Viúva pode ajuizar ação contra empregador do marido
Nesta sexta-feira será visto uma jurisprudência que trata sobre a legitimidade da viúva habilitada na Previdência Social como dependente do empregado falecido para requerer em juízo parcelas decorrentes da relação de emprego. Abaixo segue a decisão para análise dos amigos.
RECURSO DE REVISTA REGIDO PELO CPC/2015 E PELA INSTRUÇÃO NORMATIVA Nº 40/2016 DO TST E INTERPOSTO NA VIGÊNCIA DA LEI Nº 13.015/2014.
LEGITIMIDADE ATIVA PARA POSTULAR VERBAS DECORRENTES DO CONTRATO DE TRABALHO. TRABALHADOR FALECIDO. COMPLEMENTAÇÃO DE APOSENTADORIA. VIÚVA DEVIDAMENTE HABILITADA COMO DEPENDENTE PERANTE A PREVIDÊNCIA SOCIAL.
Inicialmente, destaca-se que na presente hipótese é incontroverso que a reclamante é dependente do falecido trabalhador, devidamente habilitada perante a Previdência Social. A questão em tela deve ser analisada à luz da legislação pertinente, que é o artigo 1º da Lei nº 6.858/80, a saber: "Art. 1º. Os valores devidos pelos empregadores aos empregados e os montantes das contas individuais do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço e do Fundo de Participação PIS-PASEP, não recebidos em vida pelos titulares, serão pagos, em quotas iguais, aos dependentes habilitados perante a Previdência Social ou na forma da legislação específica dos servidores civis e militares, e, na sua falta, aos sucessores previstos na lei civil, indicados em alvará judicial, independentemente de inventário ou arrolamento" (grifou-se). Registra-se que esta Corte, interpretando o citado dispositivo, vem reiteradamente decidindo que tanto os dependentes habilitados perante a Previdência Social quanto os sucessores previstos na lei civil possuem legitimidade para propor ação em que se postulam verbas não recebidas pelo empregado em vida decorrentes da relação de emprego, independentemente de inventário ou arrolamento. Nesse contexto, verifica-se que a Corte de origem, ao decidir pela ilegitimidade ativa ad causam da viúva do de cujus, violou o disposto no artigo 1º da Lei nº 6.858/80. Precedentes.
Recurso de revista conhecido e provido.
TST, RR-1001726-40.2017.5.02.0446, 2ª T., Ministro relator José Roberto Freire Pimenta, 14.02.2020.
Vistos, relatados e discutidos estes autos de Recurso de Revista n° TST-RR-1001726-40.2017.5.02.0446, em que é Recorrente MARIA LUIZA DOS SANTOS SILVA e Recorrida COMPANHIA DOCAS DO ESTADO DE SÃO PAULO - CODESP.
O Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região, por intermédio do acórdão de págs. 1.935-1.937, negou provimento ao recurso ordinário da reclamante.
A reclamante interpõe recurso de revista, às págs. 1.946-1.953, com fundamento nas alíneas "a" e "c" do artigo 896 da CLT, em que pretende a reforma da decisão.
O recurso foi admitido às págs. 1.954-1.956.
Contrarrazões pela reclamada às págs. 1.960-1.966.
Os autos não foram remetidos ao Ministério Público do Trabalho, em razão do disposto no art. 95 do RITST.
É o relatório.
VOTO
LEGITIMIDADE ATIVA PARA POSTULAR VERBAS DECORRENTES DO CONTRATO DE TRABALHO. TRABALHADOR FALECIDO. COMPLEMENTAÇÃO DE APOSENTADORIA. VIÚVA DEVIDAMENTE HABILITADA COMO DEPENDENTE PERANTE A PREVIDÊNCIA SOCIAL
I - CONHECIMENTO
A reclamante sustenta que, ao contrário do entendimento adotado pela Corte regional, há legitimidade ativa para postular em nome próprio, direito do reclamante falecido, visto que se trata de viúva dependente do reclamante.
Argumenta que, na hipótese, não se trata de pleito ligado à pensão por morte, mas "diferenças mensais em favor do empregado que vão até a data de sua morte, marco da extinção da obrigação do empregador em pagar a complementação" (pág. 1.949).
Aponta violação dos artigos 1º da Lei nº 6.858/80 e 112 da Lei nº 8.213/91.
Transcreve arestos para demonstrar o conflito de teses.
O Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região analisou o tema com a seguinte fundamentação:
"Inconformada com a r. sentença que extinguiu o feito sem resolução do mérito, a autora alega que possui legitimidade para postular a complementação de aposentadoria de seu falecido marido, argumentando que o art. 1º da Lei nº 6.858/80 garante-lhe tal direito.
Não procede o apelo.
O art. 1º da Lei nº 6.858/80 prevê que:
‘Os valores devidos pelos empregadores aos empregados e os montantes das contas individuais do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço e do Fundo de Participação PIS-PASEP, não recebidos em vida pelos respectivos titulares, serão pagos, em quotas iguais, aos dependentes habilitados perante a Previdência Social ou na forma da legislação específica dos servidores civis e militares, e, na sua falta, aos sucessores previstos na lei civil, indicados em alvará judicial, independentemente de inventário ou arrolamento’.
De início, realço que a autora postulou direitos de seu falecido marido, em nome próprio. Nesse sentido, considerando a falta de interesse processual daquele que requer em nome próprio direito alheio, o presente feito deve ser extinto sem resolução do mérito.
Diferentemente do alegado pela recorrente, não se trata de excessivo rigor formal. Outrossim, para que não pairem dúvidas, esclareço que não há pedido de pensão por morte.
Destarte, mantenho a extinção do feito sem resolução do mérito, tal como decretada na origem." (pág. 1936).
Inicialmente, destaca-se que, na presente hipótese, é incontroverso que a reclamante é dependente do falecido trabalhador, devidamente habilitada perante a Previdência Social.
A questão em tela deve ser analisada à luz da legislação pertinente, que é o art. 1º da Lei nº 6.858/80, a saber:
"Art. 1º. Os valores devidos pelos empregadores aos empregados e os montantes das contas individuais do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço e do Fundo de Participação PIS-PASEP, não recebidos em vida pelos titulares, serão pagos, em quotas iguais, aos dependentes habilitados perante a Previdência Social ou na forma da legislação específica dos servidores civis e militares, e, na sua falta, aos sucessores previstos na lei civil, indicados em alvará judicial, independentemente de inventário ou arrolamento". (grifou-se).
Registra-se que esta Corte, interpretando o citado dispositivo, vem reiteradamente decidindo que tanto os dependentes habilitados perante a Previdência Social quanto os sucessores previstos na lei civil possuem legitimidade para propor ação em que se postulam verbas não recebidas pelo empregado em vida decorrentes da relação de emprego, independentemente de inventário ou arrolamento.
Nesse sentido, citam-se os seguintes precedentes desta Corte:
"RECURSO DE REVISTA INTERPOSTO ANTES DA VIGÊNCIA DA LEI Nº 13.015/2014. LEGITIMIDADE ATIVA. EMPREGADO FALECIDO. DEPENDENTE HABILITADO PERANTE A PREVIDÊNCIA SOCIAL. VERBAS TRABALHISTAS. A jurisprudência consolidada no âmbito desta Corte Superior é firme no sentido de que os dependentes do trabalhador falecido habilitados perante a Previdência Social são partes legítimas para postular direitos decorrentes do contrato de trabalho. Precedentes. Recurso de revista de que não se conhece. (...)" (RR-199-31.2011.5.12.0049, 1ª Turma, Relator Ministro Walmir Oliveira da Costa, DEJT 14/12/2018).
"RECURSO DE REVISTA. ACÓRDÃO PUBLICADO NA VIGÊNCIA DA LEI Nº 13.015/2014. AÇÃO DE CONSIGNAÇÃO EM PAGAMENTO. VERBAS RESCISÓRIAS. EMPREGADO FALECIDO. DIVISÃO DE VALORES. HABILITAÇÃO PERANTE A PREVIDÊNCIA SOCIAL DE FILHO MENOR. Cinge-se a controvérsia acerca da legitimidade do filho menor, ainda que não habilitado perante a Previdência Social, para o recebimento das verbas rescisórias devidas a empregado falecido. O artigo 1º da Lei 6.858/1980 dispõe que os valores devidos pelos empregadores aos empregados não recebidos em vida pelos respectivos titulares, serão pagos, em cotas iguais, aos dependentes habilitados perante a Previdência Social, não estabelecendo prazo para que o dependente realize a referida habilitação. Dessa forma, evidenciado na decisão regional que o menor era filho e, portanto, dependente do de cujus, a ele também é devido o pagamento das verbas rescisórias. Recurso de revista conhecido e provido" (RR-88-66.2015.5.09.0671, 5ª Turma, Relator Ministro Breno Medeiros, DEJT 05/10/2018).
"III - RECURSO DE REVISTA INTERPOSTO PELA RECLAMADA CONSTRUTORA PUSSOLI S.A. LEGITIMIDADE ATIVA. EMPREGADO FALECIDO. DEPENDENTE HABILITADO PERANTE A PREVIDÊNCIA SOCIAL. Esta Corte Superior consolidou o entendimento no sentido de que os dependentes do empregado falecido habilitados perante a Previdência Social são partes legítimas para postular direitos decorrentes do contrato de trabalho. Precedentes. Recurso de revista não conhecido. (...)" (ARR-389-31.2010.5.09.0657, 8ª Turma, Relator Ministro Márcio Eurico Vitral Amaro, DEJT 15/06/2018).
"RECURSO DE REVISTA - VERBAS TRABALHISTAS - EMPREGADO FALECIDO - LEGITIMIDADE ATIVA - DEPENDENTE HABILITADO PERANTE A PREVIDÊNCIA SOCIAL. Nos termos do art. 1º, caput, da Lei nº 6.858/80, os dependentes habilitados perante a Autarquia Previdenciária ostentam legitimidade ativa para cobrar verbas trabalhistas devidas pelo empregador ao funcionário falecido. No caso, sendo a autora antiga companheira do de cujus e dependente habilitada junto ao INSS, inclusive recebendo pensão por morte, deve ser reconhecida a legitimidade ativa da reclamante para postular em nome próprio direitos laborais do obreiro falecido. Recurso de revista conhecido e provido" (RR-807-94.2012.5.24.0005, 7ª Turma, Relator Ministro Luiz Philippe Vieira de Mello Filho, DEJT 05/06/2015).
"RECURSO DE REVISTA INTERPOSTO NA VIGÊNCIA DA LEI Nº 13.015/2014. LEGITIMIDADE ATIVA PARA REPRESENTAR O RECLAMANTE FALECIDO EM JUÍZO. COMPANHEIRA DO DE CUJUS. SUCESSORA LEGAL. HABILITAÇÃO DE DEPENDENTE PERANTE A PREVIDÊNCIA SOCIAL. DESNECESSIDADE. A controvérsia dos autos refere-se à legitimidade de Roseli Silva de Souza, companheira do reclamante falecido, ainda que não habilitada perante a Previdência Social, para representar o de cujus nesta ação em que se buscam o reconhecimento de vínculo de emprego entre as partes e os consectários daí decorrentes. No caso, a Vara do Trabalho de origem determinou a extinção do processo sem resolução do mérito, pois concluiu que a autora desta reclamação não detém legitimidade para representar o trabalhador falecido, já que não apresentou habilitação de dependente na Previdência Social. O Regional, mantendo essa decisão, negou provimento ao recurso ordinário da autora, ressaltando que " o único requisito trazido pela lei para o recebimento das verbas salariais, rescisórias e demais valores devidos ao "de cujus" é a habilitação de dependente junto à Previdência Social " e que os documentos por ela apresentados, " mesmo destacando que o benefício de pensão por morte foi-lhe negado pela perda da qualidade de segurado do de cujus, não servem como prova da sua condição de dependente habilitado perante a Previdência Social ". O Tribunal a quo acrescentou ainda que, embora os documentos juntados indiquem a alegada convivência marital, " esta Especializada carece de competência material para apreciar, mesmo de forma incidental, questões de Direito de Família. Logo, não se pode conhecer, tampouco, declarar sua condição de sucessora nos termos da lei civil ". No entanto, essa delicada e recorrente questão deve ser analisada inicialmente à luz da legislação pertinente, que é o artigo 1º da Lei nº 6.858/80, a saber: " Art. 1º. Os valores devidos pelos empregadores aos empregados e os montantes das contas individuais do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço e do Fundo de Participação PIS-PASEP, não recebidos em vida pelos titulares, serão pagos, em quotas iguais, aos dependentes habilitados perante a Previdência Social ou na forma da legislação específica dos servidores civis e militares, e, na sua falta, aos sucessores previstos na lei civil, indicados em alvará judicial, independentemente de inventário ou arrolamento ". De acordo com o quadro fático delineado no acórdão regional, a Sra. Roseli Silva de Souza vivia em união estável com o de cujus. Com efeito, sendo reconhecidas na própria decisão regional a existência de união estável entre o homem e a mulher como entidade familiar e a condição da reclamante, ora recorrente, de herdeira necessária como companheira do falecido, nos termos dos artigos 226, § 3º, da Constituição Federal e 1.723 e 1.790 do Código Civil, a doutrina e a jurisprudência são uníssonas em considerá-la parte legítima para figurar no polo ativo de ação pleiteando valores não recebidos em vida pelo de cujus . Assim, ainda que não efetivada sua habilitação perante a Previdência Social, a Sra. Roseli Silva de Souza se enquadra na hipótese contida na segunda parte do artigo 1º da Lei nº 6.858/80, pois sucessora legal do trabalhador falecido. Registra-se que esta Corte, interpretando o citado dispositivo, vem reiteradamente decidindo que tanto os dependentes habilitados perante a Previdência Social quanto os sucessores previstos na lei civil possuem legitimidade para propor ação em que se postulam verbas não recebidas pelo empregado em vida decorrentes da relação de emprego, independentemente de inventário ou arrolamento. Assim, a ausência de habilitação perante a Previdência Social não é causa para a extinção da ação sem julgamento do mérito, tendo em vista que a habilitação pode ser feita até mesmo na fase de liquidação da sentença. Precedentes. Recurso de revista conhecido e provido" (RR-1001244-54.2016.5.02.0373, 2ª Turma, Relator Ministro José Roberto Freire Pimenta, DEJT 11/10/2019).
Nesse contexto, verifica-se que a Corte de origem, ao decidir pela ilegitimidade ativa ad causam da viúva do de cujus, violou o disposto no artigo 1º da Lei nº 6.858/80.
Pelo exposto, conheço do recurso de revista por violação do artigo 1º da Lei nº 6.858/80.
II – MÉRITO
A consequência do conhecimento do recurso de revista por violação do artigo 1º da Lei nº 6.858/80 é o seu provimento.
Assim, dou provimento ao recurso de revista para, declarando a legitimidade ativa da viúva do reclamante falecido, determinar o retorno dos autos à Vara do Trabalho de origem, para que prossiga no exame da demanda, como entender de direito.
ISTO POSTO
ACORDAM os Ministros da Segunda Turma do Tribunal Superior do Trabalho, por unanimidade, conhecer do recurso de revista por violação do artigo 1º da Lei nº 6.858/80 e, no mérito, dar-lhe provimento para, declarando a legitimidade ativa da viúva do reclamante falecido, determinar o retorno dos autos à Vara do Trabalho de origem, para que prossiga no exame da demanda, como entender de direito.
Brasília, 12 de fevereiro de 2020.
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