sexta-feira, 8 de março de 2024

Justiça concede pensão à filha de trabalhador rural

Nesta sexta-feira será visto uma jurisprudência que trata sobre a concessão do benefício de pensão por morte à filha de trabalhador rural, o qual restou comprovado o exercício de atividade rural em período anterior ao óbito. Abaixo segue a decisão para análise dos amigos.



EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. PENSÃO POR MORTE. TRABALHADOR RURAL. ATIVIDADE RURAL SEM REGISTRO. INÍCIO DE PROVA MATERIAL CORROBORADA POR IDÔNEA PROVA TESTEMUNHAL.
1. A pensão por morte é devida ao conjunto dos dependentes do segurado que falecer, aposentado ou não, e independe de carência.
2. Conforme o disposto no Art. 16, I e § 4º da Lei 8.213/91, a dependência econômica do filho não emancipado, de qualquer condição, menor de 21 (vinte e um) anos ou inválido ou que tenha deficiência intelectual ou mental que o torne absoluta ou relativamente incapaz, é presumida, não dependendo de comprovação.
3. O início de prova material restou corroborado pela prova testemunhal, demonstrando que o falecido exerceu atividade rural, mantendo a qualidade de segurado na data do óbito.
4. O e. Superior Tribunal de Justiça já decidiu que, para a descaracterização da condição de segurado especial rural, o afastamento das lides rurais não pode ser superior ao do período de graça.
5. Preenchidos os requisitos, a autora faz jus à percepção do benefício de pensão por morte, desde a data do óbito.
6. Aplica-se o disposto no Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal no que tange aos índices de correção monetária e taxa de juros de mora.
7. Os honorários advocatícios devem observar as disposições contidas no inciso II, do § 4º, do Art. 85, do CPC, e a Súmula 111, do e. STJ.
8. A autarquia previdenciária está isenta das custas e emolumentos, nos termos do Art. 4º, I, da Lei 9.289/96, do Art. 24-A da Lei 9.028/95, com a redação dada pelo Art. 3º da MP 2.180-35/01, e do Art. 8º, § 1º, da Lei 8.620/93.
9. Apelação provida.
TRF 3ª, APELAÇÃO CÍVEL Nº 5284413-27.2020.4.03.9999, 10ª T., relator desembargador federal Baptista Pereira, 06/02/2024.


ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Décima Turma, por unanimidade, decidiu dar provimento à apelação, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

RELATÓRIO
Trata-se de apelação interposta em face de sentença proferida em ação de conhecimento, em que se pleiteia a concessão de pensão por morte, na qualidade de filha menor de idade.

MM. Juízo a quo julgou improcedente o pedido, condenando a autora ao pagamento de custas, despesas processuais, e honorários advocatícios de 10% sobre o valor da causa, suspendendo a execução, em razão da gratuidade processual.

A autora apela, pleiteando a reforma da r. sentença.

Sem contrarrazões, subiram os autos.

O Ministério Público Federal ofertou seu parecer.

É o relatório.

VOTO
A pensão por morte é devida ao conjunto dos dependentes do segurado que falecer, aposentado ou não, e independe de carência (Lei 8.213/91, Art. 74 e Art. 26).

Para a concessão do benefício são requisitos a qualidade de dependente, nos termos da legislação vigente à época do óbito, bem assim a comprovação da qualidade de segurado do falecido, ou, independentemente da perda da qualidade de segurado, o preenchimento dos requisitos para concessão da aposentadoria (Lei 8.213/91, Art. 15 e Art. 102, com a redação dada pela Lei 9.528/97; Lei 10.666/03).

O óbito de Edvaldo Moreira de Azevedo ocorreu em 05/05/2017.

Em matéria previdenciária, os fatos que dão origem a alteração no mundo jurídico são regulados pela legislação vigente à época, disciplinando-lhes os efeitos futuros de acordo com o princípio tempus regit actum. À hipótese, como o óbito ocorreu em 05/05/2017, aplicam-se as regras estabelecidas pela Lei nº 13.135, de 18/06/2015, que alterou a Lei de Benefícios.

A dependência econômica do filho não emancipado, de qualquer condição, menor de 21 (vinte e um) anos ou inválido ou que tenha deficiência intelectual ou mental que o torne absoluta ou relativamente incapaz, é presumida, consoante se infere do disposto no Art. 16, I e § 4º da Lei 8.213/91.

A autora comprovou ser filha do segurado falecido, como se vê da certidão de nascimento acostada aos autos. Nascida em 07/09/2002, na data do óbito (05/05/2017) contava com 14 anos de idade.

Passo à análise do requisito referente à qualidade de segurado do falecido.

A autora alega que após o encerramento dos vínculos empregatícios registrados na CTPS, o falecido passou a se dedicar às lides rurais, até a data do óbito.

Ao dependente do trabalhador rural é expressamente garantido o direito à percepção de pensão por morte, no valor de um salário mínimo, desde que comprove o exercício de atividade rural pelo falecido, ainda que de forma descontínua, no período imediatamente anterior ao óbito.

Em relação à atividade rural, o c. STJ, no julgamento do recurso representativo da controvérsia REsp 1133863/RN, firmou o entendimento quanto a necessidade para a comprovação do desempenho em atividade campesina mediante o início de prova material corroborada com prova testemunhal robusta e capaz de delimitar o efetivo tempo de serviço rural (STJ, REsp 1133863/RN, Rel. Ministro Celso Limongi (Desembargador convocado do TJ/SP), 3ª Seção, julgado em 13/12/2010, DJe 15/04/2011).

A análise do extrato do CNIS revela que o de cujus manteve vínculos empregatícios formais, nos anos de 1991/1993, 1996/2000, e 2011. E usufruiu do benefício de auxílio doença nos períodos de 05/08 a 15/10/2011, 06/12/2011 a 04/06/2012, 08/08/ a 10/12/2012.

Para demonstrar o alegado exercício de atividade rural, a autora trouxe aos autos cópias dos seguintes documentos, em nome do falecido: ficha cadastral de produtor rural (Sítio Matori / Nova Esperança), com início de atividade em 02/10/2002; nota fiscal de comercialização de produto agrícola (mandioca), com data de 01/08/2006.

As testemunhas ouvidas em Juízo em 11/11/2019 corroboram a prova material apresentada, pois declaram que o falecido exerceu atividade rural tanto em seu sítio quanto em propriedades rurais diversas, como “boia-fria”, até a data do óbito. O depoente Raimundo Santos de Andrade afirmou conhecê-lo desde 2010, e que trabalharam juntos no campo em 2016 e 2017, levados pelo “gato” Fernando Cabral. As outras duas testemunhas afirmaram ter visto com frequência o falecido instituidor se deslocando para o trabalho rural.

O e. Superior Tribunal de Justiça já decidiu que, para a descaracterização da condição de segurado especial rural, o afastamento das lides rurais não pode ser superior ao do período de graça.

Confira-se:

"PROCESSUAL CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. DESCARACTERIZAÇÃO DO LABOR EM REGIME DE ECONOMIA FAMILIAR EM RAZÃO DE VÍNCULO DE TRABALHO URBANO. DECISÃO RECORRIDA ESTÁ EM DESCONFORMIDADE COM A JURISPRUDÊNCIA DO SUPERIOR TRIBUNAL.
I - Na origem, trata-se de ação ajuizada contra o Instituto Nacional do Seguro Social - INSS, visando, em síntese, à concessão de aposentadoria por idade rural mediante o reconhecimento de tempo de serviço rural em regime de economia, com efeitos financeiros a contar do requerimento administrativo. Na sentença, julgaram-se improcedentes os pedidos. No Tribunal a quo, a sentença foi reformada para conceder o benefício de aposentadoria por idade rural, a contar da data do requerimento administrativo, observada a prescrição quinquenal.
II - No tocante à descaracterização do labor em regime de economia familiar em razão de vínculo de trabalho urbano, o art. 143 da Lei n. 8.213/1991, ao estabelecer que o tempo de labor rural seria computado, "ainda que de forma descontínua", afasta o entendimento de que esse tempo deveria ser ininterrupto, sem definir, entretanto, qualquer limite temporal para as possíveis interrupções, lacuna normativa que somente foi preenchida por ocasião da alteração promovida pela Lei n. 11.708/2008.
III - Diante dessa lacuna na lei, o Superior Tribunal de Justiça considerou adequado o uso, por meio da analogia, do prazo previsto para o período de graça, conforme pode ser verificado de acordo com os seguintes julgados: AgInt no REsp n. 1.550.757/PR, Rel. Ministro Og Fernandes, Segunda Turma, julgado em 14/8/2018, DJe 20/8/2018; AgInt no REsp n. 1.572.229/PR, Rel. Ministro Gurgel de Faria, Primeira Turma, julgado em 20/4/2017, DJe 24/5/2017; AgRg no REsp n. 1.354.939/CE, Rel. Ministro Arnaldo Esteves Lima, Primeira Turma, julgado em 16/6/2014, DJe 1º/7/2014.
IV - Sendo assim, observa-se, compulsando os autos, que a decisão recorrida está em desconformidade com a jurisprudência do Superior Tribunal, uma vez que considerou períodos laborados com lapso temporal de aproximadamente 20 anos - entre dois dos períodos - para a comprovação do requisito carência.
V - Correta, portanto, a decisão que deu provimento ao recurso especial para afastar o reconhecimento da qualidade de segurada especial da parte recorrida.
VI - Agravo interno improvido.
(AgInt no REsp 1793424/RS, Rel. Ministro FRANCISCO FALCÃO, SEGUNDA TURMA, julgado em 17/10/2019, DJe 22/10/2019)"

O conjunto probatório está, pois, apto a demonstrar que, à época do óbito, o falecido exercia a atividade rural sem registro, mantendo, portanto, a qualidade de segurado da Previdência Social.

Preenchidos os requisitos, faz jus, a autora, à percepção do benefício de pensão por morte.

O termo inicial do benefício deve ser fixado na data do óbito (05/05/2017), tendo em vista que contra os menores impúberes não corre a prescrição, nos termos do Art. 103, parágrafo único, da Lei nº 8.213/91, e Arts. 5º, I, e 169, I, do Código Civil.

Destarte, é de se reformar a r. sentença, devendo o réu conceder à autora o benefício de pensão por morte, a partir de 05/05/2017, e pagar as prestações vencidas, corrigidas monetariamente e acrescidas de juros de mora.

Aplica-se o disposto no Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal no que tange aos índices de correção monetária e taxa de juros de mora.

Convém alertar que das prestações vencidas devem ser descontadas aquelas pagas administrativamente ou por força de liminar, e insuscetíveis de cumulação com o benefício concedido, na forma do Art. 124, da Lei nº 8.213/91.

Os honorários advocatícios devem observar as disposições contidas no inciso II, do § 4º, do Art. 85, do CPC, e a Súmula 111, do e. STJ.

A autarquia previdenciária está isenta das custas e emolumentos, nos termos do Art. 4º, I, da Lei 9.289/96, do Art. 24-A da Lei 9.028/95, com a redação dada pelo Art. 3º da MP 2.180-35/01, e do Art. 8º, § 1º, da Lei 8.620/93.

Ante o exposto, dou provimento à apelação.

É o voto.

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Perfil

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Rio Grande, Rio Grande do Sul, Brazil
Especialista em Direito Previdenciário, pela Universidade de Caxias do Sul - UCS, em parceria com a ESMAFE - Escola da Magistratura Federal, em 2009. Formado em janeiro de 2006, pela FURG - Fundação Universidade do Rio Grande, em direito. Este blog tem o objetivo de divulgar o conteúdo previdenciário de maneira gratuita para que todos possam ter acesso as informações sobre esta matéria.

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