Flexibilização no critério de baixa renda
Nesta sexta-feira será visto uma jurisprudência que trata sobre os critérios de baixa renda para análise do benefício de auxílio-reclusão e a possibilidade de flexibilização. Abaixo segue a decisão para análise dos amigos.
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. AUXÍLIO-RECLUSÃO. CRITÉRIO DE BAIXA RENDA. FLEXIBILIZAÇÃO. ÍNFIMO VALOR QUE ULTRAPASSA O MÁXIMO LEGAL. BENEFÍCIO ALIMENTAR A MENOR IMPÚBERE. NÃO INCIDÊNCIA DE PRESCRIÇÃO. DIB NA DATA DO RECOLHIMENTO AO CÁRCERE. SENTENÇA REFORMADA PARA CONCESSÃO DO BENEFÍCIO.
1. Dispunha o art. 80 da Lei nº 8.213/91, na redação vigente na data da prisão do instituidor, que o “benefício do auxílio-reclusão será devido, nas mesmas condições da pensão por morte, aos dependentes do segurado recolhido à prisão, que não receber remuneração da empresa nem estiver em gozo de auxílio-doença, de aposentadoria ou abono de permanência em serviço”.
2. No caso dos autos, a discussão resume-se ao fato de a última remuneração do instituidor ter ultrapassado o limite estabelecido pela Portaria MF 08/2017, qual seja, R$ 1.025,81 (um mil e vinte e cinco reais e oitenta e um centavos).
3. A TNU, no julgamento do Tema 169, fixou o entendimento de que “é possível a flexibilização do conceito de “baixa-renda” para o fim de concessão do benefício previdenciário de auxílio-reclusão desde que se esteja diante de situações extremas e com valor do último salário-de-contribuição do segurado preso pouco acima do limite legal – “valor irrisório”. O mesmo é o entendimento do STJ e desta Corte. Precedentes.
4. No caso em discussão, o último salário de contribuição (R$ 849,84, referente a 27 dias) não ultrapassa o máximo legal. As remunerações imediatamente anteriores (R$ 1.111,54, R$ 1.082,12 e 1.083,24) ultrapassam o valor máximo em menos de R$ 100,00. Trata-se a beneficiária, ainda, de menor impúbere e não há registro de atividade remunerada em nome de sua genitora, tratando-se de verba indispensável à sua subsistência.
5. A jurisprudência relativiza a data de início do benefício quando este é requerido por absolutamente incapazes, pois, consoante o art. 198, I, do Código Civil, prevê que não corre a prescrição contra absolutamente incapazes. Assim, deve a DIB ser fixada na data do recolhimento ao cárcere ainda que requerido após o prazo de trinta dias. Precedente.
6. Apelação provida para julgar procedente o pedido.
TRF 1ª, ApCiv. 1010658-85.2020.4.01.3400, 9ª T., Juiz Federal relator Paulo Roberto Lyrio Pimenta, 06/12/2024.
ACÓRDÃO
Decide a Nona Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região, por unanimidade, DAR PROVIMENTO AO RECURSO nos termos do voto do relator.
Juiz Federal PAULO ROBERTO LYRIO PIMENTA
Relator convocado
RELATÓRIO
Trata-se de apelação interposta pela parte autora em face de sentença que julgou improcedente o pedido de concessão de auxílio-reclusão.
Narra a apelante, em suas razões, que comprovou o preenchimento de todos os requisitos para concessão do benefício, quais sejam: recolhimento do instituidor à prisão, qualidade de segurado, qualidade de dependente e salário de contribuição inferior ao limite estabelecido pela Portaria Interministerial 19/2014.
Contrarrazões não apresentadas.
É o relatório.
VOTO
Em relação ao benefício discutido nestes autos, dispunha o art. 80 da Lei nº 8.213/91, na redação vigente na data da prisão instituidor, que o “benefício do auxílio-reclusão será devido, nas mesmas condições da pensão por morte, aos dependentes do segurado recolhido à prisão, que não receber remuneração da empresa nem estiver em gozo de auxílio-doença, de aposentadoria ou abono de permanência em serviço”.
Era, ainda, a redação do Decreto 3.048/99:
Art. 116. O auxílio-reclusão será devido, nas mesmas condições da pensão por morte, aos dependentes do segurado recolhido à prisão que não receber remuneração da empresa nem estiver em gozo de auxílio-doença, aposentadoria ou abono de permanência em serviço, desde que o seu último salário-de-contribuição seja inferior ou igual a R$ 360,00 (trezentos e sessenta reais).
§ 1º É devido auxílio-reclusão aos dependentes do segurado quando não houver salário-de-contribuição na data do seu efetivo recolhimento à prisão, desde que mantida a qualidade de segurado.
§ 2º O pedido de auxílio-reclusão deve ser instruído com certidão do efetivo recolhimento do segurado à prisão, firmada pela autoridade competente.
§ 3º Aplicam-se ao auxílio-reclusão as normas referentes à pensão por morte, sendo necessária, no caso de qualificação de dependentes após a reclusão ou detenção do segurado, a preexistência da dependência econômica.
§ 4º A data de início do benefício será fixada na data do efetivo recolhimento do segurado à prisão, se requerido até trinta dias depois desta, ou na data do requerimento, se posterior.
§ 4º A data de início do benefício será fixada na data do efetivo recolhimento do segurado à prisão, se requerido até trinta dias depois desta, ou na data do requerimento, se posterior, observado, no que couber, o disposto no inciso I do art. 105. (Redação dada pelo Decreto nº 4.729, de 2003)
§ 5º O auxílio-reclusão é devido, apenas, durante o período em que o segurado estiver recolhido à prisão sob regime fechado ou semi-aberto. (Incluído pelo Decreto nº 4.729, de 2003)
§ 6º O exercício de atividade remunerada pelo segurado recluso em cumprimento de pena em regime fechado ou semi-aberto que contribuir na condição de segurado de que trata a alínea "o" do inciso V do art. 9º ou do inciso IX do § 1º do art. 11 não acarreta perda do direito ao recebimento do auxílio-reclusão pelos seus dependentes. (Incluído pelo Decreto nº 4.729, de 2003)
No caso dos autos, a improcedência do pedido se deu pelo fato de a última remuneração do autor ter ultrapassado o limite estabelecido pela Portaria MPS/MF nº 19, de 10/01/2014:
Art. 5º O auxílio-reclusão, a partir de 1º de janeiro de 2014, será devido aos dependentes do segurado cujo salário-de-contribuição seja igual ou inferior a R$ 1.025,81 (um mil e vinte e cinco reais e oitenta e um centavos), independentemente da quantidade de contratos e de atividades exercidas.
É incontroverso que o último salário de contribuição percebido pelo instituidor foi de R$1.504,58 (um mil quinhentos e quatro reais e cinquenta e oito centavos).
A TNU, no julgamento do Tema 169, fixou o entendimento de que “é possível a flexibilização do conceito de “baixa-renda” para o fim de concessão do benefício previdenciário de auxílio-reclusão desde que se esteja diante de situações extremas e com valor do último salário-de-contribuição do segurado preso pouco acima do limite legal – “valor irrisório”.
É o mesmo o entendimento do STJ e desta Corte:
PROCESSUAL CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. AGRAVO INTERNO NOS EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO RECURSO ESPECIAL. AUXÍLIO-RECLUSÃO. FLEXIBILIZAÇÃO DO CRITÉRIO ECONÔMICO ABSOLUTO PREVISTO NA LEGISLAÇÃO PREVIDENCIÁRIA, AINDA QUE O SALÁRIO DE CONTRIBUIÇÃO DO SEGURADO SUPERE O VALOR LEGALMENTE FIXADO COMO CRITÉRIO DE BAIXA RENDA. POSSIBILIDADE. PREVALÊNCIA DA FINALIDADE DE PROTEÇÃO SOCIAL DA PREVIDÊNCIA SOCIAL. ARGUMENTOS INSUFICIENTES PARA DESCONSTITUIR A DECISÃO ATACADA. 1. Inicialmente, como consignado na decisão agravada, "em 9/4/2021, o Ministro Paulo de Tarso Sanseverino, Presidente da Comissão Gestora de Precedentes ? Portaria STJ 299/2017 ?, cancelou a afetação do presente recurso como representativo da controvérsia" (fl. 314, e-STJ). 2. Quanto ao pedido de concessão do auxílio-reclusão, a jurisprudência do STJ admite a flexibilização do critério econômico para a concessão do auxílio-reclusão, notadamente quando a diferença entre a remuneração do preso e o teto legal for ínfimo, como ocorre no presente caso. 3. Não apresentação de argumentos suficientes para desconstituir a decisão recorrida. 4. Agravo Interno não provido. (STJ - AgInt nos EDcl no REsp: 1917246 SP 2021/0014738-1, Relator: Ministro HERMAN BENJAMIN, Data de Julgamento: 13/12/2021, T2 - SEGUNDA TURMA, Data de Publicação: DJe 17/12/2021)
PREVIDENCIÁRIO. AUXÍLIO RECLUSÃO. COMPANHEIRA. UNIÃO ESTÁVEL. PROVA MATERIAL. PREVIDENCIÁRIO. RENDA SUPERIOR AO LIMITE LEGAL NA DATA DO RECOLHIMENTO À PRISÃO. FLEXIBILIZAÇÃO DO CRITÉRIO ECONÔMICO NO CASO. BENEFÍCIO CONCEDIDO. 1. A sentença, proferida na vigência do CPC/2015, não está sujeita à remessa oficial, tendo em vista que a condenação nela imposta não tem o potencial de ultrapassar o limite previsto no art. 496, § 3º. Precedentes do STJ. 2. O recurso de apelação, apresentado dentro do prazo previsto no art. 1.003, § 5º, do Código de Processo Civil, não pode ser considerado intempestivo. Arguição preliminar rejeitada. 3. A concessão do auxílio-reclusão, previsto no art. 80 da Lei nº 8.213/91, rege-se pela lei vigente à época do recolhimento à prisão, sendo exigidos os seguintes requisitos: (a) ocorrência do evento prisão; (b) demonstração da qualidade de segurado do preso; (c) condição de dependente do beneficiário; e (d) baixa renda do segurado à época da prisão. 4. Apresentada prova da existência de união estável, a companheira tem direito ao recebimento do benefício pelo prazo indicado no art. 77, § 2º, V c/c art. 80, com redação da Lei nº 13.135/2015. 5. Para a concessão do benefício, deve ser levada em consideração a remuneração percebida pelo segurado no momento da prisão e não o salário recebido em decorrência de vínculo anterior. Precedente do Superior Tribunal de Justiça. 6. O Superior Tribunal de Justiça tem admitido a flexibilização do critério econômico admitindo que o benefício seja concedido nos casos em que o salário de benefício tenha extrapolado o limite em pequeno valor. 7. Deve ser reconhecido o direito ao benefício se constatado que o segurado recebia, à época do recolhimento à prisão, salário inferior ao limite previsto no art. 13 da Emenda Constitucional nº 20/98, devidamente atualizado. 8. Remessa oficial não conhecida. Apelação interposta pelo INSS a que se nega provimento. (TRF-1 - AC: 10296225420194019999, Relator: DESEMBARGADORA FEDERAL MAURA MORAES TAYER, Data de Julgamento: 11/11/2021, PRIMEIRA TURMA, Data de Publicação: PJe 11/11/2021 PAG PJe 11/11/2021 PAG)
Analisado o CNIS de ID 155734131, o último salário de contribuição (R$ 849,84, referente a 27 dias) não ultrapassa o máximo legal. As remunerações imediatamente anteriores (R$ 1.111,54, R$ 1.082,12 e 1.083,24) ultrapassam o valor máximo em menos de R$ 100,00. Trata-se a beneficiária, ainda, de menor impúbere e não há registro de atividade remunerada em nome de sua genitora (CNIS de ID 155734132), tratando-se de verba indispensável à sua subsistência.
Quanto ao início do benefício, tem-se que, ao tempo do recolhimento à prisão, a autora era menor impúbere e, portanto, absolutamente incapaz (art. 3º do Código Civil). Ainda era absolutamente incapaz na data do requerimento, realizado apenas três meses após a prisão do instituidor (ID 155734121).
Salienta-se que, não obstante previsão específica para a matéria previdenciária, prevista no art. 74, I, da Lei 8.213/91, o Código Civil, em seu art. 198, I, prevê que não corre a prescrição contra absolutamente incapazes, razão pela qual a jurisprudência relativiza a data de início do benefício nestes casos.
Nesse sentido, precedente do STJ:
PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. REGIME GERAL DE PREVIDÊNCIA SOCIAL. PENSÃO POR MORTE. HABILITAÇÃO TARDIA DE DEPENDENTE ABSOLUTAMENTE INCAPAZ. ARTS. 79 E 103 DA LEI 8.213/1991. IMPRESCRITIBILIDADE. EXCEÇÃO. DUPLO PAGAMENTO DA PENSÃO PELO REGIME GERAL DE PREVIDÊNCIA SOCIAL. 1. A jurisprudência do STJ orienta-se no sentido de que, comprovada a absoluta incapacidade do requerente da pensão por morte, faz ele jus ao pagamento das parcelas vencidas desde a data do óbito do instituidor da pensão, ainda que não postulado administrativamente no prazo de trinta dias, uma vez que não se sujeita aos prazos prescricionais, salvo se o benefício já tenha sido pago a outro dependente previamente habilitado. 2. Não sendo o caso de habilitação tardia de menor com cumulação de dependentes previamente habilitados, o acórdão recorrido está em sintonia com a jurisprudência do STJ no sentido de que o termo inicial da pensão por morte deve retroagir à data do óbito. 3. Recurso Especial não provido. (REsp 1767198/RS, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 08/10/2019, DJe 18/10/2019)
Assim, a data de início do benefício deve retroagir à data do recolhimento à prisão (27/7/2014).
Em atenção ao expendido, DOU PROVIMENTO AO RECURSO para julgar procedente o pedido inicial e conceder à parte autora o benefício de auxílio-reclusão, com DIB em 27/7/2014 e DCB na data de progressão a regime aberto ou soltura, que deverá ser comprovada na fase executória.
Condeno o INSS na obrigação de pagar os valores retroativos entre a DIB e a DIP, atualizados nos termos do Manual de Cálculos do Distrito Federal.
Fixo os honorários em 10% do valor da condenação, obedecido ao disposto na Súmula 111 do STJ.
É o voto.
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