sexta-feira, 7 de dezembro de 2012

Beneficio assistencial ao estrangeiro é concedido

Nesta sexta-feira começarei a ver alguns processos que se encontram no Supremo Tribunal Federal esperando julgamento e que são de grande interesse para todos que utilizam a seguridade social.
O primeiro deles é o Recurso Extraordinário n.587970 que trata da concessão de benefício assistencial a estrangeiros residentes no Brasil. O processo já se encontra em sede de repercussão geral e abaixo segue o acórdão que foi impugnado via Recurso Extraordinário.

Processo n° 2006.63.01.075636-6
Relatora: Juíza Federal Luciana Ortiz Tavares Costa Zanoni
Origem: Juizado Especial Federal Cível de São Paulo
Recorrente: Instituto Nacional do Seguro Social - INSS
Recorrido: Felicia Mazzitello Albanese
 
I - RELATÓRIO
A autora pleiteou a concessão de benefício assistencial, consistente em prestação continuada nos termos do artigo 203, inciso V, da Constituição Federal.

O juízo de primeiro grau julgou procedente o pedido, condenando o INSS a implantar e pagar à autora o benefício assistencial de prestação continuada previsto no artigo 203, inciso V, da Constituição Federal, e instituido pela Lei n. 8.742/93, no valor de um salário-mínimo, bem como ao pagamento das verbas vencidas desde a data do requerimento administrativo. Foi concedida, ainda, a antecipação dos efeitos da tutela, para determinar ao Instituto Nacional do Seguro Social a implantação do referido benefício no prazo de 45 (quarenta e cinco) dias, sob pena de multa diária no valor de R$ 100,00 (cem reais).

Recorre, tempestivamente, a autarquia previdenciária e pede a reforma da r.sentença. Aduz que a parte autora possui nacionalidade estrangeira e que a assistencial social é direito exclusivo do cidadão, ou seja, daquele que está em gozo dos direitos políticos, não podendo, dessa feita, ser estendido a pessoas que não ostentem essa qualidade. Aduz, ainda, que a autora não comprovou, conforme exige a Constituição Federal, o requisito da hipossuficiência econômica, sendo, portanto, indevido o benefício. Requer a improcedência da ação e a cassação da tutela antecipada. Sustenta, por fim, que é incabível a imposição de multa diária contra o órgão previdenciário para forçar o cumprimento de uma obrigação, pois tal pratica configuraria verdadeiro enriquecimento sem causa às custas do erário, fato este completamente vedado pelo ordenamento jurídico pátrio. 
A autora apresentou contra-razões, requerendo que seja negado provimento ao recurso. É o relatório.
II - VOTO
Não assiste razão à autarquia recorrente. A autora (de nacionalidade italiana, com 67 anos de idade e residente no Brasil há mais de 54 anos) requereu administrativamente benefício assistencial, o qual foi indeferido pelo INSS, sob argumento de que há vedação à sua concessão a estrangeiros. Portanto, a questão em debate no presente recurso cinge-se à possibilidade ou não de tal concessão.
O benefício assistencial está previsto na Constituição Federal, nos seguintes termos:
"Art.203 - A assistencial social será prestada a quem dela necessitar independentemente de contribuição à seguridade social, e tem por objetivos:
(...) V - a garantia de um salário mínimo de benefício mensal à pessoa portadora de deficiência e ao idoso que comprovem não possuir meios de prover à própria manutenção ou tê-la provida por sua família, conforme dispuser a lei". (GRIFEI)

Assim, o que se depreende do dispositivo constitucional é que o benefício da assistência social será prestado à pessoa que dele necessite, ou seja, aquela portadora de deficiência ou o idoso, desde que preenchido o requisito econômico, na forma da lei.

Portanto, o que a Constituição delega para a legislação ordinária é a definição de pessoa deficiente, quem será considerado idoso e qual o critério a ser utilizado para aferição da condição de miserabilidade. De forma alguma a lei poderá restringir o benefício somente ao cidadão. 

Veja-se a doutrina a respeito: "Com efeito, o que a norma constitucional exige é que a lei ordinária regulamente seu dispositivo, vale dizer, estabeleça parâmetros e meios de operacionalização e aferição dos requisitos pré-estabelecidos pela própria Constituição. Qualquer acréscimo por meio de lei ordinária de novas condições para o assistido perceber o benefício é inconstitucional. Trata-se o benefício comentado de uma garantia que o constituinte aseegura aos indivíduos que não podem manter-se por suas próprias forças." (Bruno Henrique Silva Santos, In Algumas considerações acerca do benefício assistencial de prestação continuada, Revista de Doutrina do Tribunal Regional da 4ª Região, www.revistadoutrina.trf4.gov.br).
Ora, a Constituição não estabelece, em momento algum, que o benefício será prestado somente ao cidadão. Se a intenção fosse essa, teria havido determinação expressa, como, por exemplo, ao tratar da ação popular no artigo 5°, LXXIII, nos seguintes termos: "qualquer cidadão é parte legítima para propor ação popular, que vise a...".
Ademais, como bem fundamentado pelo d. juízo sentenciante, "a igualdade é garantia fundamental estampada no artigo 5° da CF/88, que expressamente estende aos estrangeiros residentes no país a proteção dos direitos individuais previstos na CF/88, figurando entre eles o direito ao LOAS". Diante disso, a sentença recorrida não merece reparos neste aspecto. Resta-nos analisar a presença dos pressupostos legais que autorizam a concessão do benefício.

Estabelece o artigo 20 da Lei n° 8.742/1993 c/c artigo 34 da Lei n° 10.741/2003 que o benefício assistencial deve ser concedido a partir da verificação de dois requisitos: 1) deficiência incapacitante para a vida independente ou idade superior a 65 anos e; 2) hipossuficiência individual ou familiar de prover a subsistência da pessoa deficiente.
O primeiro requisito foi suficientemente atendido. Como mencionado acima, a autora possui atualmente 67 anos de idade. 
Da mesma forma, o segundo requisito está presente. O artigo 20, parágrafo 3°, da Lei n° 8.742/93 estabeleceu o parâmetro de 1/4 do salário mínimo da renda per capita para aferição da hipossuficiência. Para o cômputo deste valor, deve-se considerar apenas aquelas pessoas referidas no artigo 16 da Lei n° 8.213/91, vez que o parágrafo 1° do artigo 20 da Lei n° 8.742/93 é expresso em considerar como família, para efeitos de benefício assistencial, apenas os dependentes previstos no Plano de Benefícios da Previdência Social.
Há que se considerar, ainda, que, nos termos do mesmo § 1° do artigo 20 da Lei n° 8.742/93, deve ser considerado, para fins de apuração da renda familiar, o grupo de pessoas elencadas no referido artigo 16 da Lei n° 8.213/91, "desde que vivam sob o mesmo teto".

No caso em análise, conforme o laudo sócio-econômico elaborado com base na visita domiciliar realizada em 06.12.2006, o núcleo familiar é composto pela autora e sua filha (Sra. Rosemeire Bunducki, 37 anos, desempregada). Não há renda familiar, a filha da autora teve que se afastar do antigo emprego, que representava a única fonte de renda da família, há mais de 03 anos por motivos de saúde. A autora e sua filha sobrevivem da ajuda de familiares e amigos. Informa ainda a Assistente Social que a família reside em imóvel alugado, o qual é objeto de uma ação de despejo por não poderem pagar o aluguel (Mandado de Citação e Petição Inicial acostados à petição anexada aos autos em 10.01.2007). Consta que a autora e sua filha tiveram que vender parte do mobiliário para arcar com despesas urgentes.

Informa, ainda, a Assistente Social que a autora e sua filha apresentam delicado estado de saúde, apresentando a autora disfunção pulmonar obstrutiva crônica com distúrbio ventilatório obstrutivo moderado com resposta ao broncodilatador. Sua filha Rosemeire vem se submetendo a cirurgias há três anos (extração de cisto hemorrágico, que ocasionou outra cirurgia corretiva), está aguardando para retirar nódulo no endométrio, que gera disfunções também na bexiga. Tem fortes dores no estômago, intestino e bexiga. Atualmente, está fazendo terapia nos serviços do sistema de saúde municipal.
Segundo conclusão da Sra. Assistente Social: "Assim sendo, podemos observar que considerando as condições materiais, como também do quadro de doenças de ambas e ainda a falta de vínculo com outros familiares da pericianda, fica caracterizada falência financeira, que atende ao critério para o benefício solicitado".

Comprovado, portanto, o requisito objetivo, tendo em vista que, segundo conclusão do laudo sócio-econômico elaborado por profissional gabaritado, a autora não possui renda alguma, restando comprovada sua hipossuficiência.

Ressalta-se que o laudo sócio-econômico foi elaborado por perito de confiança deste juízo, sendo que cabe à autarquia o ônus de descontituí-lo com evidências materiais pertinentes e não somente com argumentos, bem como que o indeferimento do benefício em sede administrativa não teve por fundamento a ausência dos requisitos legalmente estabelecidos, mas simplesmente o fato de a autora ter nacionalidade estrangeira.

Em relação à fixação da multa, razão assiste ao réu.

Embora exista a previsao legal para a fixação de multa cominatória pelo descumprimento da ordem judicial, tendo em vista a indisponibilidade do patrimônio público, bem como pelo princípio geral de direito que veda enriquecimento sem causa, entendo não ser cabível a fixação de multa na presente demanda.

Diante do exposto, dou parcial provimento ao recurso da autarquia ré, apenas para afastar a imposição de multa pelo não cumprimento de determinação judicial. Mantenho, no mais, a r. sentença recorrida. Mantida a tutela concedida.

Considerando que a autarquia recorrente sucumbiu na maior parte dos pedidos, condeno-a ao pagamento de em honorários advocatícios que fixo em R$ 300,00(trezentos reais), nos termos do artigo 55 da Lei n° 9.099/95 c/c com o artigo 1° da Lei n° 10.259/01. É o voto.

III - ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos eletrônicos, em que são partes as acima indicadas, decide a Primeira Turma Recursal do Juizado Especial Federal da Terceira Região - Seção Judiciária de São Paulo, por unanimidade, dar parcial provimento ao recurso do Instituto Nacional do Seguro Social - INSS, nos termos do voto da Juíza Federal Relatora.
São Paulo, 30 de agosto de 2007 (data do julgamento).

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Rio Grande, Rio Grande do Sul, Brazil
Especialista em Direito Previdenciário, pela Universidade de Caxias do Sul - UCS, em parceria com a ESMAFE - Escola da Magistratura Federal, em 2009. Formado em janeiro de 2006, pela FURG - Fundação Universidade do Rio Grande, em direito. Este blog tem o objetivo de divulgar o conteúdo previdenciário de maneira gratuita para que todos possam ter acesso as informações sobre esta matéria.

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