sexta-feira, 19 de junho de 2020

O mesmo período de trabalho não pode ser contabilizado duas vezes

Nesta sexta-feira será visto uma jurisprudência que trata sobre a impossibilidade de se usar o mesmo período de trabalho em dois regimes de previdência para concessão de benefício. Abaixo segue a decisão para análise dos amigos.



PREVIDENCIÁRIO. RECONHECIMENTO DE TEMPO ESPECIAL. CATEGORIA PROFISSIONAL: MOTORISTA DE CAMINHÃO. REGIME GERAL DE PREVIDÊNCIA SOCIAL E REGIME PRÓPRIO DE PREVIDÊNCIA ESTADUAL. CONTAGEM RECÍPROCA. IMPOSSIBILIDADE. 
1. O cerne da controvérsia trazida à análise consiste na aferição do alegado direito do autor à contagem de tempo de serviço especial prestado como motorista da Superintendência de Obras do Maranhão para fins de restabelecimento de sua aposentadoria por tempo de contribuição no Regime Geral de Previdência Social. 
2. Na hipótese, a documentação juntada aos autos indica que o autor exerceu a atividade de motorista na Secretaria de Obras do Estado do Maranhão - SOMAR, profissão que deve ser considerada de atividade especial, por enquadramento de categoria profissional (item 2.4.4 do anexo ao Decreto nº 53.831/64, item 2.4.2 do anexo II do Decreto nº 63.230/68 e item 2.4.2 do anexo II do Decreto nº 83.080/79), cuja sujeição a agentes nocivos é presumida até a Lei n. 9.032/95. 
3. O art. 96, I da Lei 8.213/91 veda a contagem recíproca do mesmo período de labor já computado em um regime para fins de percepção de benefício em outro. 
4. No caso dos autos, o autor não se desincumbiu, conforme lhe era devido, do ônus processual de comprovar a veracidade dos fatos constitutivos de seu direito, nos termos do que dispõe o art. 333, I, do CPC, apresentando toda a documentação necessária para verificação de que as contribuições vertidas durante o seu período de prestação de trabalho ao Estado do Maranhão não foram computadas junto ao regime próprio de previdência estadual - IPEM, tendo em conta que esse período somente poderá ser computado no Regime Geral de Previdência Social se não tiver sido aproveitado no regime próprio. 
5. Apelação desprovida.
TRF 1ª, Processo: 0037164-40.2010.4.01.3700, Desembargador federal relator João Luiz de Souza, 21/01/2020.

RELATÓRIO 
Trata-se de apelação interposta em face de sentença que, em ação pelo rito ordinário, julgou improcedente o pedido de restabelecimento de aposentadoria por tempo de contribuição. 

Nas razões de recurso, o autor reiterou os argumentos expendidos na peça inaugural, enfatizando que laborou como motorista lotado na Secretaria de Fazenda, devendo este período ser considerado para fins de aposentadoria no Regime Geral de Previdência Social, eis que não fora utilizado no regime próprio de previdência do Estado do Maranhão. 

Contrarrazões apresentadas. 

É o relatório. 

VOTO 
O cerne da controvérsia trazida à análise consiste na aferição do alegado direito do autor à contagem de tempo de serviço especial prestado como motorista da Superintendência de Obras do Maranhão para fins de restabelecimento de sua aposentadoria por tempo de contribuição no Regime Geral de Previdência Social. 

Nos termos do art. 56 e seguintes do Decreto 3.048/99 e do art. 201, § 7º, inciso I, da CF/88, a aposentadoria por tempo de contribuição é devida ao segurado que completar 35 (trinta e cinco) anos de contribuição, se homem, e 30 (trinta), se mulher. E, de acordo com o art. 57 e 58 da Lei n. 8.213/91, a aposentadoria especial é devida ao segurado que tiver trabalhado sujeito a condições especiais que prejudiquem sua saúde ou sua integridade física durante 15 (quinze), 20 (vinte) ou 25 (vinte e cinco) anos, conforme dispuser a lei. 

Neste diapasão, para reconhecimento de tempo especial o segurado deverá comprovar o tempo de trabalho permanente, não ocasional nem intermitente, em condições especiais, com exposição aos agentes nocivos químicos, físicos, biológicos ou associação de agentes prejudiciais. 

Cumpre destacar que a consideração do tempo de serviço como especial deve ser feita de acordo com a legislação vigente à época da prestação do serviço, e não da data em que perfeitas todas as condições para a aposentadoria, tal como disposto no § 1º, art. 70, do Decreto nº 3.048/99, com redação do Decreto nº 4.827/03. 

Esse é o entendimento consagrado por esta Corte: 

PREVIDENCIÁRIO. MANDADO DE SEGURANÇA. APOSENTADORIA ESPECIAL. CONCESSÃO. RECONHECIMENTO DE TEMPO LABORADO EM CONDIÇÕES ESPECIAIS. CALOR. POEIRA DE SÍLICA. RUÍDO. LEGISLAÇÃO APLICÁVEL. EPI. CÔMPUTO DO TEMPO EM GOZO DO BENEFÍCIO AUXÍLIO-DOENÇA COMO ESPECIAL. EC 20/98. JUROS E CORREÇÃO MONETÁRIA. 
1. A questão de atribuição de efeito suspensivo ao recurso resta prejudicada, uma vez que não concedido até esta data, não há utilidade na sua apreciação neste momento processual, uma vez que não cabe recurso com efeito suspensivo a partir deste julgado. 
2. O cômputo do tempo de serviço prestado em condições especiais deve observar a legislação vigente à época da prestação laboral, tal como disposto no § 1º do art. 70 do Decreto nº 3.048/99, com redação dada pelo Decreto nº 4.827/03. 
3. O impetrante exercia atividade de operador de lingotamento em indústria metalúrgica, categoria profissional que estava inserida no código 2.5.1 do Quadro Anexo II do Decreto nº 83.080/79, sendo considerada de natureza insalubre por presunção legal até o advento da Lei 9.532/95. 
4. Os formulários acostados aos autos comprovaram ainda a exposição do impetrante ao agente agressivo calor em uma intensidade acima dos limites de tolerância estabelecidos no código 1.1.1 do quadro anexo do Decreto n° 53.831/64 e pela NR-15 da Portaria n° 3.214/78, nos termos do código 2.0.4 dos Decretos n° 2.172/97 e n° 3.048/98, além da exposição ao agente poeira de sílica, com enquadramento no código 1.2.10, do Quadro anexo do Decreto 53.831/64 e no código 2.3.1, Anexo II, do Decreto nº 83.080/79. 
5. Considera-se especial a atividade exercida com exposição a ruídos superiores a 80 decibéis até 05/03/97 (Súmula nº 29 da AGU), e, a partir de então, acima de 85 decibéis, desde que aferidos esses níveis de pressão sonora por meio de perícia técnica, trazida aos autos ou noticiada no preenchimento de formulário expedido pelo empregador. 
6. Para configuração da especialidade da atividade, não é necessário que o trabalhador permaneça exposto ao nível máximo de ruído aludido na legislação durante toda a sua jornada de trabalho. 
7. A utilização de equipamentos de proteção individual não descaracteriza a atividade prestada sob condições especiais, pois seu uso não significa que estejam erradicadas as condições adversas que justificam a contagem de tempo de maneira específica, prestando-se tão somente a amenizar ou reduzir os danos delas decorrentes. 
8. O período em gozo do benefício previdenciário de auxílio-doença, deve ser computado como tempo especial, tendo em vista que antes e depois da concessão do benefício, o impetrante laborou em condições especiais. 
9. O segurado que implementou o tempo de contribuição necessário para obtenção da aposentadoria integral ou especial não se submete às regras de transição. 
10. Apelação desprovida. Remessa oficial, tida por interposta, parcialmente provida. 
(Numeração Única: 0004403-44.2006.4.01.3813; AMS 2006.38.13.004409-3 / MG; APELAÇÃO EM MANDADO DE SEGURANÇA; Relator JUIZ FEDERAL GUILHERME MENDONÇA DOEHLER; Órgão 3ª TURMA SUPLEMENTAR; Publicação 31/05/2012 e-DJF1 P. 254) Destaquei 

Em relação à época em que vigiam os Decretos nºs 53.831/64 e 83.080/79, para a comprovação do efetivo trabalho em atividade tida como perigosa, insalubre ou penosa, bastava que a categoria profissional a que pertencia o trabalhador se enquadrasse no rol constante nos anexos que integravam referidos diplomas, ressalvada a hipótese referente ao agente insalubre “ruído”, que sempre exigiu laudo pericial. 

Na sequência, a Lei n. 9.032/95, publicada em 29.04.1995, passou a exigir a demonstração da especialidade da atividade, através dos formulários SB-40 e DSS 8030, o que persistiu até a edição da Medida Provisória 1.523/96, de 14.10.1996, convertida na Lei n. 9.528/97, de 11.12.1997, a partir de quando começou a ser exigida, obrigatoriamente, a comprovação da condição especial por meio de laudo técnico assinado por médico do trabalho ou engenheiro de segurança do trabalho. 

Nesse contexto, nas hipóteses de tempo de serviço prestado após 29/04/95, deve o trabalhador comprovar a exposição permanente, não ocasional e nem intermitente aos agentes prejudiciais à saúde. 

Com relação à conversão tempo de serviço especial em comum, a jurisprudência mais recente do STJ permite tal transmudação, inclusive após 28/05/98 (Resp 956110/SP). 

Por outro lado, em se tratando de conversão do tempo de serviço comum em especial, para fins de concessão do benefício de aposentadoria especial, o Superior Tribunal de Justiça, em sede de recurso repetitivo do artigo 543-C do CPC/73, então vigente, decidiu que “para que o segurado faça jus à conversão de tempo de serviço comum em especial, é necessário que ele tenha reunido os requisitos para o benefício pretendido antes da Lei n. 9.032/95, de 28/4/95, independentemente do momento em que foi prestado o serviço.” (EDcl no REsp 1.310.034/PR, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 26/11/2014, DJe 02/02/2015). 

Na hipótese, a documentação juntada aos autos indica que o autor exerceu a atividade de motorista na Secretaria de Obras do Estado do Maranhão – SOMAR, profissão que deve ser considerada de atividade especial, por enquadramento de categoria profissional (item 2.4.4 do anexo ao Decreto nº 53.831/64, item 2.4.2 do anexo II do Decreto nº 63.230/68 e item 2.4.2 do anexo II do Decreto nº 83.080/79), cuja sujeição a agentes nocivos é presumida até a Lei n. 9.032/95. 

Entretanto, o art. 96, I da Lei 8.213/91 veda a contagem recíproca do mesmo período de labor já computado em um Regime para fins de percepção de benefício em outro. 

Na hipótese, o autor não se desincumbiu, conforme lhe era devido, do ônus processual de comprovar a veracidade dos fatos constitutivos de seu direito, nos termos do que dispõe o art. 333, I, do CPC, apresentando toda a documentação necessária para verificação de que as contribuições vertidas durante o seu período de prestação de trabalho ao Estado do Maranhão não foram computadas junto ao regime próprio de previdência estadual – IPEM, tendo em conta que esse período somente poderá ser computado no Regime Geral de Previdência Social se não tiver sido aproveitado no regime próprio. 

Posto isso, nego provimento à apelação, nos termos da fundamentação. 

É como voto.

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Rio Grande, Rio Grande do Sul, Brazil
Especialista em Direito Previdenciário, pela Universidade de Caxias do Sul - UCS, em parceria com a ESMAFE - Escola da Magistratura Federal, em 2009. Formado em janeiro de 2006, pela FURG - Fundação Universidade do Rio Grande, em direito. Este blog tem o objetivo de divulgar o conteúdo previdenciário de maneira gratuita para que todos possam ter acesso as informações sobre esta matéria.

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