais, o que de fato deve ser aferido regularmente quando do retorno dos autos à origem. Entendo, outrossim, importante fazer esse registro para consideração da turma de origem quando do novo julgamento.
Porém, além desse ponto, o que justificou meu pedido de vista foi o fato de o nobre relator, para dirimir a controvérsia posta, ter apontado apenas a legislação atual, construída a partir da Lei 8.213/91 (art. 55), enquanto os fatos se deram antes mesmo da vigência da atual Carta Constitucional de 1988. Como é sabido, todos os textos magnos consagraram o princípio da irretroatividade das leis, não me parecendo idôneo sustentar toda a tese apenas na legislação atual e posterior aos fatos.
Com efeito, o raciocínio laborado pelo nobre relator parece-me correto e condizente com a legislação da época, embora não tenha feito qualquer consideração a respeito.
O primeiro ordenamento previdenciário correlacionado à época dos fatos é a Lei Orgânica da Previdência Social (a LOPS), consagrada na Lei 3.807/1960, que assim dispunha:
Art. 16. As anotações feitas nas carteiras de trabalhador autônomo e de Trabalho e Previdência Social dispensam qualquer registro interno de inscrição, valendo, para todos os efeitos, como comprovação de filiação à previdência social, relação de emprego, tempo de serviço e salário-de-contribuição podendo em caso de dúvida, ser exigida pela previdência social a apresentação dos documentos que serviram de base às anotações.
Parágrafo único. É garantido ao segurado o direito de promover essas anotações a qualquer tempo, mediante a simples apresentação dos respectivos documentos. (Incluído pelo Decreto-lei nº 66, de 1966)
Art. 32. [...]
§ 2º A prova de tempo de serviço para os efeitos dêste artigo bem assim a forma de pagamento da indenização correspondente ao tempo em que o segurado não haja contribuído para a previdência social, será feita de acôrdo com o estatuído no regulamento desta lei.
Em 1973, foi instituída a Lei 5.890/73, que assim prescreveu sobre o tema:
Art. 10. [...]
§ 8º Não se admitirá, para cômputo de tempo de serviço, prova exclusivamente testemunhal. As justificações judiciais ou administrativas, para surtirem efeito, deverão partir de um início razoável de prova material.
Por sua vez, o Regulamento disposto com o Decreto 83.080/1979 assim dispôs sobre o assunto:
Art. 57. A prova de tempo de serviço é feita através de documentos que comprovem inequivocamente o exercício de atividade remunerada nos períodos a serem contados, devendo esses documentos serem contemporâneos dos fatos a comprovar e mencionar com precisão as datas de início e término ou duração do trabalho prestado, a natureza dele e a condição em que foi prestado o valor da remuneração recebida ou o das contribuições recolhidas.
§ 1º As anotações na Carteira de Trabalho e Previdência Social relativas a férias, alterações de salário e outras que demonstrem a seqüência do exercício da atividade podem suprir possível falha de registro de admissão ou dispensa.
§ 2º Servem para a prova prevista neste artigo, entre outros, os documentos seguintes:
I - a Carteira de Trabalho e Previdência social, inclusive a emitida pelo INPS na forma do artigo 20, a antiga carteira de férias ou carteira sanitária, a caderneta de matrícula e a caderneta de contribuições dos extintos Institutos de Aposentadoria e Pensões;
II - atestado de tempo de serviço passado por empresa, certificado emitido por sindicato que agrupa trabalhadores avulsos, certidão de contribuições passada por extinto Instituto de Aposentadoria e Pensões e certidão expedida pela Delegacia de Trabalho Marítimo;
III - certidão de inscrição ou matrícula em órgão de fiscalização profissional, acompanhada de documento que prove o exercício de atividade;
IV - contrato social e respectivo distrato, quando for o caso, ata de assembléia geral e registro de firma individual.
§ 3º Na falta de documento contemporâneo pode ser aceita declaração ou atestado de empresa ainda existente ou certificado ou certidão de entidade oficial do qual constem os dados previstos no capítulo deste artigo, desde que extraídos de registros efetivamente existentes e acessíveis à fiscalização da previdência social.
§ 4º Se o documento apresentado pelo segurado não atende ao estabelecido neste artigo, a prova de tempo de serviço pode ser complementada por outros documentos que levam à convicção do fato a comprovar, inclusive mediante justificação administrativa, na forma do Título III da Parte IV.
§ 5º A comprovação do tempo de serviço realizada mediante justificação judicial só produz efeito perante a previdência social quando baseada em razoável início de prova material.
Art. 58. Não é admitida prova exclusivamente testemunhal para efeito de comprovação de tempo de serviço.
Nessa linha de ideias, corroboro integralmente a convicção levada a cabo pelo eminente relator:
"37. Diante da especificidade da legislação previdenciária em relação à trabalhista (ver item 14 e seguintes) e da opção jurisprudencial assentada pelo STJ de não admitir como início de prova material o vínculo de trabalho (e a respectiva anotação em CTPS) reconhecido em ação trabalhista (anotação sempre extemporânea, após o término do contrato) desacopanhado de outros elementos de prova, é forçoso definir como parâmetro para o julgamento do tema 240 que é extemporânea qualquer anotação feita em CTPS após o término do vínculo de trabalho.
38. Na linha autorizada pela IN 77/2015, a assinatura da CTPS feita ainda dentro do contrato de trabalho (emissão posterior de CTPS, por exemplo) mostra-se contemporânea. Nessa hipótese, a eficácia probatória pode se mostrar diversa, a depender da casuística.
39. Primeiro, se não houver defeito formal que lhe comprometa a fidedignidade, na forma da súmula 75 da TNU, ou não houver o apontamento de dúvida fundada pelo INSS, vale como prova plena do vínculo de emprego e do tempo de contribuição. Segundo, se houver defeito formal que lhe comprometa a fidedignidade ou apontamento de dúvida fundada pelo INSS, vale como início de prova material a ser corroborada por prova testemunhal, ou sequer vale como início de prova material, considerada a gravidade dos vícios ou os elementos de provas contrários apresentados pela autarquia ou produzidos durante o processo administrativo ou judicial, exigindo-se outro(s) elementos materiais de prova.
40. Em resumo e para que fique claro e definido, nesses casos de anotação do vínculo de traballho ainda no curso do contrato, a força probatória da CTPS, seja qual for, não pode ser afastada simplesmente por ser extemporânea (questão central do tema 240). Já a assinatura da CTPS feita após o término do vínculo é extemporânea e, só por isso, não tem eficácia, isoladamente, como início de prova material (salvo registro regular no CNIS, que prevalece sobre a CTPS), conforme será demonstrado e definido a seguir."
Todavia, embora concorde com a proposta da tese, penso que ela deve também se referir à legislação pretérita vigente ao tempo dos fatos apreciados, demonstrando que a legislação previdenciária sempre exigiu início de prova material para corroboração do tempo de serviço. O relator propôs:
"[...] 1) fixar a tese do tema 240 nos seguintes termos: (i) é extemporânea a anotação de vínculo empregatício em CTPS realizada voluntariamente pelo empregador após o término do contrato de trabalho; (ii) a anotação de vínculo empregatício realizada de forma voluntária e extemporânea em CTPS, desacompanhada de outros elementos materiais de prova a corroborá-la, não serve como início de prova material para fins previdenciários (art. 55, § 3º, da Lei 8.213/91); 2) restituir os autos à origem para adequação à tese ora firmada."
Ao passo que proponho:
"[...] 1) fixar a tese do tema 240 nos seguintes termos: (i) é extemporânea a anotação de vínculo empregatício em CTPS, realizada voluntariamente pelo empregador, após o término do contrato de trabalho; (ii) essa anotação, desacompanhada de outros elementos materiais de prova a corroborá-la, não serve como início de prova material para fins previdenciários (art. 32, §2º, da Lei 3.807/60 c/c arts. 57, §5º, e 58 do Decreto 83.080/79, art.10, §8º, da Lei 5.890/73, bem como art. 55, § 3º, da Lei 8.213/91); 2) restituir os autos à origem para adequação à tese ora firmada".
Ou, se preferida pela Corte uma redação mais enxuta:
"[...] 1) fixar a tese do tema 240 nos seguintes termos: (i) é extemporânea a anotação de vínculo empregatício em CTPS, realizada voluntariamente pelo empregador, após o término do contrato de trabalho; (ii) essa anotação, desacompanhada de outros elementos materiais de prova a corroborá-la, não serve como início de prova material para fins previdenciários; 2) restituir os autos à origem para adequação à tese ora firmada".
Desse modo, a tese evidencia a compreensão do tema sobre todo o período fático e não só a partir da Lei 8.213/91.
Em convergência parcial com o nobre relator, voto por DAR PROVIMENTO ao incidente.
RELATÓRIO
1. Trata-se de pedido de uniformização de interpretação de lei federal - PUIL - intentado pelo INSS contra acórdão proferido pela 1ª TR da SJPE, que acolheu anotação extemporânea em CTPS como início de prova material para fins de reconhecimento de tempo de contribuição.
2. Relata a inicial, em síntese: a) o juízo de origem e o acórdão reconheceram como início de prova material, para fins de tempo de contribuição, anotação extemporânea em CTPS, desacompanhada de outras provas materiais; b) alegando que a anotação na CTPS foi corroborada por prova testemunhal convincente, reconheceram o período de 10/10/1966 (a partir dos 16 anos da idade) a 28/05/1982, sem concessão de benefício (o autor já estava vinculado, na DER, a RPPS); c) no entanto, o período anotado junto à Usina Santa Terezinha S/A era de 02/01/1958 (07 anos de idade) a 28/05/1982; d) a CTPS somente foi emitida em 26/08/1982; e) no CNIS consta vínculo com a Usina Santa Terezinha S/A de 29/09/1979 a 03/1982 (última remuneração) sem comprovação nos autos; f) na CTPS também consta vínculo de 12/02/1983 a 30/06/1987 com a mesma empresa (não sindicado no PUIL); g) a decisão recorrida está em confronto com jurisprudência de outras TR's, da TNU e do STJ, que não consideram a anotação extemporânea em CTPS, desacompanhada de outras provas materiais, como início de prova material.
3. O PUIL foi inadmitido na origem e admitido pela presidência da TNU, em julgamento de agravo nos próprios autos.
4. Na sessão do dia 06/11/2019, a TNU decidiu conhecer do PUIL e afetá-lo como representativo de controvérsia (Tema 240), a fim de solucionar a seguinte questão jurídica: "Saber se a anotação de vínculo empregatício realizada extemporaneamente em CTPS tem a serventia de início de prova material para fins previdenciários (art. 55, § 3º, da Lei 8.213/91) ou se depende de outros elementos materiais de prova a corroborá-la".
5. O Instituto Brasileiro de Direito Previdenciário (IBDP) foi admitido como amicus curiae, apresentando manifestação escrita (evento 29) com a seguinte conclusão:
a) Pelo não seguimento do Pedido de Uniformização de interpretação de Lei Federal interposto pelo INSS, ante a inexistência de similitude fática entre o caso concreto e os paradigmas invocados, nos termos da fundamentação retro;
b) Ademais, quanto ao mérito, opina também pela negativa de seguimento, uma vez que o acórdão recorrido, ao reconhecer a anotação da CTPS extemporânea em decorrência de sentença judicial no âmbito trabalhista como início de prova material, corroborada durante o processo por outro documento e por prova testemunhal, está de acordo com a orientação desta Turma Nacional de Uniformização, nos termos do art. 16, §6º, do inc. VI, "a", do Regimento Interno da TNU.
6. No evento 30, declarei o processo apto para julgamento.
VOTO
PEDIDO DE UNIFORMIZAÇÃO DE INTERPRETAÇÃO DE LEI FEDERAL. REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. TEMA 240. DIREITO PREVIDENCIÁRIO. ANOTAÇÃO DE VÍNCULO EMPREGATÍCIO REALIZADA EXTEMPORANEAMENTE EM CTPS. SERVENTIA COMO INÍCIO DE PROVA MATERIAL. IMPOSSIBILIDADE. NECESSIDADE DE OUTROS ELEMENTOS MATERIAIS PARA CORRORÁ-LA. TESE QUE NÃO SE APLICA À ANOTAÇÃO EXTEMPORÂNEA DECORRENTE DE SENTENÇA TRABALHISTA. CONTROVÉRSIA ESPECÍFICA SOBRE APRECIAÇÃO DO STJ. PUIL 293. PUIL PROVIDO.
7. Inicialmente, analiso as alegações do IBDP, que sindicam fase já superada deste PUIL, qual seja, a de conhecimento, quando se afirmou, na decisão de afetação, o preenchimento dos requisitos legais e regimentais, em especial a similitude fática e jurídica entre a decisão recorrida e os paradigmas invocados.
8. Da decisão de afetação destaco (destaques constantes do original):
"Inicialmente, presentes os requisitos de admissibilidade típicos à espécie, notadamente o cotejo analítico e a similitude fático-jurídica entre o acórdão recorrido e o aresto apontado como paradigma, conheço do incidente de uniformização, na mesma linha, aliás, do entendimento exposto pelo Exmo. Ministro Presidente desta TNU.
Com efeito, enquanto o acórdão recorrido entendeu que a anotação extemporânea em CTPS teria presunção iuris tantum de veracidade e poderia ser corroborada por prova testemunhal, os acórdãos paradigmas perfilham orientação no sentido de que a anotação extemporânea em CTPS não se presta, por si só, como início de prova material, devendo ser complementada por prova documental e testemunhal.
Para bem ilustrar o dissídio pretoriano, confira-se o teor do acórdão vergastado:
"De início, vale registrar que o decisum ora recorrido trata-se de nova sentença, uma vez que a primeira sentença foi anulada por esta Turma Recursal para fins de realização de audiência que apurasse os períodos de 02/01/1958 a 28/05/1982 anotados extemporaneamente na CTPS do autor, um dos pontos alegados no primeiro recurso inominado do INSS (vide anexo 20).
Pois bem.
Em relação à alegação de que o vínculo teve anotação extemporânea, tenho que, na espécie, o conjunto probatório coligido ao feito revela-se hábil à comprovação do labor exercido pelo autorno período de 02/01/1958 a 28/05/1982 (anexo 10, pág. 02).
A anotação constante de sua CTPS (anexo 16, pág. 03 e 04), conquanto extemporânea, goza de presunção juris tantum de veracidade, de modo que infirmá-la pressupõe prova robusta em contrário, o que, no caso dos autos, não ocorreu. Precedentes REsp 310.264/SP, Rel. Min. FernandoGonçalves, 6ª Turma, DJ 18.02.2002, p. 530; AC 2004.38.03.000757-8/MG, Rel. DesembargadoraFederal Neuza Maria Alves Da Silva, Segunda Turma,e-DJF1 p.33 de 17/07/2008. No mesmosentido, entendimento esposado pela TNU, PEDILEF 200672950156781.
Ademais, com o fim de obter maiores esclarecimentos, foi designada audiência de instrução e julgamento, em que se verificou a veracidade das afirmações do demandante e de sua testemunha, cujos depoimentos foram firmes e coerentes, conforme bem pontuado pelo douto julgador.
Assim, ressalvadas as situações circunstanciais, há de se prestigiar o magistrado que conheceu diretamente da prova, principalmente seu contato com as partes, em audiência, ao lado do cotejo com a prova documental.
Dessa forma, reconhecer os períodos de 02/01/1958 a 28/05/1982 como de efetiva atividade laboral é medida que se impõe."
Dos arestos paradigmas indigitados pelo recorrente, colho, por todos, o seguinte julgado da Turma Recursal do Mato Grosso, que bem ilustra a divergência jurisprudencial:
"PREVIDENCIÁRIO. AVERBAÇÃO DE TEMPO DE SERVIÇO. CTPS. ANOTAÇÃO EXTEMPORÂNEA. NECESSIDADE DE OUTRAS PROVAS MATERIAIS . APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. FALTA DE IMPLEMENTAÇÃO DO PEDÁGIO. IMPOSSIBILIDADE. 1. O Autor pleiteou o reconhecimento do tempo de serviço trabalhado desde setembro de 1966 a março de 1992. A CPTS do Autor, juntada em seu original nos autos, foi expedida em agosto de 1976, mas sofreu anotação extemporânea dos vínculos trabalhistas ocorridos a partir de 1966. Assim, o período registrado anteriormente à expedição da Carteira de Trabalho necessitou ser reforçado por outras provas materiais. Assim, por causa disso, o Autor anexou cópia do Livro Geral da empresa para a qual trabalhou, demonstrando registros do contrato de trabalho apenas a partir de fevereiro de 1972, de modo que apenas desse tempo em diante foi-lhe reconhecido o direito de averbação. O período anterior a 1972, por ausência de prova material e por anotação intempestiva na CTPS não pôde ser reconhecido. (...)" (Processo 2007.36.00.703132-1, Rel. Juiz Federal JOSÉ PIRES DA CUNHA).
No mais, havendo multiplicidade de recursos com fundamento em idêntica questão de direito, proponho a este egrégio colegiado a afetação do tema para ser definido sob o rito dos pedidos de uniformização representativos de controvérsia (art. 16 do RITNU), tendo em conta, inclusive, a evidente relevância da discussão travada nos presentes autos. E, nesse compasso, delimito a questão a ser submetida a julgamento: "Saber se a anotação de vínculo empregatício realizada extemporaneamente em CTPS tem a serventia de início de prova material para fins previdenciários (art. 55, § 3º, da Lei 8.213/91) ou se depende de outros elementos materiais de prova a corroborála".
Esse o quadro, com base no art. 8º, III, do Regimento Interno desta Turma Nacional de Uniformização, voto por CONHECER do presente incidente de uniformização e afetá-lo como tema representativo de controvérsia, adotando-se, por conseguinte, as providências previstas nos §§ 5º e 6º do mesmo Regimento.
9. Eis uma síntese de manifestação do IBDP:
a) os vínculos controversos de 02/01/1958 a 28/05/1982 e de 12/02/1983 a 30/06/1987 foram anotados na CTPS em decorrência de reclamatória trabalhista;
b) além da CTPS, foi juntada declaração da empresa comprobatória do trabalho;
c) a íntegra da reclamatória trabalhista não foi juntada sob o argumento comprovado nos autos de uma enchente no município;
d) foi realizada audiência com oitiva de testemunhas, que confimou a veracidade do vínculo de 1958 a 1982;
e) para análise da questão controversa é necessário, primeiro, identificar a razão pela qual houve a anotação extemporânea do vínculo de emprego na CTPS do segurado, ou seja, se em decorrência de processo judicial que tramitou perante a Justiça do Trabalho, ou se em decorrência de um ato do próprio empregador em proceder à anotação extemporânea;
f) isso porque, no caso selecionado, a anotação extemporânea decorreu de sentença trabalhista e, além disso, o segurado juntou declaração da empresa. Assim, as circunstâncias fáticas do caso são as seguintes: (i) vínculo anotado extemporaneamente na CTPS em virtude de uma reclamatória trabalhista; (ii) pedido amparado por outra prova material: declaração da empregadora; (iii) produção de prova testemunhal perante o Juízo de origem, para fins de comprovação do vínculo;
g) em casos como esse, a jurisprudência (STJ e TNU) é pacífica no sentido de que a anotação extemporânea serve como início de prova material;
h) já os três paradigmas invocados pelo INSS tratam de casos em que a anotação extemporânea do vínculo se deu por ato do empregador, e não em decorrência de uma reclamatória trabalhista, como ocorreu no caso concreto. Assim, em se tratando de vínculos de emprego anotados extemporaneamente na CTPS que não sejam decorrentes de uma reclamatória trabalhista, tem-se premissas fáticas diversas, que ensejam um tratamento jurídico diverso;
i) em casos como este (anotação extemporânea por ato do empregador), a exigência feita pela jurisprudência de fato é a de que a parte interessada apresente outros meios de prova material, o que decorre justamente da ausência de uma decisão proferida no âmbito da Justiça do Trabalho, que garante uma maior carga probante à anotação extemporânea do vínculo em tais casos;
j) assim, não se vislumbra divergência jurisprudencial a ser uniformizada, mas sim, casos pautados em premissas fáticas diferentes, que têm sido tratados de forma segura pelos tribunais, inclusive a TNU: (i) sendo a anotação extemporânea decorrente de sentença trabalhista, serve como início de prova material; (ii) sendo a anotação extemporânea não decorrente de senteneça trabalhista, não serve de forma autônoma como início de prova material, sendo necessária a juntada de outros documentos.
10. Os pedidos de não seguimento do IBDP não podem ser acolhidos. Primeiro, porque a admissibilidade do PUIL já foi devidamente analisada e acolhida em decisão unânime deste colegiado, estando preclusa. Segundo, porque, salvo o registro feito na inicial, não consta em qualquer outra peça dos autos, em especial nas duas sentenças e acórdãos, uma menção sequer à existência de ação trabalhista ou declaração da empresa. Assim, a controvérsia posta em julgamento é compatível com o julgado recorrido. Por fim, é certo que ao longo do julgamento serão feitas as devidas distinções veiculadas pelo IBDP, para fins de fixação de tese e de sua aplicação ao caso concreto.
11. DA NÃO APLICAÇÃO AO CASO DA SÚMULA 75 DA TNU
12. De início, é importante afastar da discussão dos autos qualquer possibilidade de aplicação da súmula 75 da TNU, assim vazada: A Carteira de Trabalho e Previdência Social (CTPS) em relação à qual não se aponta defeito formal que lhe comprometa a fidedignidade goza de presunção relativa de veracidade, formando prova suficiente de tempo de serviço para fins previdenciários, ainda que a anotação de vínculo de emprego não conste no Cadastro Nacional de Informações Sociais (CNIS).
13. Isso porque o caso envolve anotação de vínculo empregatício realizada extemporaneamente em CTPS (período de 1958 a 05/1982, com CTPS emitida em 26/08/1982), que, por si só, constituiu defeito formal que lhe compromete a fidedignidade para atuar como prova plena e suficente do tempo de contribuição anotado, como apregoa a súmula 75. A discussão posta, na verdade, é se essa anotação extemporânea constituiu, sozinha, início de prova material (sujeito a confirmação por prova testemunhal), ou se depende de outros elementos materiais a corroborá-la.
14. É importante frisar que as demais súmulas que tratam de presunção de veracidade das anotações em CTPS (12 do TST e 225 do STF) devem ser vistas, no universo previdenciário, com reservas, uma vez que, após editadas, a legislação previdenciária sofreu inúmeras alterações, (i) exigindo início de prova material, (ii) mudando a centralidade da comprovação do tempo de contribuçilão da CTPS para o CNIS e (iii) demandando a apresentação de documentos em caso de lançamento de registros extemporâneos neste último cadastro. Nesse sentido:
Art. 55. O tempo de serviço será comprovado na forma estabelecida no Regulamento, compreendendo, além do correspondente às atividades de qualquer das categorias de segurados de que trata o art. 11 desta Lei, mesmo que anterior à perda da qualidade de segurado:
§ 3º A comprovação do tempo de serviço para os fins desta Lei, inclusive mediante justificativa administrativa ou judicial, observado o disposto no art. 108 desta Lei, só produzirá efeito quando for baseada em início de prova material contemporânea dos fatos, não admitida a prova exclusivamente testemunhal, exceto na ocorrência de motivo de força maior ou caso fortuito, na forma prevista no regulamento. (Redação dada pela Lei nº 13.846, de 2019)
Art. 29-A. O INSS utilizará as informações constantes no Cadastro Nacional de Informações Sociais – CNIS sobre os vínculos e as remunerações dos segurados, para fins de cálculo do salário-de-benefício, comprovação de filiação ao Regime Geral de Previdência Social, tempo de contribuição e relação de emprego. (Redação dada pela Lei Complementar nº 128, de 2008)
(...)
§ 2o O segurado poderá solicitar, a qualquer momento, a inclusão, exclusão ou retificação de informações constantes do CNIS, com a apresentação de documentos comprobatórios dos dados divergentes, conforme critérios definidos pelo INSS. (Redação dada pela Lei Complementar nº 128, de 2008)
§ 3o A aceitação de informações relativas a vínculos e remunerações inseridas extemporaneamente no CNIS, inclusive retificações de informações anteriormente inseridas, fica condicionada à comprovação dos dados ou das divergências apontadas, conforme critérios definidos em regulamento. (Incluído pela Lei Complementar nº 128, de 2008)
§ 4o Considera-se extemporânea a inserção de dados decorrentes de documento inicial ou de retificação de dados anteriormente informados, quando o documento ou a retificação, ou a informação retificadora, forem apresentados após os prazos estabelecidos em regulamento. (Incluído pela Lei Complementar nº 128, de 2008)
§ 5o Havendo dúvida sobre a regularidade do vínculo incluído no CNIS e inexistência de informações sobre remunerações e contribuições, o INSS exigirá a apresentação dos documentos que serviram de base à anotação, sob pena de exclusão do período. (Incluído pela Lei Complementar nº 128, de 2008)
15. Como se vê, presunções trabalhistas não podem ser transportadas acriticamente para a esfera previdenciária, uma vez que a lei - e não mero ato normativo infralegal: decreto, instrução normativa ou portaria - estabelece requisitos diferentes para a comprovação de relação de emprego (matéria trabalhista) e tempo de contribuição (matéria previdenciária).
16. No caso, como visto dos trechos legais acima grifados, para fins previdenciários exige-se, sempre, início de prova material, além de contemporaneidade das anotações do CNIS, que, como se sabe, há muito (pelo menos desde 2008, com a edição do Decreto 6.722/2008), passou a ser a principal ferramenta e forma de comprovação de fatos e de efetivação de direitos previdenciários, em especial relação de emprego e tempo de contribuição, vinculando o próprio INSS.
17. A regulamentação do art. 29-A da Lei 8.213/91 pelo Decreto 3.048/91 comprova essa prevalência do CNIS sobre outros documentos, inclusive, a CTPS, que passa a ser documento secundário, utilizado quando ausente ou irregular a informação no CNIS. Nesse sentido:
Art. 19. Os dados constantes do Cadastro Nacional de Informações Sociais - CNIS relativos a vínculos, remunerações e contribuições valem como prova de filiação à previdência social, tempo de contribuição e salários-de-contribuição. (Redação dada pelo Decreto nº 6.722, de 2008).
§ 1º O segurado poderá solicitar, a qualquer tempo, a inclusão, a exclusão, a ratificação ou a retificação de suas informações constantes do CNIS, com a apresentação de documentos comprobatórios dos dados divergentes, conforme critérios definidos pelo INSS, independentemente de requerimento de benefício, exceto na hipótese prevista no art. 142, observado o disposto nos art. 19-B e art. 19-C. (Redação dada pelo Decreto nº 10.410, de 2020).
§ 2º Informações inseridas extemporaneamente no CNIS, independentemente de serem inéditas ou retificadoras de dados anteriormente informados, somente serão aceitas se corroboradas por documentos que comprovem a sua regularidade, na forma prevista no art. 19-B. (Redação dada pelo Decreto nº 10.410, de 2020).
[...]
§ 7o Para os fins de que trata os §§ 2o a 6o, o INSS e a DATAPREV adotarão as providências necessárias para que as informações constantes do CNIS sujeitas à comprovação sejam identificadas e destacadas dos demais registros. (Incluído pelo Decreto nº 6.722, de 2008).
[...]
§ 12. Os recolhimentos efetuados na época apropriada constantes do CNIS serão reconhecidos automaticamente, observados a contribuição mínima mensal e o disposto no art. 19-E, dispensada a comprovação do exercício da atividade. (Incluído pelo Decreto nº 10.410, de 2020)
Art. 19-B. Na hipótese de não constarem do CNIS as informações sobre atividade, vínculo, remunerações ou contribuições, ou de haver dúvida sobre a regularidade das informações existentes, o período somente será confirmado por meio da apresentação de documentos contemporâneos dos fatos a serem comprovados, com menção às datas de início e de término e, quando se tratar de trabalhador avulso, à duração do trabalho e à condição em que tiver sido prestada a atividade. (Redação dada pelo Decreto nº 10.410, de 2020).
§ 1º Além dos dados constantes do CNIS a que se refere o art. 19, observada a forma de filiação do trabalhador ao RGPS, os seguintes documentos serão considerados para fins de comprovação do tempo de contribuição de que trata o caput, desde que contemporâneos aos fatos a serem comprovados: (Incluído pelo Decreto nº 10.410, de 2020)
I - carteira profissional ou Carteira de Trabalho e Previdência Social; (Incluído pelo Decreto nº 10.410, de 2020)
II - contrato individual de trabalho;
[...]
18. Assim, é certo que o registro de vínculo no CNIS, contemporâneo e sem irregularidade, faz prova do tempo de contribuição, independente de CTPS. Ausente, irregular ou extemporâneo o vínculo no CNIS, a CTPS é um dos principais documetos para reconhecimento do vínculo, retificação do CNIS e concessão de benefício.
19. Em resumo, a princípio, diante da prevalência do CNIS sobre a CTPS, há de se estender à segunda (CTPS, como regra, as mesmas exigências legais de regularidade e contemporaneidade do primeiro (CNIS), para fins de eficácia dos fatos previdenciários neles lançados, o que confirma a hipótese de não se aplicar a súmula 75 ao caso em discussão.
20. DO INÍCIO DE PROVA MATERIAL: CONCEITO, IMPORTÂNCIA, CONSTITUCIONALIDADE, AMPLIAÇÃO E CONTEMPORANEIDADE
21. O início de prova material de tempo de contribuição, de acordo com conceito construído pela doutrina e jurisprudência, é aquele feito mediante documentos que sinalizem de forma idônea o exercício da atividade nos períodos a serem contados, devendo guardar alguma contemporaneidade com os fatos a comprovar, indicando, ainda, o período e a função exercida pelo trabalhador.
22. Quanto aos dispositivos legais que tratam do tema no âmbito do RGPS e balizam e auxiliam a construção de um conceito legal e jurisprudencial de início de prova material e de sua eficácia no processo previdenciário de reconhecimento de direitos, já foram transcritos acima e não serão repetidos (art. 55, §3º e art. 29-A, ambos da Lei 8.213/91 e disposições do Decreto 3.048/99).
23. Como se vê, é antiga e latente a preocupação do legislador com o estabelecimento de mecanismos que tragam credibilidade e maior segurança jurídica ao reconhecimento do tempo de contribuição no âmbito do RGPS, que é requisito de acesso praticamente indispensável para todo e qualquer benefício previdenciário. Assim, com o propósito de proteger a própria higidez do sistema previdenciário, o início de prova material foi o principal mecanismo de salvaguarda criado pelo legislador para evitar reconhecimentos indevidos de tempo de contribuição.
24. Na doutrina especializada, até autores com forte viés protetivo do segurado defendem o requisito do início de prova material. Nesse sentido:
"A exigência de prova material para a comprovação de tempo de serviço é fundada na necessidade de que o reconhecimento desse fato de singular relevância para o direito previdenciário se opere com segurança. Essa é a razão pela qual a prova exclusivamente testemunhal, nos termos do art. 55, §3º, da Lei 8.213/91, em regra, não é admitida para demonstração de tempo de serviço.
A necessidade de prova material é justificada pela circunstância de que a entidade previdenciária não reúne condições de apresentar testemunhas para infirmar as alegações dos segurados e, em relação a fatos distantes no tempo, tampouco conta com estrutura hábil para realizar diligências que contribuam para avaliação acerca da procedência dos fatos alegados pelos particulares.
A prova testemunhal guarda sensível nota de precariedade. Enquanto a prova material é vestígio de um fato, ação humana ou acontecimento - e, sendo vestígio, constitui um dado ou indício contemporâneo ao fato que se pretende demonstrar - a prova testemuhal é inapta para fixação de datas remotas. Se a prova material emana da ocorrência própria do fato que se pretende demonstrar (ou de um fato próximo a ele por meio de um juízo de presunção) e não tem vínculo com qualuer ação judicial, a prova testemunhal, de outra sorte, é produzida apenas proque há um litígico, isto é, porque existe interesse de uma das partes em influenciar a decisão judicial.
[...]
A precisão laboratorial de datas, garantidas por idosas testemunhas em ações previdenciárias, que muitas vezes à sede do juízo chegam juntamente com o autor, já não impressiona e nem sensibiliza, minando em alguns casos o fundamento da credibilidade da prova testemunhal, qual seja, a presunção de que as pessoas afirmam a verdade.
[...]
De todo modo, na delicada tarefa de apreciação de prova em direito previdenciário, a exigência de prova material para comprovação de tempo de atividade abrangida pelo RGPS é, em princípio, justificada na segurança da resposta (administrativa ou judicial) à pretensão de gozo de benefício previdenciário (SAVARIS, José Antônio. Direito processual previdenciário. - e ed. rev. atual. ampl. - Curibita: Alteridade Editora, 2016. p. 299-300).
25. Na jurisprudência, por mais de uma vez, o STF afirmou a constitucionalidade do início de prova material como exceção à regra da liberdade probatória. Nesse sentido: RE 226.772/SP - Rel. Ministro Marco Aurélio - DJU 06.10.2000 e RE 236.759/SP, DJU 27.04.2001. De maior destaque foi o julgamento pelo plenário da ADI nº 2.555, no qual foi afirmada a constitucionalidade da inclusão na Lei 7.986/89 da exigência de início de prova material para a concessão da pensão especial do seringueiro, prevista no art. 54 do ADCT:
AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. ART. 54 DO ADCT. PENSÃO MENSAL VITALÍCIA AOS SERINGUEIROS RECRUTADOS OU QUE COLABORARAM NOS ESFORÇOS DA SEGUNDA GUERRA MUNDIAL. ART. 21 DA LEI Nº 9.711, DE 20.11.98, QUE MODIFICOU A REDAÇÃO DO ART. 3º DA LEI Nº 7.986, DE 20.11.89. EXIGÊNCIA, PARA A CONCESSÃO DO BENEFÍCIO, DE INÍCIO DE PROVA MATERIAL E VEDAÇÃO AO USO DA PROVA EXCLUSIVAMENTE TESTEMUNHAL. A vedação à utilização da prova exclusivamente testemunhal e a exigência do início de prova material para o reconhecimento judicial da situação descrita no art. 54 do ADCT e no art. 1º da Lei nº 7.986/89 não vulneram os incisos XXXV, XXXVI e LVI do art. 5º da CF. O maior relevo conferido pelo legislador ordinário ao princípio da segurança jurídica visa a um maior rigor na verificação da situação exigida para o recebimento do benefício. Precedentes da Segunda Turma do STF: REs nº 226.588, 238.446, 226.772, 236.759 e 238.444, todos de relatoria do eminente Ministro Marco Aurélio. Descabida a alegação de ofensa a direito adquirido. O art. 21 da Lei 9 .711/98 alterou o regime jurídico probatório no processo de concessão do benefício citado, sendo pacífico o entendimento fixado por esta Corte de que não há direito adquirido a regime jurídico. Ação direta cujo pedido se julga improcedente. (ADI 2555, Relator(a): ELLEN GRACIE, Tribunal Pleno, julgado em 03/04/2003, DJ 02-05-2003 PP-00029 EMENT VOL-02108-02 PP-00241)
26. E note-se que o legislador vem prestigiando esse mecanismo de credibilidade e segurança jurídica da prova previdenciária, estendendo a sua aplicabilidade para os casos de união estável e dependência econômica (art. 16, §§5º e 6º, da Lei 8.213/91, introduzidos pela Lei 13.846/2019), e exigindo que o início de prova seja contemporâneo (art. 55, §3º, da Lei 8.213/91, alterado pela Lei 13.846/2019). Nesse sentido:
"Art. 16. [...]
§ 5º As provas de união estável e de dependência econômica exigem início de prova material contemporânea dos fatos, produzido em período não superior a 24 (vinte e quatro) meses anterior à data do óbito ou do recolhimento à prisão do segurado, não admitida a prova exclusivamente testemunhal, exceto na ocorrência de motivo de força maior ou caso fortuito, conforme disposto no regulamento. (Incluído pela Lei nº 13.846, de 2019)
§ 6º Na hipótese da alínea c do inciso V do § 2º do art. 77 desta Lei, a par da exigência do § 5º deste artigo, deverá ser apresentado, ainda, início de prova material que comprove união estável por pelo menos 2 (dois) anos antes do óbito do segurado. (Incluído pela Lei nº 13.846, de 2019)
[...]
Art. 55. O tempo de serviço será comprovado na forma estabelecida no Regulamento, compreendendo, além do correspondente às atividades de qualquer das categorias de segurados de que trata o art. 11 desta Lei, mesmo que anterior à perda da qualidade de segurado:
§ 3º A comprovação do tempo de serviço para os fins desta Lei, inclusive mediante justificativa administrativa ou judicial, observado o disposto no art. 108 desta Lei, só produzirá efeito quando for baseada em início de prova material contemporânea dos fatos, não admitida a prova exclusivamente testemunhal, exceto na ocorrência de motivo de força maior ou caso fortuito, na forma prevista no regulamento. (Redação dada pela Lei nº 13.846, de 2019)
27. A questão da contemporaneidade - agora fixada em lei - do início de prova material foi percebida por esta TNU ainda em 2006, quando editou a súmula 34, nos seguintes termos: "Para fins de comprovação do tempo de labor rural, o início de prova material deve ser contemporáneo à época dos fatos a provar".
28. Infelizmente, sob o manto da antiga redação do §3º do art. 55 da Lei 8.213/91, esse entendimento da TNU, em alguma medida, não foi acolhido pelo STJ, como se vê da súmula 577: "É possível reconhecer o tempo rural anterior ao documento mais antigo apresentado, desde que amparado em convincente prova testemunhal colhida sob o contraditório". Fala-se em "alguma medida" porque a súmula trata de trabalhador rural/segurado especial, cuja prova material envolve, em regra, outros documentos que não a CTPS, que, por se referir a segurado empregado, comprova vínculo de trabalho específico, individualizado e devidamente definido no tempo, não passível de se demonstrar por documentos genéricos que somente apontem profissões, como, por exemplo, a de lavrador.
29. Mesmo assim, espera-se que agora, com a incorporação expressa da contemporaneidade na Lei 8.213/91, o entendimento da súmula 34 da TNU volte a ganhar destaque, relegando-se a flexibilização do iníco de prova material na forma sumulada pelo STJ para os casos anteriores à Lei 13.846/2019.
30. Ponto final da discussão sobre a contemporaneidade refere-se à diferenciação entre prova documental/material e prova documentada/pessoal, esta última uma verdadeira prova pessoal, utilizada para tentar burlar a exigência de prova material. Para a hipótese, o exemplo de maior destaque, inclusive com interesse para a solução do caso concreto, são as declarações de ex-empregadores. Sobre o tema, colhe-se da doutrina especializada:
"Particularmente em relação à prova material, a "afirmação do fato" chega ao magistrado não por um pessoa, mas por uma coisa (um objeto qualquer ou um documento). A prova material se presta, então, a indicar a realização de fatos, a sugerir que ocorreu determinado evento. A prova material não é produzida para solução de um litígio judicial, mas advém de causa própria, como produto de um determinado fato realizado.
(...)
É por essa razão que as declarações de prestação de serviço - firmadas, por exemplo, por ex-empregadores ou por dirigentes de sindicatos de trabalhdores rurais - não guardam a natureza de prova material, mas de prova pessoal. Manifestando-se por meio de documentos, as declarações destinadas a fazer fé de determinado fato, embora sejam classificadas como prova documental, não constituem prova material, mas pessoal.
(...)
A prova material, ainda que ofereça apenas um via para presunções, goza de alta credibilidade por sua natureza casual e por sua contemporaneidade e na justa medida em que se percebe que, de fato, originou-se espontaneamente (tão espontaneamente quanto um vestígio), de uma só vez ou aos poucos, mas sempre contemporaneamente (tão contemporaneamente quanto um vestígio) ao fato que afirma, ao fato cuja existência sugere". (SAVARIS, José Antônio. Direito processual previdenciário. - e ed. rev. atual. ampl. - Curibita: Alteridade Editora, 2016. p. 307 e 315).
31. Como bem definiu a TNU no tema 199, ainda em 2014: "A declaração extemporânea de ex-empregador não é documento hábil à formação do início de prova material necessário à comprovação de atividade laboral em determinado período." Com esse entendimento, evita-se que verdadeiros depoimentos documentados contemporâneamente sejam tratados como início de prova material.
32. E a exceção feita pelo STJ para a empregada doméstica, autorizando a declaração de ex-empregador como início de prova material, porque casuística e limitada no tempo (período anterior à vigência da Lei 5.859/72), não afasta a correta dicção da tema 199 da TNU, que representa o entendimento amplamente majoritário da jurisprudência nacional sobre o tema. Nesse sentido:
PREVIDENCIÁRIO. TRABALHADOR URBANO. EMPREGADA DOMÉSTICA. DECLARAÇÃO NÃO-CONTEMPORÂNEA DE EX-EMPREGADOR. AUSÊNCIA DE INÍCIO DE PROVA MATERIAL. IMPOSSIBILIDADE DE REEXAME DO CONJUNTO FÁTICO-PROBATÓRIO. INCIDÊNCIA DA SÚMULA 7/STJ. AGRAVO IMPROVIDO.
1. A matéria foi devidamente enfrentada na decisão proferida pelo eminente relator, o qual entendeu que a declaração não-contemporânea de ex-empregador não é válida como início de prova material para fins de concessão de benefício previdenciário.
2. Esse tema não comporta maiores discussões no âmbito da Terceira Seção deste Superior Tribunal, uma vez que existe entendimento pacífico de que declaração extemporânea não serve como prova idônea de tempo de serviço perante a Previdência Social.
3. A inversão do julgado, como pretende a recorrente, não está adstrita à interpretação da legislação federal, mas, sim, ao exame de matéria fático-probatória, cuja análise é afeta às instâncias ordinárias. Incidência, à espécie, da Súmula 7/STJ.
4. Agravo regimental improvido. (AgRg no Ag 592.892/SP, Rel. Ministra MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA, SEXTA TURMA, julgado em 07/02/2008, DJ 25/02/2008, p. 370)
PREVIDENCIÁRIO. PROCESSO CIVIL. APOSENTADORIA POR IDADE. RECONHECIMENTO DE TEMPO DE SERVIÇO. DOMÉSTICA. COMPROVAÇÃO. CONTRIBUIÇÕES PREVIDENCIÁRIAS. NECESSIDADE SOMENTE APÓS A EDIÇÃO DA LEI N. 5.859/72.
I - Na origem, trata-se de ação na qual a autora pretende ver reconhecido o tempo de serviço prestado como doméstica de 1957 a 1972.
II - A atividade do empregado doméstico foi regulamentada com a edição da Lei n. 5.859, de 11.12.1972. Dessa forma, a comprovação de trabalho doméstico em período anterior à edição da Lei n. 5.859/79, no qual não se exigia o registro em carteira, pode ser feita por meio de declaração do ex-empregador.
III - O STJ também tem-se posicionado no sentido de que o reconhecimento de tempo de serviço de empregada doméstica, para fins previdenciários, depende de comprovação por início de prova material, não sendo admitida prova exclusivamente testemunhal. O início de prova material é aquele feito mediante documentos contemporâneos ao exercício da atividade.
IV - Como se vê, a comprovação do exercício de atividade para fins previdenciários pressupõe o que a norma denomina de início de prova material. Não é a demonstração exaustiva, mas um ponto de partida que propicie ao julgador meios de convencimento. V - No caso dos autos, conforme se observa do acórdão recorrido, a recorrente juntou documentos suficientes como início de prova material do exercício da atividade doméstica. É o que se extrai dos excertos de fls. 116-118.
VI - Quanto à exigência de contribuições, "o pedido de declaração de tempo de serviço, para comprovação de trabalho doméstico, cuja atividade tenha ocorrido antes da regulamentação desta profissão e da obrigatoriedade de sua filiação à Previdência Social, resulta, excepcionalmente, na dispensa à exigência de contribuições previdenciárias". (REsp 828.573/RS, DJ de 9.5.2006).
VII - Agravo interno improvido. (AgInt no AREsp 903.354/SP, Rel. Ministro FRANCISCO FALCÃO, SEGUNDA TURMA, julgado em 20/02/2018, DJe 26/02/2018)
PREVIDENCIÁRIO. EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA NO RECURSO ESPECIAL.
EMPREGADA DOMÉSTICA. INÍCIO DE PROVA MATERIAL. DISSÍDIO DEMONSTRADO. COMPROVAÇÃO DE TEMPO MEDIANTE DECLARAÇÃO EXTEMPORÂNEA DE EX-EMPREGADOR. AUSÊNCIA DE REGULAMENTAÇÃO DA PROFISSÃO. INEXISTÊNCIA DE PREVISÃO LEGAL DE REGISTRO DE FILIAÇÃO OBRIGATÓRIA AO RGPS E DE REGISTRO NA CTPS. ADOÇÃO DE CRITÉRIOS FAVORECEDORES DE UMA JURISDIÇÃO SOCIALMENTE JUSTA. MITIGAÇÃO DA EXIGÊNCIA.
I - A profissão de empregada doméstica somente foi regulamentada por meio da edição da Lei n. 5.859, de 11/12/72, o que dificulta, deveras, a comprovação do trabalho doméstico no período anterior à sua vigência, pois, à época, não se exigia o registro na respectiva carteira de trabalho.
II - A matéria vertente - possibilidade ou não de comprovação de tempo de serviço pela empregada doméstica mediante declaração extemporânea de ex-empregador - não se encontra definitivamente pacificada por qualquer das Seções deste Sodalício Tribunal, não obstante a afirmação, constante em precedentes, no sentido de inexistência de controvérsia.
III - É dominante o entendimento quanto à inexigibilidade da prova documental relativa ao período anterior à regulamentação da profissão e, consequentemente, pela possibilidade de que a declaração de ex-empregador, ainda que não contemporânea do tempo de serviço alegado, seja considerada para fins de início de prova material.
IV - Não se pretende dificultar, ou até mesmo impossibilitar, a comprovação do trabalho doméstico no período que antecede a regulamentação da profissão, mas sim adotar critérios favorecedores de uma jurisdição socialmente justa, admitindo mais amplamente documentação comprobatória da atividade desenvolvida, mesmo que sob a categoria de documento extemporâneo do serviço prestado.
V - As declarações de ex-empregadores, para fins de comprovação do exercício de atividade de empregada doméstica no período anterior à vigência da Lei n. 5.859, de 11/12/72, devem ser consideradas para fins de início de prova material, ainda que ausente a contemporaneidade do documento, desde que corroboradas por robusta prova testemunhal. VI - Embargos de Divergência acolhidos. (EREsp 1165729/PR, Rel. Ministro NEFI CORDEIRO, TERCEIRA SEÇÃO, julgado em 25/02/2015, DJe 05/03/2015)
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE SERVIÇO. DECLARAÇÃO DE EX-EMPREGADOR. CONTEMPORANEIDADE. NECESSIDADE. SÚMULA 568/STJ. MODIFICAÇÃO DO ACÓRDÃO. REEXAME DE PROVAS. SÚMULA 7/STJ.
1. A jurisprudência desta Corte é firme no sentido de que as declarações prestadas pelos ex-empregadores somente podem ser consideradas como início de prova material quando contemporâneas à época dos fatos alegados. Na hipótese dos autos, contudo, o Tribunal de origem deixou consignado que o documento é extemporâneo à época dos fatos.
2. O Tribunal a quo decidiu de acordo com jurisprudência desta Corte, de modo que se aplica à espécie o enunciado da Súmula 568/STJ.
3. A inversão do julgado, nos moldes propostos pelo recorrente, não está adstrita à interpretação da legislação federal, mas, sim, ao exame de matéria fático-probatória, cuja análise é afetada às instâncias ordinárias. Incidência, à espécie, da Súmula 7/STJ. Agravo interno improvido. (AgInt no AREsp 879.831/SP, Rel. Ministro HUMBERTO MARTINS, SEGUNDA TURMA, julgado em 17/05/2016, DJe 25/05/2016)
33. Esta própria TNU já teve oportunidade de aplicar o entendimento jurisprudencial do STJ, afirmando: "as declarações assinadas por ex-empregadores somente devem ser consideradas como início de prova material para fins de comprovação do exercício de atividade de empregada doméstica, ainda que ausente a contemporaneidade do documento, quando corroboradas por robusta prova testemunhal e se refiram a período anterior à vigência da Lei nº 5.859, de 11/12/1972 (PUIL 0007223-71.2012.4.03.6302/SP, julgado em 25/05/2017).
34. CONCEITO DE ANOTAÇÃO EXTEMPORÂNEA DE VÍNCULO DE TRABALHO PARA O TEMA EM JULGAMENTO
35. Segundo a CLT, a CTPS deve ser assinada no prazo de 5 dias úteis após a admissão do trabalhador, podendo, no entanto, ser feito o registro a qualquer momento, em especial quando da rescição ou por atuação da fiscalização do trabalho. Nesse sentido:
Art. 29. O empregador terá o prazo de 5 (cinco) dias úteis para anotar na CTPS, em relação aos trabalhadores que admitir, a data de admissão, a remuneração e as condições especiais, se houver, facultada a adoção de sistema manual, mecânico ou eletrônico, conforme instruções a serem expedidas pelo Ministério da Economia. (Redação dada pela Lei nº 13.874, de 2019)
§ 2º - As anotações na Carteira de Trabalho e Previdência Social serão feitas: (Redação dada pela Lei nº 7.855, de 24.10.1989)
a) na data-base; (Redação dada pela Lei nº 7.855, de 24.10.1989)
b) a qualquer tempo, por solicitação do trabalhador; (Redação dada pela Lei nº 7.855, de 24.10.1989)
c) no caso de rescisão contratual; ou (Redação dada pela Lei nº 7.855, de 24.10.1989)
d) necessidade de comprovação perante a Previdência Social. (Redação dada pela Lei nº 7.855, de 24.10.1989)
§ 3º - A falta de cumprimento pelo empregador do disposto neste artigo acarretará a lavratura do auto de infração, pelo Fiscal do Trabalho, que deverá, de ofício, comunicar a falta de anotação ao órgão competente, para o fim de instaurar o processo de anotação. (Redação dada pela Lei nº 7.855, de 24.10.1989)
36. Sobre o tema, diz o art. 60 da IN 77/2015:
Art. 60. As anotações em CP e/ou CTPS relativas a férias, alterações de salários e outras que demonstrem a sequência do exercício da atividade podem suprir possível falha de registro de admissão ou ou dispensa.
§ 1º No caso de omissão, emenda ou rasura em registro quanto ao início ou ao fim do período de trabalho, as anotações contemporâneas serão consideradas para o reconhecimento da data a que se referir, servindo como parâmetro, os registros de admissão e de saída nos empregos anteriores ou posteriores.
§ 2º Para os casos em que a data da emissão da CP ou da CTPS for anterior à data fim do contrato de trabalho, o vínculo relativo a este período poderá ser computado, sem necessidade de quaisquer providências, salvo existência de dúvida fundada.
§ 3º No caso de contrato de trabalho, cuja data fim seja anterior à data da emissão da CP ou da CTPS, deverá ser exigida prévia comprovação da relação de trabalho, por ficha de registro de empregado, registros contábeis da empresa, admitindo-se outros documentos que levem à convicção do fato a comprovar.
37. Diante da especificidade da legislação previdenciária em relação à trabalhista (ver item 14 e seguintes) e da opção jurisprudencial assentada pelo STJ de não admitir como início de prova material o vínculo de trabalho (e a respectiva anotação em CTPS) reconhecido em ação trabalhista (anotação sempre extemporânea, após o término do contrato) desacopanhado de outros elementos de prova, é forçoso definir como parâmetro para o julgamento do tema 240 que é extemporânea qualquer anotação feita em CTPS após o término do vínculo de trabalho.
38. Na linha autorizada pela IN 77/2015, a assinatura da CTPS feita ainda dentro do contrato de trabalho (emissão posterior de CTPS, por exemplo) mostra-se contemporânea. Nessa hipótese, a eficácia probatória pode se mostrar diversa, a depender da casuística.
39. Primeiro, se não houver defeito formal que lhe comprometa a fidedignidade, na forma da súmula 75 da TNU, ou não houver o apontamento de dúvida fundada pelo INSS, vale como prova plena do vínculo de emprego e do tempo de contribuição. Segundo, se houver defeito formal que lhe comprometa a fidedignidade ou apontamento de dúvida fundada pelo INSS, vale como início de prova material a ser corroborada por prova testemunhal, ou sequer vale como início de prova material, considerada a gravidade dos vícios ou os elementos de provas contrários apresentados pela autarquia ou produzidos durante o processo administrativo ou judicial, exigindo-se outro(s) elementos materiais de prova.
40. Em resumo e para que fique claro e definido, nesses casos de anotação do vínculo de traballho ainda no curso do contrato, a força probatória da CTPS, seja qual for, não pode ser afastada simplesmente por ser extemporânea (questão central do tema 240). Já a assinatura da CTPS feita após o término do vínculo é extemporânea e, só por isso, não tem eficácia, isoladamente, como início de prova material (salvo registro regular no CNIS, que prevalece sobre a CTPS), conforme será demonstrado e definido a seguir.
41. DA DEFINIÇÃO DO TEMA
42. Consideradas as impressões colhidas até esse momento, é possível afirmar, na linha do que já defende esse colegiado, que a anotação de vínculo empregatício realizada extemporaneamente em CTPS, conforme definição retro, isoladamente, não constituiu início de prova material na forma exigida pelo §3º do art. 55 da Lei 8.213/91, exigindo outros elementos materias de prova a corraborá-la. Registre-se, desde já, que essa afirmação não se estende à anotação extemporânea fruto de decisão da Justiça do Trabalho, que será enfrentada adiante.
43. Para contextualizar, estamos tratando de situações como a dos autos, em que o vínculo de trabalho somente foi anotado após o seu término, em CTPS também emitida após o fim do contrato de trabalho. Outra situação típica da hipótese controversa é quando a anotação do vínculo na CTPS se faz fora da ordem sucessiva dos registros, ficando à frente de contratos mais recentes.
44. Nesse contexto fático, é forçoso reconhecer que a CTPS, em relação à anotação extemporânea, perdeu a sua força probatória, se assemelhando a uma declaração de ex-empregador, que sabidamente tem força de prova pessoal e não material, como afirmado pela TNU no tema 199 e pelo STJ.
45. Registre-se que a jurisprudência, consolidada na súmula 75 da TNU, sempre emprestou força probatória relativa à CTPS quando despida de vícios formais e com registros contemporâneos e concatenados, inclusive de dados secundários como férias e salários. Fora desse contexto, é imperioso reconhecer que a CTPS é um mero documento particular, prenchido sem participação de agentes públicos, que está sujeito à fraudes e manipulações graciosas para gerar efeitos previdenciários indevidos.
46. Veja-se que a própria Lei 8.213/91, no art. 29-A, ao regulamentar o CNIS como intrumento de reconhecimento de direitos previdenciários, colocando-o, inclusive, em ordem hierarquia prioritária à CTPS, deixou expresso que lançamentos extemporâneos ou com dúvidas sobre sua regularidade somente podem ser validados quando apresentados documentos idôneos para esclarecimento e confirmação. Entendimento diverso não pode ser aplicado à CTPS com lançamento extemporâneo, sob pena de fragilizar a credibilidade e a segurança jurídica do sistema que o legislador reiteradamente vem tentando implantar no âmbito probatório do reconhecimento de direitos previdenciários.
47. Essa TNU, em julgamento de 2015, assim se manifestou sobre o tema:
PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIOS EM ESPÉCIE. APOSENTADORIA POR IDADE. RECONHECIMENTO DE VÍNCULO EMPREGATÍCIO. EXTEMPORANEIDADE DAS INFORMAÇÕES NA CTPS. CONFECÇÃO DA CTPS EM DATA POSTERIOR AO DAS INFORMAÇÕES NELA CONTIDAS. IMPOSSBILIDADE DE SERVIR COMO INÍCIO DE PROVA MATERIAL. ANALOGIA A SÚMULA N° 34 DESTA TNU. PRECEDENTES DO STJ. QUESTÃO DE ORDEM Nº 20. INCIDENTE DE UNIFORMIZAÇÃO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO. (PU 05131205220134058300, relator JUIZ FEDERAL BRUNO LEONARDO CÂMARA CARRÁ, julgado em 18/06/2015, DOU 03/07/2015 PÁGINAS 116/223)
48. Como será visto a seguir, veja-se que o próprio STJ somente acolhe como início de prova material a anotação extemporânea de CTPS decorrente de sentença trabalhista quando, no processo judicial laboral, tenha sido produzida prova capaz de demonstrar o exercício da atividade laborativa. No caso, muito mais cautela e segurança se precisa ter quando a CTPS é assinada extemporaneamente pelo empregador, de forma voluntária e diretamente junto ao empregado. Qual seria, nesse caso, a diferença entre essa anotação extemporânea e voluntária e uma declaração firmada pelo ex-empregador, que a jurisprudência pacificada não acolhe como prova material?
49. ANOTAÇÃO DECORRENTE DE SENTENÇA TRABALHISTA: NÃO ABRANGÊNCIA PELO TEMA 240
50. No que toca à anotação extemporânea decorrente de sentença trabalhista, a solução afirmada acima não pode ser aplicada, uma vez que para o caso específico existe sólida e dominante jurisprudência do STJ, que não pode ser tocada ou afrontada por essa TNU, no sentido de que "a sentença trabalhista pode ser considerada como início de prova material, desde que prolatada com base em elementos probatórios capazes de demonstrar o exercício da atividade laborativa, durante o período que se pretende ter reconhecido na ação previdenciária."
Nesse sentido:
PREVIDENCIÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. INOVAÇÃO RECURSAL. SENTENÇA TRABALHISTA MERAMENTE HOMOLOGATÓRIA DE ACORDO. IMPRESTABILIDADE DE UTILIZAÇÃO COMO INÍCIO DE PROVA MATERIAL. JURISPRUDÊNCIA CONSOLIDADA DO STJ.
1. A jurisprudência desta Corte está firmada no sentido de que a sentença trabalhista pode ser considerada como início de prova material, desde que prolatada com base em elementos probatórios capazes de demonstrar o exercício da atividade laborativa, durante o período que se pretende ter reconhecido na ação previdenciária.
2. Na espécie, ao que se tem dos autos, a sentença trabalhista está fundada apenas nos depoimentos das partes, motivo pelo qual não se revela possível a sua consideração como início de prova material para fins de reconhecimento da qualidade de segurado do instituidor do benefício e, por conseguinte, como direito da parte autora à pensão por morte.
3. Agravo interno a que se nega provimento. (AgInt no AREsp 1405520/SP, Rel. Ministro SÉRGIO KUKINA, PRIMEIRA TURMA, julgado em 07/11/2019, DJe 12/11/2019)
PREVIDENCIÁRIO. PENSÃO POR MORTE. QUALIDADE DE SEGURADO. SENTENÇA TRABALHISTA HOMOLOGATÓRIA DE ACORDO. UTILIZAÇÃO. IMPOSSIBILIDADE.
1. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça está firmada no sentido de que a sentença trabalhista pode ser considerada como início de prova material, desde que prolatada com base em elementos probatórios capazes de demonstrar o exercício da atividade laborativa, durante o período que se pretende ter reconhecido na ação previdenciária. Precedentes: AgInt no AREsp 529.963/RS, Rel. Ministro Benedito Gonçalves, Primeira Turma, DJe 28.2.2019; REsp 1.758.094/RJ, Rel. Ministro Herman Benjamim, Segunda Turma, DJe 17.12.2018; e AgInt no AREsp 688.117/SP, Rel. Ministro Sérgio Kukina, Primeira Turma, DJe 11.12.2017.
2. O Tribunal a quo reconheceu a qualidade de segurado do instituidor da pensão, com base na "sentença homologatória de acordo realizado em sede de Reclamação Trabalhista (fl. 110), em que foi reconhecida a relação de emprego entre o de cujus e a empresa DIVIPISO COMÉRCIO DE DIVISÓRIAS FORROS E PISOS LTDA-ME., no período de 03/05/2004 a 17/11/2005, na função de montador" (fl. 278, e-STJ) 3. Na espécie, ao que se tem dos autos, a sentença judicial trabalhista só homologou os termos de acordo entre as partes, para o reconhecimento de vínculo laboral do trabalhador já falecido, sem nenhuma incursão em matéria probatória.
4. Assim, inexistindo, quer naqueles autos da Justiça Especializada, quer nos da Justiça Federal, a produção de prova documental ou mesmo testemunhal, para se reconhecer o período de tempo em que o falecido teria trabalhado para a empresa firmatária do acordo, a sentença homologatória trabalhista é insuficiente, no caso, para embasar a pensão por morte aos dependentes do segurado.
5. Recurso Especial provido. (REsp 1760216/SP, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 26/03/2019, DJe 23/04/2019)
51. Ademais, o tema da força probatória da anotação em CTPS decorrente de sentença trabalhista está pedende de apreciação do STJ no PUIL n. 293, sob a relatoria do ministro Og Fernandes.
52. Nesse contexto, não cabe à TNU, no momento, enfrentar em representativo de controvérsia matéria pendente de unifomização junto ao STJ. Assim, a resposta ao tema 240 por parte desta TNU deve ficar restrita às hipóteses de anotação extemporânea em CTPS que não sejam decorrentes de sentença trabalhista,
53. DA FIXAÇÃO DA TESE
54. Propõe-se a fixação de tese nesse sentido:
(i) é extemporânea a anotação de vínculo empregatício em CTPS realizada voluntariamente pelo empregador após o término do contrato de trabalho;
(ii) a anotação de vínculo empregatício realizada de forma voluntária e extemporânea em CTPS, desacompanhada de outros elementos materiais de prova a corrobará-la, não serve como início de prova material para fins previdenciários (art. 55, § 3º, da Lei 8.213/91).
55. DA APLICAÇÃO DA TESE AO CASO CONCRETO
56. Como foi dito no item 10 retro, o julgado de origem não faz menção à anotação de CTPS por sentença trabalhista ou à existência de outro documento a servir como início de prova material. Inclusive, não invocou a parcial anotação no CNIS para afirmar a veracidade do vínculo. Na verdade, acolheu como início de prova material, exclusivamente, a anotação extemporânea em CTPS. Nesse contexto, a decisão recorrida está em contradição com a tese firmada acima.
57. Em face do exposto, voto por DAR PROVIMENTO ao PUIL, julgando-o como representativo de controvérsia, para 1) fixar a tese do tema 240 nos seguintes termos: (i) é extemporânea a anotação de vínculo empregatício em CTPS realizada voluntariamente pelo empregador após o término do contrato de trabalho; (ii) a anotação de vínculo empregatício realizada de forma voluntária e extemporânea em CTPS, desacompanhada de outros elementos materiais de prova a corrobará-la, não serve como início de prova material para fins previdenciários (art. 55, § 3º, da Lei 8.213/91); 2) restituir os autos à origem para adequação à tese ora firmada.
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