Decisão trata sobre a prorrogação da qualidade de segurado por desemprego involuntário
Nesta sexta-feira será visto uma decisão da Turma Nacional de Uniformização representativa de controvérsia que gerou o tema 239 com a seguinte redação "A prorrogação da qualidade de segurado por desemprego involuntário, nos moldes do §2º do art. 15 da Lei 8.213/91, se estende ao segurado contribuinte individual se comprovada a cessação da atividade econômica por ele exercida por causa involuntária, além da ausência de atividade posterior.". Abaixo segue a decisão para análise dos amigos.
EMENTA
REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. PREVIDENCIÁRIO. PRORROGAÇÃO DA QUALIDADE POR DESEMPREGO INVOLUNTÁRIO PELO CONTRIBUINTE INDIVIDUAL. NECESSIDADE DE DEMONSTRAÇÃO QUE A ATIVIDADE ECONÔMICA POR ELE EXERCIDA FOI CESSADA POR CAUSA INVOLUNTÁRIA, TAL COMO SE EXIGE DO EMPREGADO, QUE NÃO TERÁ A PRORROGAÇÃO NO CASO DE PEDIDO DE DEMISSÃO OU DE JUSTA CAUSA PARA A RESCISÃO DO VÍNCULO. TESE NO SENTIDO DE QUE: "A PRORROGAÇÃO DA QUALIDADE DE SEGURADO POR DESEMPREGO INVOLUNTÁRIO, NOS MOLDES DO §2º DO ART. 15 DA LEI 8.213/91, SE ESTENDE AO SEGURADO CONTRIBUINTE INDIVIDUAL SE COMPROVADA A CESSAÇÃO DA ATIVIDADE ECONÔMICA POR ELE EXERCIDA POR CAUSA INVOLUNTÁRIA, ALÉM DA AUSÊNCIA DE ATIVIDADE POSTERIOR". INCIDENTE PARCIALMENTE PROVIDO. QUESTÃO DE ORDEM N. 20 DA TNU.
TNU, PEDIDO DE UNIFORMIZAÇÃO DE INTERPRETAÇÃO DE LEI (TURMA) Nº 0504272-91.2018.4.05.8400/RN, RELATOR: JUIZ FEDERAL ATANAIR NASSER RIBEIRO LOPES, 30/04/2021.
ACÓRDÃO
A Turma Nacional de Uniformização decidiu, por maioria, DAR PARCIAL PROVIMENTO ao incidente, nos termos do voto do Juiz Relator, fixando a seguinte tese jurídica: "a prorrogação da qualidade de segurado por desemprego involuntário, nos moldes do §2º do art. 15 da Lei 8.213/91, se estende ao segurado contribuinte individual se comprovada a cessação da atividade econômica por ele exercida por causa involuntária, além da ausência de atividade posterior". Vencidos os Juízes Federais IVANIR CESAR IRENO JUNIOR e POLYANA FALCÃO BRITO, que negavam provimento ao incidente. Pedido de Uniformização julgado como representativo da controvérsia (Tema 239).
Brasília, 28 de abril de 2021.
VOTO-VISTA - FÁBIO SOUZA, Juiz Federal
1. Pedido de Uniformização de Interpretação de Lei (PUIL) interposto por NEUSA //AURELIANDO DA SILVA contra acórdão do da Turma Recursal do Rio Grande do Norte, que julgou improcedente pedido para condenar o INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL (INSS) a conceder pensão por morte, por não reconhecer a manutenção da qualidade de segurado.
2. A Turma Nacional de Uniformização (TNU) conheceu do incidente e o afetou como representativo de controvérsia, vinculando-o ao tema 239, cuja questão jurídica foi formulada nos seguintes termos: saber se a prorrogação da qualidade de segurado por desemprego involuntário se estende ao segurado contribuinte individual.
3. O Juiz Federal Relator, Dr. Atanair Nasser Ribeiro Lopes, votou no sentido de dar parcial provimento ao incidente, propondo a seguinte tese para o tema: "a prorrogação da qualidade de segurado por desemprego involuntário, nos moldes do §2º do art. 15 da Lei 8.213/91, se estende ao segurado contribuinte individual se comprovada a cessação da atividade econômica por ele exercida por causa involuntária, além da ausência de atividade posterior".
4. Pedi vista, para melhor analisar a questão.
5. Prorrogação do período de graça por desemprego. O art. 15, da lei 8.213/91, concede prazo de manutenção extraordinária da qualidade de segurado, fixando um período de graça de 12 meses para o segurado que deixar de exercer atividade de filiação obrigatória ao Regime Geral de Previdência Social. Nos termos do § 1º do mesmo dispositivo, esse período será de 24 meses se o segurado possuir mais de 120 contribuições mensais sem interrupção que acarrete perda da qualidade de segurado.
6. Ambos os prazos (art. 15, II e § 1º) serão acrescidos de 12 meses para os desempregados, nos termos do § 2º:
§ 2º Os prazos do inciso II ou do § 1º serão acrescidos de 12 (doze) meses para o segurado desempregado, desde que comprovada essa situação pelo registro no órgão próprio do Ministério do Trabalho e da Previdência Social
7. A legislação previdenciária não fornece um conceito de desemprego, deixando ao intérprete a tarefa de significar a expressão contida no art. 15, § 2º da Lei 8.213/91.
8. O fato é que “o conceito de desemprego é fruto de um longo processo de construção, com muitos embates e consequências. Longe de ser um fenômeno claro, determinado e neutro, que as estatísticas poderiam definir e medir, seu conceito variou nos países, regiões e principalmente com o pensamento econômico hegemônico” (OSHIRO, Felício. MARQUES, Rosa Maria. O conceito de desemprego e sua medição no século XX. In Textos & Contextos (Porto Alegre), v. 15, n. 2, p. 305).
9. O Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) classifica a população economicamente ativa em dois grupos: população ocupada e população desocupada. No primeiro, incluem-se os empregados, os que trabalham por conta própria, os empregadores e os não remunerados. Já os desocupados são as pessoas que “não tinham trabalho, num determinado período de referência, mas estavam dispostas a trabalhar, e que, para isso, tomaram alguma providência efetiva (consultando pessoas, jornais, etc.)” (ww2.ibge.gov.br/home/estatistica/indicadores/trabalhoerendimento/pme/pmemet2.shtm)
10. O Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (DIEESE), responsável pela Pesquisa de Emprego e Desemprego (PED), classifica o desemprego em três modalidades, assim sintetizadas: (a) desemprego aberto – pessoas que procuraram trabalho de modo efetivo nos últimos 30 dias; (b) desemprego oculto por trabalho precário: pessoas que, para sobreviver, exerceram algum trabalho de auto-ocupação, de forma descontínua e irregular; e (c) desemprego oculto por desalento: pessoas que não possuem trabalho e não o buscaram nos últimos 30 dias (www.dieese.org.br/metodologia/metodologiaPed.html).
11. Como se infere das diversas metodologias estatísticas atuais, desempregado é o indivíduo em situação involuntária de não trabalho, mesmo que não esteja em busca de um emprego (em sentido estrito). Desse modo, se o segurado está em busca de um trabalho em qualquer das modalidades do art. 11 da Lei 8.213/91, deve ser considerado desempregado.
12. Desse modo, como já decidiu, em ação civil pública, o Tribunal Regional Federal da 4ª Região, “o disposto no art. 15, §§ 1º e 2º, da Lei nº 8.213/91, que determina a ampliação do período de graça, aplica-se ao segurado contribuinte individual, uma vez comprovado afastamento involuntário do mercado do trabalho por quaisquer meios permitidos em Direito...” (TRF4 – apelação cível 009219-91.2010.404.7100/RS).
13. Por outro lado, como a lei não restringe a extensão do período de graça aos casos de desemprego aberto, o benefício deve ser garantido também nos casos de desemprego oculto por trabalho precário ou por desalento.
14. A tese de que a prorrogação do período de graça alcança o contribuinte individual já foi afirmada por este TNU, no julgamento do pedido de uniformização 5000459-19.2016.4.04.7109/RS, na sessão de 21/02/2019:
PEDIDO DE UNIFORMIZAÇÃO DE INTERPRETAÇÃO DE LEI FEDERAL. PENSÃO. QUALIDADE DE SEGURADO. PERÍODO DE GRAÇA. DESEMPREGO. PRORROGAÇÃO. ART. 15, §2º, DA LEI 8.213/91. “BICOS”. CONTRIBUINTE INDIVIDUAL. INEXISTÊNCIA DE ÓBICE. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO.
I. O TRABALHO PRECÁRIO E ESPORÁDICO (“BICOS”) NÃO OBSTA A APLICAÇÃO DO § 2º, DO ART. 15 DA LEI 8.213/91.
II. A EXTENSÃO DO PERÍODO DE GRAÇA, PREVISTA NO § 2º, DO ART. 15 DA LEI 8.213/91, SE APLICA AOS CONTRIBUINTES INDIVIDUAIS.
15. Desse modo, com a vênia da divergência, considero que a interpretação realizada pelo voto do Relator é a que melhor reflete o sentido na norma.
16. Isto posto, voto no sentido de DAR PARCIAL PROVIMENTO ao incidente, nos termos do voto do Relator.
VOTO DIVERGENTE - IVANIR CESAR IRENO JUNIOR, Juiz Federal
1. O caso envolve o julgamento do tema representativo de controvérsia nº 239, com a seguinte questão a ser dirimida por esta TNU: "saber se a prorrogação da qualidade de segurado por desemprego involuntário se estende ao segurado contribuinte individual".
2. O cenário fático envolvido nas vias ordinárias é o seguinte: a) discussão de benefício de pensão por morte; b) instituidor falecido em 11/09/2017 (câncer de pulmão); c) segurado contribuinte individual por conta própria de 01/04/2010 a 30/04/2016; d) profissão não identificada; e) recolhimentos na forma da LC 123, na alíquota de 11% até 05/2011 e a partir de então na alíquota de 5% (MEI?); f) as contribuições de 01/2016 a 04/2016 foram pagas em 06/12/2016; g) última contribuição em 04/2016.
3. O voto do relator é no sentido de dar parcial provimento ao PUIL para:
(i) fixar a seguinte tese: "a prorrogação da qualidade de segurado por desemprego involuntário, nos moldes do §2º do art. 15 da Lei 8.213/91, se estende ao segurado contribuinte individual se comprovada a cessação da atividade econômica por ele exercida por causa involuntária, além da ausência de atividade posterior";
(ii) determinar o retorno dos autos à turma de origem para adequação, nos termos da Questão de Ordem n. 20 da TNU.
4. Peço vênia para divergir do relator, apresentando concepção contrária à sua conclusão, no sentido de que a norma de extensão do período de graça do §2º do art. 15 da Lei 8.213/91, referente ao desemprego involuntário, não se aplica ao contribuinte individual, sendo restrita aos segurados empregado, empregado doméstico e avulso.
5. De início, registro que não desconheço a jurisprudência favorável desta TNU no sentido de que o contribuinte individual faz jus à prorrogação, uma vez que "o conceito de desemprego abrange as situações involuntárias de não trabalho, não importando a sua condição anterior, se de empregado, ou autônomo."
6. Talvez em razão dessa posição da TNU, invocada em precedentes citados pelo relator, o voto de sua excelência não tenha se dedicado a fundo a definir o exato alcance subjetivo da expressa "segurado desempregado", preocupando-se quase que exclusivamente com a caracterização da involuntariedade e comprovação da falta de trabalho".
7. No entanto, é importante frisar que não localizei qualquer precedente do STJ sobre o tema, a demonstrar que ainda existe espaço para controvérsia e entendimento diverso.
8. Diz a Lei 8.213/91:
Art. 15. Mantém a qualidade de segurado, independentemente de contribuições:
I - sem limite de prazo, quem está em gozo de benefício, exceto do auxílio-acidente; (Redação dada pela Lei nº 13.846, de 2019)
II - até 12 (doze) meses após a cessação das contribuições, o segurado que deixar de exercer atividade remunerada abrangida pela Previdência Social ou estiver suspenso ou licenciado sem remuneração;
III - até 12 (doze) meses após cessar a segregação, o segurado acometido de doença de segregação compulsória;
IV - até 12 (doze) meses após o livramento, o segurado retido ou recluso;
V - até 3 (três) meses após o licenciamento, o segurado incorporado às Forças Armadas para prestar serviço militar;
VI - até 6 (seis) meses após a cessação das contribuições, o segurado facultativo.
§ 1º O prazo do inciso II será prorrogado para até 24 (vinte e quatro) meses se o segurado já tiver pago mais de 120 (cento e vinte) contribuições mensais sem interrupção que acarrete a perda da qualidade de segurado.
§ 2º Os prazos do inciso II ou do § 1º serão acrescidos de 12 (doze) meses para o segurado desempregado, desde que comprovada essa situação pelo registro no órgão próprio do Ministério do Trabalho e da Previdência Social.
9. A controvérsia, no caso, é definir o alcance da expressão "segurado desempregado", se limitada aos segurados empregado, empregado doméstico e trabalhador avulso1, ou passível de aplicação a outras espécies de segurado, como o contribuinte individual.
10. Antecipadamente, renovando vênias ao relator, firmo a compreensão de que somente os segurados empregado, empregado doméstico e trabalhador avulso estão dentro do âmbito de proteção da norma questionada, uma vez que são os únicos passíveis de se apresentarem na situação de "desempregados". Nos tópicos a seguir, pretendo densificar e comprovar essa afirmativa.
11. Embora o critério literal não seja o mais adequado para interpretação das leis, ele é o primeiro a ser utilizado na cadeia interpretativa, uma vez que não é possível desvendar o verdadeiro conteúdo do texto (norma) sem conhecer, primeiro, o significado semântico das palavras e expressões nele contidas. Além disso, o critério literal estabelece limites ao intérprete, que, a título de exemplo, não pode chegar, por outros critérios de interpretação (sistemático, teleológico etc), a resultados que violem significados semânticos inequívocos e unívocos, veiculados em palavras como "sim e não", "dia e noite", "dentro e fora" etc.
12. E na hipótese dos autos, que envolve dupla regra de exceção - previdenciária e tributária -, a interpretação literal ganha importância, devendo merecer deferência pelo intérprete-aplicador, sob pena de se transformar a exceção em regra. Esse é princípio básico e inatacável de hermenêutica.
13. Por imposição constitucional (art. 201, caput), o sistema previdenciário é contributivo, sendo a regra o pagamento de contribuições para os segurados terem acesso ao benefício. O sistema de filiação, manutenção e perda da qualidade de segurado, instituído pelos artigos 15 e 102 da Lei 8.213/91, e a exigência das contribuições previdenciárias na forma da Lei 8.212/91, são, juntamente com a carência e o tempo de contribuição, a espinha dorsal desse sistema contributivo.
14. Ainda em reforço à contributividade, temos os princípios do equilíbrio financeiro e atuarial (art. 201) e da preexistência da fonte de custeio (art, 195, §5º), que mereceram prestígio do STF com a recente edição da tese do tema 503, no seguinte sentido: "No âmbito do Regime Geral de Previdência Social - RGPS, somente lei pode criar benefícios e vantagens previdenciárias, não havendo, por ora, previsão legal do direito à 'desaposentação' ou à ‘reaposentação’, sendo constitucional a regra do art. 18, § 2º, da Lei nº 8.213/91."
15. Nesse contexto, é certo que a manutenção da qualidade de segurado, exigência legal para acesso à grande maioria dos benefícios previdenciários, demanda pagamento de contribuições. Excepcionalmente, a lei estabeleceu hipótese de dispensa desse pagamento sem prejuízo da qualidade de segurado e acesso aos benefícios, denominada de período de graça. Assim, por se tratar de regra de exceção, que mitiga o caráter contributivo do sistema, as hipóteses de período de graça devem ser interpretadas restritivamente, sem voluntarismos ou ampliações indevidas.
16. Ainda que indiretamente e em alguma medida, as hipóteses de graça são também exceção à regra de incidência tributária, uma vez que acabam por afastar temporariamente o pagamento de tributo, sem consequências típicas do inadimplemento. Assim, poderiam ser tratadas como normas de isenção, que à luz do art. 111 do CTN também deve ser interpretadas restritivamente.
17. Afirmada a necessidade de interpretação literal, é de se ver que o art. 15 da Lei 8.213/91 foi seletivo e casuístico na escolha da atribuição das hipóteses de períodos de graça às diversas espécies de segurado, às vezes fazendo escolhas subjetivas (limitações), em outras não. Assim, ver-se-á que, nesse tema, as distinções, restrições e diferenciações são comuns, atendendo a opção concretizadora do legislador.
18. Nos incisos I, III, IV e V, as hipóteses de graça se aplicam a todos os segurados, sem distinção. Já no II e VI, somente aos segurados obrigatórios e facultativos, respectivamente. A prorrogação do §1º se aplica somente aos segurados obrigatórios nas hipóteses do inciso II. Por fim, a do § 2º somente ao segurados obrigatórios enquadrados como "segurados desempregados".
19. A lei, em momento algum, quis, no §2º, como fez no §1º, estender genericamente a prorrogação do período de graça para todos os segurados obrigatórios, sem distinção, mas somente a um grupo específico, valendo-se de termo comumente conhecido e compreendido semanticamente em ambientes técnicos e populares, qual seja, desemprego, que é o oposto de emprego. Assim. é certo que somente pode ser "segurado desempregado" quem era "segurado empregado" ou assemelhado (doméstico ou avulso).
20. Diversos fundamentos poderiam ser invocados como justificativa para a restrição imposta pelo legislador. Um deles é o desejo, justificado, de proteger com mais intensidade o principal e amplamente mais numeroso público de todo regime previdenciário, qual seja, os segurados empregados, que trabalham por conta alheia e em hipótese alguma podem controlar o acesso e manutenção ao trabalho e fonte de renda. Outro, seria a dificuldade, lógica e probatória, de se aferir situação involuntária de não trabalho por quem trabalha de forma autônoma, por conta própria.
21. Assim, tenho que sob o ângulo literal e restritivo, como deve se dar a interpretação no caso, a prorrogação pelo desemprego não serve ao contribuinte individual.
22. E, avançando para outros critérios interpretativos, em especial o sistemático e o lógico, a conclusão é a mesma.
23. Sobre o desemprego involuntário como evento a ser protegido pelo RGPS, a CF/88 estabeleceu:
Art. 7º São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social:
I - relação de emprego protegida contra despedida arbitrária ou sem justa causa, nos termos de lei complementar, que preverá indenização compensatória, dentre outros direitos;
II - seguro-desemprego, em caso de desemprego involuntário;
[...]
Art. 201. A previdência social será organizada sob a forma do Regime Geral de Previdência Social, de caráter contributivo e de filiação obrigatória, observados critérios que preservem o equilíbrio financeiro e atuarial, e atenderá, na forma da lei, a:
[...]
III - proteção ao trabalhador em situação de desemprego involuntário;
24. Implementando a principal proteção ao evento desemprego involuntário, o legislador editou a Lei 7.998/90, criando o seguro-desemprego, destinado, exclusivamente, "ao trabalhador desempregado em virtude de dispensa sem justa causa, inclusive a indireta, e ao trabalhador comprovadamente resgatado de regime de trabalho forçado ou da condição análoga à de escravo" (arts. 2º e 3º).
25. Como se vê, o seguro-desemprego, benefício por excelência destinado ao "segurado desempregado", somente alcança o segurado empregado ou assemelhado, não protegendo o contribuinte individual.
26. Secundariamente, em mais uma concretização da proteção ao evento "desemprego involuntário", o legislador ampliou o período de graça em favor do "segurado desempregado", valendo-se da mesma terminologia utilizada na Lei 7.998/90, qual seja, "trabalhador desempregado" (Lei 7.998/90) e "segurado desempregado" (Lei 8.213/91).
27. Assim, seria ilógico e sistematicamente inadequado se entender que a Lei 7.998/90, principal e mais efetivo mecanismo de proteção do evento desempregado involuntário, protegeu, com a mesma terminologia, mas de forma menos abrangente, evento de menor importância como a prorrogação da qualidade de segurado, alcançando no primeiro caso somente o trabalhador com vínculo de emprego e no segundo qualquer trabalhador. E veja-se que ninguém coloca em cheque, por inconstitucionalidade por omissão, a escolha legislativa feita na Lei 7.998/90.
28. Prosseguindo, é certo que a Lei 8.213/91 diferenciou as espécies de segurado, definindo expressamente quem é o segurado empregado e o contribuinte individual. Nesse sentido:
Art. 11. São segurados obrigatórios da Previdência Social as seguintes pessoas físicas:
I - como empregado:
a) aquele que presta serviço de natureza urbana ou rural à empresa, em caráter não eventual, sob sua subordinação e mediante remuneração, inclusive como diretor empregado;
[...]
II - como empregado doméstico: aquele que presta serviço de natureza contínua a pessoa ou família, no âmbito residencial desta, em atividades sem fins lucrativos;
[...]
V - como contribuinte individual:
[...]
g) quem presta serviço de natureza urbana ou rural, em caráter eventual, a uma ou mais empresas, sem relação de emprego; (Incluído pela Lei nº 9.876, de 26.11.99)
h) a pessoa física que exerce, por conta própria, atividade econômica de natureza urbana, com fins lucrativos ou não;
29. Nota-se que a lei previdenciária fez escolhas claras, trazendo para o seu universo a diferenciação de conceitos da legislação trabalhista, onde é bem diverso, inclusive no rol de direitos, o tratamento do empregado e do trabalhador autônomo. Assim, somente se pode compreeender o alcance subjetivo da expressão "segurado desempregado" em oposição a segurado empregado, que tem conceituação previdenciária diversa e excludente da do contribuinte individual.
30. Nesse sentido, peço licença para transcrever pertinente comentário doutrinário do autor e juiz federal Rafael Porto (ainda não publicado e cedido gentilmente para este voto), que bem espelha o entendimento apresentado:
Analisemos, em primeiro lugar, a expressão “desempregado”. Tal termo não foi conceituado pela lei, devendo, assim, ser buscada sua conceituação em oposição à de “empregado”. Com efeito, se a lei define o que é “empregado” e depois utiliza, sem definir, o termo “desempregado”, a conceituação deste deve ser buscada em cotejo com a daquele. Assim, segurado “desempregado” é aquele que vem de perder o emprego, ou seja, é o segurado empregado (inclusive o doméstico e também o trabalhador avulso, que é equiparado ao empregado por disposição constitucional5) em período de graça.
Cabe ressaltar que o termo foi assim interpretado durante quase 30 anos, contudo recentemente passou a ganhar corpo – na senda do incremento assustador do voluntarismo judicial no Brasil - corrente jurisprudencial a sustentar a possibilidade de que o termo englobe também outras categorias de segurados. Neste sentido, há decisão recente da TNU (PEDILEF 50005598320124047215) admitindo a inclusão aí do contribuinte individual. Assim, segundo tal entendimento, caso o contribuinte individual comprove situação de “desemprego” (salientamos, contudo, que o termo tecnicamente correto para tal situação é “desocupação”, gênero do qual “desemprego” é espécie), poderia fazer – segundo tal corrente jurisprudencial – jus à prorrogação por doze meses do período de graça6.
31. Na doutrina, Frederico Amado tratou do tema nos seguintes termos:
"Logicamente, essa prorrogação apenas poderá beneficiar o segurado empregado e o empregado doméstico, pois apenas nestes casos haverá um verdadeiro desemprego. Mesmo assim, apenas os segurados empregados que possuam vínculo empregatício farão jus ao elastecimento de 12 meses, pois há casos de inexistência de vínculo empregatício, a exemplo do servidor titular de cargo em comissão (relação estatutária, e não celetista) e do titular de mandato eletivo". (AMADO, Frederico. Curso de Direito e Processo Previdenciário. 12, ed. rev., ampl. e atual. - Salvador: Ed. Juspodivm, 2020, p. 487).
32. Em resumo, tenho que incluir o contribuinte individual no rol do §2º do art. 15 da Lei 8.213/91 é possibilitar a extensão de benefício para situações não previstas pelo legislador, em violação a preceitos básicos como os da separação de poderes, contribuitividade, equilíbrio financeiro e atuarial, seletividade e distributividade, contrapartida e isonomia. É, na verdade, ativismo judicial, desprovido de amparo constitucional e legal concretos, ainda que sob a máxima de princípios.
33. Aqui, se estaria fazendo o contrário do que se fez recentemente esta TNU no julgamento do tema 255, versando sobre outra hipótese de prorrogaçação da qualidade de segurado. No citado tema, sob o fundamento central de que o intérprete não pode restringir onde o legislador não o fez, fixou-se a seguinte tese: "O pagamento de mais de 120 (cento e vinte) contribuições mensais, sem interrupção que acarrete a perda da qualidade de segurado, garante o direito à prorrogação do período de graça, previsto no parágrafo 1º, do art. 15 da Lei 8.213/91, mesmo nas filiações posteriores àquela na qual a exigência foi preenchida, independentemente do número de vezes em que foi exercido." No caso em julgamento, estar-se-ia desprezando a clara limitação imposta pelo legislador, para extender proteção a segurado não beneficiado pela norma.
34. Não acredito que os diversos fundamentos lançados pela TNU em seus precedentes autorizem a interpretação ampliativa buscada pela recorrente e acolhida na proposta de tese apresentada pelo relator. Entre os argumentos temos: isonomia, uniformidade e equivalência de prestações, mudanças no mercado de trabalho etc. Cito, para contextualizar, trechos relevantes de um dos precedentes Pedilef n. 05009466520144058400):
[...]
8. É cediço que as atividades laborais não se restringem à relação empregatícia. Aliás, com as transformações ocorrentes no mundo do trabalho- tecnológicas, científicas e dentro de um contexto de crise econômica e de globalização, cada vez mais o trabalhador se vê fragilizado nos seus direitos trabalhistas e previdenciários. Não podemos ignorar que a Lei de Benefícios é uma versão “remasterizada” da antiga Lei Orgânica da Previdência Social de 1960 – com a inclusão dos trabalhadores rurais e permeada por regras de transição – quando se acreditava que seria possível concentrar as relações de trabalho no formato padronizado do vínculo empregatício.
9. Dependendo da necessidade de quem contrata o trabalhador e de como o serviço é prestado, podemos ter outras relações de trabalho, tais como o trabalho eventual, o avulso e o autônomo. De todo o modo, o princípio da uniformidade e equivalência das prestações devidas aos trabalhadores urbanos e rurais (parágrafo único do art.194 da CF/88) não compactua com distinções previdenciárias que não estejam amparadas em justificativas razoáveis, seja do ponto de vista da responsabilidade pelo recolhimento das contribuições ou no princípio da seletividade. De efeito, se os trabalhadores verteram o mesmo número de contribuições, ou trabalharam pelo mesmo período (nas situações em que a lei exige apenas a prova do trabalho), sendo todos segurados obrigatórios, não faz sentido que a manutenção da qualidade de segurado seja maior para uma categoria e menor para outra.
35. Confesso, com o devido respeito, a dificuldade de enfrentar objetivamente argumentos baseados em princípios abstratos, conceitos indeterminados e busca por justiça no caso concreto. Pelo menos, os trechos grifados deixam evidente que se buscou, nos precedentes, com base em princípios e em mudanças estruturais do mercado de trabalho, bem conhecidas do legislador, diga-se de passagem, igualar as regras de manutenção da qualidade de segurado entre categorias que a lei teria desigualado "sem justificativas razoáveis".
36. Ocorre que o tratamento diferenciado, seja na relação de custeio, seja na de benefício, é algo comum no âmbito previdenciário, em especial quando se trata de segurados empregado e contribuinte individual, com características tão diversas. Vamos somente a alguns relevantes exemplos.
37. O primeira e mais importante deles refere-se à exclusão do contribuinte individual do rol de beneficiários do auxílio-acidente, referendada recentemente por esta TNU no tema 201, assim vazado: "O contribuinte individual não faz jus ao auxílio-acidente, diante de expressa exclusão legal."
38. Será que "faz sentido" e "é razoável" não estender ao contribuinte individual esse benefício, colocando-o em situação de proteção inferior ao segurado empregado? Fico a pensar nos milhares de motoboys e serventes de pedreiro, contribuintes individuais (porque também podem ser empregados), que todos os dias sofrem acidentes no trabalho, que deixam sequelas redutoras da capacidade (encurtamento de membros, redução de amplitudes de movimentos, cegueira monocular etc), e voltam posteriormente ao mercado laboral com limitações e sem o benefício indenizatório do auxílio-acidente. Embora um senso de justiça aguçado possa apontar o contrário, se trata de uma escolha legítima do legislador, que não pode ser sindicada pelo Judiciário, porque o arcabouço constitucional assim não permite (separação dos poderes, contribuitividade, precedência do custeio etc).
39. Outras várias diferenciações podem ser citadas: a) regras de custeio distintas, sem presunção de recolhimentos para o contribuinte individual; b) início da contagem da carência em momento distinto, após o pagamento da primeira contribuição sem atraso; c) exigência de carência para o contribuinte individual no salário-maternidade; d) necessidade de complemento de contribuições para que o salário de contribuição atinja o valor mínimo de 01 SM, sob pena de não ser computado para fins previdenciários (art. 5º da Lei 10.666/2003), situação que não atingia o segurado empregado pelo menos até a EC 103/2019.
40. Também o invocado conceito de desemprego do IBGE, que incluiria o contribuinte individual, e as mudanças estruturais do mercado de trabalho nos últimos anos (pejotização, MEI's, informalidade, precariedade de vínculos etc), não justificam a implementação, via judicial, de isonomia entre categorias distintas, que a lei previdenciária distinguiu.
41. Pelo IBGE, "O desemprego, de forma simplificada, se refere às pessoas com idade para trabalhar (acima de 14 anos) que não estão trabalhando, mas estão disponíveis e tentam encontrar trabalho. Assim, para alguém ser considerado desempregado, não basta não possuir um emprego."
42. O conceito em questão ou outros na mesma linha não se aplicam na esfera previdenciária. Primeiro, porque possuem finalidade distinta, ou seja, servem para aferir, sistematizar e medir dados de ocupação no país, com o fim de produzir estatísticas e orientar a adoção de políticas públicas voltadas do fortalecimento do mercado de trabalho. Na verdade, para o IBGE o que é conhecido popularmente como “desemprego” aparece no conceito de “desocupação”.
43. Segundo, porque o IBGE não tem um conceito legal de desemprego. Assim, aplicar o citado conceito ao direito previdenciário viola princípios e regras constitucionais básicas referentes à legalidade e contributividade. Com essa adoção se estaria, no caso, como já dito anteriormente, estendendo possibilidade de benefício fora das hipóteses previstas pela legislador. Relembrando o STF no tema 503, somente lei pode criar benefícios e vantagens previdenciárias.
44. Terceiro, como foi desenvolvido anteriormente, a lei previdenciária, interpretada sistematicamente a partir da CF/88 e conjugada com a legislação do seguro-desemprego, nos dá, com segurança, um conceito legal, para fins previdenciários, do que é desemprego, não sendo necessário buscar subsídios em outras fontes.
45. Por fim, é certo que as mudanças estruturais do mercado de trabalho não justificam, no âmbito previdenciário, a não observância dos princípios da legalidade e contribuitividade.
46. Em síntese, contribuinte individual e segurado empregado, por suas peculiaridades, são tratados de forma diferente pelo legislador previdenciário, não sendo sequer a diferenciação acerca da prorrogação do período de graça a mais prejudicial das distinções. Assim, ressaindo clara a escolha distintiva do legislador e estando amparado no sistema constitucional, não cabe ao Judiciário promover movimento isonômico com base em princípios abstratos, conceitos jurídicos indeterminados e prognose fática conhecida do legislador, para ampliar o período de graça do contribuinte individual pelo desemprego. .
47. Para finalizar, gostaria de abordar, com um outro olhar, a pertinente preocupação do relator com a comprovação do "desemprego involuntário" pelo contribuinte individual. Nesse ponto, peço licença para destacar palavras de sua excelência:
"Sob esse contexto, admitir que o contribuinte individual simplesmente faça prova de falta de atividade como sinônimo de desemprego involuntário, sem examinar-se a causa da cessação de sua atividade econômica anterior, acaba por lhe conferir um tratamento privilegiado em relação ao empregado, sabidamente mais frágil e destinatário de maior proteção, o qual, se postulada demissão ou ensejado justa causa para o fim do vínculo, não terá o elastecimento pretendido no §2º do art. 15 da Lei 8.213/91. Se para ele se examina a causa de cessação da atividade anterior, como bem aponta a exigência de caracterização de desemprego involuntário disposta como risco social na Constituição, porque para o contribuinte individual a mesma indagação não seria feita? Penso que essa conduta, na suposta aplicação do princípio de igualdade, levaria em conta apenas o resultado posterior consistente na falta de atividade, mas deixa de considerar o momento anterior e objeto do risco social que é justamente a indagação dos motivos que levaram à cessação da atividade anterior pelo segurado.
[...]
O que se percebe é justamente a exigência de que a prova demonstre que a situação de desemprego não tenha sido causada voluntariamente pelo segurado, o que, adaptado à condição do contribuinte individual, exige a devida demonstração por ele de que a cessação de sua atividade econômica anteriormente desenvolvida foi cessada por condição alheia à sua vontade, ou seja, por causa involuntária.
[...]
Diante de todo esse contexto, faz-se imprescindível que se apure o motivo que levou à cessação da atividade econômica, empresarial ou profissional, exercida anteriormente pelo contribuinte individual, tal como se verifica se o empregado pediu demissão ou deu causa à rescisão do vínculo, justificando-se a prorrogação do §2º do art. 15 da Lei 8.213/91 apenas na hipótese de comprovação de que a atividade anterior foi cessada de forma involuntária pelo contribuinte individual."
48. Inobstante a preocupação do relator, tenho que as dificuldades de se comprovar a cessação involuntária da atividade econômica do contribuinte individual somente comprovam o equívoco de se lhe aplicar essa indevida benesse. Digo isso porque são inúmeras as figuras de contribuinte individual, a permitir as mais diversas casuísticas. Cito, a título de exemplo: produtor rural, empresário, MEI, camelô, diarista, manicure, cabeleireira, todos os profissionais liberais, taxista, pedreiro, dentista, prestadores de serviço em geral etc.
49. Pergunto, a título de exemplo, a falta de tomadores de serviço para uma diarista, de compradores para um comelô, de clientes para um MEI e assim por diante, seriam hipóteses de "desemprego involuntário"? Essa casuítica, sem um elemento objetivo de controle como exite para o empregado (ausência de relação de emprego), vai gerar insegurança jurídica e disputas fáticas disfuncionais, com um grave risco de se confundir inadimplência com "desemprego involuntário".
50. Corre-se até o risco de se colocar em situção melhor o contribuinte individual que se arrisque a demontrar "desemprego involuntário", do que aquele que prestou serviço a pessoa jurídica e teve renda inferior a 01 SM, que não pode alegar ausência de trabalho, mas só terá o período computado se complementar o valor da contribuição.
51. Note-se que o transtorno já começa na via administrativa, onde as três hipóteses aceitas pelo INSS (art. 137, §4º, da IN 77/2015) para comprovar desemprego involuntário não se aplicam: (i) registro no órgão do MTE; (ii) percepção de seguro-desemprego; e (iii) registro no Sistema Nacional de Emprego - SINE.
52. Em face do exposto, voto por NEGAR PROVIMENTO ao PUIL, fixando a seguinte tese: "a prorrogação da qualidade de segurado por desemprego involuntário, nos moldes do §2º do art. 15 da Lei 8.213/91, não se aplica ao segurado contribuinte individual.
VOTO - ATANAIR NASSER RIBEIRO LOPES, Juíza Federal
Cuida-se de incidente que discute sobre a possibilidade de extensão do período de graça por mais doze meses, em função de suposto "desemprego involuntário", com relação ao segurado contribuinte individual. A Corte deliberou pela conversão do presente incidente em Representativo de Controvérsia, definindo o seguinte tema a ser dirimido: "saber se a prorrogação da qualidade de segurado por desemprego involuntário se estende ao segurado contribuinte individual".
Colho do acórdão recorrido as seguintes premissas fáticas:
6. A pretensão recursal encontra-se respaldada no fundamento de que o seu esposo, por ocasião do óbito ocorrido em 11/09/2017, detinha a qualidade de segurado, porquanto se encontrava desempregado, havendo, por conseguinte, a prorrogação do período de graça.
7. Ao dirimir a lide, destacou o julgador sentenciante: “(...) No caso dos autos, quanto à condição de segurado do instituidor na data do óbito, a partir da compreensão normativa descrita acima e das provas valoradas a seguir, entendo não comprovada. Com efeito, segundo CNIS (anexo 02), o instituidor não apresentava 120 contribuições individuais sem perda da qualidade de segurado. Ademais, era filiado como contribuinte individual, não havendo que se falar em desemprego involuntário, condição que, inclusive, sequer foi alegada à inicial. Sendo assim, descabe a aplicação de qualquer das causas de extensão do período de graça, sendo de apenas doze meses. Dessa forma, como a última contribuição foi vertida em 04/2016 e o óbito ocorrido em 09/2017, mesmo considerando a regra contida no art. 15, § 4º, da LBPS, constata-se que o pretenso instituidor não ostentava mais a qualidade de segurado no momento do falecimento.” Trecho da sentença (anexo 9).
8. Compulsando os autos, verifica-se que a última contribuição vertida diz respeito à competência de abril de 2016, de modo que quando do seu óbito em 11/09/2017 não mais possuía qualidade de segurado do RGPS.
9. Sendo assim, à luz dos fundamentos jurídicos expedidos, não se vê como possa conferir decisão favorável à autora/recorrente.
10. Sentença infensa a qualquer alteração.
Por sua vez, o recorrente entabulou em suas razões a violação ao entendimento desta TNU nos seguintes precedentes:
PEDIDO NACIONAL DE UNIFORMIZAÇÃO DE JURISPRUDÊNCIA. DIVERGÊNCIA. CONTRIBUINTE INDIVIDUAL. APLICABILIDADE DA PRORROGAÇÃO DO PERÍODO DE GRAÇA PREVISTO NO ART. 15, §2º DA LEI Nº 8.213/91. INCIDENTE CONHECIDO E PROVIDO COM A CIDÊNCIA DA QUESTÃO DE ORDEM Nº. 20 DA TNU. (TNU. PEDILEF nº. 0500946-65.2014.4.05.8400. Relator Dr. Juiz Federal Daniel Machado da Rocha. DJ 21/10/2015).
PEDIDO DE UNIFORMIZAÇÃO DE INTERPRETAÇÃO DE LEI FEDERAL AUTOS Nº 506465-21.2014.4.05.8400 RELATOR: Fábio Henrique Rodrigues de Moraes Fiorenza REQUERENTE: Orlando Pereira Diniz REQUERIDO: INSS JUÍZO RECORRIDO: Seção Judiciária do Rio Grande do Norte Assunto: prorrogação do período de graça para manutenção da qualidade de segurado. VOTO-EMENTA PREVIDENCIÁRIO. AUXÍLIO-DOENÇA. CONTRIBUINTE INDIVIDUAL. DESEMPREGO. APLICAÇÃO DO ART. 15, §2°, DA LEI N. 8.213/91. POSSIBILIDADE. INCIDENTE CONHECIDO E PROVIDO.
INTEIRO TEOR INCIDENTE DE UNIFORMIZAÇÃO JEF Nº 2008.70.51.0031305/PR RELATOR: Juiz Federal ANTONIO FERNANDO SCHENKEL DO AMARAL E SILVA RECORRENTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL – INSS ADVOGADO: Procuradoria Regional do INSS RECORRIDO: LUCIA INES PIRES BATISTA PREVIDENCIÁRIO. CONTRIBUINTE INDIVIDUAL. RECONHECIMENTO DA SITUAÇÃO DE DESEMPREGO. POSSIBILIDADE. INCIDÊNCIA DO ARTIGO 15, § 2º, DA LEI Nº 8.213/91. 1. Não há, na legislação previdenciária, qualquer dispositivo que imponha óbice ao reconhecimento da situação de desemprego, ou sem trabalho, ao segurado contribuinte individual. 2. O conceito de desemprego abrange as situações involuntárias de não trabalho, não importando a sua condição anterior, se de empregado, ou autônomo. 3. Deste modo, aplica-se ao segurado contribuinte individual sem trabalho o disposto no artigo 15, § 2º, da Lei nº 8.213/91. 4. Incidente de Uniformização conhecido e improvido.
Entendi bem colocada a controvérsia, inclusive admitida pelo Presidente da turma de origem e pelo Presidente desta Corte, de modo que o recurso foi conhecido, com sua conversão em Representativo em função da sensibilidade da questão envolvida, multiplicada em diversos procedimentos nos juízos ordinários.
No que tange ao mérito, parece-me possível que o contribuinte individual, de forma alheia à sua vontade, seja tolhido do exercício de sua atividade profissional ou empresarial, mas jamais por vontade própria ou meras justificativas de dificuldades econômicas.
O art. 15, inciso II, da Lei 8.213/91 é dirigido a todas as figuras de segurados obrigatórios, distinguindo-se dos facultativos que estão regidos no inciso VI. Portanto, quando o §2º do mesmo dispositivo permite a majoração do período de manutenção da qualidade de segurado prevista no inciso II, reporta-se a todos os segurados desocupados, que é o conceito atual de desemprego. Cito os dispositivos em questão:
"Art. 15. Mantém a qualidade de segurado, independentemente de contribuições: [...] II - até 12 (doze) meses após a cessação das contribuições, o segurado que deixar de exercer atividade remunerada abrangida pela Previdência Social ou estiver suspenso ou licenciado sem remuneração; [...] §2º Os prazos do inciso II ou do § 1º serão acrescidos de 12 (doze) meses para o segurado desempregado, desde que comprovada essa situação pelo registro no órgão próprio do Ministério do Trabalho e da Previdência Social".
Segundo o IBGE, "a PNAD Contínua é a nossa pesquisa que mostra quantos desempregados há no Brasil. Nela, o que é conhecido popularmente como “desemprego” aparece no conceito de “desocupação”. Assim, a taxa de desemprego no país, e em todas as economias modernas, é apurada "com base na PNAD Contínua como taxa de desocupação", que, por sua vez, é "a porcentagem de pessoas na força de trabalho que estão desempregadas" (Disponível em https://www.ibge.gov.br/explica/desemprego.php). Essa compreensão ilustra precedentes desta Corte ao preceituar:
"É cediço que as atividades laborais não se restringem à relação empregatícia. Aliás, com as transformações ocorrentes no mundo do trabalho- tecnológicas, científicas e dentro de um contexto de crise econômica e de globalização, cada vez mais o trabalhador se vê fragilizado nos seus direitos trabalhistas e previdenciários. Não podemos ignorar que a Lei de Benefícios é uma versão “remasterizada” da antiga Lei Orgânica da Previdência Social de 1960 – com a inclusão dos trabalhadores rurais e permeada por regras de transição – quando se acreditava que seria possível concentrar as relações de trabalho no formato padronizado do vínculo empregatício" (citação em maior extensão abaixo).
Corrobora essa compreensão o fato de o §3º do art. 137 da IN 77/2015 conferir a mesma proteção ao servidor público que se desvincula do regime próprio, o que só vem a demonstrar a evolução do conceito de desemprego para a definição mais ampla de desocupação. Portanto, entendo inegável a extensão do §2º aos segurados que se enquadrem no inciso II do art. 15 da Lei 8.213/91.
Todavia, penso que os precedentes desta Corte, com a devida vênia, confundiram em alguns casos a situação do contribuinte individual, que labora por conta própria, assumindo o ônus da sua atividade econômica, com a figura do empregado, subordinado e dependente econômico do empregador, cujo vínculo é submetido a uma álea que não lhe é natural intervir. Dele é exigida uma prova mais contundente, atrelada à inevitabilidade, cuja prova não pode ser simplista no sentido de mera falta de atividade. Afinal, ele é o senhor de sua atividade econômica, da qual deve arcar com os ônus e bônus respectivos, sob pena de converter-se uma proteção apropriada e determinada pela Constituição (CF/88, art. 201, inciso III - "proteção ao trabalhador em situação de desemprego involuntário") a hipótese corriqueira de cessação de atividade formal (podendo, inclusive, passar ao exercício informal justamente para obter a proteção aqui debatida). Enfim, com a devida vênia, não me parece que exista isonomia ou igualdade de situação entre empregado e contribuinte individual, justificando-se tratamento distinto e adequado entre eles.
Esse raciocínio não permeou precedentes anteriores nesta Corte, como antes referi, os quais fizeram tábula rasa quanto às diferenças envolvidas entre as categorias citadas, como se observa no Pedilef n. 05009466520144058400:
6. Penso que a questão a ser decidida no presente incidente ainda não foi apreciada por esta Turma de Uniformização, A questão examinada no PEDILEF 50473536520114047000, relatada pelo colega Bruno Carrá, versava sobre a possibilidade de aplicação do §2º do art. 15 para quem deu ensejo ao rompimento do vínculo empregatício. No presente recurso, a controvérsia reside na interpretação do enunciado normativo abranger ou não os contribuintes individuais. Feito o necessário “distinguish”, passo a apreciação da questão controvertida.
7. Considero que deve prevalecer a interpretação da Turma Regional de Uniformização da 4ª Região. De fato, os enunciados constantes dos §1º e 2º do artigo 15 da Lei 8.213/91 não podem ser interpretados literalmente. A aplicação de normas, extraídas de leis ou regulamentos, para a resolução de conflitos sociais, tem a vantagem de simplificar o trabalho dos operadores do direito que não necessitam realizar juízos morais complexos. Contudo, não é possível aplicar nenhum texto sem a realização de uma atividade de interpretação que não pode ser uma operação mecânica e meramente cognoscitiva. Por melhores que sejam os legisladores de um País, jamais será possível abarcar toda a complexidade da vida social e, além disso, todos os sistemas jurídicos aceitam o critério interpretativo de que a aplicação de uma norma não pode levar a um resultado irracional, absurdo ou incompatível com o princípio da isonomia. No julgamento da Reclamação 4374, cabe recordar que o STF, no voto ministro Gilmar Mendes, destacou que o legislador deve tratar a matéria de forma sistemática. Isso significa dizer que todos os benefícios da seguridade social (assistenciais e previdenciários) devem compor um sistema consistente e coerente. Com isso, podem-se evitar incongruências na concessão de benefícios, cuja consequência mais óbvia é o tratamento anti-isonômico entre os diversos beneficiários das políticas governamentais.
8. É cediço que as atividades laborais não se restringem à relação empregatícia. Aliás, com as transformações ocorrentes no mundo do trabalho- tecnológicas, científicas e dentro de um contexto de crise econômica e de globalização, cada vez mais o trabalhador se vê fragilizado nos seus direitos trabalhistas e previdenciários. Não podemos ignorar que a Lei de Benefícios é uma versão “remasterizada” da antiga Lei Orgânica da Previdência Social de 1960 – com a inclusão dos trabalhadores rurais e permeada por regras de transição – quando se acreditava que seria possível concentrar as relações de trabalho no formato padronizado do vínculo empregatício.
9. Dependendo da necessidade de quem contrata o trabalhador e de como o serviço é prestado, podemos ter outras relações de trabalho, tais como o trabalho eventual, o avulso e o autônomo. De todo o modo, o princípio da uniformidade e equivalência das prestações devidas aos trabalhadores urbanos e rurais (parágrafo único do art.194 da CF/88) não compactua com distinções previdenciárias que não estejam amparadas em justificativas razoáveis, seja do ponto de vista da responsabilidade pelo recolhimento das contribuições ou no princípio da seletividade. De efeito, se os trabalhadores verteram o mesmo número de contribuições, ou trabalharam pelo mesmo período (nas situações em que a lei exige apenas a prova do trabalho), sendo todos segurados obrigatórios, não faz sentido que a manutenção da qualidade de segurado seja maior para uma categoria e menor para outra.
10. Nessa linha, podem ser apontados os seguintes precedentes: [...] TRF4, AC 5009219-91.2010.404.7100, Quinta Turma, Relatora p/ Acórdão Maria Isabel Pezzi Klein, juntado aos autos em 06/02/2013; [...] TRF4, EINF 5008335-28.2011.404.7100, Terceira Seção, Relator p/ Acórdão Néfi Cordeiro, juntado aos autos em 08/07/2013.
11. No caso, não houve a realização de instrução probatória. Assim, a solução adequada para o caso é o retorno dos autos para a primeira instância, a fim que seja oportunizado à parte autora comprovar que se encontrava em uma situação de privação do trabalho, nos termos da Questão de Ordem 20 [...]
12. Em sendo assim, mais uma vez pedindo vênia ao Nobre colega, entendo que o incidente nacional de uniformização de jurisprudência formulado pela parte autora deva ser provido, com a aplicação da Questão de Ordem n.º 020 desta TNU, para que a Turma Recursal de Origem se adeque ao entendimento de que: (a) os contribuintes individuais devem desfrutar do período de graça previsto no art. 15, § 2º, da Lei n.º 8.213/91; e (b) o desemprego ou situação de ausência de trabalho pode ser comprovado por todos os meios de prova existentes em direito, e não apenas pelo registro da CTPS no Ministério do Trabalho.
É possível vislumbrar que o aludido precedente admitiu a simples prova de falta de atividade por parte do contribuinte individual, ignorando o que o levou a cessar sua atividade econômica antes desenvolvida. Essa situação desiguala a situação com a categoria do empregado, o qual não terá a mesma proteção se por vontade própria pediu demissão ou deu causa ao rompimento do vínculo. Em recente precedente desta Corte, que contou com voto de desempate do eminente Presidente, Ministro Antônio Carlos, decidiu-se que o pedido de demissão não admite prorrogação do período de graça com base no §2º do art. 15 da Lei 8.213/91. Colho do referido Pedilef n. 5006552-34.2016.4.04.7000/PR:
"O STJ conta sobre o tema com o seguinte precedente:
PREVIDENCIÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. NEGATIVA DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL. INEXISTÊNCIA. PENSÃO POR MORTE. QUALIDADE DE SEGURADO. DESEMPREGO VOLUNTÁRIO. EXTENSÃO DO PERÍODO DE GRAÇA. ART. 15, § 2º, DA LEI N. 8.213/91. NÃO APLICABILIDADE. 1. Verifica-se não ter ocorrido ofensa ao art. 535 do Código de Processo Civil/73, na medida que o Tribunal de origem dirimiu, fundamentadamente, as questões que lhe foram submetidas, apreciando integralmente a controvérsia posta nos autos. 2. A Previdência Social tem por finalidade o amparo ao beneficiário que, mediante fatos da vida, por vezes alheios à sua vontade, venha a experimentar situações que respaldem o direito à obtenção dos chamados benefícios previdenciários. 3. Ao traçar os objetivos da Previdência Social, o art. 1º da Lei n. 8.213/91 enumera as circunstâncias capazes de ensejar a cobertura previdenciária e, dentre elas, está expressamente descrita a situação de desemprego involuntário. 4. Nada obstante o § 2º do art. 15 da Lei n. 8.213/91 não seja categórico quanto à sua incidência apenas na hipótese de desemprego involuntário, em uma interpretação sistemática das normas previdenciárias é de se concluir que, tendo o rompimento do vínculo laboral ocorrido por ato voluntário do trabalhador, sua qualidade de segurado será mantida apenas nos doze primeiros meses após o desemprego, a teor do art. 15, II, da Lei n. 8.213/91, sem a prorrogação de que trata o § 2º do mesmo artigo 5. Recurso especial improvido. (REsp 1367113/SC, Rel. Ministro SÉRGIO KUKINA, PRIMEIRA TURMA, julgado em 21/06/2018, DJe 08/08/2018)
Já esta Corte Nacional contempla inúmeros casos de sua apreciação, como se colhe nos seguintes exemplos:
BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO. AUXÍLIO-DOENÇA. RESTABELECIMENTO. QUALIDADE DE SEGURADO. PERÍODO DE GRAÇA. PRORROGAÇÃO. ART. 15, § 2º DA LEI Nº. 8.213/91. DESEMPREGO. AUSÊNCIA DE OPORTUNIDADE DE PROVA. ANULAÇÃO DO ACÓRDÃO RECORRIDO. PROVIMENTO PARCIAL DO INCIDENTE. 1 - A prorrogação do período de graça prevista no parágrafo 2º do art. 15 da Lei nº. 8.213/91 somente se aplica nas hipóteses de ausência de contribuições ao sistema previdenciário decorrente de desemprego involuntário efetivamente provado. Entendimento pacífico do STJ. 2 – Fundando-se a decisão submetida à TNU em pressuposto inexistente – na espécie prova de desemprego – impõe-se a anulação do acórdão recorrido para que no JEF seja dada oportunidade à parte autora-recorrida de produzir tal prova. 3 - Incidente de uniformização conhecido e parcialmente provido. Acórdão anulado. (00166793520084013200, JUIZ FEDERAL ALCIDES SALDANHA LIMA, DOU 08/04/2011.)
VOTO-EMENTA PREVIDENCIÁRIO. QUALIDADE DE SEGURADO. PERÍODO DE GRAÇA. PRORROGAÇÃO. ART. 15, § 2º DA LEI Nº. 8.213/91. PROVA DA SITUAÇÃO DE DESEMPREGO. MERA AUSÊNCIA DE ANOTAÇÃO DE VÍNCULO EMPREGATÍCIO NA CTPS. INSUFICIÊNCIA. PRECEDENTE DESTA TURMA NACIONAL EM SENTIDO DIVERSO SUPERADO. ACÓRDÃO RECORRIDO ALINHADO AO ENTENDIMENTO DO STJ (PET 7.115/PR). INCIDENTE DE UNIFORMIZAÇÃO NÃO CONHECIDO. 1 - Pedido de Uniformização interposto em face de acórdão que confirmou a sentença a qual julgara improcedente pedido de concessão de auxílio-doença, sob o fundamento de que o autor não mais detinha a qualidade de segurado na data do surgimento da incapacidade (novembro de 2003), uma vez que seu último vínculo empregatício cessara em 19.6.2002. Adotou o acórdão recorrido a tese de que não há como estender ao autor o prazo de 24 meses de período de graça referido no § 2º do art. 15 da LBPS, em razão da total falta de prova quanto à situação de desemprego. 2 - O recorrente suscita divergência entre o acórdão recorrido e o entendimento adotado por esta Turma Nacional no PEDILEF nº. 2003.82.10.008118-5 (Rel. Juiz Federal Pedro Pereira dos Santos, DJ 19.3.2007) no qual se acolheu a tese de que a carteira de trabalho sem anotação de vínculo empregatício presta-se a comprovar a situação de desemprego, para os fins previstos no art. 15, § 2º da Lei nº. 8.213/91. 3 - A prorrogação do período de graça prevista no parágrafo 2º do art. 15 da Lei nº. 8.213/91 somente aplica-se nas hipóteses de ausência de contribuições ao sistema previdenciário decorrente de desemprego involuntário efetivamente provado. A ausência de registro na CTPS após a cessação do último vínculo empregatício não é suficiente para comprovar a situação de desemprego. Entendimento pacífico do STJ (PET 7.115/PR, Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, Terceira Seção, DJE 6.4.2010). 4 - Precedente desta TNU em sentido diverso superado. Acórdão recorrido alinhado ao entendimento pacificado no STJ. 5 - Incidente de uniformização não conhecido. (00206482220084013600, JUIZ FEDERAL ALCIDES SALDANHA LIMA, DOU 27/04/2012.)
Posto isso, entendo por definir a tese no sentido de que "a prorrogação do período de graça prevista no art. 15, §2º, da Lei 8.213/91 somente se aplica na hipótese comprovada de desemprego involuntário, não abrangendo, portanto, as hipóteses de rescisão por justa causa e pedido de demissão".
Sob esse contexto, admitir que o contribuinte individual simplesmente faça prova de falta de atividade como sinônimo de desemprego involuntário, sem examinar-se a causa da cessação de sua atividade econômica anterior, acaba por lhe conferir um tratamento privilegiado em relação ao empregado, sabidamente mais frágil e destinatário de maior proteção, o qual, se postulada demissão ou ensejado justa causa para o fim do vínculo, não terá o elastecimento pretendido no §2º do art. 15 da Lei 8.213/91. Se para ele se examina a causa de cessação da atividade anterior, como bem aponta a exigência de caracterização de desemprego involuntário disposta como risco social na Constituição, porque para o contribuinte individual a mesma indagação não seria feita? Penso que essa conduta, na suposta aplicação do princípio de igualdade, levaria em conta apenas o resultado posterior consistente na falta de atividade, mas deixaria de considerar o momento anterior e objeto do risco social que é justamente a indagação dos motivos que levaram à cessação da atividade anterior pelo segurado.
Talvez como obiter dictum, essa indagação não passou despercebida no julgamento do Pedilef n. 50473536520114047000, no sentido de que, quem quer que seja o segurado – empregado ou contribuinte individual –, compete-lhe demonstrar situação de desemprego involuntário. Nesse sentido:
[...] 6.1. De acordo com o art. 15, §2º, da Lei 8.213/91, mantém-se a qualidade de segurado, independente de contribuição, por até 24 (vinte e quatro) meses, prorrogáveis por mais 12 (doze), desde que comprovada situação de desemprego.
6.2. Por outro lado, dispõe a Constituição Federal no art. 201, III, que a previdência social será organizada sob a forma de regime geral, de caráter contributivo e de filiação obrigatória, e atenderá, nos termos da lei, à proteção ao trabalhador em situação de desemprego involuntário. (grifo)
6.3À luz do regramento constitucional acima, a interpretação que melhor se coaduna com a finalidade da norma é aquela segundo a qual apenas o desemprego involuntário está apto a receber a proteção especial deferida pela legislação previdenciária. Com efeito, o fator de risco social eleito pelo legislador para ser objeto de atenção e proteção especial foi o desemprego involuntário.
6.4. A norma constitucional em destaque, ao enunciar a expressão "nos termos da lei", exige naturalmente que a regra complementar subjacente se coadune com seus preceitos valorativos. Em outras palavras, a locução "desemprego involuntário" foi ali colocada como objeto de destaque, a significar adequação da lei a seus termos.
6.5. Ademais, considerando a nítida feição social do direito previdenciário cujo escopo maior é albergar as situações de contingência que podem atingir o trabalhador durante sua vida, não é razoável deferir proteção especial àqueles que voluntariamente se colocam em situação de desemprego. No desemprego voluntário não há risco social. O risco é individual e deliberadamente aceito pelo sujeito.
6.6. A norma do art. 15, §2º, contém regra extraordinária, que elastece por até 36 (trinta e seis) meses o período de graça. Regra extraordinária que, por assim dizer, deve ser apropriada a situações extraordinárias, de contingência, imprevisíveis. Se a situação foi tencionada pela parte, a ela cabe o ônus de sua ação (ou inação), não ao Estado. [...]
6.7. Ressalte-se que não se trata de criar restrição ao comando legal. Cuida-se, em verdade, de adequar a norma legal ao comando constitucional, interpretando-o em conformidade com os princípios informadores do Direito Previdenciário, dentre eles a proteção ao hipossuficiente e a seletividade e distributividade na prestação dos benefícios e serviços.
6.8. Com estas considerações, entendo que a interpretação adequada a ser conferida ao §2º do art. 15 da Lei 8.213/1, à luz do art. 201, III, da Constituição Federal, exige a condição de desemprego involuntário para o deferimento da benesse contida na legislação previdenciária.
7. Ante o exposto, voto por conhecer e dar provimento ao presente incidente de uniformização, reafirmando o entendimento desta TNU de que a prorrogação do período de graça prevista no §2º do art. 15 da Lei 8.213/91 somente se aplica às hipóteses de desemprego involuntário (PEDILEF 200972550043947, JUÍZA FEDERAL VANESSA VIEIRA DE MELLO, TNU, DOU 06/07/2012). (PEDILEF 50473536520114047000, JUIZ FEDERAL BRUNO LEONARDO CÂMARA CARRÁ, TNU, DOU 23/01/2015 PÁGINAS 68/160.)
O que se percebe é justamente a exigência de que a prova demonstre que a situação de desemprego não tenha sido causada voluntariamente pelo segurado, o que, adaptado à condição do contribuinte individual, exige a devida demonstração por ele de que a cessação de sua atividade econômica anteriormente desenvolvida foi cessada por condição alheia à sua vontade, ou seja, por causa involuntária.
A diferença existente entre o empregado e o contribuinte individual foi examinada por ocasião do Pedilef n. 0001974-48.2012.4.01.3311/BA, no qual se consignou:
É tranquilo o entendimento de que, como regra geral, o contribuinte individual é o responsável pelo recolhimento de suas contribuições, cabendo a si o ônus de promover o pagamento nas datas e valor corretos. É o que dispõe o artigo 30, II, da Lei nº 8.212/91:
Art. 30. A arrecadação e o recolhimento das contribuições ou de outras importâncias devidas à Seguridade Social obedecem às seguintes normas:
(...)
II - os segurados contribuinte individual e facultativo estão obrigados a recolher sua contribuição por iniciativa própria, até o dia quinze do mês seguinte ao da competência;
A controvérsia surge quando a remuneração desse profissional se dá mediante a prestação de serviços a empresas, diretamente ou por meio de cooperativa de serviços, tendo em vista que o art. 4º da Lei nº 10.666/2003 criou o dever de essas entidades promoverem a retenção da contribuição previdenciária devida pelo autônomo. Na sequência, previu o art. 5º do mesmo diploma legal a obrigação de o contribuinte complementar as contribuições que porventura tenham sido recolhidas abaixo do mínimo legal, senão vejamos:
Art. 4o Fica a empresa obrigada a arrecadar a contribuição do segurado contribuinte individual a seu serviço, descontando-a da respectiva remuneração, e a recolher o valor arrecadado juntamente com a contribuição a seu cargo até o dia 20 (vinte) do mês seguinte ao da competência, ou até o dia útil imediatamente anterior se não houver expediente bancário naquele dia.
§ 1o As cooperativas de trabalho arrecadarão a contribuição social dos seus associados como contribuinte individual e recolherão o valor arrecadado até o dia 20 (vinte) do mês subsequente ao de competência a que se referir, ou até o dia útil imediatamente anterior se não houver expediente bancário naquele dia.
(...)
Art. 5o O contribuinte individual a que se refere o art. 4o é obrigado a complementar, diretamente, a contribuição até o valor mínimo mensal do salário-de-contribuição, quando as remunerações recebidas no mês, por serviços prestados a pessoas jurídicas, forem inferiores a este.
Diante desse cenário, podem surgir quatro situações que resultarão em situação de pendência fiscal:
1) o contribuinte presta serviços de valor igual ou superior ao salário mínimo, a empresa ou cooperativa retém a parcela referente à contribuição previdenciária mas NÃO promove o recolhimento da exação;
2) o contribuinte presta serviços de qualquer valor e, a despeito da obrigação legal, NÃO há retenção da parcela referente à contribuição previdenciária por parte da empresa ou da cooperativa;
3) o contribuinte presta serviços de valor inferior ao mínimo legal, a empresa ou cooperativa retém a parcela referente à contribuição previdenciária e promove o recolhimento da exação;
4) o contribuinte presta os serviços de valor inferior ao mínimo legal, a empresa ou cooperativa retém a parcela referente à contribuição previdenciária mas NÃO promove o recolhimento da exação;
Tendo em vista que a sistemática inaugurada pelo art. 4ª da Lei 10.666/2003 veicula mera norma de substituição tributária, que não exime o contribuinte individual do dever de complementar o pagamento do valor que faltar para atingir o mínimo ou recolher diretamente a exação sempre que não houver a retenção dela na fatura de prestação dos serviços, conclui-se que apenas na situação contemplada pelo item 1 é que a irregularidade do pagamento não poderá gerar prejuízo ao segurado, seja por eventual atraso no recolhimento, seja pelo recolhimento em valor inferior ao mínimo.
Em todos as outras hipóteses caberá ao segurado ou efetuar diretamente o recolhimento porque das duas uma: OU não terá sofrido o desconto no valor recebido pela prestação do serviço (item 2) OU a retenção terá sido sobre valor inferior ao mínimo, hipótese em que terá o dever de promover o recolhimento da diferença de valor para que seja atingido o valor mínimo de contribuição (itens 3 e 4). A única diferença entre essas duas últimas hipóteses é que no caso do item 4 não constará nenhum recolhimento em seu favor nas respectivas competências a despeito de ter havido a retenção, bastando que o segurado comprove perante o INSS que houve o desconto de uma parte do que seria devido, cabendo-lhe a responsabilidade apenas pelo que faltar.
Diante de todo esse contexto, faz-se imprescindível que se apure o motivo que levou à cessação da atividade econômica, empresarial ou profissional, exercida anteriormente pelo contribuinte individual, tal como se verifica se o empregado pediu demissão ou deu causa à rescisão do vínculo, justificando-se a prorrogação do §2º do art. 15 da Lei 8.213/91 apenas na hipótese de comprovação de que a atividade anterior foi cessada de forma involuntária pelo contribuinte individual.
Quanto a essa prova, o STJ decidiu na Pet 7115 pela possibilidade de ampla produção, inclusive por testemunhas, motivo pelo qual não deve se restringir ao registro no órgão do Ministério do Trabalho. Lembro que até a Administração admite a comprovação por outros meios, como a percepção do seguro desemprego. Desta feita, a mesma compreensão deve nortear a prova em relação às causas involuntárias de cessação da atividade pelo contribuinte individual, como também à desocupação posterior.
Assim, voto por definir a seguinte tese: "a prorrogação da qualidade de segurado por desemprego involuntário, nos moldes do §2º do art. 15 da Lei 8.213/91, se estende ao segurado contribuinte individual se comprovada a cessação da atividade econômica por ele exercida por causa involuntária, além da ausência de atividade posterior".
Posto isso, voto por DAR PARCIAL PROVIMENTO AO INCIDENTE, determinando o retorno dos autos à turma de origem para adequação, nos termos da Questão de Ordem n. 20 da TNU.
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