sexta-feira, 4 de março de 2022

Jurisprudência trata sobre o início do benefício quando concedido judicialmente

Nesta sexta-feira será visto uma decisão da Turma Nacional de Uniformização representativa de controvérsia que gerou o tema 246 com a seguinte redação "I - Quando a decisão judicial adotar a estimativa de prazo de recuperação da capacidade prevista na perícia, o termo inicial é a data da realização do exame, sem prejuízo do disposto no art. 479 do CPC, devendo ser garantido prazo mínimo de 30 dias, desde a implantação, para viabilizar o pedido administrativo de prorrogação. II - quando o ato de concessão (administrativa ou judicial) não indicar o tempo de recuperação da capacidade, o prazo de 120 dias, previsto no § 9º, do art. 60 da Lei 8.213/91, deve ser contado a partir da data da efetiva implantação ou restabelecimento do benefício no sistema de gestão de benefícios da autarquia.". Abaixo segue a decisão para análise dos amigos.

EMENTA
PEDIDO DE UNIFORMIZAÇÃO DE INTERPRETAÇÃO DE LEI. REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. TEMA 246. BENEFÍCIO POR INCAPACIDADE. CONCESSÃO POR DETERMINAÇÃO JUDICIAL. DATA DA CESSAÇÃO DO BENEFÍCIO. ESTIMATIVA NO LAUDO. TERMO A QUO. DATA DO EXAME PERICIAL. AUSÊNCIA DE ESTIMATIVA. 120 DIAS CONTADOS DA DATA DA IMPLANTAÇÃO. PEDIDO ADMINISTRATIVO DE PRORROGAÇÃO. NECESSIDADE. INCIDENTE CONHECIDO E PROVIDO.
1. A micropolítica pública dos benefícios por incapacidade está baseada em dois pontos centrais: (i.) o auxílio-doença deve ser concedido com uma previsão de data de cessação; e (ii.) o segurado tem o direito a pedir a prorrogação do benefício.
2. A redação dos parágrafos 8º e 9º, art. 60 da Lei 8.213/91 refere-se à fixação de um prazo estimado para a duração do benefício. Apesar disso, há substancial diferença entre os dois dispositivos.
3. Quando estima um momento de recuperação da capacidade de trabalho, o perito projeta o prazo a partir da data do exame. Em outras palavras, o expert informa o prazo que considera suficiente para a recuperação da capacidade de trabalho considerando como termo a quo a data em que faz a análise pericial. Por esse motivo, não faz qualquer sentido computar o prazo de recuperação identificado pelo perito a partir da implantação do benefício, evento completamente fora do controle do expert, especialmente, no âmbito judicial.
4. Entretanto, quando não há a estimativa do momento de recuperação da capacidade, o prognóstico é substituído pela presunção legal estabelecida no § 9º, do art. 60 da Lei 8.213/91, sendo fixada a data de cessação do benefício no “prazo de cento e vinte dias, contado da data de concessão ou de reativação do auxílio-doença”.
5. A estimativa da cessação do benefício, seja em razão do prognóstico, seja por presunção legal, não pode configurar um obstáculo à manutenção da prestação previdenciária, quando o fato gerador do benefício permanecer presente. Tanto o prognóstico, quanto a presunção cedem diante da realidade. Por isso, é essencial oportunizar ao segurado a apresentação de pedido de prorrogação do auxílio-doença, como previsto no § 9º, do art. 60 da Lei 8.213/91 e no § 2º, do art. 78 do Decreto 3.048/99.
6. TESE (TEMA 246): I - Quando a decisão judicial adotar a estimativa de prazo de recuperação da capacidade prevista na perícia, o termo inicial é a data da realização do exame, sem prejuízo do disposto no art. 479 do CPC, devendo ser garantido prazo mínimo de 30 dias, desde a implantação, para viabilizar o pedido administrativo de prorrogação. II - Quando o ato de concessão (administrativa ou judicial) não indicar o tempo de recuperação da capacidade, o prazo de 120 dias, previsto no § 9º, do art. 60 da Lei 8.213/91, deve ser contado a partir da data da efetiva implantação ou restabelecimento do benefício no sistema de gestão de benefícios da autarquia.
7. Incidente conhecido e provido.
TNU, PEDILEF 0500881-37.2018.4.05.8204/PB, Juiz federal relator do acórdão Fábio Souza, 24/11/2020.

ACÓRDÃO
A Turma Nacional de Uniformização decidiu, por unanimidade DAR PROVIMENTO ao incidente, fixando, por maioria, a tese proposta nos termos do voto do Juiz Federal FÁBIO SOUZA, nos seguintes termos: "I - Quando a decisão judicial adotar a estimativa de prazo de recuperação da capacidade prevista na perícia, o termo inicial é a data da realização do exame, sem prejuízo do disposto no art. 479 do CPC, devendo ser garantido prazo mínimo de 30 dias, desde a implantação, para viabilizar o pedido administrativo de prorrogação. II - Quando o ato de concessão (administrativa ou judicial) não indicar o tempo de recuperação da capacidade, o prazo de 120 dias, previsto no § 9º, do art. 60 da Lei 8.213/91, deve ser contado a partir da data da efetiva implantação ou restabelecimento do benefício no sistema de gestão de benefícios da autarquia.". Vencidos parcialmente o Juiz Relator e os Juízes Federais ERIVALDO RIBEIRO DOS SANTOS, ATANAIR NASSER LOPES E PAULO CEZAR NEVES JUNIOR. Pedido de Uniformização julgado como representativo da controvérsia (Tema 246).

Brasília, 20 de novembro de 2020.

RELATÓRIO
Trata-se de incidente de uniformização, suscitado pelo ente público, pretendendo a reforma de acórdão oriundo de Turma Recursal que, mantendo a sentença, entendeu que, para fins de fixação da DCB do auxílio-doença concedido judicialmente, o prazo de recuperação estimado pelo perito judicial deve ser computado a partir da data de sua efetiva implantação, e não da data da perícia judicial.

Na espécie, a perícia judicial, realizada no dia 06/06/2018, concluiu que o segurado necessita do prazo de 180 dias para o restabelecimento de sua capacidade laborativa, tendo as instâncias ordinárias fixado o início desse prazo a partir de sua efetiva implantação, com pagamento dos valores atrasados desde a DER.

O acórdão recorrido, no ponto em que é atacado pelo presente recurso, após examinar os documentos e argumentos apresentados nos autos, concluiu nos seguintes termos:

O presente caso é de fácil deslinde, pois já é entendimento pacificado nesta TR de que o prazo de recuperação do quadro incapacitante da parte autora, estimado pelo perito judicial e nesta situação de cento e oitenta dias (promovente de 39 anos e apanhador de aves, portador de cervicalgia e outros transtornos especificados de discos intervertebrais, que a incapacitam para o exercício de suas atividades habituais – anexo nº 14), deve ter seu marco inicial de contagem a partir da data da efetiva implantação do benefício, primeiramente, para não gerar qualquer prejuízo a autora que teve seu pedido reconhecido em juízo mesmo com a antecipação da tutela, como também para que ela se submeta ao tratamento indicado pelo expert e, por conseguinte, possa manter a sua subsistência e a de sua família com o valor do benefício percebido. (grifei)

O ente público sustenta o cabimento do pedido de uniformização, por entender que o acórdão recorrido está em confronto com a jurisprudência da 6.ª TR/SP:

A propósito das condições de saúde do autor, apontou o perito que ele está total e temporariamente incapaz, em virtude de esquizofrenia paranoide, CID10, F20.0. Consoante o laudo, é susceptível de recuperação ou reabilitação profissional e deve ser reavaliado em um ano contado da data da perícia médica, realizada em 06/07/2016. Comprovada, portanto, a incapacidade exigida pela Lei n. 8.213/91, o restabelecimento do benefício deve ser deferido. Em face do prazo de recuperação previsto no laudo médico, a DCB será 06/08/2017. (Processo n.º 0000838-11.2016.4.03.6321, relator o Juiz Federal Herbert Cornelio Pieter de Bruyn Junior, julgado no dia 08/08/2017) (grifei)

Relatados no essencial, passo a decidir.

VOTO
O pedido de uniformização de interpretação de lei federal está previsto no art. 14 da Lei n.º 10.259/2001, sendo cabível quando “houver divergência entre decisões sobre questões de direito material proferidas por Turmas Recursais na interpretação da lei”.

Por questões de direito material, deve-se entender os pontos controvertidos de direito, ou seja, aqueles alusivos à construção, a partir dos enunciados dos textos normativos, da norma jurídica do caso concreto, desde que, para o deslinde da controvérsia, não seja necessária a reavaliação de provas nem o reexame dos fatos concretamente discutidos na demanda.

Para demonstrar a divergência, necessário o confronto do acórdão recorrido com acórdão paradigma de Turma Recursal de região diferente, da própria TNU ou do STJ (art. 14, § 4º). Também é possível que se utilize, para tais fins, enunciado de súmula da TNU ou do STJ.

***

No presente caso, o pedido merece ser conhecido, pois o acórdão recorrido julgou o ponto controvertido em sentido contrário ao entendimento posto no acórdão paradigma.

A controvérsia reside no seguinte ponto: “a partir da regra constante do art. 60, §9.º, da Lei n.º 8.213/91, saber se, para fins de fixação da DCB do auxílio-doença concedido judicialmente, o prazo de recuperação estimado pelo perito judicial deve ser computado a partir da data de sua efetiva implantação ou da data da perícia judicial”.

A concessão do benefício de auxílio-doença, por ser temporário, opera a partir da consideração do chamado “prazo de recuperação”, que é o intervalo de tempo considerado pelo perito judicial para o restabelecimento do segurado.

De início, importante observar que o “prazo de recuperação” não se confunde com “prazo de duração do benefício”, este necessário para a contagem dos efeitos financeiros do auxílio-doença.

Dessa maneira, o desafio posto neste julgamento é definir, a partir da questão controvertida posta, as balizas temporais para o correto pagamento do benefício, quando ele é concedido judicialmente.

Nos termos do art. 60, §1.º, da Lei n.º 8.213/91, o benefício do auxílio-doença é devido, para o segurado empregado, a partir do 16.º dia de afastamento, e para os demais segurados, a partir da DII (data de início da incapacidade).

Se requerido após 30 dias, contados da DII, o benefício é devido a partir da DER (data de entrada do requerimento):

Art. 60. O auxílio-doença será devido ao segurado empregado a contar do décimo sexto dia do afastamento da atividade, e, no caso dos demais segurados, a contar da data do início da incapacidade e enquanto ele permanecer incapaz. (Redação dada pela Lei nº 9.876, de 26.11.99)
§ 1º Quando requerido por segurado afastado da atividade por mais de 30 (trinta) dias, o auxílio-doença será devido a contar da data da entrada do requerimento. [...]

Assim, quando concedido administrativamente, o “prazo de duração do benefício” opera segundo as seguintes balizas temporais: DIB na DII ou na DER, e DCB com o fim do “prazo de recuperação”, que se inicia a partir da implantação do benefício.

No que diz respeito à extensão desse prazo, há duas possibilidades: a) prazo certo de duração, estimado pelo perito, ou seja, calculado por aproximação ou estipulado como base na média que entenda aplicável ao caso; b) prazo mínimo de duração, a ser estimado pelo perito, caso não possa calculá-lo, por razões várias, de forma aproximada, como no item anterior. Também deve ser considerado prazo mínimo aquele arbitrado de forma condicionada.

Na ausência de fixação de prazo certo ou de prazo mínimo, salvo definição de intervalo diverso pelo perito, deve-se fixá-lo em 120 dias, considerando-o como prazo mínimo:

§ 8º Sempre que possível, o ato de concessão ou de reativação de auxílio-doença, judicial ou administrativo, deverá fixar o prazo estimado para a duração do benefício. (Incluído pela Lei nº 13.457, de 2017) (grifei)
§ 9º Na ausência de fixação do prazo de que trata o § 8o deste artigo, o benefício cessará após o prazo de cento e vinte dias, contado da data de concessão ou de reativação do auxílio-doença, exceto se o segurado requerer a sua prorrogação perante o INSS, na forma do regulamento, observado o disposto no art. 62 desta Lei. (Incluído pela Lei nº 13.457, de 2017) (grifei)

Em todo caso, é facultado ao segurado requerer a prorrogação do benefício, na hipótese de entender que a incapacidade ainda persiste, nos termos das regras acima transcritas.

Quando o benefício é concedido judicialmente, devem ser aplicadas as mesmas regras.

Todavia, surgem duas dificuldades, em razão da omissão legislativa e das peculiaridades temporais inerentes à tramitação de um processo judicial: a) a definição do termo inicial do “prazo de recuperação”; b) a necessidade de se assegurar o direito do segurado de requerer a prorrogação do benefício.

As dificuldades surgem porque, entre a data da perícia judicial e a data da implantação do benefício, decorre tempo indefinido, podendo ser de muitos meses ou de alguns anos, caso se aguarde o julgamento em segunda instância ou mesmo o trânsito julgado.

Então, caso se adote a mesma regra administrativa e se entenda que o “prazo de recuperação” deve ser contado a partir da “data da perícia judicial”, em grande quantidade dos casos, não chegará a haver a implantação do benefício, mas somente o pagamento de atrasados. É que, entre a “data da perícia judicial” e a “implantação do benefício”, terá decorrido tempo superior àquele fixado como “prazo de recuperação”, seja nos casos de estimativa de “prazo certo” ou de estimativa “prazo mínimo”, ou ainda nos casos omissos, para os quais foi considerado o prazo de 120 dias.

Esse tipo de situação gera incerteza e imprevisibilidade para o segurado (“insegurança jurídica”), que não poderá planejar seu tratamento em conjunto com sua atividade laboral ou econômica. Além disso, é possível que a condição física do segurado tenha se agravado e que ele necessite “prazo de recuperação maior”. Nesse sentido, conferir o art. 10 da Portaria Conjunta n.º 2/DIRAT/DIRBEN/PFE/INSS, de 12 de março de 2020.

Por outro lado, se se adotar como termo inicial a “data da implantação do benefício”, como fez o acórdão recorrido, o problema do direito de prorrogação é resolvido e a questão da imprevisibilidade para o segurado é minimizada, porém será gerado passivo desproporcional para o INSS, ou seja, superior àquele previsto pela legislação de regência.

Quid juris?
A solução, nesse tipo de caso, é sempre difícil para os magistrados, estando tal dificuldade em alguma ou algumas das hipóteses adiante mencionadas: (i) falta de acordo sobre todos os conceitos necessários para a definição da questão controvertida; (ii) a norma não apresentou todo o regramento necessário ou foi mal redigida; (iii) as situações fáticas são bem mais complexas do que imaginou o legislador; (iv) os termos utilizados pela norma jurídica são semanticamente imprecisos: vagos, ambíguos ou porosos.

Em casos como este, a solução pode estar em seguir o caminho intermediário, qual seja, no caso, contando-se o “prazo de recuperação” não a partir da “data da implantação do benefício”, mas a partir da “data elaboração do laudo pericial judicial”, porém determinando-se a extensão do pagamento do benefício, caso necessário, até que decorra 30 dias a partir da implantação.

Assim, caso o “prazo de recuperação” seja estimado por “prazo certo”, basta que o termo inicial seja fixado na “data da perícia”. Todavia, caso o “prazo de recuperação” seja estimado por “prazo mínimo” e este prazo não supere o tempo decorrido entre “data da perícia” e a “data da implantação”, além da fixação do termo inicial na “data da perícia”, determina-se que o benefício seja pago de forma contínua até 30 dias após a efetiva implantação.

Essa mesma solução, mediante a fixação do “prazo de segurança”, nos termos acima, deve ser adotada também nos casos omissos, nos quais incide, por determinação do art. 60, §9.º, da Lei n.º 8.213/91, o prazo de 120 dias.

Dessa maneira, sem desconsiderar os parâmetros legais, pelo contrário, com base neles, garante-se o respeito ao “prazo de recuperação” previsto pela norma, bem como o “direito de prorrogação”, legalmente assegurado ao beneficiário.

Por fim, importante deixar registrado, a título de “obiter dictum”, a possibilidade de, durante a tramitação do processo judicial, o INSS, administrativamente, ou seja, independentemente de ordem judicial, prorrogar o benefício de auxílio-doença ou mesmo convertê-lo aposentadoria por invalidez. Em tais hipóteses, penso que sempre deve ser considerada a melhor decisão em favor do segurado. Dessa forma, por exemplo, convertido o auxílio-doença em aposentadoria por invalidez, não deve esta ser, necessariamente, revogada, caso, ao fim da tramitação judicial, seja determinada a implantação apenas do auxílio-doença. É importante que o INSS, zelando pelos direitos fundamentais dos segurados, não ignore a hipótese de eventual agravamento na saúde do benefíciário, circunstância que pode já não ser mais do conhecimento do Poder Judiciário, em razão do tempo decorrido entre a perícia judicial e a decisão final.

Em tais termos, voto no sentido de CONHECER E DAR PARCIAL PROVIMENTO ao pedido de uniformização, fixando a seguinte conclusão de tese: "Para fins de fixação da DCB do auxílio-doença concedido judicialmente, adota-se o seguinte entendimento: 1) Quando o prazo de recuperação for estimado pelo perito em “prazo certo”, este é contado a partir da perícia, salvo se o magistrado, de forma fundamentada, fixar marco diverso; 2) Quando o prazo de recuperação for condicionado ou estimado pelo perito em “prazo mínimo” e este prazo não supere o tempo decorrido entre a “data da perícia” e a “data da implantação”, além da fixação do termo inicial na “data da perícia”, deve-se determinar que o benefício seja pago de forma contínua até 30 dias após a efetiva implantação”; 3) Em ambos os casos, é garantido ao segurado a fixação da DIB de acordo com as regras fixadas no art. 60, “caput” e §1.º, da Lei n.º 8.213/91."

VOTO-VISTA - ATANAIR NASSER RIBEIRO LOPES, Juiz Federal
O pedido de uniformização foi interposto pelo INSS, distribuído para a relatoria do Juiz Federal Bianor Arruda, contando com votos, além do relator mencionado, dos Juízes Federais Fábio Souza e Erivaldo dos Santos. Colho do encaminhamento do eminente relator, sobre a questão fática aqui refletida:

"Trata-se de incidente de uniformização, suscitado pelo ente público, pretendendo a reforma de acórdão oriundo de Turma Recursal que, mantendo a sentença, entendeu que, para fins de fixação da DCB do auxílio-doença concedido judicialmente, o prazo de recuperação estimado pelo perito judicial deve ser computado a partir da data de sua efetiva implantação, e não da data da perícia judicial. Na espécie, a perícia judicial, realizada no dia 06/06/2018, concluiu que o segurado necessita do prazo de 180 dias para o restabelecimento de sua capacidade laborativa, tendo as instâncias ordinárias fixado o início desse prazo a partir de sua efetiva implantação, com pagamento dos valores atrasados desde a DER. O acórdão recorrido, no ponto em que é atacado pelo presente recurso, após examinar os documentos e argumentos apresentados nos autos, concluiu nos seguintes termos:

O presente caso é de fácil deslinde, pois já é entendimento pacificado nesta TR de que o prazo de recuperação do quadro incapacitante da parte autora, estimado pelo perito judicial e nesta situação de cento e oitenta dias (promovente de 39 anos e apanhador de aves, portador de cervicalgia e outros transtornos especificados de discos intervertebrais, que a incapacitam para o exercício de suas atividades habituais – anexo nº 14), deve ter seu marco inicial de contagem a partir da data da efetiva implantação do benefício, primeiramente, para não gerar qualquer prejuízo a autora que teve seu pedido reconhecido em juízo mesmo com a antecipação da tutela, como também para que ela se submeta ao tratamento indicado pelo expert e, por conseguinte, possa manter a sua subsistência e a de sua família com o valor do benefício percebido. (grifei)"

A TNU afetou o presente recurso como representativo de controvérsia, vinculando-o ao tema 246 e formulando a seguinte questão jurídica: “a partir da regra constante do art. 60, § 9.º, da Lei n.º 8.213/91, saber se, para fins de fixação da DCB do auxílio-doença concedido judicialmente, o prazo de recuperação estimado pelo perito judicial deve ser computado a partir da data de sua efetiva implantação ou da data da perícia judicial”.

O eminente relator bem refletiu sobre o problema de fundo enfrentado, ponderando as seguintes razões:

As dificuldades surgem porque, entre a data da perícia judicial e a data da implantação do benefício, decorre tempo indefinido, podendo ser de muitos meses ou de alguns anos, caso se aguarde o julgamento em segunda instância ou mesmo o trânsito julgado.

Então, caso se adote a mesma regra administrativa e se entenda que o “prazo de recuperação” deve ser contado a partir da “data da perícia judicial”, em grande quantidade dos casos, não chegará a haver a implantação do benefício, mas somente o pagamento de atrasados. É que, entre a “data da perícia judicial” e a “implantação do benefício”, terá decorrido tempo superior àquele fixado como “prazo de recuperação”, seja nos casos de estimativa de “prazo certo” ou de estimativa “prazo mínimo”, ou ainda nos casos omissos, para os quais foi considerado o prazo de 120 dias.

Esse tipo de situação gera incerteza e imprevisibilidade para o segurado (“insegurança jurídica”), que não poderá planejar seu tratamento em conjunto com sua atividade laboral ou econômica. Além disso, é possível que a condição física do segurado tenha se agravado e que ele necessite “prazo de recuperação maior”. Nesse sentido, conferir o art. 10 da Portaria Conjunta n.º 2/DIRAT/DIRBEN/PFE/INSS, de 12 de março de 2020.

Por outro lado, se se adotar como termo inicial a “data da implantação do benefício”, como fez o acórdão recorrido, o problema do direito de prorrogação é resolvido e a questão da imprevisibilidade para o segurado é minimizada, porém será gerado passivo desproporcional para o INSS, ou seja, superior àquele previsto pela legislação de regência.

Pedi vista dos autos justamente diante desse grave problema decorrente da excessiva demanda na 1ª Região, suas peculiaridades e o consequente retardamento na solução dos litígios lhe submetidos. Por isso mesmo, antes de ponderar sobre as razões de cada magistrado, devo registrar a extensão continental que abrange as quatorze unidades da federação encampadas na 1ª Região. Não fosse bastante, cuida-se, em grande parte, de localidades inóspitas, selvagens, onde o homem se desloca sobre rios e florestas até conseguir chegar a centros urbanos. É impossível não atentar para a peculiaridade que envolve as regiões de Selva Amazônica, do Pantanal, do Sertão Baiano, do Bico do Papagaio, das Alterosas de Minas Gerais, dos afluentes e das comunidades ribeirinhas e indígenas nos rios que banham e cortam o Pará, o Maranhão e o Tocantins. A grandeza é notável desde a Chapada dos Veadeiros em Goiás até a Serra da Chapada das Mesas em Carolina no Maranhão, desde o Delta do Parnaíba até o alto mar de Cabrália, da nascente do São Francisco em São Roque de Minas, na Serra da Canastra, até o Touro e a Sucuri na represa da hidrelétrica de Paulo Afonso na Bahia.

Quando são tomadas decisões gerais, muitas delas se baseando na limitada realidade de São Paulo e Rio de Janeiro, ignora-se a dimensão e os reflexos que elas poderão ter na imensidão do país. Sob essa perspectiva, o problema pressentido pelo eminente relator é exponencialmente majorado quando se trata das dificuldades da 1ª Região. Dizer simplesmente que os processos judiciais demoram para ser concluídos, seria injusto e leviano com a bravura e o esforço contínuo de servidores e magistrados que enfrentam essa realidade de perto. Não é incomum que um juiz em Manaus tenha de se deslocar para responder por Tefé; de Macapá para o Oiapoque; entre distâncias e situações incomuns à realidade do Sul-Sudeste. Desse modo, é possível que o julgamento ocorra até dois anos depois da perícia, implicando espaço imenso de tempo. É sob essa ótica que refletimos na 4ª Turma Recursal de Minas e chegamos a uma conclusão que atendesse às diversas peculiaridades. Antes, porém, faço o registro das propostas nos votos já encaminhados.

O relator votou no seguinte sentido:

"Para fins de fixação da DCB do auxílio-doença concedido judicialmente, adota-se o seguinte entendimento: 1) Quando o prazo de recuperação for estimado pelo perito em “prazo certo”, este é contado a partir da perícia, salvo se o magistrado, de forma fundamentada, fixar marco diverso; 2) Quando o prazo de recuperação for condicionado ou estimado pelo perito em “prazo mínimo” e este prazo não supere o tempo decorrido entre a “data da perícia” e a “data da implantação”, além da fixação do termo inicial na “data da perícia”, deve-se determinar que o benefício seja pago de forma contínua até 30 dias após a efetiva implantação”; 3) Em ambos os casos, é garantido ao segurado a fixação da DIB de acordo com as regras fixadas no art. 60, “caput” e §1.º, da Lei n.º 8.213/91."

O Juiz Fábio Souza abriu divergência, ponderando voto nos seguintes termos:

I - Quando a decisão judicial adotar a estimativa de prazo de recuperação da capacidade prevista na perícia, o termo inicial é a data da realização do exame, sem prejuízo do disposto no art. 479 do CPC, devendo ser garantido prazo mínimo de 30 dias, desde a implantação, para viabilizar o pedido administrativo de prorrogação. II - Quando o ato de concessão (administrativa ou judicial) não indicar o tempo de recuperação da capacidade, o prazo de 120 dias, previsto no § 9º, do art. 60 da Lei 8.213/91, deve ser contado a partir da data da efetiva implantação ou restabelecimento do benefício no sistema de gestão de benefícios da autarquia."

Por sua vez, o Juiz Erivaldo dos Santos analisou as duas propostas e não se satisfez com as sugestões, ponderando a seguinte fundamentação:

Peço vênia para discordar da proposta do relator, porque a meu juízo, ela não resolve adequadamente as situações em que, na data da implantação, já se tem escoado todo o prazo previsto pelo perito, obstando dessa forma o exercício do direito de pedir prorrogação do benefício, caso persista a incapacidade (artigo 60, § 9ª, da Lei º 8213/91).

E, da mesma forma, também me oponho à divergência, porque a meu sentir, o dispositivo que orienta a fixação de prazo judicial à duração do benefício é o §8º, muito claro ao dispor que "Sempre que possível, o ato de concessão ou de reativação de auxílio-doença, judicial ou administrativo, deverá fixar o prazo estimado para a duração do benefício".

Já a hipótese prevista no item II da tese divergente encerra orientação que já está expressa na lei, e orienta apenas o INSS, no sentido de que "Na ausência de fixação do prazo de que trata o § 8o deste artigo, o benefício cessará após o prazo de cento e vinte dias, contado da data de concessão ou de reativação do auxílio-doença (...)".

Em juízo a DCB é fixada, repito, com base no § 8º sempre que possível, devendo ser estabelecido o prazo de duração do benefício e, como não se implanta auxílio-doença por tempo indeterminado; se a sentença não fixar, o prazo será de 120 (cento e vinte) dias.

Com essas considerações, à luz dos dispositivos legais interpretados, entendo que, de fato, o benefício de auxílio-doença deve ser mantido enquanto durar a incapacidade laboral, devendo a decisão judicial fixar a sua cessação de acordo com os elementos probatórios trazidos aos autos. Para os casos em que o título judicial não traz o termo final, por alguma razão, o INSS já está orientado fixar DCB em 120 dias.

E, para contemplar situações em que o prazo para recuperação é superado pelo prazo de duração do processo ou pela demora na implantação do benefício, a fim possibilitar o exercício do direito à prorrogação, já que não se prorroga benefício não implantado, é razoável a fixação de prazo após a implantação, que contemple a previsão para recuperação e a possibilidade de requerer a prorrogação do benefício, se for o caso.

Com isso, propôs a seguinte solução no seu voto:
"Respeitado o disposto no art. 479 do CPC, a DCB do benefício de auxílio-doença concedido em juízo será fixada com base na estimativa de recuperação feita pelo perito judicial, contada a partir da data do exame, e deverá contemplar também prazo de 30 dias para eventual requerimento de prorrogação do benefício, a partir de sua implantação, em cumprimento de tutela antecipada ou decisão definitiva".

As três soluções são ótimas, mas esqueceram, a meu ver, das hipóteses em que o término do prazo estimado pelo perito para recuperação cessou há muito tempo atrás antes que o magistrado emita a sentença e o benefício seja efetivamente implantado. Como mencionei, dado o congestionamento na 1ª Região, próprio de suas peculiaridades, há casos em que o prazo de recuperação venceu há dois anos atrás, quando o juiz irá agora decidir o feito. Muitos têm fixado o benefício no prazo estimado pelo perito, reservando ao segurado que discuta o período posterior em novo requerimento administrativo ou em nova ação judicial, o que prejudica o direito ao pedido de prorrogação conferido ao segurado. Outros, ignorando o enorme tempo decorrido, determinam a implantação assegurando-se o prazo para pedido de prorrogação, tal como enunciado nas propostas anteriores, o que leva ao pagamento pelo INSS de anos de benefício possivelmente indevido, sem lastro em perícia apropriada quanto ao tempo posterior. Como bem destacado pelo relator, "se se adotar como termo inicial a “data da implantação do benefício”, como fez o acórdão recorrido, o problema do direito de prorrogação é resolvido e a questão da imprevisibilidade para o segurado é minimizada, porém será gerado passivo desproporcional para o INSS, ou seja, superior àquele previsto pela legislação de regência".

Eu diria que mesmo em se adotando a data da perícia, como ponderei, o tempo entre o término do prazo fixado pelo perito e a data da implantação terá abarcado tempo demasiadamente longo sem lastro algum probatório.

Diante de tal situação, quando esse prazo de recuperação tenha superado um tempo razoável, a contar da data da perícia, o qual estimo em tempo maior que 120 dias, a solução mais indicada seria a realização de nova perícia, a fim de aferir a situação do segurado e resolver desde logo a situação peculiar vivenciada. Isso porque o segurado não pôde postular o pedido de prorrogação, enquanto o INSS também não pôde reavaliar o segurado e verificar se ainda estariam mantidas as condições de incapacidade.

Penso que a ponderação proposta pelo eminente Juiz Erivaldo dos Santos seja mais enxuta e apropriada, à qual acrescentaria e adequaria quanto ao ponto antes ressaltado nos seguintes termos:

"I- respeitado o disposto no art. 479 do CPC, a DCB do benefício de auxílio-doença será fixada com base na estimativa de recuperação feita pelo perito judicial, contada a partir da data do exame, e deverá contemplar prazo de 30 dias para eventual requerimento de prorrogação do benefício, a partir de sua implantação, em cumprimento de tutela antecipada ou decisão definitiva; II- decorridos mais de 120 dias entre a cessação da recuperação estimada e a data em que seria implantado o benefício, o juízo deve designar nova perícia para aferir a situação do segurado no período posterior, aplicando-se, na sequência, o item anterior quanto à nova conclusão pericial".

Ante o exposto, voto por dar provimento ao recurso do INSS e determinar a devolução dos autos à origem para adequação, nos termos da Questão de Ordem n. 20 da TNU.

VOTO-VISTA - ERIVALDO RIBEIRO DOS SANTOS, Juiz Federal
Tema 246 - A partir da regra constante do art. 60, §9.º, da Lei n.º 8.213/91, saber se, para fins de fixação da DCB do auxílio-doença concedido judicialmente, o prazo de recuperação estimado pelo perito judicial deve ser computado a partir da data de sua efetiva implantação ou da data da perícia judicial.

Trata-se de incidente de uniformização interposto pelo INSS, com fulcro no artigo 14, §2º, da Lei 10.259/01, em face de acórdão prolatado pela Turma Recursal da Paraíba, que negou provimento ao recurso sob o fundamento de que o prazo de recuperação do quadro incapacitante da parte autora, estimado pelo perito judicial e nesta situação de cento e oitenta dias (promovente de 39 anos e apanhador de aves, portador de cervicalgia e outros transtornos especificados de discos intervertebrais, que a incapacitam para o exercício de suas atividades habituais – anexo nº 14), deve ter seu marco inicial de contagem a partir da data da efetiva implantação do benefício.

Nas razões de recurso, a parte recorrente alega que o entendimento da Turma Recursal da Paraíba diverge das Turmas Recursais de São Paulo e Paraná, no sentido de que o prazo para recuperação do segurado deve ser contado a partir da data da perícia médica judicial.

Intimada, a parte adversa apresentou contrarrazões.

A Turma Nacional de Uniformização, em sessão realizada em dezembro de 2019, afetou o presente recurso como representativo de controvérsia, vinculando-o ao tema 246 e formulando a seguinte questão jurídica: “a partir da regra constante do art. 60, § 9.º, da Lei n.º 8.213/91, saber se, para fins de fixação da DCB do auxílio-doença concedido judicialmente, o prazo de recuperação estimado pelo perito judicial deve ser computado a partir da data de sua efetiva implantação ou da data da perícia judicial”.

Ao deslinde do tema apresentado a julgamento importa interpretar os dispositivos abaixo:

Art. 60. O auxílio-doença será devido ao segurado empregado a contar do décimo sexto dia do afastamento da atividade, e, no caso dos demais segurados, a contar da data do início da incapacidade e enquanto ele permanecer incapaz.
(...)
§ 8º Sempre que possível, o ato de concessão ou de reativação de auxílio-doença, judicial ou administrativo, deverá fixar o prazo estimado para a duração do benefício. (Incluído pela Lei nº 13.457, de 2017)
§ 9º Na ausência de fixação do prazo de que trata o § 8o deste artigo, o benefício cessará após o prazo de cento e vinte dias, contado da data de concessão ou de reativação do auxílio-doença, exceto se o segurado requerer a sua prorrogação perante o INSS, na forma do regulamento, observado o disposto no art. 62 desta Lei. (Incluído pela Lei nº 13.457, de 2017)

Obviamente que não podemos interpretar um parágrafo dissociado de seu contexto, como adverte Tercio Sampaio Ferraz Junior em Introdução ao Estudo do Direito, 4ª ed, p. 282. A solução do tema não está apenas na interpretação do parágrafo 9º, a que se refere o tema, mas do conjunto de dispositivos que regulam o auxílio-doença.

Ora, o artigo 60, caput, estabelece a regra geral para o auxílio-doença, no que se refere a sua duração, ou seja, o benefício é devido apenas pelo período da incapacidade.

Logo, se a prova pericial traz informação quanto ao prognóstico de cura ou de recuperação da capacidade laboral, o benefício, em regra, não pode ir além.

Para ilustrar, examinemos o caso concreto.

Segundo a sentença, mantida na íntegra pela Turma Recursal de origem, o perito fixou a data de início da incapacidade (DII) em 06/10/17. Como a DER é posterior à DII, a data de início do benefício foi fixada em 22/01/18, com prognóstico de recuperação em seis meses que, a meu juízo, deve ser contado da data do laudo pericial, salvo se um outro ponto de partida fosse apontado pelo próprio perito, e no caso tal não ocorreu.

Ou seja, realizada a perícia em 06/06/18, a previsão de recuperação seria em 06/12/18, e não em 120 da implantação do benefício, que pode resultar prazo menor, quando se concede tutela de urgência, e prazo muito maior, quando não se defere, contrariando a regra no sentido de que o benefício só é mantido enquanto durar a incapacidade.

O Ilustre relator, Dr. Bianor Arruda Bezerra Neto, votou no sentido de conhecer e dar parcial provimento ao pedido de uniformização e fixar a seguinte tese: "Para fins de fixação da DCB do auxílio-doença concedido judicialmente, adota-se o seguinte entendimento: 1) Quando o prazo de recuperação for estimado pelo perito em “prazo certo”, este é contado a partir da perícia, salvo se o magistrado, de forma fundamentada, fixar marco diverso; 2) Quando o prazo de recuperação for condicionado ou estimado pelo perito em “prazo mínimo” e este prazo não supere o tempo decorrido entre a “data da perícia” e a “data da implantação”, além da fixação do termo inicial na “data da perícia”, deve-se determinar que o benefício seja pago de forma contínua até 30 dias após a efetiva implantação”; 3) Em ambos os casos, é garantido ao segurado a fixação da DIB de acordo com as regras fixadas no art. 60, “caput” e §1.º, da Lei n.º 8.213/91."

Por seu turno, o Ilustre Juiz Federal Fábio Souza apresentou voto divergente, propondo a fixação da seguinte tese: ”I - Quando a decisão judicial adotar a estimativa de prazo de recuperação da capacidade prevista na perícia, o termo inicial é a data da realização do exame, sem prejuízo do disposto no art. 479 do CPC, devendo ser garantido prazo mínimo de 30 dias, desde a implantação, para viabilizar o pedido administrativo de prorrogação. II - Quando o ato de concessão (administrativa ou judicial) não indicar o tempo de recuperação da capacidade, o prazo de 120 dias, previsto no § 9º, do art. 60 da Lei 8.213/91, deve ser contado a partir da data da efetiva implantação ou restabelecimento do benefício no sistema de gestão de benefícios da autarquia."

Peço vênia para discordar da proposta do relator, porque a meu juízo, ela não resolve adequadamente as situações em que, na data da implantação, já se tem escoado todo o prazo previsto pelo perito, obstando dessa forma o exercício do direito de pedir prorrogação do benefício, caso persista a incapacidade (artigo 60, § 9ª, da Lei º 8213/91).

E, da mesma forma, também me oponho à divergência, porque a meu sentir, o dispositivo que orienta a fixação de prazo judicial à duração do benefício é o §8º, muito claro ao dispor que "Sempre que possível, o ato de concessão ou de reativação de auxílio-doença, judicial ou administrativo, deverá fixar o prazo estimado para a duração do benefício".

Já a hipótese prevista no item II da tese divergente encerra orientação que já está expressa na lei, e orienta apenas o INSS, no sentido de que "Na ausência de fixação do prazo de que trata o § 8o deste artigo, o benefício cessará após o prazo de cento e vinte dias, contado da data de concessão ou de reativação do auxílio-doença (...)".

Em juízo a DCB é fixada, repito, com base no § 8º sempre que possível, devendo ser estabelecido o prazo de duração do benefício e, como não se implanta auxílio-doença por tempo indeterminado; se a sentença não fixar, o prazo será de 120 (cento e vinte) dias.

Com essas considerações, à luz dos dispositivos legais interpretados, entendo que, de fato, o benefício de auxílio-doença deve ser mantido enquanto durar a incapacidade laboral, devendo a decisão judicial fixar a sua cessação de acordo com os elementos probatórios trazidos aos autos. Para os casos em que o título judicial não traz o termo final, por alguma razão, o INSS já está orientado fixar DCB em 120 dias.

E, para contemplar situações em que o prazo para recuperação é superado pelo prazo de duração do processo ou pela demora na implantação do benefício, a fim possibilitar o exercício do direito à prorrogação, já que não se prorroga benefício não implantado, é razoável a fixação de prazo após a implantação, que contemple a previsão para recuperação e a possibilidade de requerer a prorrogação do benefício, se for o caso.

Nessas condições, voto no sentido de DAR PROVIMENTO ao pedido de uniformização do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), determinando o retorno dos autos à origem para adequação à seguinte tese: "Respeitado o disposto no art. 479 do CPC, a DCB do benefício de auxílio-doença concedido em juízo será fixada com base na estimativa de recuperação feita pelo perito judicial, contada a partir da data do exame, e deverá contemplar também prazo de 30 dias para eventual requerimento de prorrogação do benefício, a partir de sua implantação, em cumprimento de tutela antecipada ou decisão definitiva"

Ante o exposto, voto por CONHECER E DAR PROVIMENTO AO INCIDENTE DE UNIFORMIZAÇÃO.

VOTO DIVERGENTE - FÁBIO SOUZA, Juiz Federal
O plenário da Turma Nacional de Uniformização (TNU), em sessão realizada em dezembro de 2019, afetou o presente recurso como representativo de controvérsia, vinculando-o ao tema 246 e formulando a seguinte questão jurídica: “a partir da regra constante do art. 60, §9.º, da Lei n.º 8.213/91, saber se, para fins de fixação da DCB do auxílio-doença concedido judicialmente, o prazo de recuperação estimado pelo perito judicial deve ser computado a partir da data de sua efetiva implantação ou da data da perícia judicial”.

O MM Juiz Federal relator, Dr. Bianor Arruda Bezerra Neto, votou no sentido de conhecer e dar parcial provimento ao pedido de uniformização e fixar a seguinte tese: “para fins de fixação da DCB do auxílio-doença concedido judicialmente, quando o prazo de recuperação for condicionado ou estimado pelo perito em “prazo mínimo” e este prazo não supere o tempo decorrido entre a “data da perícia” e a “data da implantação”, além da fixação do termo inicial na “data da perícia”, deve-se determinar que o benefício seja pago de forma contínua até 30 dias após a efetiva implantação”.

Apesar do brilhantismo exposto no voto do Relator, peço vênia para apresentar voto parcialmente divergente. Para tanto, fundamento o voto com uma resumida explicação da origem e da fundamentação do dinâmica da “previsão de alta” e, em seguida, a partir de premissas extraídas dessa evolução, identifico os elementos centrais dessa verdadeira política pública de administração de benefícios por incapacidade, propondo critérios de interpretação do § 9º, do art. 60 da Lei 8.213/91.

***

I. Pontos Centrais da Micropolítica Pública de Gestão de Benefícios por Incapacidade

Originalmente, a cessação do auxílio-doença apenas poderia ocorrer após a constatação, por perícia, da recuperação da capacidade de trabalho. Essa exigência tornava mais difícil, oneroso e demorado o controle dos requisitos de manutenção do benefício.

Em 2006, por meio do Decreto 5.844, o Poder Executivo adotou medida para racionalizar o sistema de perícia previdenciária, instituindo a prática que ficou conhecida como “alta programada”, como base normativa no § 1º, do art. 78 do Regulamento da Previdência Social (RPS - Decreto 3.048/99):

RPS, art. 78, § 1º, com redação dada pelo Decreto 5.844/2006 (atualmente alterado):

O INSS poderá estabelecer, mediante avaliação médico-pericial, o prazo que entender suficiente para a recuperação da capacidade para o trabalho do segurado, dispensada nessa hipótese a realização de nova perícia.

Em razão de diversas críticas e impugnações, a autarquia previdenciária complementou a normatização da nova sistemática, prevendo a possibilidade de formulação de pedido de prorrogação, com efeito suspensivo:

Pedido de Prorrogação - Instrução Normativa da Presidência do INSS 45/2010, art. 277, § 2º (atualmente revogado):

Caso o prazo fixado para a recuperação da capacidade para o trabalho seja insuficiente, o segurado poderá solicitar a realização de nova perícia médica por meio de pedido de prorrogação - PP nos quinze dias que anteceder a cessação do benefício, cuja perícia poderá ser realizada pelo mesmo profissional responsável pela avaliação anterior.

Infere-se, portanto, uma inversão da dinâmica: ao invés de o INSS fazer a perícia para cessar o benefício, passa-se a presumir a recuperação da capacidade na data estimada ab initio pelo perito, cabendo ao segurado provocar a realização de nova perícia caso ainda se considere incapacitado em momento próximo ao previsto para a cessação.

A prática consolidou-se no âmbito administrativo, sendo reafirmada nas normatizações posteriores, até ser incorporada ao plano legislativo pela Medida Provisória 767/2017, convertida da Lei 13.457/2017, por meio da inclusão dos parágrafos 8º do art. 60 da Lei 8.213/91, cuja aplicação abrange os benefícios concedidos em razão de ordem judicial:

Lei 8.213/91, art. 60
§ 8° Sempre que possível, o ato de concessão ou de reativação de auxílio-doença, judicial ou administrativo, deverá fixar o prazo estimado para a duração do benefício.

Esse procedimento transformou completamente a forma de o INSS lidar com a manutenção e a cessação benefícios por incapacidade, adquirindo status de verdadeira política pública microsetorial, impactando práticas, estrutura, planejamento e funcionamento da Administração Previdenciária.

O impacto foi tão grande que a existência de situações nas quais não se pode prever o momento da recuperação deixaram de se enquadrar nas soluções construídas pela política previdenciária, a qual passou a trabalhar com uma lógica binária: ou a incapacidade é permanente (o que exige reabilitação profissional ou conversão em aposentadoria por invalidez); ou é temporária (o que exige a fixação de uma previsão de cessação).

Para os casos que não se enquadram nessas hipóteses - isto é, a incapacidade é temporária, mas não é possível estimar a data da recuperação - foi necessário criar uma solução subsidiária, por meio de uma presunção legal prevista no § 9º, do art. 60, da Lei 8.213/91.

Lei 8.213/91, art. 60
§ 9° Na ausência de fixação do prazo de que trata o § 8o deste artigo, o benefício cessará após o prazo de cento e vinte dias, contado da data de concessão ou de reativação do auxílio-doença, exceto se o segurado requerer a sua prorrogação perante o INSS, na forma do regulamento, observado o disposto no art. 62 desta Lei.

Analisando a evolução desse quadro normativo, é possível identificar dois pontos centrais dessa micropolítica pública: (i.) o auxílio-doença deve ser concedido com uma previsão de data de cessação; e (ii.) o segurado tem o direito a pedir a prorrogação do benefício.

A análise de cada um desses aspectos conduz à intepretação adequada dos parágrafos 8º e 9º, necessária à formulação da resposta à questão jurídica controvertida analisada neste recurso representativo de controvérsia.

(i.) o auxílio-doença deve ser concedido com uma previsão de data de cessação

A redação dos parágrafos 8º e 9º, art. 60 da Lei 8.213/91 refere-se à fixação de um prazo estimado para a duração do benefício. Apesar disso, há substancial diferença entre os dois dispositivos.

Ao estabelecer a exigência de uma previsão de recuperação, a lei não está fixando uma deliberação formal ou burocrática, tampouco criando um benefício por prazo certo. Como já exposto anteriormente, o que se busca é uma metodologia de aferição da permanência do fato gerador do benefício, ou seja, a identificação da continuidade do estado incapacitante.

Quando estima um momento de recuperação da capacidade de trabalho, o perito projeta o prazo a partir da data do exame. Em outras palavras, o expert informa o prazo que considera suficiente para a recuperação da capacidade de trabalho considerando como termo a quo a data em que faz a análise pericial. Não se trata, portanto, de uma presunção legal, mas de uma estimativa firmada por critérios de medicina baseada em evidência.

Por esse motivo, não faz qualquer sentido computar o prazo de recuperação identificado pelo perito a partir da implantação do benefício, evento completamente fora do controle do expert, especialmente, no âmbito judicial.

Evidentemente, a apreciação da prova deve observar a previsão do art. 479 do CPC:

O juiz apreciará a prova pericial de acordo com o disposto no art. 371, indicando na sentença os motivos que o levaram a considerar ou a deixar de considerar as conclusões do laudo, levando em conta o método utilizado pelo perito

Entretanto, quando não há a estimativa do momento de recuperação da capacidade, o prognóstico é substituído pela presunção legal estabelecida no § 9º, do art. 60 da Lei 8.213/91, sendo fixada a data de cessação do benefício no “ prazo de cento e vinte dias, contado da data de concessão ou de reativação do auxílio-doença”.

As premissas dos parágrafos 8º e 9º, art. 60 da Lei 8.213/91 são muito distintas. Enquanto o § 8º trata de uma previsão de alta baseada em dados clínicos do caso concreto, o § 9º cria uma presunção relativa de cessação da incapacidade no prazo de 120 dias, como forma de adequação à política pública, que abandonou a exigência de perícias comprobatórias da recuperação.

Desse modo, a presunção legal deve ser aplicada nos termos previstos pelo legislador: 120 dias contados da data concessão ou da reativação, o que significa que o termo inicial corresponde ao momento da efetiva implantação do benefício no sistema da autarquia previdenciária.

Vale destacar que essa distinção expressa na lei é reconhecida também administrativamente, como se infere da Portaria Conjunta nº 2, de 12 de março de 2020, eidtada pelos Diretores de Atendimento e Benefício do INSS, em conjunto com o Procurador-Geral da Procuradoria Federal Especializada junto ao INSS:

Art. 11 Não havendo a fixação de DCB pelo Poder Judiciário para os benefícios de auxílio-doença, salvo nos casos em que a parte dispositiva preveja o encaminhamento ao Programa de Reabilitação Profissional - PRP, o benefício deverá ser implantado ou reativado pela CEAB/DJ com conclusão "DCB não informada pelo juiz" e será fixado pelo sistema o prazo de 120 (cento e vinte) dias, contados da data do cumprimento (DDB/atualização).

Fica evidente, portanto, que, na aplicação do § 8º, do art. 60 da Lei 8.213/91, o prazo é contado a partir da data da perícia, por se tratar, na realidade, do momento previsto para a cessação da incapacidade. Entretanto, a aplicação do § 9º exige que o prazo seja computado a partir da implantação do benefício, por se tratar de arbitramento realizado pelo legislador, sem conexão com o ato pericial.

Essas razões permitem chegar a duas conclusões:
Quando a decisão judicial adotar a estimativa de prazo de recuperação da capacidade prevista na perícia, o termo inicial é a data da realização do exame, sem prejuízo do disposto no art. 479 do CPC.

Quando o ato de concessão (administrativa ou judicial) não indicar o tempo de recuperação da capacidade, o prazo de 120 dias, previsto no § 9º, do art. 60 da Lei 8.213/91, deve ser contado a partir da data da efetiva implantação ou restabelecimento do benefício no sistema de gestão de benefícios da autarquia.

(ii.) o segurado tem o direito a pedir a prorrogação do benefício

A estimativa da cessação do benefício, seja em razão do prognóstico, seja por presunção legal, não pode configurar um obstáculo à manutenção da prestação previdenciária, quando o fato gerador do benefício permanecer presente. Tanto o prognóstico, quanto a presunção cedem diante da realidade.

Por isso, é essencial oportunizar ao segurado a apresentação de pedido de prorrogação do auxílio-doença, como previsto no § 9º, do art. 60 da Lei 8.213/91 e no § 2º, do art. 78 do Decreto 3.048/99.

Ocorre que o percurso processual pode conduzir a situações em que o prazo previsto para a cessação do benefício seja anterior ou muito próximo à sua efetiva implantação, inviabilizando pedido administrativo de prorrogação.

A inclusão dos benefícios concedidos por ordem judicial na micropolítica pública de gestão de benefícios por incapacidade, não pode gerar uma garantia inferior àquela oferecida aos benefícios obtidos administrativamente. Desse modo, a previsão de data para a cessação do benefício deve sempre estar acompanhada da possibilidade real de formulação de pedido de prorrogação perante a Administração Pública.

Isso provova a necessidade de fixação de um prazo mínimo suficiente a permitir que o segurado tome conhecimento da decisão judicial e, se necessário, adote os procedimentos exigidos para o pedido administrativo de prorrogação.

Esse é o entendimento da próprira Administração, com se infere do § 1º, do aer. 10 da Portaria Conjunta nº 2, de 12 de março de 2020, eidtada pelos Diretores de Atendimento e Benefício do INSS, em conjunto com o Procurador-Geral da Procuradoria Federal Especializada junto ao INSS:

Art. 10 Havendo fixação de DCB pelo Poder Judiciário, o servidor deverá cumprir a decisão, utilizando a conclusão "DCB informada pelo juiz" e inserir a data fixada.
§ 1º Salvo nas hipóteses de decisão judicial ou de despacho do órgão de execução da PGF com ordem expressa em sentido contrário, em se tratando de DCB vencida ou com prazo a vencer inferior a 30 dias da DDB/atualização, deve o benefício ser implantado com DCB no 30º dia posterior a data do efetivo cumprimento, como forma de possibilitar o pedido de prorrogação.
§ 2º Se a ordem judicial informar a DCB e condicionar a cessação do benefício à reavaliação do autor, prevalecerá a opção do segurado em requerer nova perícia médica (pedido de prorrogação), caso se julgue incapaz para o retorno ao trabalho.
§ 3º Realizada a implantação ou reativação do benefício, comunicar diretamente ao Poder Judiciário, em casos de recepção de intimação direta, ou ao órgão de execução da PGF, quando por este demandado, as providências adotadas em atendimento à decisão judicial, utilizando-se o modelo do Anexo I, devendo o servidor administrativo encerrar a tarefa.

O procedimento adotado pela Administração está em pleno acordo com a lei e em harmonia com os princípios da proporcionalidade e da razoabilidade, não havendo motivos para interferência do Poder Judiciária na prática adotada pela autarquia.

Assim, chega-se à terceira conclusão: o prazo entre o momento da efetiva implantação ou restabelecimento do benefício e a data prevista para a cessação do benefício não poderá ser inferior a 30 dias.

***

Conclusão
Considerando a fundamentação exposta, proponho ao Colegiado da TNU a formulação da seguinte tese jurídica, dividida em três assertivas:

I - Quando a decisão judicial adotar a estimativa de prazo de recuperação da capacidade prevista na perícia, o termo inicial é a data da realização do exame, sem prejuízo do disposto no art. 479 do CPC, devendo ser garantido prazo mínimo de 30 dias, desde a implantação, para viabilizar o pedido administrativo de prorrogação.

II - Quando o ato de concessão (administrativa ou judicial) não indicar o tempo de recuperação da capacidade, o prazo de 120 dias, previsto no § 9º, do art. 60 da Lei 8.213/91, deve ser contado a partir da data da efetiva implantação ou restabelecimento do benefício no sistema de gestão de benefícios da autarquia.

Ante o exposto, voto no sentido de DAR PROVIMENTO ao pedido de uniformização do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), determinando o retorno dos autos à origem para adequação à seguinte tese: ”I - Quando a decisão judicial adotar a estimativa de prazo de recuperação da capacidade prevista na perícia, o termo inicial é a data da realização do exame, sem prejuízo do disposto no art. 479 do CPC, devendo ser garantido prazo mínimo de 30 dias, desde a implantação, para viabilizar o pedido administrativo de prorrogação. II - Quando o ato de concessão (administrativa ou judicial) não indicar o tempo de recuperação da capacidade, o prazo de 120 dias, previsto no § 9º, do art. 60 da Lei 8.213/91, deve ser contado a partir da data da efetiva implantação ou restabelecimento do benefício no sistema de gestão de benefícios da autarquia."

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Rio Grande, Rio Grande do Sul, Brazil
Especialista em Direito Previdenciário, pela Universidade de Caxias do Sul - UCS, em parceria com a ESMAFE - Escola da Magistratura Federal, em 2009. Formado em janeiro de 2006, pela FURG - Fundação Universidade do Rio Grande, em direito. Este blog tem o objetivo de divulgar o conteúdo previdenciário de maneira gratuita para que todos possam ter acesso as informações sobre esta matéria.

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