sexta-feira, 26 de julho de 2024

Prazo para revisão de aposentadoria na via judicial não corre enquanto INSS não decidir sobre pedido administrativo

Nesta sexta-feira será visto uma jurisprudência que trata sobre o fato de haver em aberto um pedido do aposentado de revisão administrativa do benefício feito em 2010 que o INSS não analisou, logo, o prazo decadencial de 10 anos para revisão via ação judicial, estabelecido no artigo 103 da Lei nº 8213/91, não deve correr enquanto a autarquia federal não decidir sobre o pedido de revisão administrativa. Abaixo segue a decisão para análise dos amigos.


EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. INCIDENTE DE ASSUNÇÃO DE COMPETÊNCIA. TEMA TRF4 11. EFEITOS DO PEDIDO ADMINISTRATIVO DE REVISÃO SOBRE O PRAZO DECADENCIAL. TEMA 975 DO STJ. DISTINGUISHING. DIREITO DE REVISÃO DO ATO DE DEFERIMENTO OU INDEFERIMENTO DO PEDIDO DE REVISÃO. PRAZO DECADENCIAL. TERMO INICIAL. DISTINÇÃO E AUTONOMIA EM RELAÇÃO AO DIREITO DE REVISÃO DO ATO DE CONCESSÃO INICIAL DO BENEFÍCIO. INTERPRETAÇÃO DO ART. 103 DA LEI 8.213/91.
1. Incidente de Assunção de Competência instaurado para uniformizar o entendimento das Turmas Previdenciárias do Tribunal Regional Federal da 4ª Região sobre a seguinte questão: saber se o pedido administrativo de revisão do ato de concessão do benefício, formulado antes do decurso do prazo de 10 (dez) anos da concessão, produz efeitos sobre o prazo decadencial previsto no art. 103 da Lei 8.213/91.
2. A questão envolvida neste IAC não guarda identidade com o padrão decisório do Tema 975/STJ.
3. A tese jurídica firmada no julgamento do Tema 975/STJ estabelece, precisamente, que a decadência do direito de revisão do ato concessório atinge inclusive questões não apreciadas pela Administração na análise da concessão do benefício previdenciário. De sua ratio decidendi extrai-se, mediatamente, o entendimento de que o prazo decadencial não está sujeito a causas de impedimento, suspensão ou interrupção à luz do que prevê a legislação em vigor, sem prejuízo do que possa vir a ser estabelecido em lei, consoante dispõe a primeira parte do art. 207 do Código Civil. Com efeito, a influência da ratio extraída do julgamento do aludido tema repetitivo sobre a questão discutida neste IAC (eficácia expansiva) cinge-se à inaplicabilidade de causas de impedimento, suspensão e interrupção do prazo decadencial.
4. O direito potestativo de revisão do ato de deferimento ou indeferimento do pedido de revisão é distinto e autônomo em relação ao direito potestativo de revisão do ato de concessão (autonomia quanto ao nascimento, ao prazo decadencial para exercício, ao termo inicial de contagem do prazo e ao ato contra o qual se dirigirá o seu exercício).
5. Na ADI 6.096, proposta perante o Supremo Tribunal Federal, impugnou-se a inserção de prazo decadencial para a revisão de ato de indeferimento, cancelamento ou cessação de benefício previdenciário pelo art. 24 da Lei 13.846/19, que modificou o art. 103 da Lei 8.213/91. A ação direta não visou a impugnar a constitucionalidade da nova redação do art. 103 da Lei de Benefícios quanto aos demais pontos, entre os quais o que estabelece textualmente um prazo de decadência de 10 (dez) anos para a revisão do ato de deferimento, indeferimento ou não concessão de revisão de benefício, com termo inicial fixado no dia em que o segurado tomar conhecimento da decisão de deferimento ou indeferimento de revisão de benefício no âmbito administrativo.
6. Assim, o dispositivo da decisão proferida pelo STF no julgamento da ADI 6.096, interpretado à luz da delimitação do objeto da ação direta e da fundamentação do acórdão (isto é, a partir da conjugação de todos os elementos da decisão, como determina o art. 489, § 3º, do CPC), declara a inconstitucionalidade parcial, com redução de texto, do art. 24 da Lei 13.846/19, removendo do ordenamento jurídico as expressões do texto que dizem respeito tão somente à inserção de prazo decadencial para a revisão de ato de indeferimento, cancelamento ou cessação de benefício previdenciário.
7. Não houve declaração de inconstitucionalidade por arrastamento das demais situações previstas pelo art. 24 da Lei 13.846/19, porque inexiste entre elas e o prazo de decadência estabelecido para a revisão do ato de indeferimento inicial do benefício (inserção declarada inconstitucional pelo STF) uma relação hierárquica (fundante da validade). Além disso, o texto relativo às demais hipóteses normativas do enunciado do art. 24 da Lei 13.846/19 pode sobreviver, sem prejuízo estrutural ou semântico, à inconstitucionalidade do prazo decadencial para a revisão do ato de indeferimento inicial, pois não há um vínculo necessário de subordinação horizontal entre as situações preceitadas.
8. Nesse sentido, a partir da nova redação do art. 103 da Lei 8.213/91, dada pelo art. 24 da Lei 13.846/19, tornou-se mais evidente que o direito potestativo de revisão do segurado nasce em dois momentos distintos, em função de pressupostos fáticos diversos, e se destina a impugnar dois atos administrativos diferentes. O exercício de cada direito potestativo pressuporá, primeiro, o seu nascimento a partir da verificação no mundo dos fatos de hipóteses normativas diversas (ato administrativo de concessão e ato administrativo de deferimento ou indeferimento de revisão) e, segundo, estará sujeito a prazos decenais de decadência cuja contagem será iniciada a partir de termos iniciais também diversos.
9. Tal interpretação já era possível produzir a partir do trecho final da redação anterior do art. 103 da Lei de Benefícios, pela qual identificava-se a existência de um prazo decadencial distinto e autônomo para a revisão do ato que decide o pedido administrativo de revisão. O advento do art. 24 da Lei 13.846/19 vem sendo utilizado como vetor interpretativo para se chegar a essa compreensão, a exemplo do julgamento do Tema 256 pela TNU.
10. O direito potestativo de revisão do ato administrativo de concessão surge com a juridicização de seu suporte fático, qual seja, a decisão administrativa que concede o benefício, e seu exercício pelo segurado sujeita-se a prazo decadencial contado "do dia primeiro do mês subsequente ao do recebimento da primeira prestação". O direito potestativo de revisão do ato administrativo de deferimento ou indeferimento da revisão postulada pelo segurado, por sua vez, nasce com a juridicização de seu suporte fático, a edição do ato administrativo que decide o pedido revisional, e seu exercício sujeita-se a prazo decadencial contado "do dia em que o segurado tomar conhecimento da decisão de deferimento ou indeferimento de revisão de benefício, no âmbito administrativo".
11. É possível que o segurado venha a exercer o direito potestativo de revisão do ato de concessão do benefício por meio de mais de um pedido administrativo de revisão, porque variados são os elementos do ato concessório e do benefício previdenciário que poderão estar sujeitos a eventual impugnação. Assim, como cada decisão administrativa a ser tomada pelo INSS nos processos revisionais constituirá um ato administrativo próprio, o direito potestativo dele nascido será, por consequência, também autônomo em relação ao direito de revisão do ato concessório e em relação a cada ato de deferimento ou indeferimento de revisão, o que implica reconhecer que o direito potestativo de revisão exercido contra ato de deferimento ou indeferimento de revisão terá por limite a matéria objeto de revisão.
12. Como não há falar em suspensão ou interrupção do prazo de decadência porque o pedido de revisão formulado na esfera administrativa é o exercício, em si, do direito potestativo de revisão do ato concessório, negar a existência de um prazo decadencial autônomo para o segurado exercer o direito de revisão judicial do ato administrativo que decide o pedido de revisão implicaria reconhecer a inexistência de um prazo decadencial para o segurado revisar a decisão administrativa do processo revisional, o que possibilitaria a eternização indesejável da discussão em torno do ato administrativo, tendo em vista o grave comprometimento à segurança jurídica que essa interpretação acarretaria. Paralelamente a isso, não se pode cogitar validamente de um ato administrativo (ou mesmo de uma omissão administrativa) imune ao controle jurisdicional - o que na prática poderia se configurar bastando à Administração permanecer inerte em relação ao pedido revisional formulado pelo segurado até que transcorressem os 10 anos do prazo decadencial -, na medida em que tal interpretação implicaria afastar o controle de legalidade/juridicidade da atividade administrativa pelo Poder Judiciário, com evidente ofensa à garantia da inafastabilidade da jurisdição (art. 5º, XXXV, da CF).
13. A interpretação que reconhece a autonomia do direito potestativo e da contagem do prazo decadencial para a revisão pelo segurado do ato que defere ou indefere o pedido revisional guarda paralelismo com o direito assegurado ao INSS de anular, no exercício da autotutela administrativa e no prazo decadencial de dez anos, o ato administrativo que tenha deferido a revisão postulada pelo segurado (art. 103-A da Lei 8.213/91), estabelecendo-se, assim, um equilíbrio de forças na relação do segurado com a Administração previdenciária.
14. Enquanto a Administração não cumprir "o dever de explicitamente emitir decisão" sobre o pedido de revisão formulado (art. 48 da Lei 9.784/99), não correrá o prazo decadencial em desfavor do segurado. O beneficiário não deve ser penalizado pela mora da Previdência Social, que, por sua vez, não pode se beneficiar da própria omissão. Além do mais, enquanto perdurar o estado de indefinição decisória pela Administração previdenciária, sequer terá iniciado o prazo decadencial.
15. Tese jurídica fixada nos seguintes termos: I - O art. 103 da Lei 8.213/91 estabelece prazos decadenciais distintos e autônomos de 10 (dez) anos ao segurado para revisar o ato de concessão de benefício e para revisar o ato de deferimento ou indeferimento de pedido administrativo de revisão de benefício; II - O prazo decadencial para o segurado revisar o ato de concessão de benefício conta-se do dia primeiro do mês subsequente ao do recebimento da primeira prestação; III - O prazo decadencial para o segurado revisar o ato de deferimento ou indeferimento de pedido administrativo de revisão de benefício conta-se do dia em que o beneficiário tomar conhecimento da decisão administrativa, limita-se à impugnação da matéria que tenha sido objeto do processo administrativo revisional e não corre enquanto a Administração não cumprir o dever de decidir explicitamente o pedido de revisão.
16. Cabendo ao órgão colegiado julgar também o recurso que dá origem à assunção de competência admitida, conforme disposto no art. 947, §2º, do CPC, no caso concreto, deve ser provida a apelação, com a anulação da sentença e a devolução dos autos à origem para que seja retomado o trâmite regular da ação.
TRF 4ª, Incidente de Assunção de Competência (IAC) Nº 5056290-11.2018.4.04.7100, 3ª Seção do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, Desembargadora Federal relatora Tais Schilling Ferraz, 28.06.24.

ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 3ª Seção do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por maioria, vencidos a relatora e os Desembargadores Federais CELSO KIPPER, RICARDO TEIXEIRA DO VALLE PEREIRA e SEBASTIÃO OGÊ MUNIZ, dar provimento à apelação, com a anulação da sentença e a devolução dos autos à origem para que seja retomado o trâmite regular da ação, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Porto Alegre, 26 de junho de 2024.

RELATÓRIO
Trata-se de Incidente de Assunção de Competência (IAC) suscitado pela Sexta Turma deste Tribunal nos autos da AC Nº 5056290-11.2018.4.04.7100, objetivando uniformizar o entendimento das Turmas Previdenciárias sobre a possibilidade de se reconhecer que o pedido de revisão do ato de concessão de benefício previdenciário, apresentado no âmbito administrativo, produz efeitos no cálculo do prazo decadencial a que faz referência o art. 103 da Lei 8.213/91.

O IAC originou-se no seguinte julgamento, que esteve sob minha relatoria:

AÇÃO REVISIONAL. PRAZO DECADENCIAL. TEMA 975 DO STJ. EFEITOS SOBRE O PRAZO DO PEDIDO ADMINISTRATIVO DE REVISÃO. DIVERGÊNCIA NO ÂMBITO DA 3ª SEÇÃO SOBRE QUESTÃO JURIDICAMENTE RELEVANTE. SUSCITADO INCIDENTE DE ASSUNÇÃO DE COMPETÊNCIA. 1. O Superior Tribunal de Justiça, no julgamento dos REsp nºs 1648336/RS e 1644191/RS (Tema 975), submetidos ao rito dos recursos especiais repetitivos, decidiu que se aplica o prazo decadencial de dez anos estabelecido no art. 103, caput, da Lei 8.213/1991 às hipóteses em que a questão controvertida não foi apreciada no ato administrativo de análise de concessão de benefício previdenciário. 2. As turmas da 3ª Seção vêm decidindo, preponderantemente, pela plena incidência do julgado, inclusive aos casos em que, embora ajuizada a ação judicial após o prazo previsto no art. 103 da Lei 8.213/91, o segurado haja formulado pedido administrativo de revisão dentro do mesmo prazo, reconhecendo que a ratio decidendi, no julgamento do tema, ao ter incursionado sobre a natureza do prazo decadencial, aplicável aos direitos potestativos, foi expressa ao não admitir hipóteses de suspensão, interrupção ou renovação desse prazo. 3. Havendo, porém, focos de divergência quanto a essa interpretação, sob o entendimento de que o direito deve ser considerado tempestivamente exercido quando o segurado pede administrativamente a revisão dentro do prazo de 10 anos, ainda que a ação judicial seja ajuizada posteriormente, e em se tratando de tema de grande relevância jurídica, é conveniente e oportuna a afetação do tema à 3ª Seção, mediante incidente de assunção de competência, prestigiando-se a segurança jurídica e o debate em colegiado maior. 4. Suscitado incidente de assunção de competência, nos termos do §4º do art. 947 do Código de Processo Civil. (TRF4, APELAÇÃO CÍVEL Nº 5056290-11.2018.4.04.7100, 6ª Turma, Desembargadora Federal TAIS SCHILLING FERRAZ, POR UNANIMIDADE, JUNTADO AOS AUTOS EM 20/05/2021)

O Ministério Público Federal acostou manifestação sobre o mérito do presente incidente, opinando pelo reconhecimento de que o pedido de revisão na via administrativa não tem o condão de suspender ou de interromper o curso do prazo decadencial (evento 7, PARECER1).

O INSS apresentou razões (evento 9, DOC1) postulando: a) que seja inadmitido o Incidente de Assunção de Competência, por versar questão decidida com força vinculante no Tema repetitivo 975/STJ; b) pela eventualidade, que seja adotada a tese de que o prazo da Lei n. 8.213/1991, art. 103, por ser decadencial, não se interrompe nem se suspende e a sua incidência deve ser avaliada de forma autônoma em relação a cada pedido de revisão do ato de concessão do benefício previdenciário; c) que seja negado provimento à apelação da parte autora.

O Instituto Brasileiro de Direito Previdenciário – IBDP acostou petição solicitando sua intervenção no presente IAC como amicus curiae, ao fundamento de que o tema possui relevância social e previdenciária e que o IBDP possui representatividade e pertinência no trato da questão, sendo apto a contribuir para o debate. Na mesma oportunidade, apresentou os argumentos que entende pertinentes com relação ao tema em foco (evento 28, DOC1).

Admiti a intervenção do IBDP como amicus curiae.

O incidente foi admitido em 29/11/2023 (evento 77, ACOR1).

No evento 90, PET1 o IBDP requer a conversão do Incidente de Assunção de Competência em Incidente de Arguição de Inconstitucionalidade.

É o relatório.

VOTO
Sobre o pedido de conversão do IAC em Incidente de Arguição de Inconstitucionalidade

Pretende o Instituto Brasileiro de Direito Previdenciário a conversão do presente Incidente de Assunção de Competência em Incidente de Arguição de Inconstitucionalidade, a fim de que seja examinada a constitucionalidade do inciso II do art. 103 da Lei nº 8.213/91, com a redação atribuída pela Lei nº 13.846/2019.

Afirma que diante da ausência de fundamentação a respeito do mencionado inciso quando da apreciação da ADI nº 6.096 pelo Supremo Tribunal Federal, oportunidade em que a Corte Superior decidiu, sem restrição, no sentido da declaração de inconstitucionalidade do art. 24 da Lei nº 13.846/2019 no que deu nova redação ao art. 103 da Lei nº 8.213/1991, "os juízes e tribunais não poderão negar a aplicação do inc. II do art. 103 da Lei 8.213/1991 sem fazer jurisdição constitucional".

Destaco o teor da regra apontada:

Lei nº 8.213/91:
Art. 103. O prazo de decadência do direito ou da ação do segurado ou beneficiário para a revisão do ato de concessão, indeferimento, cancelamento ou cessação de benefício e do ato de deferimento, indeferimento ou não concessão de revisão de benefício é de 10 (dez) anos, contado:
(...)
II - do dia em que o segurado tomar conhecimento da decisão de indeferimento, cancelamento ou cessação do seu pedido de benefício ou da decisão de deferimento ou indeferimento de revisão de benefício, no âmbito administrativo. (grifei)

Verifico que este incidente, observados os limites de sua admissão, versa sobre a aplicação do prazo decadencial de 10 anos para a revisão do ato de concessão de benefício previdenciário, ponderando sobre a específica questão da possibilidade de sua suspensão, renovação ou novo prazo em virtude de tempestivo pedido revisional na via administrativa, de forma a garantir futuro ajuizamento de demanda revisional para além dos 10 anos.

Nesse contexto, entendo que o teor destacado do inciso II em comento, ainda que possa ser objeto de debate, não reclama incidente de inconstitucionalidade, Neste incidente examinamos os efeitos de um pedido revisional na via administrativa sobre a decadência ao passo que o inciso II apontado aponta os termos iniciais para o lapso decadencial. As questões, embora relacionadas, são distintas.

Entendo que, das duas uma: ou consideramos que o STF não nulificou, num arrastamento, o inciso II do art. 103 da Lei 8.213/91, caso em que temos que avaliar sua aplicabilidade, no contexto em que subsista, ou consideramos que o referido inciso seguiu o destino do restante do artigo em que inserido, nesse sentido interpretando a decisão do STF. Em qualquer dos casos, não há necessidade de se fazer, aqui, um juízo de constitucionalidade.

Diante do que já decidiu o STF quando da apreciação da ADI nº 6.096, que teve embargos de declaração rejeitados e trânsito em julgado em 03/08/2021, não vejo como acolher o pedido do IBDP.

Assim, decido pelo indeferimento do pedido de conversão do IAC em Incidente de Arguição de Inconstitucionalidade.

Do mérito do IAC

No caso, como visto, trata-se de ação previdenciária ajuizada em 21/09/2018, na qual se buscou a revisão de benefício concedido em 27/03/2002, com DIB fixada em 11/12/2001, e pagamento da primeira prestação em abril/2002 (processo 5056290-11.2018.4.04.7100/RS, evento 8, PROCADM1, p. 48). A pretensão é de revisão dos critérios de concessão, para acréscimo de tempo de serviço, com reflexos no valor da renda mensal inicial.

No julgamento dos REsp nºs 1.631.021/PR e 1.612.818/PR, sob a sistemática dos recursos repetitivos, o STJ concluiu, apreciando o Tema 966, que, sob a exegese do caput do artigo 103 da Lei 8.213/1991, incide o prazo decadencial para reconhecimento do direito adquirido a benefício previdenciário mais vantajoso.

Este o teor da ementa resultante do julgamento-paradigma:

PREVIDENCIÁRIO. RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. RECONHECIMENTO DO DIREITO ADQUIRIDO AO BENEFÍCIO MAIS VANTAJOSO. EQUIPARAÇÃO AO ATO DE REVISÃO. INCIDÊNCIA DO PRAZO DECADENCIAL. ARTIGO 103 CAPUT DA LEI 8.213/1991. TEMA 966. RECURSO ESPECIAL NÃO PROVIDO.
1. Cinge-se a controvérsia em saber se o prazo decadencial do caput do artigo 103 da Lei 8.213/1991 é aplicável aos casos de requerimento de um benefício previdenciário mais vantajoso, cujo direito fora adquirido em data anterior à implementação do benefício previdenciário ora em manutenção.
2. Em razão da natureza do direito tutelado ser potestativo, o prazo de dez anos para se revisar o ato de concessão é decadencial.
3. No âmbito da previdência social, é assegurado o direito adquirido sempre que, preenchidos os requisitos para o gozo de determinado benefício, lei posterior o revogue, estabeleça requisitos mais rigorosos para a sua concessão ou, ainda, imponha critérios de cálculo menos favoráveis ao segurado.
4. O direito ao beneficio mais vantajoso, incorporado ao patrimônio jurídico do trabalhador segurado, deve ser exercido por seu titular nos dez anos previstos no caput do artigo 103 da Lei 8.213/1991.
Decorrido o decênio legal, acarretará a caducidade do próprio direito. O direito pode ser exercido nas melhores condições em que foi adquirido, no prazo previsto no caput do artigo 103 da Lei 8.
213/1991.
5. O reconhecimento do direito adquirido ao benefício mais vantajoso equipara-se ao ato revisional e, por isso, está submetido ao regramento legal. Importante resguardar, além da segurança jurídica das relações firmadas com a previdência social, o equilíbrio financeiro e atuarial do sistema previdenciário.
6. Tese delimitada em sede de representativo da controvérsia: sob a exegese do caput do artigo 103 da Lei 8.213/1991, incide o prazo decadencial para reconhecimento do direito adquirido ao benefício previdenciário mais vantajoso.
7. Recurso especial do segurado conhecido e não provido. Observância dos artigos 1.036 a 1.041 do CPC/2015.
(REsp nºs 1.631.021/PR e 1.612.818/PR, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, DJe 13/03/2019)

Em julgamento posterior, ao julgar o tema 975, o STJ deixou claro que a solução é a mesma, ainda que não tenha havido discussão, no ato de concessão do benefício, sobre a pretensão que dá ensejo ao processo judicial.

A Primeira Seção do STJ, ao julgar os REsp nºs 1648336/RS e 1644191/RS pela sistemática dos recursos repetitivos, reconheceu a fluência do prazo decadencial do art. 103 da Lei 8.213/91, ainda que o pedido, ora formulado em juízo, não tenha sido examinado expressamente pela Administração quando da concessão do benefício.

O acórdão, publicado em 04/08/2020, vem assim ementado:

PREVIDENCIÁRIO. CONTROVÉRSIA SUBMETIDA AO REGIME DOS ARTS. 1.036 E SEGUINTES DO CPC/2015. TEMA 975/STJ. REGIME GERAL DE PREVIDÊNCIA SOCIAL. BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO. REVISÃO DO ATO DE CONCESSÃO. QUESTÕES NÃO DECIDIDAS. DECADÊNCIA ESTABELECIDA NO ART. 103 DA LEI 8.213/1991. CONSIDERAÇÕES SOBRE OS INSTITUTOS DA DECADÊNCIA E DA PRESCRIÇÃO. AFASTAMENTO DA APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO DA ACTIO NATA.
IDENTIFICAÇÃO DA CONTROVÉRSIA
1. Trata-se de Recurso Especial (art. 105, III, "a" e "c", da CF/1988) em que se alega que incide a decadência mencionada no art. 103 da Lei 8.213/1991, mesmo quando a matéria específica controvertida não foi objeto de apreciação no ato administrativo de análise de concessão de benefício previdenciário.
2. A tese representativa da controvérsia, admitida no presente feito e no REsp 1.644.191/RS, foi assim fixada (Tema 975/STJ): "questão atinente à incidência do prazo decadencial sobre o direito de revisão do ato de concessão de benefício previdenciário do regime geral (art. 103 da Lei 8.213/1991) nas hipóteses em que o ato administrativo da autarquia previdenciária não apreciou o mérito do objeto da revisão."
FUNDAMENTOS DA RESOLUÇÃO DA CONTROVÉRSIA
3. É primordial, para uma ampla discussão sobre a aplicabilidade do art. 103 da Lei 8.213/1991, partir da básica diferenciação entre prescrição e decadência.
4. Embora a questão seja por vezes tormentosa na doutrina e na jurisprudência, há características inerentes aos institutos, das quais não se pode afastar, entre elas a base de incidência de cada um deles, fundamental para o estudo da decadência do direito de revisão dos benefícios previdenciários.
5. A prescrição tem como alvo um direito violado, ou seja, para que ela incida deve haver controvérsia sobre o objeto de direito consubstanciada na resistência manifestada pelo sujeito passivo, sendo essa a essência do princípio da actio nata (o direito de ação nasce com a violação ao direito). Essa disciplina está disposta no art. 189 do CC: "art. 189. Violado o direito, nasce para o titular a pretensão, a qual se extingue, pela prescrição, nos prazos a que aludem os arts. 205 e 206."
6. Por subtender a violação do direito, o regime prescricional admite causas que impedem, suspendem ou interrompem o prazo prescricional, e, assim como já frisado, a ação só nasce ao titular do direito violado.
7. Já a decadência incide sobre os direitos exercidos independentemente da manifestação de vontade do sujeito passivo do direito, os quais são conhecidos na doutrina como potestativos. Dessarte, para o exercício do direito potestativo e a consequente incidência da decadência, desnecessário haver afronta a esse direito ou expressa manifestação do sujeito passivo para configurar resistência, pois o titular pode exercer o direito independentemente da manifestação de vontade de terceiros. 8. Não há falar, portanto, em impedimento, suspensão ou interrupção de prazos decadenciais, salvo por expressa determinação legal (art. 207 do CC).
9. Por tal motivo, merece revisão a corrente que busca aplicar as bases jurídicas da prescrição (como o princípio da actio nata) sobre a decadência, quando se afirma, por exemplo, que é necessário que tenha ocorrido a afronta ao direito (explícito negativa da autarquia previdenciária) para ter início o prazo decadencial.
10. Como direito potestativo que é, o direito de pedir a revisão de benefício previdenciário prescinde de violação específica do fundo de direito (manifestação expressa da autarquia sobre determinado ponto), tanto assim que a revisão ampla do ato de concessão pode se dar haja ou não ostensiva análise do INSS. Caso contrário, dever-se-ia impor a extinção do processo sem resolução do mérito por falta de prévio requerimento administrativo do ponto não apreciado pelo INSS.
11. Isso é reforçado pelo art. 103 da Lei 8.213/1991, que estabelece de forma específica o termo inicial para o exercício do direito potestativo de revisão quando o benefício é concedido ("a contar do dia primeiro do mês seguinte ao do recebimento da primeira prestação") ou indeferido ("do dia em que tomar conhecimento da decisão indeferitória definitiva no âmbito administrativo").
12. Fosse a intenção do legislador exigir expressa negativa do direito vindicado, teria ele adotado o regime prescricional para fulminar o direito malferido. Nesse caso, o prazo iniciar-se-ia com a clara violação do direito e aplicar-se-ia o princípio da actio nata.
13. Não é essa compreensão que deve prevalecer, já que, como frisado, o direito que se sujeita a prazo decadencial independe de violação para ter início.
14. Tais apontamentos corroboram a tese de que a aplicação do prazo decadencial independe de formal resistência da autarquia e representa o livre exercício do direito de revisão do benefício pelo segurado, já que ele não se subordina à manifestação de vontade do INSS.
15. Considerando-se, por fim, a elasticidade do lapso temporal para os segurados revisarem os benefícios previdenciários, a natureza decadencial do prazo (não aplicação do princípio da actio nata) e o princípio jurídico básico de que ninguém pode alegar desconhecimento da lei (art. 3º da LINDB), conclui-se que o prazo decadencial deve ser aplicado mesmo às questões não tratadas no ato de administrativo de análise do benefício previdenciário.

O Relator do acórdão paradigma, Ministro Herman Benjamin, assim se pronunciou em seu voto:

(...)
É primordial, para uma ampla discussão sobre a aplicabilidade do art. 103 da Lei 8.213/1991, partir da básica diferenciação entre prescrição e decadência.
Embora a questão seja por vezes tormentosa na doutrina e na jurisprudência, há características inerentes aos institutos, das quais não se pode afastar, entre elas a base de incidência de cada um deles, fundamental para o estudo da decadência do direito de revisão dos benefícios previdenciários.
A prescrição tem como alvo um direito violado, ou seja, para que ela incida deve haver controvérsia sobre o objeto de direito consubstanciada na resistência manifestada pelo sujeito passivo, sendo essa a essência do princípio da actio nata (o direito de ação nasce com a violação ao direito). Essa disciplina está disposta art. 189 do CC: "art. 189. Violado o direito, nasce para o titular a pretensão, a qual se extingue, pela prescrição, nos prazos a que aludem os arts. 205 e 206."
Por subtender a violação do direito, o regime prescricional admite causas que impedem, suspendem ou interrompem o prazo prescricional, e, assim como já frisado, a ação só nasce ao titular do direito violado.
Já a decadência incide sobre os direitos exercidos independentemente da manifestação de vontade do sujeito passivo do direito, os quais são conhecidos na doutrina como potestativos. Assim, para o exercício do direito potestativo e a consequente incidência da decadência, desnecessário haver afronta a esse direito ou expressa manifestação do sujeito passivo para configurar resistência, pois o titular pode exercer o direito independentemente da manifestação de vontade de terceiros.
Não há falar, portanto, em impedimento, suspensão ou interrupção de prazos decadenciais, salvo por expressa determinação legal (art. 207 do CC).
O direito de revisar o benefício previdenciário foi qualificado como potestativo pelo legislador, conforme o art. 103 da Lei 8.213/1991, o que significa que o exercício do direito revisional na seara administrativa ou judicial pelo segurado prescinde da manifestação de vontade do INSS, bastando que haja concessão ou indeferimento de um benefício previdenciário.
Por tal motivo, merece revisão a corrente que busca aplicar as bases jurídicas da prescrição (como o princípio da actio nata) sobre a decadência, quando se afirma, por exemplo, que é necessário que tenha ocorrido a afronta ao direito (expressa negativa da autarquia previdenciária) para ter início o prazo decadencial.
Como direito potestativo que é, o direito de pedir a revisão de benefício previdenciário independe de violação específica do fundo de direito (manifestação expressa da autarquia sobre determinado ponto), tanto assim que a revisão ampla do ato de concessão pode ser realizada independentemente de haver expressa análise do INSS. Caso contrário, dever-se-ia impor a extinção do processo sem resolução do mérito por falta de prévio requerimento administrativo do ponto não apreciado pelo INSS.
Isso é reforçado pelo art. 103 da Lei 8.213/1991, que estabelece de forma específica o termo inicial para o exercício do direito potestativo de revisão quando o benefício é concedido ("a contar do dia primeiro do mês seguinte ao do recebimento da primeira prestação") ou indeferido ("do dia em que tomar conhecimento da decisão indeferitória definitiva no âmbito administrativo").
Fosse a intenção do legislador exigir expressa negativa do direito vindicado, teria adotado o regime prescricional para fulminar o direito malferido. Nesse caso, o prazo iniciar-se-ia com a violação expressa do direito e aplicar-se-ia o princípio da actio nata.
Sob a perspectiva aqui proposta, o regime decadencial impingido ao direito de revisão é muito mais benéfico ao segurado do que é o regime prescricional, pois, além de ter prazo de 10 anos — elástico se comparado aos demais prazos do ordenamento jurídico —, pode ser exercido independentemente de a autarquia ter-se oposto expressamente ao ponto objeto de inconformidade.
Isso está alinhado com o entendimento doutrinário e jurisprudencial de que é obrigação do INSS conceder o melhor benefício previdenciário possível ao segurado, nisso incluída a adoção do melhor regime jurídico adquirido aplicável.
(...)
O Supremo Tribunal Federal tem sinalizado no mesmo sentido, de forma a aplicar o prazo decadencial do art. 103 da Lei 8.213/1991 independentemente de o objeto da revisão judicial ter sido apreciado administrativamente. A propósito: ARE 845.209 AgR, Relator: Min. MARCO AURÉLIO, Primeira Turma, julgado em 9/12/2014, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-021 DIVULG 30-01-2015 PUBLIC 02-02-2015); ARE 1.045.210, Relator: Min. LUIZ FUX, julgado em 26/06/2017, publicado em PROCESSO ELETRÔNICO DJe-142 DIVULG 28/06/2017 PUBLIC 29/06/2017; ARE 921.149/SC, Rel. Min. Cármen Lúcia (decisão monocrática), Segunda Turma, DJe 27.11.2015; RE 983.372/SC, Rel. Min. Rosa Weber (decisão monocrática), Primeira Turma, DJe 18.8.2016; e ARE 999.206 ED, Relator: Min. MARCO AURÉLIO, julgado em 18/11/2016, publicado em PROCESSO ELETRÔNICO DJe-251 DIVULG 24/11/2016 PUBLIC 25/11/2016.
(...)
Com relação às teses que defendem a essencialidade do direito e o rigorismo excessivo para com o segurado do Regime Geral de Previdência Social, o ponto que eu gostaria de destacar é que o legislador, já considerando a natureza básica alimentar dos benefícios previdenciários, estabeleceu prazo privilegiado de dez anos para o exercício do direito de revisão de benefício.
Considero privilegiado o regime porque o lapso de tempo que fulmina outros direitos relacionados a verbas alimentares é, em regra, de até cinco anos, a exemplo: a) prescrição em cinco anos para os direitos trabalhistas dos servidores públicos, assim como para a revisão de proventos da inatividade (art. 1º do Decreto 20.910/1932); b) prescrição em dois anos para entrar com ação para recebimento de direitos trabalhistas celetistas após a extinção do contrato, retroagindo-se o pagamento das diferenças a cinco anos antes do ajuizamento (art. 11 da CLT); e c) prescrição em dois anos da pretensão para a cobrança de alimentos já fixados em sentença ou ato voluntário (art. 206, § 2°, do Código Civil).
Tendo em conta, por fim, a elasticidade do lapso temporal para os segurados revisarem os benefícios previdenciários, a natureza decadencial do prazo (não aplicação do princípio da acio nata) e o princípio jurídico básico de que ninguém pode alegar o desconhecimento da lei (art. 3º da LINDB), conclui-se que o prazo decadencial deve ser aplicado mesmo às questões não tratadas no ato administrativo de análise do benefício previdenciário.

O precedente do Superior Tribunal de Justiça, originado do Tema 975, é de natureza vinculante e, em sua ratio decidendi, está claro que o prazo para pedir a revisão do ato de concessão do benefício flui independentemente de prévia provocação da Administração para que se pronuncie sobre a questão.

Toda a construção dos fundamentos determinantes do julgado está assentada na natureza decadencial do prazo aplicado aos direitos potestativos, que podem ser exercidos independentemente da manifestação do sujeito passivo e, por essa razão, têm prazos extintivos, em prestígio à segurança jurídica.

A respectiva ratio decidendi se aplica ao caso dos autos.

O Superior Tribunal de Justiça afastou, nos julgados antes transcritos, de forma expressa, a teoria da actio nata, aplicável apenas à prescrição e que exige violação de direito para o nascimento da pretensão. Essa teoria é que seria compatível com suspensão, interrupção, impedimento e renovação de prazo.

O ponto nodal a ser examinado no presente incidente está relacionado à movimentação da seara administrativa para obter a revisão do benefício e sua consequência na contagem do prazo decadencial.

Diversas controvérsias já enfrentadas pelos tribunais superiores, guardam relação com a questão aqui debatida e todas foram solucionadas a partir do pressuposto de que o prazo para a revisão do ato de concessão do benefício previdenciário é de natureza decadencial. A seguir se retoma algumas delas:

Saber se o prazo para o pensionista postular o direito à revisão do benefício originário corre a partir da concessão do referido benefício ou da concessão da pensão por morte (Tema 1.057/STJ);

Saber se a Lei 10.999/2004, que resultou da MP 201/2004, autorizando a revisão dos benefícios concedidos a partir de março de 1994, com a inclusão do IRSM de fevereiro de 1994, produziu efeitos sobre o prazo decadencial para a revisão dos benefícios, cuja renda mensal fora alcançada pela aplicação de índice menor que o devido (v.g. REsp 1.717.533, j. 07/11/2019; AREsp 1.555.456, j. 23/09/2019; e Tema nº 130/TNU);
Saber se o prazo de decadência previsto no art. 103 da Lei 8.213 alcança pedidos de revisão fundados em questão não examinada quando da concessão do benefício (Tema 975/STJ);
Saber se o direito ao melhor benefício, com base na melhor DIB, corre inclusive nos casos de direito adquirido (Tema 966/STJ).

Todas essas controvérsias foram decididas de forma contrária ao que pretendiam os segurados, porque se entendeu que o prazo para o exercício do direito de revisão é decadencial, na sua essência, e que flui em decorrência de direito potestativo e não do direito a uma prestação. Assim, em resposta às questões acima, proclamou-se que: 1) o direito de pedir a revisão do ato de concessão da pensão por morte, se depender da revisão do ato de concessão do benefício originário, tem prazo que flui desde esta primeira concessão; 2) a lei que determinou a revisão dos benefícios, para a inclusão do IRSM como fator de correção monetária de salários de contribuição, não interrompeu o prazo para os segurados pedirem a revisão de seus benefícios; 3) a circunstância de não ter sido debatida determinada questão quando da concessão do benefício não impede a fluência do prazo de revisão, nem faz surgir para o segurado novo prazo decadencial, ao se aperceber que seu benefício poderia ter sido melhor calculado; 4) o direito adquirido ao melhor benefício, reconhecido pelo STF em precedente vinculante, não é causa impeditiva da fluência do prazo decadencial para a revisão do benefício.

Discorrendo sobre o tema, em sua dissertação de mestrado, a juíza Luciane Merlin Kravetz afirma que o direito potestativo consiste em um poder que a lei atribui ao titular de influir sobre a situação jurídica de terceiro, independentemente de seu consentimento. Diferentemente do direito a uma prestação, o direito potestativo se impõe e coloca a outra parte em estado de sujeição, podendo ser exercido por uma ação constitutiva (KRAVETZ, Luciane M. Desorientação Jurisprudencial: como as decisões do Superior Tribunal de Justiça na área previdenciária podem prejudicar a formação de precedentes. Dissertação (Mestrado em Direito). São Paulo: FGV, 187p. 2021).

Mais adiante, no mesmo trabalho de conclusão, a ilustre colega invoca o magistério de Schreiber, para explicar as razões pelas quais os prazos decadenciais não se suspendem nem se interrompem:

“Os prazos de decadência, já se disse, são fatais. Vale dizer: não se sujeitam às causas de impedimento, suspensão ou interrupção que o legislador prevê para a prescrição. Tais causas correspondem, em apertada síntese, a situações em que o legislador ordena a paralisação ou o reinício da contagem do prazo prescricional por entender que o titular da pretensão não podia agir ou já agiu de modo suficiente para obter a realização da prestação pelo devedor. Por exemplo, o prazo prescricional não corre “entre os cônjuges, na constância da sociedade conjugal” (art. 197, I) e é interrompido na hipótese de realização de “protesto cambial” pelo credor (art. 202, III). Nenhuma dessas situações se aplica aos prazos decadenciais. Isso porque, em se tratando de direito potestativo, de duas uma: ou (i) o titular não age e o prazo decadencial segue seu curso; ou (ii) o titular age e seu direito é automaticamente atendido, não havendo que se falar em reinício ou retomada do prazo decadencial. Em outras palavras: não há qualquer razão para se impedir, suspender ou interromper a fluência do prazo decadencial à espera de um comportamento do devedor, porque não se está diante do direito a uma prestação, mas sim de um direito de interferência unilateral na esfera jurídica alheia.” (SCHREIBER. Direito civil e constituição. São Paulo: Atlas, 2013. p. 83) grifei.

Faço apenas uma ressalva à construção acima. Quando se diz que nos direitos potestativos o titular age e seu direito é automaticamente atendido, é preciso considerar que alguns direitos potestativos esgotam-se na simples possibilidade de formular um pedido, como ocorre quando um dos cônjuges quer anular um casamento. A posterior possibilidade ou não de anulação não interfere no direito potestativo de buscá-la. De acrescentar que um mesmo ato jurídico pode estar vinculado a um prazo decadencial e um outro prescricional, sendo que o primeiro se dirige ao exercício do direito de buscar um resultado (direito potestativo), ainda que este resultado, para ser alcançado, dependa de uma prestação de parte de alguém (direito subjetivo e prestacional), a gerar uma pretensão, sujeita, aí sim, à prescrição.

Daí que o direito de pedir revisão de benefício é potestativo e independe do atendimento do pedido pelo INSS (direito a uma prestação, sujeito, portanto, à prescrição), da mesma forma que o exercício do direito de pedir a anulação de um contrato, independe da concordância do outro contratante ou do direito de entrar com rescisória independe do reconhecimento do pedido pelo réu. Em se tratando de direito potestativo, não se espera da pessoa, em face de quem o direito é exercido, qualquer comportamento prestacional, apenas que se sujeite à decisão do titular do direito; no caso, a decisão do segurado de pedir a revisão.

O autor exerceu o direito de pedir a revisão, perante o INSS, antes do decurso do prazo de 10 anos. Seu pedido, porém, não foi atendido e, pelo que se observa dos documentos juntados, sequer foi processado. Ele, então, ingressou com a presente ação judicial, passados, já, muito mais que 10 anos contados da concessão do benefício.

O exercício do direito de pedir a revisão, na via administrativa não produziu interrupção nem suspensão do prazo decadencial, nem impediu sua fluência até que realizada a mesma tentativa pela via judicial.

A defesa do afastamento da prejudicial de decadência, aparentemente, não dependeria do reconhecimento de hipótese de interrupção, suspensão ou impedimento de fluência do prazo de decadência, pois passaria pela hipótese de que existiriam dois termos iniciais para contagem do prazo de 10 anos para revisão do ato de concessão do benefício: o primeiro, a contar do dia primeiro do mês seguinte ao recebimento da primeira prestação; e o segundo a contar do indeferimento definitivo do pedido de revisão que tenha sido formulado no âmbito administrativo.

O argumento, porém, não é sustentável. O ato que se quer revisar é um só e ele data de muito mais do que 10 anos, contados retroativamente do ajuizamento da ação.

Analisa-se a seguir, de qualquer forma, se a lei de benefícios, em algum momento, teria criado um direito potestativo autônomo, dirigido à revisão do ato de indeferimento da revisão do ato de concessão do benefício, vale dizer: se a lei prevê (ou previu) o direito potestativo de pedir a revisão da decisão de indeferimento do pedido de revisão do ato concessório. Leia-se o teor do dispositivo, que foi submetido à questionamento quanto à respectiva constitucionalidade, perante o STF:

Art. 103. O prazo de decadência do direito ou da ação do segurado ou beneficiário para a revisão do ato de concessão, indeferimento, cancelamento ou cessação de benefício e do ato de deferimento, indeferimento ou não concessão de revisão de benefício é de 10 (dez) anos, contado:
I - do dia primeiro do mês subsequente ao do recebimento da primeira prestação ou da data em que a prestação deveria ter sido paga com o valor revisto; ou (Incluído pela Lei nº 13.846, de 2019)
II - do dia em que o segurado tomar conhecimento da decisão de indeferimento, cancelamento ou cessação do seu pedido de benefício ou da decisão de deferimento ou indeferimento de revisão de benefício, no âmbito administrativo. (Incluído pela Lei nº 13.846, de 2019)

Tal redação previu que o segurado teria:

1. 10 anos para pedir revisão do ato de concessão, indeferimento, cancelamento ou cessação de benefício e

2. 10 anos para pedir a revisão do ato de deferimento ou indeferimento de pedido de revisão de benefício.

Na primeira hipótese, a lei se dirige à concessão do benefício.

Na segunda hipótese, a lei se dirige à eventual decisão que deferiu ou indeferiu a revisão de um benefício já concedido.

A Lei 13.846/2019 previu um prazo específico de decadência para o segurado buscar a revisão da decisão em um prévio pedido de revisão dos critérios de manutenção de um benefício em manutenção. Coerente com este entendimento é o termo inicial para requerer a revisão de cada um desses atos: no primeiro caso, o prazo se reporta ao momento da concessão, enquanto que na hipótese da revisão de um benefício em manutenção, o prazo se reporta ao ato de indeferimento ou deferimento dessa revisão.

Até essa alteração legislativa, não se cogitava de decadência para o pedido de revisão de decisão que deferiu ou indeferiu a revisão.

Eis a redação anterior:

Art. 103. É de dez anos o prazo de decadência de todo e qualquer direito ou ação do segurado ou beneficiário para a revisão do ato de concessão de benefício, a contar do dia primeiro do mês seguinte ao do recebimento da primeira prestação ou, quando for o caso, do dia em que tomar conhecimento da decisão indeferitória definitiva no âmbito administrativo.

O STF, na ADI 6096, decidiu pela inconstitucionalidade da tentativa feita pelo legislador, através da Lei 13.846/2019, ao alterar o art. 103 da Lei 8.213/91, de estabelecer um prazo fatal para o exercício do direito de o segurado buscar um benefício previdenciário, na hipótese de ter havido indeferimento, cessação ou cancelamento do próprio pedido de benefício.

O STF, reafirmando entendimento que já havia adotado em outros julgamentos, considerou inconstitucional fulminar a pretensão de revisar ato de indeferimento, cancelamento ou cessação, por comprometer o direito fundamental à obtenção de benefício previdenciário (núcleo essencial do fundo do direito), em ofensa ao art. 6º da Constituição da República, reafirmando que o prazo de 10 anos destina-se apenas à revisão dos aspectos do ato de concessão do benefício, com o objetivo de modificar o valor da renda inicial.

Na referida ADI, a Suprema Corte declarou inconstitucional o art. 24 da Lei 13.846/2019 no que deu nova redação ao art. 103 da Lei 8.213/91.

Ainda que o STF não tenha se debruçado especificamente sobre a decadência da revisão do pedido de revisão, decidiu pela declaração de inconstitucionalidade com redução de texto, de forma que resulta sem validade a norma inquinada, retomando-se a vigência da redação anterior do art. 103 da Lei de Benefícios, o que não favorece o segurado, já que tal redação não assegura um novo direito potestativo de buscar a revisão da negativa de revisão do ato de concessão (para alterar a respectiva gradação econômica).

A prever um novo prazo decadencial para o segurado buscar a revisão da gradação inicial de seu benefício, que fluiria de uma decisão de indeferimento de anterior pedido revisional formulado na via administrativa, o legislador estaria dando tratamento de prescrição a uma situação de decadência, estaria adotando o pressuposto de que houve uma nova violação de direito. Porém a renovação da violação do direito não faria renascer direito potestativo, mas sim nova pretensão.

Ainda que tenha havido um pedido revisional na via administrativa, é do mesmo ato administrativo de concessão de benefício que se trata e a ele se reporta o início do prazo decadencial. A eventual negativa administrativa de revisão sequer teria o condão de criar um novo prazo. Não se aplica, aqui, a teoria da actio nata.

Um exemplo pode tornar mais claro este efeito: Uma ação rescisória ajuizada no prazo decadencial de 2 anos e julgada improcedente ou extinta, não faz renascer o prazo para a rescisão da decisão rescindenda. O máximo que se admite é uma rescisória da própria decisão na ação rescisória, desde que presente algum dos pressupostos legais.

Com essas considerações, entendo que a controvérsia deve ser solucionada no sentido de que se fixar a seguinte tese jurídica:

O direito de requerer judicialmente a revisão do ato de concessão de benefício previdenciário decai em 10 anos, nos termos do art. 103 da Lei 8.213/91, contados ininterruptamente do primeiro dia do mês seguinte ao do pagamento da primeira prestação, prazo que não se suspende, interrompe nem tem sua fluência impedida pela formulação, ainda que dentro do período legal, de pedido revisional na via administrativa.

O caso concreto

Antônio dos Santos obteve, em 27/03/2002, o benefício nº 119450803-8 com DIB em 11/12/2001 e RMI de R$ 654,31 (processo 5056290-11.2018.4.04.7100/RS, evento 1, DOC10). O primeiro pagamento do benefício ocorreu em abril/2002 (processo 5056290-11.2018.4.04.7100/RS, evento 8, PROCADM1, p. 48).

Na data de 07/06/2010, formulou pedido de revisão do ato concessório na via administrativa, ocasião em que pretendia reconhecimento e averbação de períodos de especialidade a fim de ser concedido o benefício mais vantajoso (processo 5056290-11.2018.4.04.7100/RS, evento 1, INF_REV_BEN9).

Não obtendo sucesso (sequer processamento do pedido), o autor, em 21/09/2018, ingressou com a presente ação, na qual buscou a revisão de benefício.

Considerando que a presente ação foi ajuizada mais de dez anos após o mês subsequente ao pagamento da primeira parcela do benefício, e tendo em conta que o pedido administrativo de revisão não interrompe, suspende ou impede a fluência do prazo decadencial, nem faz nascer novo direito revisional, impõe-se o reconhecimento da decadência do direito, mantendo-se, portanto, a sentença de primeiro grau.

Sendo assim, quanto ao mérito do pedido, voto por negar provimento à apelação da parte autora.

Dispositivo

Ante o exposto, voto por indeferir o pedido de conversão do IAC em Incidente de Arguição de Inconstitucionalidade, e consolidar a seguinte tese para os efeitos do art. 947, § 3º, do CPC/2015:

O direito de requerer judicialmente a revisão do ato de concessão de benefício previdenciário decai em 10 anos, nos termos do art. 103 da Lei 8.213/91, contados ininterruptamente do primeiro dia do mês seguinte ao do pagamento da primeira prestação, prazo que não se suspende, interrompe nem tem sua fluência impedida pela formulação, dentro do período legal, de pedido revisional na via administrativa.

E, no caso concreto, voto por negar provimento à apelação.

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Rio Grande, Rio Grande do Sul, Brazil
Especialista em Direito Previdenciário, pela Universidade de Caxias do Sul - UCS, em parceria com a ESMAFE - Escola da Magistratura Federal, em 2009. Formado em janeiro de 2006, pela FURG - Fundação Universidade do Rio Grande, em direito. Este blog tem o objetivo de divulgar o conteúdo previdenciário de maneira gratuita para que todos possam ter acesso as informações sobre esta matéria.

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