Empresa é condenada a indenizar trabalhadora com doença ocupacional
Nesta sexta será visto um acórdão relativo a condenação da empresa devido ao fato da trabalhadora ter adquirido Síndrome do Túnel do Carpo pelas atividades que exercia. O TRT 4 entendeu que "cabe ao empregador o dever de zelar pela higidez física e mental do trabalhador, atribuindo-lhe inúmeros deveres de cuidado".
No presente caso a autora passou por duas cirurgias no punho, tendo se submetido ainda a tratamento medicamentoso e fisioterápico, sendo que após conseguir a alta do benefício previdenciário foi despedida imotivadamente. Conforme a perícia médica ficou caracterizado que a doença da autora ocorreu devido a atividade laborativa que exercia na empresa.
O TRT4 condenou a empresa ao pagamento de dano moral, material e pensão mensal vitalícia, considerando que no laudo pericial consta a possibilidade de reabilitação da autora, calculada na base de 12% sobre o último salário da autora. Abaixo segue o acórdão para análise dos amigos.
No presente caso a autora passou por duas cirurgias no punho, tendo se submetido ainda a tratamento medicamentoso e fisioterápico, sendo que após conseguir a alta do benefício previdenciário foi despedida imotivadamente. Conforme a perícia médica ficou caracterizado que a doença da autora ocorreu devido a atividade laborativa que exercia na empresa.
O TRT4 condenou a empresa ao pagamento de dano moral, material e pensão mensal vitalícia, considerando que no laudo pericial consta a possibilidade de reabilitação da autora, calculada na base de 12% sobre o último salário da autora. Abaixo segue o acórdão para análise dos amigos.
EMENTA: RECURSO ORDINÁRIO DA RECLAMADA.
DOENÇA OCUPACIONAL. SÍNDROME DO TÚNEL DO CARPO. MOVIMENTOS REPETITIVOS. A
caracterização do dano que configura o direito à reparação depende da
configuração dos seguintes elementos: ilicitude (ato omissivo ou comissivo),
dano e nexo causal entre ambos. Hipótese em que restou demonstrado que as
atividades da reclamante exigiam movimentos repetitivos (preensão palmar e
pinça), dando causa ao surgimento da síndrome do túnel do carpo. A omissão da
empresa quanto à implementação de medidas a fim de evitar o surgimento de
doenças relacionadas ao trabalho configura a culpa e o dever de indenizar, na
forma do art. 186 do Código Civil. Provimento negado.
INDENIZAÇÃO POR DANO MATERIAL. INCAPACIDADE PARCIAL E
TEMPORÁRIA. CONVERSÃO DA PARCELA ÚNICA EM PENSÃO MENSAL. Laudo pericial que
atesta que a patologia da autora é temporária, sendo possível a reabilitação.
Havendo essa probabilidade afirmada nos autos, não se afigura possível a
concessão da indenização em parcela única, ainda que se reconheça o direito de
opção do credor, previsto no parágrafo único do art. 950 do CPC. Conversão da
indenização em pensão mensal, sem termo previamente estipulado, já que, para
todos os efeitos, a incapacidade prevalece, até que nova situação de fato venha
a obstar o pagamento da pensão, cuja revisão é possível através de ação
apropriada. Provido o recurso, para converter em pensão mensal a indenização
fixada pela sentença através de parcela única.
RECURSO ORDINÁRIO DA RECLAMANTE. INDENIZAÇÃO POR DANO
MATERIAL. PERCENTUAL ATRIBUÍDO À INCAPACIDADE. A transitoriedade da
incapacidade não é fator determinante para a fixação do percentual de perda
laborativa, que é arbitrada de acordo com a conclusão técnica pericial. Por
menor que seja o tempo de permanência da incapacidade, enquanto ela perdurar o
trabalhador estará impedido de exercer integralmente sua atividade e, conseqüentemente,
de prover adequadamente o seu sustento. A perda funcional é mensurada para o
presente, e se projeta para o futuro, indefinidamente, enquanto não reduzida ou
curada a patologia apresentada. Provido o apelo, para majorar de 5% (cinco por
cento) para 12% (doze por cento) o percentual atribuído à perda da capacidade
laboral.
(TRT-4, Proc.n.0063800-13.2009.5.04.0531, 8ª Turma, Desembargadora Relatora Ana Rosa Pereira Zago Sagrilo, publicação 13.05.2011)
VISTOS e relatados estes
autos de RECURSO ORDINÁRIO interposto de sentença proferida pelo MM.
Juiz da Vara do Trabalho de Farroupilha, sendo recorrentes CLEIDE SALETE WIATTER DE OLIVEIRA E TRAMONTINA
FARROUPILHA S.A. - INDÚSTRIA METALÚRGICA e recorridos OS MESMOS.
Inconformadas com a sentença de fls. 616-22, da lavra do Juiz
Adair João Magnaguagno, as partes recorrem ordinariamente.
A reclamante, consoante razões de fls. 625-33,
pretendendo a majoração da indenização por danos materiais e morais, e a
reforma da decisão com relação aos juros e correção monetária.
A reclamada, a seu turno, insurge-se em relação aos
seguintes itens, objetos do seu apelo de fls. 635-8: inexistência de doença
ocupacional, indenização por danos morais, estéticos e materiais, FGTS do
período de afastamento e honorários assistenciais.
Com contra-razões da reclamante às fls. 646-61 e da reclamada
às fls. 635-8, os autos sobem a este Tribunal para julgamento.
É o relatório.
RECURSO ORDINÁRIO DA RECLAMADA (Inversão da análise dos
recursos em razão da prejudicialidade da matéria).
DOENÇA OCUPACIONAL. NEXO CAUSAL.
Insurge-se a ré contra o reconhecimento da doença ocupacional
pela sentença, já que se funda em análise parcial da prova e no flagrante
cerceamento de defesa. Afirma que a decisão desconsiderou a impugnação ao laudo
pericial, onde demonstra-se ter o perito partido de premissas equivocadas,
firmando o laudo em afirmações da obreira que não condizem sequer com o
disposto na inicial. Entende comprovado inexistir incapacidade laboral, podendo
a autora desempenhar toda e qualquer atividade, sendo a patologia meramente
temporária. Aduz que não se pode fixar um percentual de perda de 24% sobre uma
patologia transitória e curável, muito menos definitivamente. Assinala que a
sentença não levou em consideração informações essenciais, como o fato de a autora,
antes de ser admitida na reclamada, ter trabalhado na colônia até os 20 anos,
realizando atividades agrícolas que por si só poderiam ter desencadeado as
lesões. Aponta confusão do perito ao trazer a lide a tabela DPVAT. Sustenta que
o laudo é fundado em suposições, já que não se realizou estudo aprofundado e
detalhado a respeito da existência ou não de nexo causal entre a alegada
patologia e as atividades realizadas na empresa. Registra que é muito maior a
probabilidade da patologia ser decorrente de condições de saúde pessoais da
obreira, das atividades agrícolas exercidas quando jovem ou das atividades
pessoais. Pondera que o perito não procedeu à análise de uma possível concausa
entre a patologia e a predisposição individual da autora, que por ser jovem,
claramente não teria adquirido a doença. Ressalta que nos arquivos médicos da
autora constam afastamentos sem qualquer vinculação com as atividades, motivo
pelo qual não existe CAT. Aduz que a reclamante nunca apresentou qualquer
limitação ou redução da capacidade laborativa em razão de qualquer patologia
com ligação ao período do contrato. Diz que o laudo traz dúvidas quanto ao nexo
causal e a concausa da patologia da autora. Indaga que procedimento deveria ter
tomado a reclamada para evitar a doença, se forneceu treinamento condizente,
proteção adequada e abundante, fiscalizando o uso, e se monitorou e adequou o
ambiente de trabalho, cumprindo a legislação. Invoca o §1º do art. 20 da Lei n.
8.213/91, argumentando que se não há incapacidade, não há doença enquadrável
como do trabalho. Entende comprovada a inexistência de nexo, afirmando não
existir culpa da empresa pela patologia acometida.
Ao exame.
Na inicial a autora informa que foi admitida pela
reclamada em 22.02.1995, como lixadora de peças de metais, passando à
função de prenseira a partir de 01.02.1996, e de alimentadora de
linha de produção, a partir de 16.01.2007. Foi despedida em 06.05.2009,
após ter obtido alta do benefício previdenciário. Afirma que se encontrava apta
ao ser contratada, tendo as tarefas empreendidas na empresa, de natureza
sistemática e repetitiva, a exigir esforço físico, ocasionado o surgimento de
doença ocupacional (fls. 03-4).
A reclamada defende-se, em síntese, negando a ocorrência
de quaisquer acidente ou condições de insegurança na empresa, ou que estivesse
a autora submetida ao emprego de força ou a repetição de movimentos na função
desempenhada. Afirma existir o rodízio de funções na empresa, de acordo com os
preceitos de ergonomia. Nega esteja a doença relacionada ao trabalho, e que
tenha a empresa deixado de atentar para as normas de segurança do trabalho
(fls. 73-4).
A sentença reconhece a existência de nexo causal entre a
doença alegada e as atividades da autora na empresa, reputando a esta, uma vez
caracterizada a culpa, o dever de indenizar.
Não merece reforma.
Incontroverso que o contrato de trabalho entre as partes vigeu
por 14 anos, dentre os quais aproximadamente 11 foram desempenhados pela autora
na função de prenseira (CTPS de fl. 26 e perfil profissiográfico
previdenciário, de fl. 31).
O perito médico refere que na aludida função a obreira operava
prensa. Trabalhando sentada, suas tarefas consistiam em colocar as peças
metálicas leves (garfos) no local em que seriam prensados e, após, depositá-las
na caixa ao lado. Em uma hora, furava cerca de 1000 garfos, sendo a máquina
acionada via pedal. Para isso, realizava movimentos de “preensão palmar”
e “pinça em local da prensa”, os quais exigiam a utilização dos
seguintes grupos osteomusculares: “loja
flexora e extensora de antebraços para pega das peças; lojas flexora e extensora de membros inferiores para
acionamento de pedal; sobrecarga sobre discos invertebrais tóraco-lombo-sacrais
devido permanência da postura sentado por longos períodos” (fl. 567).
Na entrevista com o perito, informou a autora que os primeiros
sintomas teriam surgido em 2003, e que os exames realizados a partir de então
correlacionaram as lesões à Síndrome do Túnel do Carpo. Passou por duas
cirurgias no punho direito, submetendo-se a tratamento medicamentoso e
fisioterápico (histórico da doença, fls. 569-70). Com a inicial foram acostados
diversos exames que apontam para a mesma conclusão (fls. 34/59).
O expert cita literatura médica que correlaciona o
aparecimento da doença à execução de movimentos repetitivos. A definição da
patologia é citada na fl. 578:
A síndrome do túnel do carpo caracteriza-se pela
compressão do nervo mediano ao nível do referido túnel, e manifesta-se
clinicamente por parestesias, dores nas mãos, sinal de Phalen e Tinel no punho.
Em fases mais avançadas, por hipoestesia tátil, térmica e dolorosa em
território do nervo mediano na mão, além de fraqueza e atrofia da musculatura
tênar.
Conclui o perito, com base na sintomatologia e nos achados de
exames físico e eletroneuromiográficos (resposta 11.8 aos quesitos da
reclamada – fl. 581) que “A Parte Reclamante
possui patologia Síndrome do Túnel do Carpo (STC) em punho direito, com
história prévia de procedimentos cirúrgicos.” (fl. 580).
Consignou ainda as seguintes conclusões (fl. 580):
b) A STC da Parte Reclamante apresenta nexo
causal com as atividades laborais que exercia na Parte Reclamada,
conforme citado em 'Avaliação Ergonômica'.
c) A STC possui caráter temporário, pois
existe tratamento cirúrgico e reabilitação indicados na literatura médica.
d) A Parte Reclamante apresenta contra-indicação
permanente para atividades com movimentos repetitivos com preensão palmar e
pinça.
e) A Parte Reclamante possui cicatriz em punho
direito, com consequente dano estético em nível leve.
e) Aplico a Tabela DPVAT: A 'perda total do uso de uma
das mãos' corresponde a 60%. Considerando que a perda funcional é parcial
(leve), aplico 2/5 sobre os 60% devido a perda funcional, atingindo 24%.
O dano estético leve (numa classificação Leve-Moderado-Grave)
(grifou-se)
A reclamada apresentou impugnação às conclusões do perito, as
quais são renovadas em sede recursal. Mas, ao contrário do que afirma nas
razões do apelo, as impugnações foram todas enfrentadas pela decisão de
primeiro grau.
A caracterização do dano que configura o direito à reparação
depende do ato praticado ou deixado de praticar pelo empregador, do resultado
lesivo deste ato em relação ao empregado e de que tenha havido nexo causal
entre ambos, ou seja, devem existir os seguintes elementos: ilicitude
(ato omissivo ou comissivo), dano e nexo causal.
No caso concreto, o dano resta cabalmente comprovado
através da perícia médica e dos inúmeros exames complementares realizados pela
autora e juntados com a inicial, que demonstram a presença de lesão no punho
direito, compatível com a patologia descrita pelo expert no laudo
pericial.
Já no que diz respeito ao nexo causal, o laudo é conclusivo no
sentido de que a doença acometida na autora (síndrome do túnel do carpo)
tem correlação com o trabalho desempenhado na empresa. Ao contrário do que
afirma a recorrente, o laudo não se funda em suposições, mas no exame clínico,
nos exames complementares e na análise das condições de trabalho da reclamante.
Vale ressaltar que as conclusões médicas do INSS também apontam a
síndrome do túnel do carpo (CID G56.0) como a patologia causadora da
incapacidade da reclamante (ver perícias de fls. 494-7, 501-4 , 512-5, 517-8, e
laudos periciais de fls. 529-32).
No laudo médico pericial o expert destacou que a patologia
pode ser desencadeada pela prática de movimentos repetitivos, fator este
presente na atividade da obreira. Nesse sentido, os próprios atestados de
saúde ocupacional juntados aos autos pela empresa (fls. 92-9), emitidos a
partir de 1996 – época em que a autora passou à função de prenseira –,
apontam os movimentos repetitivos como risco ocupacional presente nas
tarefas inerentes ao cargo.
Ademais, a síndrome do túnel do carpo vem descrita no Lista B do
Anexo II do Regulamento da Previdência Social (Dec. n. 3.048/99), como uma das
“DOENÇAS DO SISTEMA NERVOSO RELACIONADAS COM O
TRABALHO” (Grupo VI da CID-10), em decorrência de fatores de risco como
posições forçadas e gestos repetitivos (Z57.8).
Portanto, os elementos probantes presentes nos autos conduzem à
conclusão de que a doença adquirida pela autora originou-se no trabalho. As
queixas iniciais, surgidas em 2003, remetem a período em que a reclamante já
laborava na empresa, desempenhando a função de prenseira há pelo menos
seis anos. Nessa linha, os exames médicos da autora, os procedimentos
cirúrgicos a que foi submetida e os afastamentos do trabalho reforçam a
conclusão de que o trabalho foi a causa da doença adquirida.
Veja-se que no exercício de suas funções a reclamante chegava a
furar cerca de mil talheres em uma hora, realizando sempre o mesmo movimento de
“preensão” e “pinçamento” das peças durante toda a jornada de trabalho.
Como bem esclarecido pelo laudo médico pericial, as Lesões por
Esforço Repetitivo (LER) e os Distúrbios Ósteomusculares Relacionados ao
Trabalho (DORT) têm como desencadeantes fatores de natureza ergonômica, tais
como o esforço excessivo, alta repetitividade de um mesmo padrão de movimento,
incorreção postural, vibração, entre outros. Dessa forma, a submissão do
empregado ao exercício de atividades sob as condições anteriormente referidas,
durante toda uma jornada diária de trabalho, propicia o surgimento da LER e
DORT.
O Magistrado da origem bem esclarece que a constatação do nexo
causal nada tem a ver com a transitoriedade da doença. A possibilidade de
cura não afasta eventual conclusão quanto ao fato da patologia ter sido
originada em decorrência do trabalho. A constatação da doença e da relação
desta com o trabalho é que configuram o nexo causal, elemento que restou
demonstrado nos presentes autos.
Eventual hipótese excludente do nexo causal ou configuração de
concausa competia à ré comprovar, ônus do qual não se desincumbiu. Cumpre
ressaltar que além de não terem sido objeto da perícia, as atividades agrícolas
empreendidas pela autora não são apontadas pelo expert como causa da
patologia constatada.
A causa degenerativa levantada pela ré, de igual sorte, é
meramente especulativa, já que desacompanhada de qualquer prova ou elemento
técnico hábil a afastar a conclusão da perícia.
Cogitar da inexistência de incapacidade laborativa seria o mesmo
que acolher parcialmente o laudo pericial, o que não se afigura lógico e
consentâneo aos demais elementos de prova. O expert constatou que a
lesão acometida na autora ainda a impossibilita para o exercício de suas
atividades, apesar de já ter passado por duas cirurgias no punho direito.
Havendo incapacidade e não restando comprovada a causa degenerativa alegada
pela ré, restam afastadas, para o caso concreto, as situações delineadas pelo
§1º do art. 20 da Lei n. 8.213/91.
O fato dos laudos médicos do INSS não examinarem o nexo causal
não impede que a causa da doença seja investigada em ação judicial, conforme
entendimento já consolidado através do item II da Súmula n. 378 do TST.
Ademais, a empresa não emitiu a CAT, tendo a autora sido encaminhada para a
autarquia previdenciária no sentido de obter o auxílio-doença comum.
Apesar de o INSS constatar a mesma patologia (síndrome do túnel
do carpo), enaltece o perito judicial que a perícia médica da previdência não
avalia o posto de trabalho nem as atividades laborais in loco,
circunstâncias fundamentais para apuração do nexo.
No que tange à culpa da reclamada, melhor sorte não lhe
assiste.
Desde 2005 a reclamada reconhece, através da elaboração dos seus
próprios Programas de Prevenção de Riscos Ambientais (PPRA´s de fls. 192/381)
que o setor de estamparia da empresa, no qual a reclamante trabalhou por
onze anos como prenseira, proporciona riscos ocupacionais em decorrência
de esforço físico, movimentos repetitivos e postura inadequada, fatores
estes que são desencadeadores da síndrome do túnel do carpo, conforme descrito
no laudo pericial. O PPRA elaborado em 2009 inclusive sugere a aquisição de uma
prensa (guilhotina) de corte contínuo (fl. 228), o que só foi providenciado
pela ré depois de instalada a doença na obreira (ver observação do perito, de
fl. 567).
De outro lado, não há prova de que a reclamada tenha implementado
o rodízio de funções que alega em contestação, tampouco outras medidas,
previstas nos seus programas de prevenção, tendentes à redução dos riscos
ocupacionais.
A legislação infraconstitucional referente à segurança e medicina
do trabalho, recepcionada pela Constituição Federal, atribui ao empregador o
dever de zelar pela higidez física e mental do trabalhador, atribuindo-lhe
inúmeros “deveres de cuidado”, a exemplo do disposto nos artigos 154 e
seguintes da CLT.
Compete à empresa, portanto, atentar para as normas de segurança
e medicina do trabalho, adotando medidas preventivas a fim de evitar acidentes,
assim como o surgimento de doenças relacionadas ao trabalho.
A responsabilidade não se restringe ao cumprimento de requisitos
formais, como a elaboração e a manutenção de Programas de Prevenção e de
Controle de Saúde Ocupacional, sendo obrigação do empregador adotar na prática
as medidas de prevenção, de controle e de eliminação do risco ocupacional
apontadas, certificando-se, sobretudo, de que os empregados estão sendo
beneficiados pela sua implementação.
A reclamada foi negligente no implemento dessas medidas, dando
causa ao surgimento da doença na reclamante, configurando a culpa e o dever de
indenizar, na forma do art. 186 do Código Civil. O dispositivo em tela
estabelece que “Aquele que, por ação ou
omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a
outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito.”.
Mantém-se a sentença, analisando-se a questão do percentual de
incapacidade no tópico posterior.
RECURSOS ORDINÁRIOS DO RECLAMANTE E DA RECLAMADA (Análise
conjunta).
1. INDENIZAÇÃO
POR DANO MATERIAL E MORAL.
Reconhecida a existência de nexo causal e da culpa por parte da
ré, o Julgador condenou a empresa ao pagamento de indenização por dano moral,
da ordem de R$12.000,00, por dano estético, da ordem de R$1.200,00, e por dano
material, da ordem de R$31.700,00.
As partes recorrem.
O reclamante discorda do posicionamento da origem quanto
aos valores arbitrados. No que tange ao dano material, aduz que o perito concluiu
que a perda da capacidade laborativa da autora foi de 24%, de acordo com a
tabela DPVAT, tendo o Juízo fixado-a em 5%. Argumenta que não há elementos
técnicos que estabeleçam certeza quanto à reversibilidade da lesão, sendo a
possibilidade aventada no laudo matéria meramente especulativa. Pondera que a
questão é eminentemente técnica, e que a redução é desprovida de qualquer
amparo técnico. Requer, assim, que seja observado o percentual definido na
perícia técnica ou, alternativamente, critério mais razoável. Quanto ao dano
moral, refere que a indenização está fundamentada nos artigos 186, 927, 949 e
950 do Código Civil, bem assim nos incisos V e X do art. 5º da Constituição
Federal. Pondera que os danos extrapatrimoniais devem ser indenizados de acordo
com a condição econômica das partes, o grau de culpa do empregador, a gravidade
dos efeitos da doença, de forma a não significar valores irrisórios ou montante
que importe o enriquecimento da vítima ou a ruína do empregador. Sustenta que o
valor arbitrado não atende às finalidades da compensação pela lesão física
instalada e amenização dos sofrimentos de ordem moral, bem como à repressão
pelo ato culposo da recorrida, não servindo como medida de coibição à
reincidência do ato, dado o porte financeiro da ré. Postula a majoração da
indenização.
A reclamada, por sua vez, afirma não se poder falar em
dano de qualquer natureza, muito menos de ordem moral, senão em caso de culpa
grave ou dolo do empregador. Entende que o valor de R$13.000,00 arbitrado na
sentença mostra-se elevado a justificar o abalo moral sofrido. Da mesma forma,
impugna o valor fixado a título de danos materiais, por estar distante da
realidade, na medida em que o perito referiu que a suposta limitação é
temporária, não se podendo levar em consideração a expectativa de vida da
obreira, como se fosse realizar a apuração de uma pensão mensal vitalícia. Se o
perito não pode quantificar o período da incapacidade, argumenta que caberia ao
juízo fixá-lo, ou limitar ao período em que a autora encontrou-se em benefício
previdenciário. Alternativamente, postula a minoração da indenização a valores
módicos, em razão da transitoriedade da limitação funcional. Menciona que não
há prova de que a reclamante tenha sofrido em decorrência das lesões. Ressalta que
qualquer indenização deferida deve estar vinculada aos limites da
proporcionalidade e razoabilidade, levando em consideração a possibilidade de
quem paga, o caráter reparatório e pedagógico e existência de efetivo prejuízo.
Sustenta que não há fundamentação para a condenação em tela, já que não
comprovado o dano sofrido. Por cautela, pugna pela minoração do valor atribuído
à indenização por dano moral, considerando a inexistência de incapacidade
laboral e pela inexistência de culpa, não havendo, conforme máxima do direito
penal, como exigir da reclamada conduta diversa. Contesta a forma como foi
arbitrado o valor da indenização, já que o capital social declarado não
representa a lucratividade da empresa, podendo inclusive estar comprometido.
Prequestiona o inciso V do art. 5º da CF/88. Impugna a ré o deferimento do
pensionamento vitalício em parcela única. Destaca que o Julgador limitou-se “[...] a apontar qual seria o valor devido
integralmente, sem ponderar que a percepção em parcela única deve no mínimo levar
em consideração que a antecipação do pagamento, reduzindo-se o valor a ser
adimplido.” (sic –
fl. 638). Pondera que eventual incapacidade poderá cessar com o passar
do tempo, o que faria também com que cessasse a respectiva indenização.
Analisa-se.
a) Percentual atribuído à perda da capacidade laboral.
O laudo pericial utilizou-se da Tabela DPVAT como parâmetro para
estimar a perda da capacidade laborativa da autora.
O seguro obrigatório foi instituído por lei (Lei n. 6.194/74) e
indeniza as vítimas de acidentes com veículo automotor, dos quais resulte morte
ou invalidez permanente total ou parcial.
A invalidez é conceituada como a perda ou redução, em caráter
definitivo, das funções de um membro ou órgão, em decorrência de acidente
provocado por veículo automotor. O valor da indenização é apurado de acordo com
o percentual de incapacidade atribuído à vítima, por meio de tabela que
estabelece o índice de perda funcional de acordo com o órgão ou membro
atingido.
Trata-se de tabela oficial amplamente utilizada nos casos de
responsabilidade civil, inclusive nos de acidente laboral ou doença ocupacional
dos quais resulte incapacidade para o trabalhador.
Sendo assim, correto o procedimento do perito em adotar a tabela
DPVAT, e ele o faz nos seguintes termos: “A
'perda total do uso de uma das mãos' corresponde a 60%. Considerando que
a perda funcional é parcial (leve), aplico 2/5 sobre os 60% devido a perda
funcional, atingindo 24%. O dano estético leve (numa classificação
Leve-Moderado-Grave)” (fl. 581).
Considerando que a autora não teve perda total da função da sua
mão direita, mas que continua presente a incapacidade para o trabalho, a qual o
perito classificou como leve, arbitrou-se o percentual de perda em 24%.
O julgador, no entanto, reduziu esse quantitativo, pelos
seguintes fundamentos (fl. 620):
[...] No que pertine ao percentual de perda, com
efeito, impõe-se ajustar o percentual de perda apurado pelo perito,
pois a tabela DPVAT é utilizada como parâmetro para o caso de perda ou
redução permanente da capacidade laboral. No caso, em havendo redução
temporária (e não permanente) da capacidade laboral, com
possibilidade (porém não a certeza) da reversibilidade da lesão (mesmo após a
realização de cirurgias e de longos períodos de afastamento, o punho direito da
autora não está totalmente curado), e sendo a lesão da reclamante de grau leve
(com força muscular em grau IV, em escala de I a V, na preensão palmar e
interósseos e pinça polegar-indicador à direita, conforme item 9, “G”, 4, “a”,
do laudo, fl. 574), sem incapacidade para o trabalho (sendo indeferido o pedido
de reconsideração acerca da manutenção de benefício previdenciário, fl. 551),
acolho parcialmente a impugnação oposta, ajustando o percentual de perda
funcional para 5% da tabela DPVAT.
(grifou-se)
Merece parcial reforma.
A transitoriedade da incapacidade não é fator determinante para a
fixação do percentual de perda laborativa. Por menor que seja o tempo de
permanência da incapacidade, enquanto ela perdurar o trabalhador estará impedido
de exercer integralmente sua atividade e, conseqüentemente, de prover
adequadamente o seu sustento.
A perda funcional é mensurada para o presente, e se projeta para
o futuro, indefinidamente, enquanto não reduzida ou curada a patologia
apresentada.
No caso concreto, estimou o perito uma perda funcional de 24%,
que persistirá enquanto não reabilitada a autora da síndrome a que foi
acometida.
Contudo, assiste razão ao Magistrado quanto a merecer redução o
percentual arbitrado.
O perito aponta no laudo que a principal queixa da autora é “fraqueza
na mão direita” (fl. 569), e constata que de fato há perda da força
muscular, de grau leve, na mão direita (fl. 574).
Segundo o expert, a força muscular é classificada em uma
escala de I a V, encontrando-se a reclamante no nível IV, ou seja, perdeu
apenas um grau em relação à força normal, o que reforça a conclusão pericial
quanto à perda funcional classificada como de grau leve.
Não obstante a coerência do laudo, no aspecto, o perito aplicou a
fração de 2/5 sobre o percentual equivalente à perda total do membro (60%),
como se a autora tivesse perdido dois graus na escala de força.
Pela lógica adotada no laudo, a perda funcional da autora, que é
classificada como leve, representaria 1/5 do percentual de 60% atribuído para a
“perda total do uso de uma das mãos”, prevista na tabela DPVAT,
resultando em 12% (doze por cento) a perda da capacidade laborativa.
Sendo assim, dá-se provimento parcial ao recurso ordinário da
reclamante para fixar em 12% (doze por cento) o percentual atribuído à perda da
capacidade laborativa da autora.
b) Indenização por dano material. Parcela única.
Assim decidiu o Juízo da origem no que tange à matéria:
Faz jus à reclamante, portanto, ao pagamento de
indenização correspondente à redução da capacidade laborativa causada pelo
empregado (5%, já considerado o prognóstico de reversibilidade). Em sendo
o pedido principal da parte o de pagamento de indenização em parcela única,
fica prejudicada a análise do pedido sucessivo de pagamento de forma mensal
e vitalícia. Ademais, é direito da reclamante preferir o pagamento da
indenização em parcela única (art. 950, parágrafo único, do Código Civil).
(grifou-se)
Com efeito, restou comprovado o nexo causal entre a doença de que
sofre a autora (síndrome do túnel do carpo) e as atividades realizadas na
empresa, tendo o perito concluído pela perda funcional da reclamante.
Configurados também a culpa da empresa e o dever de indenizar,
incide à espécie o artigo 950 do Código Civil, in verbis:
Se da ofensa resultar defeito pelo qual o ofendido não
possa exercer o seu ofício ou profissão, ou se lhe diminua a capacidade de
trabalho, a indenização, além das despesas do tratamento e lucros
cessantes até ao fim da convalescença, incluirá pensão correspondente à
importância do trabalho para que se inabilitou, ou da depreciação
que ele sofreu.
(grifou-se).
A importância do trabalho para o qual se inabilitou a autora
corresponde a 12% (doze por cento), sendo esta a medida da indenização a
título de dano material incidente no caso concreto, a qual se resolve pelo
pagamento de uma pensão mensal.
A pensão mensal vitalícia, portanto, liga-se à perda ou redução
permanente da capacidade laborativa. Seu objetivo é compensar economicamente o
trabalhador, presumindo o legislador que, em situações tais, a produtividade (e
os ganhos econômicos dela resultantes) reduz-se de forma proporcional ao grau
de incapacidade adquirida.
Incide aqui a regra da restitutio in integrum, consagrada
no art. 944 do CCB, segundo o qual “A indenização
mede-se pela extensão do dano.”. Nesse sentido, a doutrina de Sergio
Cavalieri Filho (Programa de Responsabilidade Civil, Malheiros, 2005, 6ª edição
revista e aumentada, páginas 135-5):
(...) no caso de sofrer a vítima ferimento ou ofensa à
saúde que lhe acarrete temporária ou permanente redução da capacidade
laborativa, como, por exemplo, perda de um braço, perna, olho (arts. 949 e 950
do Código Civil), a indenização consistirá, além dos danos emergentes -
despesas de tratamento etc. -, em lucros cessantes até o fim da
incapacidade, se temporária, ou, se permanente, durante toda a sua sobrevida. A
pensão será fixada com base nos ganhos da vítima e na proporção da redução de
sua capacidade laborativa, arbitrada por perícia médica.
(grifou-se)
No caso concreto, a perda da autora não é permanente, “pois existe tratamento cirúrgico e reabilitação
indicados na literatura médica” (laudo – fl. 580).
Ainda que o laudo refira que é temporária a limitação funcional
da reclamante, o perito não precisou o período até a convalescença,
pressupondo-se o cumprimento dos tratamentos propostos.
Mister ressaltar que a autora já passou por fisioterapia e duas
cirurgias na tentativa de reverter o quadro clínico, não obtendo sucesso na
cura da doença.
Para todos os efeitos, portanto, a incapacidade prevalece, até
que nova situação de fato venha a obstar o pagamento da pensão, cuja revisão é
possível através de ação apropriada. A natureza da parcela é alimentar, e
vincula-se diretamente à limitação do trabalhador.
Mas, ainda que não haja certeza quanto à cura, há prognóstico
técnico, consubstanciado no laudo pericial realizado nos autos, de que é
possível a reabilitação da reclamante. E havendo essa probabilidade afirmada
nos autos, não se afigura possível, ainda que se entenda pelo direito de opção
do credor, a concessão da indenização em parcela única.
A data inicial do pagamento da pensão deve coincidir com a alta
do benefício previdenciário, ou seja, 01.05.2009. Esta foi a data fixada pelo
Julgador da origem em relação ao marco inicial do prazo prescricional, e que
não é objeto de recurso pelas partes. Ademais, adota-se na sentença a tese,
compartilhada pelo Regional, de que a lesão resta caracterizada quando o
empregado toma conhecimento da consolidação e estabilização dos seus efeitos na
capacidade laborativa.
Não há fundamento legal para que a indenização seja limitada ao
período de gozo de benefício previdenciário, como postula a ré. A pensão mensal
deve perdurar por todo o período de convalescença, sendo a perícia médica atual
e conclusiva quanto a existência de incapacidade.
Sendo assim, dá-se provimento parcial ao recurso ordinário da
reclamada para converter em pensão mensal vitalícia a indenização por dano
material concedida na sentença através de parcela única, a ser calculada na
base de 12% (doze por cento) sobre o valor do último salário percebido pela
reclamante (R$1.243,00 mensais, fl. 30), em parcelas vencidas desde 01.05.2009
e vincendas, com juros e correção monetária, em valores a serem apurados em liquidação
de sentença.
c) Constituição de capital.
A questão restou prejudicada em face do deferimento, pela
sentença, da indenização em parcela única.
No entanto, reformada a decisão, deve ser apreciada a matéria
trazida com a inicial.
Quando à constituição de capital, dispõe o artigo 475-Q do CPC
que:
Art. 475-Q. Quando a indenização por ato ilícito
incluir prestação de alimentos, o juiz, quanto a esta parte, poderá
ordenar ao devedor constituição de capital, cuja renda assegure o
pagamento do valor mensal da pensão.
§ 1º Este capital, representado por imóveis, títulos
da dívida pública ou aplicações financeiras em banco oficial, será inalienável
e impenhorável enquanto durar a obrigação do devedor.
(...)
§ 5º Cessada a obrigação de prestar alimentos, o juiz
mandará liberar o capital, cessar o desconto em folha ou cancelar as garantias
prestadas. (grifou-se).
A constituição de capital tem por finalidade assegurar o
cumprimento da obrigação pelo devedor, mormente quando a indenização pelo ato
ilícito reverte-se em pensionamento mensal.
Tendo em vista o deferimento da pensão mensal à reclamante, e da
expectativa de sobrevida que a ela se atribui (42,5 anos, em média, conforme
refere o Julgador da origem – fl. 621, in fine), e caso perdure
indefinidamente a incapacidade, mais se torna necessária a implementação dessa
garantia.
Nesta senda, dá-se provimento ao recurso ordinário da reclamante
para determinar a constituição de capital pela reclamada, na forma do art.
475-Q do CPC.
d) Indenização por dano moral.
Salienta-se que o dano moral é presumido nas hipóteses de
acidente de trabalho ou doença ocupacional das quais resultem diretamente danos
físicos ao trabalhador, como no caso dos autos.
A lesão física suportada pelo empregado faz presumir o impacto na
sua esfera subjetiva, causando ofensa aos direitos da personalidade e à sua
dignidade, razão pela qual deve ser objeto de reparação, a teor do art. 5º,
incisos V e X, da Carta Magna.
Salutar a doutrina de José Affonso Dallegrave Neto, na obra
Responsabilidade Civil no Direito do Trabalho (Editora LTr: 2005, página 216),
ao assim lecionar:
O dano é considerado moral quando violam os direitos
de personalidade, originando, de forma presumida, angústia, dor, sofrimento,
tristeza ou humilhação à vítima, trazendo-lhe sensações e emoções negativas.
Não se pode negar que todos esses sentimentos afloram na vítima de acidente e
doenças do trabalho. A lesão à dignidade humana e, por conseqüência, o dano moral
são inevitáveis e presumidos.
Quanto ao valor a ser indenizado, muito embora extremamente
subjetiva a valoração do abalo emocional (pretium doloris), a quantia
fixada a título de indenização não deve ser insignificante, de forma a
estimular a reiteração do ato ilícito, tampouco exagerada, proporcionando o
enriquecimento indevido da vítima. O valor da indenização deve atender aos
critérios pedagógico, punitivo e reparador, balizadores da reparação do dano
moral. Deve, de igual forma, instigar a ré a tomar as devidas e necessárias
providências no intuito de evitar acidentes e o surgimento de doenças
ocupacionais, como aquela vivenciada pela autora.
Levando em conta os parâmetros elencados, entende-se que o valor
de R$12.000,00 (doze mil reais) arbitrado à indenização por dano moral atinge
tanto a finalidade pedagógico-punitiva quanto a reparatória, sem ser irrisório
no intuito de compensar o abalo suportado pela autora, razão pela qual não deve
sofrer qualquer redução ou majoração.
Vale ressaltar, quanto ao apelo da reclamada, que o valor não é
elevado. A reclamante passou por duas cirurgias objetivando, sem sucesso, a
cura da doença. Em que pese a apuração do quantum dependa das
circunstâncias fáticas de cada caso, o valor encontra-se consentâneo em relação
àqueles usualmente fixados por este Regional em casos semelhantes. Nesse
sentido, o acórdão da lavra desta Relatora, proferido nos autos do processo n.
0110200-87.2005.5.04.0511 [RO] (Data: 09/07/2009), e que restou assim ementado:
EMENTA: RECURSO DA RECLAMANTE. RESPONSABILIDADE CIVIL
DO EMPREGADOR. SÍNDROME DO TÚNEL DO CARPO. MOVIMENTOS REPETITIVOS. O Decreto nº
3.048/99, alterado pelo de nº 6.042/2007, regulamenta a aplicação do nexo
técnico epidemiológico. Ao tratar das “doenças do sistema nervoso central
relacionadas com o trabalho”, menciona que a Síndrome do Túnel do Carpo
(G.56.0) tem como agentes etiológicos ou fatores de risco de natureza
ocupacional “posições forçadas e gestos repetitivos”. Recurso provido.
Muito embora a capacidade econômica do ofensor seja parâmetro a
balizar o arbitramento da indenização, justamente por se atribuir à condenação
um caráter punitivo-pedagógico, equivoca-se a reclamada ao referir que a
sentença fixa a indenização com base no seu capital social. Não há esta informação
nos autos.
Recursos aos quais se nega provimento.
2. JUROS
E CORREÇÃO MONETÁRIA.
A fim de evitar a preclusão, a autora recorre dos critérios
adotados na origem acerca dos juros e correção monetária. Invoca a aplicação da
Súmula n. 54 do STJ, segundo a qual os juros moratórios fluem a partir do
evento danoso, em caso de responsabilidade extracontratual. Conclui, assim, que
os juros e correção monetária devem incidir a partir da data da lesão. Por
cautela, argumenta pela aplicação do art. 883 da CLT. Transcreve julgados deste
Regional sobre a matéria.
Efetivamente, as indenizações por dano moral e material, por
terem sido arbitradas por decisão judicial, sofrem correção monetária somente a
partir da sentença, na medida em que a indenização já visa compensar a vítima
em um valor atual, proporcional à extensão do dano. Nesse sentido, inclusive, a
Súmula n. 50 deste Regional:
RESPONSABILIDADE CIVIL. DANO MORAL. CORREÇÃO
MONETÁRIA. TERMO INICIAL. Fixada a indenização por dano moral em valor
determinado, a correção monetária flui a partir da data em que prolatada a
decisão, sob o pressuposto de que o quantum se encontrava atualizado naquele
momento.
A pensão decorrente da incapacitação para o trabalho, por sua
vez, é paga através de parcelas mensais, com base na remuneração da vítima,
sendo devida desde a data da alta do benefício previdenciário. Assim, cada
parcela deve sofrer atualização monetária a partir do seu respectivo
vencimento.
Quanto aos juros de mora, mesmo no caso do pensionamento mensal,
são devidos apenas a partir do ajuizamento da ação, na forma do art. 883 da CLT
e art. 39 da Lei n. 8.177/91. Não se adota, para tal fim, a Súmula n. 54 do
STJ.
Nesta senda, dá-se provimento parcial ao recurso ordinário da
reclamante, para determinar que os juros de mora sejam contados a partir do
ajuizamento da ação, e que a correção monetária sobre a pensão mensal incida a
partir do respectivo vencimento de cada parcela.
RECURSO ORDINÁRIO DA RECLAMADA (Matérias remanescentes).
1. FGTS
DO PERÍODO DE AFASTAMENTO.
A reclamada entende indevida a determinação de recolhimento do
FGTS no período em que a autora esteve em gozo de benefício previdenciário.
Aduz que sempre procedeu de forma correta ao recolhimento da parcela durante a
contratação, sendo obrigatório o FGTS apenas quando o afastamento tiver por
motivo acidente do trabalho, conforme art. 15, §5º da Lei n. 8.036/90. Afirma
que a autora percebeu benefício previdenciário em período posterior ao término
do pacto laboral, estando afastada por motivos pessoais de saúde e não em razão
do trabalho, sendo incabível responsabilizar a ré por eventuais diferenças no
período.
Sem razão.
Via de regra, o gozo de benefício previdenciário do tipo
auxílio-doença comum acarreta a suspensão do contrato de trabalho, eximindo o
empregador da obrigação de arcar com determinadas parcelas contratuais, entre
elas o recolhimento do FGTS.
Contudo, a legislação determina a efetivação dos depósitos nos
casos de afastamento em decorrência de acidente de trabalho.
É o que se depreende dos artigos 15, § 5º da Lei nº 8.036/90 e 28
do Decreto nº 99.684/90, in verbis:
Art. 15. Para os fins previstos nesta lei, todos os
empregadores ficam obrigados a depositar, até o dia 7 (sete) de cada mês, em
conta bancária vinculada, a importância correspondente a 8 (oito) por cento da
remuneração paga ou devida, no mês anterior, a cada trabalhador, incluídas na
remuneração as parcelas de que tratam os arts. 457 e 458 da CLT e a
gratificação de Natal a que se refere a Lei nº 4.090, de 13 de julho de 1962,
com as modificações da Lei nº 4.749, de 12 de agosto de 1965.
(...)
§ 5º O depósito
de que trata o caput deste artigo é obrigatório nos casos de afastamento para
prestação do serviço militar obrigatório e licença por acidente do trabalho.
Art. 28. O depósito na conta vinculada do FGTS é
obrigatório também nos casos de interrupção do contrato de trabalho prevista em
lei, tais como:
(...)
III - licença por acidente de trabalho;
(grifou-se)
Tendo a sentença reconhecido que a doença acometida na autora tem
origem ocupacional, sendo causa, inclusive, do seu afastamento do trabalho,
impõe-se a determinação do recolhimento do FGTS no respectivo período.
Ressalte-se que tinha o empregador a obrigação de emitir a CAT,
na medida em que a doença tinha relação com o trabalho. O fato do INSS ter
concedido o auxílio-doença ao invés do auxílio-acidente, conforme já referido,
não impede o reconhecimento do nexo causal por decisão judicial.
Tal declaração projeta efeitos no contrato de trabalho, como a
sua interrupção para efeitos trabalhistas e, com esta, a obrigação do
empregador em recolher o FGTS.
Sentença mantida.
2. HONORÁRIOS
ASSISTENCIAIS.
Sustenta a ré que para a fixação dos honorários assistenciais é
necessário o preenchimento de alguns requisitos, como o caso da credencial
sindical, a qual inexiste nos autos. Invoca a aplicação das Súmulas 219 e 329
do TST, excluindo da condenação os honorários deferidos.
Com razão.
Este Colegiado, revendo posicionamento anteriormente adotado,
e em consonância com a jurisprudência consolidada do Tribunal Superior do
Trabalho (Súmulas 219 e 329), passa a ter por aplicáveis nesta Justiça
Especializada apenas as normas constantes da Lei nº 5.584/70 para fins de
deferimento do benefício da Assistência Judiciária e, conseqüentemente, dos
honorários advocatícios daí decorrentes (honorários assistenciais).
Assim, são requisitos para o deferimento de honorários
advocatícios, nas lides decorrentes da relação de emprego, a apresentação de
credencial sindical e a percepção de salário inferior ao dobro do
mínimo legal (ou, alternativamente a este, a apresentação de declaração de
pobreza).
No caso concreto, apesar de ter sido firmada declaração de
pobreza (fl. 20), inexiste nos autos credencial sindical fornecida pelo
sindicato da categoria profissional, nos termos do art. 14 da Lei nº 5.584/70,
razão pela qual merece reforma a sentença.
Dá-se provimento ao recurso ordinário da reclamada para
absolvê-la da condenação ao pagamento de honorários assistenciais fixados em
15%
CONTRA-RAZÕES DA RECLAMADA.
LITIGÂNCIA DE MÁ-FÉ.
Em contra-razões a reclamada acusa a autora de agir de má-fé ao
intentar a majoração de valores já deferidos na sentença, razão pela qual pugna
pela aplicação de multa a tal título, como forma de coibir prática que vem
ocorrendo de forma reiterada na Justiça do Trabalho.
Nada a deferir.
A autora utiliza-se do seu lídimo direito de recorrer das
decisões judiciais, assegurado constitucionalmente pelo art. 5º, inciso LV.
Apesar de obtidas as indenizações postuladas, assiste-lhe interesse em discutir
os valores arbitrados pela sentença, postulando a sua majoração caso estejam
aquém dos limites deduzidos na inicial.
Ademais, não resta demonstrada objetivamente ou quiçá comprovada,
qualquer infringência às disposições constantes do artigo 17 do CPC.
Inexiste, pois, suporte legal à aplicação da pena de litigância
de má-fé prevista no art. 18 do CPC.
Indefere-se a pretensão.
ACORDAM os Magistrados integrantes da 8ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região: por
unanimidade, dar provimento parcial ao recurso ordinário da reclamante para: a)
fixar em 12% (doze por cento) o percentual atribuído à perda da capacidade
laborativa da autora; b) determinar a constituição de capital pela reclamada,
na forma do art. 475-Q do CPC; c) determinar que os juros de mora sejam
contados a partir do ajuizamento da ação, e que a correção monetária sobre a
pensão mensal incida a partir do respectivo vencimento de cada parcela. Por
unanimidade, dar provimento parcial ao recurso ordinário da reclamada para: a)
converter em pensão mensal vitalícia a indenização por dano material concedida
na sentença através de parcela única, a ser calculada na base de 12% (doze por
cento) sobre o valor do último salário percebido pela reclamante (R$1.243,00
mensais, fl. 30), em parcelas vencidas desde 01.05.2009 e vincendas, com juros
e correção monetária, em valores a serem apurados em liquidação de sentença; b)
absolvê-la da condenação ao pagamento de honorários assistenciais fixados em
15% (quinze por cento) do valor da condenação. Valor da condenação que se reduz
para R$17.000,00 (dezessete mil reais), para os fins legais.
Porto Alegre, 5 de maio de 2011
(quinta-feira).
Relatora
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